Hannah Luiza (Halu)O sol já estava alto quando abri os olhos e ouvi os passarinhos cantando do lado de fora. Não era só o barulho deles, mas também as vozes de Matheus e Gigante no quintal, preparando o churrasco. O cheiro de carvão aceso invadia a casa, trazendo a promessa de um dia cheio de risadas, comida boa e muita bagunça.Levantei-me devagar, ainda sentindo a leveza do momento de ontem à noite. A festa no baile tinha sido incrível, e, apesar da pequena confusão com um grupo rival, tudo acabou bem. Matheus, como sempre, liderou o bonde com sabedoria, e eu não podia estar mais orgulhosa do homem que estava ao meu lado. Ele não era perfeito, mas quem é? O mais importante é que ele estava tentando, por mim e pelo nosso bebê.Depois de tomar um banho rápido, fui para a cozinha preparar uma salada para acompanhar o churrasco. Comida saudável nunca era prioridade para o bonde, mas eu estava grávida, e alguém precisava pensar em coisas além de carne, cerveja e maconha.Logo, Carlinha
Luiz Carlos (Luizinho)Acordei com a cabeça latejando, mas nem era ressaca, era essa porra de ansiedade que sempre me pega quando sei que vou estar no mesmo espaço que a Vany. A casa da Halu tava cheia de gente, a fumaça do churrasco já tomava conta e o som de pagode rolava solto. Me enfiei no quintal, de olho na movimentação, e claro, de olho nela.Lá estava a Vany, toda bonita, rindo com Halu e Macla. Parecia até que não tinha acontecido nada entre a gente ontem à noite. Mas eu lembrava de cada detalhe. Aquele cabelo bagunçado, a pele quente, o jeito como ela gritava meu nome... Ah, irmão, aquela mulher é do caralho. Só que hoje ela tava toda cheia de si, fingindo que eu não existo.— Aí, Luizinho, tá babando por quê? — Matheus chegou do nada, me dando um tapa nas costas.— Nada, mano. Só olhando o movimento.Ele deu uma risada daquelas, debochada.— Movimento? Tu tá olhando é pra Vany, porra. Já entendi qual é a tua.— Ah, para de graça, MT. Vany é tipo eu: cachorra sem dono.— Cac
Hannah Luiza (Halu)Acordei naquele pique de aniversário, sabe? Carlinha tava tão animada que mal tinha dormido. Eu já tinha deixado tudo pronto no salão do jeitinho que ela queria: muita cor, brinquedos espalhados, mesa de doces linda, bolo temático... Tudo perfeito pra minha princesa. Não era só um aniversário, era o dia dela brilhar.Quando os convidados começaram a chegar, a festa pegou fogo. As crianças correndo, pulando nos brinquedos, os adultos dançando os funks infantis que Carlinha adora. Tava tudo fluindo bem. Ela tava radiante, com aquele sorriso que ilumina o mundo.Mas, como sempre, parece que a felicidade atrai problema, né?Eu tava na mesa dos salgados organizando umas bandejas quando a confusão começou. A mãe da Macla e da Vany chegou. E não foi numa boa, não. Ela tava completamente drogada, gritando como se fosse dona do pedaço.— Cadê a minha neta? Eu quero ver minha neta! Eu sou a avó dela e tenho esse direito, porra! — ela berrou.O salão inteiro parou. As criança
Matheus (MT)Eu acordava com o barulho da chuva fina batendo na janela do quarto. Odeio chuva faz lembrar do dia que mataram meu pai tentando invadir o morro. Halu estava esparramada na cama ao meu lado, um braço protetor sobre a barriga imperceptível que carregava nosso bebê.Olhei pra ela e sorri. Ela parecia tão tranquila, como se todo o caos de ontem tivesse evaporado durante a noite. Mas eu sabia que não era bem assim. O que aconteceu na festa ainda tava martelando na minha cabeça, e eu não podia ignorar.Levantei com cuidado pra não acordar ninguém, fui até a cozinha e comecei a fazer o café. Dona Neuza já tinha avisado a gente que não ia poder vim hoje, então vou adiantar as coisas por aqui. Enquanto a cafeteira fazia seu trabalho, eu peguei o celular e abrir o WhatsApp. Macla tinha mandado uma mensagem de madrugada.“Matheus, desculpa por ontem. Nossa mãe é um problema que a gente ainda não sabe como resolver. A Halu não mereceu o que ela falou ontem, minha mãe não é espelho
Hannah Luiza (Halu)O dia começou divertido, apesar da nossa vida corrida e dos perigos eminentes que nos cercam, sempre nos divertimos. Carlinha ainda estava comendo as panquecas que ela pediu para eu fazer e enquanto isso liguei para o Do Céu que avisou que ele e Boca de sacola já estavam à minha espera. Depois liguei para Macla e pedi a ela para ficar com Carlinha. — Amiga, tô na padaria, trás ela aqui que eu fico. — Valeu, amiga. Vou resolver aquele assunto de ontem. — Ela soltou um suspiro. — Boa sorte com a Marinete. Sei que ela é minha mãe, mas tenho vergonha dela e dos B.Os que ela causa.— Relaxa, amiga! Vou só conversar com ela. Quando sai de casa, Do Céu e Boca estavam com o radinho na mão, prontos pra qualquer parada.— Qual é a treta, patroa? — Boca perguntou, já animado.— Hoje a gente vai na casa da Marinete. Vou resolver isso de uma vez.Eles se entreolharam e assentiram, sem questionar. Era por isso que eu confiava nesses caras. Deixamos Carlinha na padaria e Sub
Hannah Luiza (Halu)(Três meses depois) Quem diria que depois de tanto caos as coisas finalmente estariam tranquilas? O morro tá em paz. Os negócios tão fluindo, sem nenhum estresse maior. A Marinete? Ela aprendeu o lugar dela e, sinceramente, tem sido um alívio não ter que lidar com as loucuras daquela mulher. Carlinha tá cada dia mais feliz, e isso é tudo que importa pra mim. Hoje, especialmente, é um dia importante. É a inauguração do nosso projeto social, algo que eu e o Matheus sonhamos há um tempo. Não vou mentir, foi um corre danado pra organizar tudo, mas valeu cada segundo. Quando olho pra Carlinha brincando com as outras crianças, sinto que finalmente tô fazendo algo que importa. — Tá pronta, amor? — Matheus perguntou sorrindo. — Pronta, sempre, meu querido. Bora lá que hoje é dia de festa. Peguei Carlinha no colo e seguimos juntos pro galpão que transformamos no centro do projeto. O lugar tava lotado. Crianças, mães, jovens, todo mundo ali parecia empolgado. A ene
O hospital tava lotado, como sempre. O barulho de crianças chorando, gente falando alto no celular e aquela música ambiente de espera eram quase sufocantes. Matheus estava ao meu lado, com o pé batendo no chão numa agonia só. — Se essa médica demorar mais cinco minutos, eu juro que vou dar um tiro na cara de alguém, Halu. Revirei os olhos, segurando a vontade de rir. Ele era exagerado até a última gota, mas essa mania de resolver tudo na base da ameaça me tirava do sério. — Matheus, pelo amor de Deus! Que exemplo é esse que você quer dar pras nossas crianças? Ele bufou, cruzando os braços como uma criança contrariada. — Exemplo, Halu? O exemplo é que ninguém brinca com a minha família, porra! Respirei fundo, segurando a paciência. Coloquei minha mão sobre a dele, tentando acalmá-lo. — Ó, respira e para de palhaçada. Tá tudo bem. A médica vai chamar a gente logo. Não precisa arrumar confusão. Ele me olhou, meio contrariado, mas assentiu. Matheus era assim: uma mistura d
Matheus (MT)O som do carro ecoava baixo enquanto eu subia a ladeira. Meu coração ainda tava acelerado com a notícia de que eu ia ser pai de dois moleques. Dois! Caralho, era bom demais pra ser verdade. A Halu tava exausta, então deixei ela em casa pra descansar. Dei um beijo nela antes de sair, prometendo não demorar.Agora era hora de subir pro “escritório”. O morro não parava, e, mesmo com as melhores notícias do mundo, eu sabia que precisava resolver uns assuntos. Quando cheguei, os caras já estavam na esquina, fazendo o tradicional toquinho.— Olha quem chegou! O rei do morro e agora pai dos príncipes! — gritou Dudu, me zoando enquanto batia no peito em respeito.Dei risada e bati de volta.— Tá ligado, né, irmão? Dois pivetes pra tocar o terror aqui!Os caras riram, e fizemos o toquinho rápido antes de eu seguir pro barraco onde ficava o “escritório”. O Luizinho já tava lá, de pé, mexendo no celular. Assim que me viu, largou o aparelho e veio me cumprimentar.— MT! Já fiquei sab