Detestava Carnaval! A porra da festa da carne. Toda a bagunça que parecia eterna nessa época do ano me entediava. Não se via nem se falava em outra coisa e isso era muto chato. Odiava a loucura coletiva que tomava conta das ruas, das casas, das famílias e da TV. Minhas lembranças da época de menina eram muito ruins pois nessa época do ano Marta trabalhava dobrado e até viajava e lá em Copacabana passava uma semana inteira por conta dos cuidados da Chica e morria de medo de Madame Severina me colocar na roda de prostituição ou fazer leilão da minha pureza. Eram dias e noites de agonia e incerteza. E durante a minha adolescência o movimento do Bordel triplicava e meu ir e vir era complicado. Para minha segurança Mainha proibia minhas saídas e eu ficava refém dentro do apartamento sempre acompanhada e vigiada por alguém de confi
Então era isso que eu vinha notando de diferente na Galeria, no ap., no João. Também a bicha velha do Claudio, o síndico, estava diferente. Sempre tão rabugento e quando usava Cocaína ficava mudo e torto e do nada todo bonzinho, socializando.Era a Heroína!Voltamos a festa e a maioria dos convidados dançavam ao som do rock do Nirvana, muito doidos e felizes. Passei por eles desviando dos sapatos, saltos, gravatas e casacas jogados pelo chão. Nem me notaram. Cruzei a saleta e fui me debruçar no janelão que dava para a Avenida Copacabana. Lá embaixo o povo brincava numa farra ecumênica regada a alegria brasileira. De qualquer forma acabara de conhecer um outro tipo de alegria e ainda sentia os efeitos no corpo. Bem no meio das minhas pernas. A sensação de orgasmo que senti com a Heroína me fez lembrar da festa na
Pensei em desistir do negócio, pensei até em voltar para o Baixo Gávea. Sei lá! Dentro de mim os instintos de aranha apitavam querendo me avisar do perigo envolvido em toda aquela história. Mas eu já estava muito na onda do desafio. No fundo eu sabia que não iria ser um simples negócio! Maninho foi de cerveja, se levantou e serviu-se mostrando intimidade com o lugar, o Índio bebia wiske com gelo num copo maior que a sua mão. Podia saber que era pelo cheiro. Eu amava wiske! Ficamos nessa bebendo enquanto ele mostrava em um telão pendurado no teto o que rolava ali no seu castelo, se referia assim ao casarão e com muito orgulho. A propaganda de última geração era fantástica e em inglês, apresentava o Clube Privê como casa de entretenimento e descanso. Em verdade um puteiro com jogos de azar e consumo d
4ª PARTESe despediu me pedindo juízo, me abençoou e mandou os mil beijos de Marta. Falei com meu filho e com Maria. Matei a saudade, mas não consegui arrancar dela sobre a saúde de minha irmã. Alguma coisa apertava o meu coração. Não saí nem atendi mais nenhum telefonema, também não consegui chorar Pacheco andava louco atrás de mim e pediu a Telma que fizesse eu atender o telefone. Meus clientes de Cocaína me procuravam loucamente e esperavam por mim lá no Bar Coluna e por fim compravam suas drogas com outros traficantes. Ele estava perdendo uma grana considerável. E eu nem aí!- A boca do Maninho deve estar bombando! Foda-se! – Falei alto enquanto tirava o fone do gancho.Pelo celular liguei para o Giovani e fiz a encomenda do Índio para daí dois dias, em seguida l
Eu ainda vivia a ilusão de poder conviver com a Heroína na veia assim como vivi com a Cocaína por tantos anos. usar drogas sempre me emburreceu.Nós éramos nordestinas! Fortes por natureza! Iríamos vencer essa guerra também! Fosse o que fosse! Seríamos felizes juntas!Três meses de Clube Prive e eu trocava as cabines de jogo pelas grandes e confortáveis almofadas do salão da escuridão depois de algumas aplicações. Esse era o melhor jeito de sentir o clímax da onda. O uso da Heroína na veia causa um torpor paralisante que ainda não tinha me alcançado, porém ao meu redor era comum ter muitos usuários desmaiados, delirantes e fora de si e eu estava cansada em ver mulheres jogadas pelas almofadas serem abusadas sexualmente por todo tipo de pessoa. Homens, mulheres, grupos. Sem prote&cce
E assim nos divertimos muito no Coluna, como nos velhos tempos. Só que éramos pessoas diferentes agora. Eu, no meu eterno vai e vem, entre idas e vindas ao banheiro e as doses que me deixaram numa boa a noite toda. Telma não saia do meu pé e lá pelas tantas já muito doida acabou confessando que Marta a incumbiu de cuidar de mim e que era para eu voltar para casa fosse como fosse. Ela já sabia da Heroína, todos sabiam e ela conhecia bem. O Alemão foi viciado em Heroína por um bom tempo. Na Alemanha é comum. Ela o conheceu assim. Hoje ele só cheira Cocaína. Ela passou muito sufoco com o cara e viu o rumo que as coisas estavam tomando. Por isso deu um tempo. Disse que a vida era minha e que elas não tinham o direito de interferir. Mas que estavam ali para ajudar. Lá pelas tantas Solange e Gracinha saíram para um programa.&
O calor do sol no meu rosto me despertou. As janelas abertas do quarto de hospital traziam a presença do dia. A brisa era suave e quente e o cheiro das flores invadiam o lugar.- Estou sentindo cheiro das flores! – gritei bem alto.Não estava com medo, nem insensível. Além dos odores do lugar senti o calor do sol e o sopro quente do vento no rosto.Eu estava sentindo! E estava bem.Dr. Marcelo e um enfermeiro entraram sorridentes me dando bom dia. Me surpreendi, pois retribui o cumprimento. Estava feliz em vê-lo! Em ver um rosto conhecido. E aquele alívio acho que na alma, em saber quem eu era e finalmente livre das alucinações.- Bom dia Laura. – Dr. Marcelo sorrindo.- Bom dia senhorita. – O enfermeiro simpático.- Bom dia senhores. Sou eu dr., a Laura. Bom dia pro senhor também.
Tinha sonhos e muito amor para dar a minha família que cuidou de mim e não deixou que eu me acabasse. Eles lutaram do jeito deles por minha vida e muitas vezes até mais que eu mesma. Assim sendo todo o sofrimento foi enterrado naquele belíssimo almoço de domingo organizado para me receber em casa. Eles me perdoaram e eu perdoei a mim mesma. Tudo era passado! Nos meses que se seguiram o objetivo era ficar limpa. Eu frequentava os grupos de Alcoólicos Anônimos (A.A), o de Narcóticos Anônimos (N.A.). Por um bom tempo me dediquei a um centro de recuperação que funcionava como um ambulatório. Oferecia oficinas, grupos de recreação e atividades artesanais, sala de convivência, biblioteca e grupos de conversa, além das consultas habituais de psicólogo e médico. Davam os remédios e café
Voltar para casa sem Marta foi difícil! Acho que de todos os tormentos que vivi esse foi o mais difícil. Porém ao entrar na cobertura senti uma imensa paz. Kalebe brincava na sala com Maria. Cheiro de comida no ar. A mesa posta para o jantar. Tudo limpo e arrumado. Assim como eu!O enterro de minha irmã foi majestoso.O velório varou a noite para que todos pudessem se despedir. Teve música, comes e bebes e um vídeo de despedida. Teve muita choradeira também. As mulheres que trabalharam para Marta a tinham como uma mãe, os amigos a adoravam e todos os afilhados estavam lá! Foi lindo!Ela estava linda e foi tudo do jeitinho que queria. Deixou tudo escrito, tudo pago e encomendado. E o Advogado, seu marido, realizou todas as suas últimas vontades e depois do enterro partiu. Foi para o sul. Tinhas parentes por lá.- Deixei