Olivia estava íntima, passou a se referir a ele por “Gu” e nada mais, ele não ligava, era quase que um cuidado maternal. Quase.
Olhou para as horas no celular, passava do meio dia, ainda teria tempo para se recompor e recuperar a vida que a Claudia sugou. Pediu almoço e se permitiu ficar jogado na sala, não faria nada, não se moveria para absolutamente nada, às nove horas da noite estaria inteiro novamente. No horário marcado, estava à espera de Armando.
— Está muito elegante hoje, jovem — disse olhando-o.
— Muito obrigado, grandão, nunca usei isso aqui, precisei recorrer à menina da recepção para me ajudar — confessou enquanto ajeitava a gravata borboleta, se olhando no pequeno espelho do carro.
— Tenho certeza que ela não se importou em ajudar. — Piscou para Gustavo e os dois riram.
Ela não ligou, ao contrário, assim que viu Gustavo saindo do elevador com a faixa e a gravata do smoking em suas mãos, banho tomado, cabelo arrumado e o perfume tomando conta por onde ele passava, a menina hiper ventilou e quase morreu de tanto tremer. Ele não era um homem lindo e sabia disso, mas tinha uma beleza que despertava o desejo de alguns. Não entendia esse poder que exercia sobre as mulheres, associava esse fascínio delas a seu trabalho, sempre achou que o cheiro de sexo e falta de pudor o acompanhavam. Quando mais novo, isso o deprimia, sentia como se o cheiro das atrocidades sofridas estivesse impregnado em suas narinas, mas com o tempo reverteu a situação e fez de suas dores, seu trabalho e usava isso a seu favor.
O carro parou e Armando o tirou de seu devaneio, empurrando-o gentilmente para fora. Não falou muito sobre aquela noite, era uma mulher e eles iriam a um evento, não passou nome, idade, e muito menos sobre o que se tratava aquela noite, disse somente que ela lhe daria todas as informações necessárias. Ele desceu, parou em frente à grande porta branca da mansão em que estava, bateu três vezes e esperou. A porta abriu e uma mulher baixa e com uniforme o atendeu, pediu para que entrasse e esperasse que logo sua senhora desceria, e assim ele fez. A casa era linda e tão majestosa quanto demonstrava ser por fora, parou em frente à grande escada e viu o sapato vermelho e o tecido fino balançando enquanto ela descia.
Ele parou de respirar.
Linda. Os cabelos escorriam lisos por seu corpo, emoldurando o rosto perfeito, os olhos azuis destacando-se na maquiagem muito bem feita e em seus lábios somente um toque molhado e nada mais, não tinha mais do que vinte e dois anos. O vestido vermelho moldado ao seu corpo, revelando cada curva, cada detalhe perfeito. Ele não conseguiria descrever o que ela usava, mas se existisse a perfeição, com toda a certeza aquela mulher se enquadrava na definição.
Parou no último degrau e o encarou, Gustavo notou uma gota de constrangimento e vergonha, mas ela tratou de esconder rapidamente o sentimento. Limpou a garganta antes de falar.
— Oi, me chamo Jéssica — disse baixo.
— Prazer, sou o Gustavo. — Ele sorriu, aproximando-se um pouco mais, fazendo com que ela desse um passo para trás. — Não vou te morder.
— Sim... É... Claro que não... — Estava completamente sem jeito, segurou no corrimão, procurando equilíbrio.
— Vamos? — Gustavo estendeu a mão para ela e a guiou para a porta assim que ela se apoiou nele. — Pode me falar mais sobre essa noite?
— Ah, sim, claro. — Esperou entrarem no carro para então lhe explicar o que aconteceria. — É um dos eventos da empresa do meu pai, ele não mora aqui no Brasil, e... Ai, meu Deus, como isso é complicado. — Ela não conseguia concluir o que precisava ser dito.
Gustavo viu a angústia nos olhos dela, segurou suas mãos entre as mãos dele e notou o quão gelada ela estava. Respirou fundo a encarando.
— Jéssica, olhe para mim — pediu baixinho com medo de assustá-la. — Preciso saber o que espera de mim essa noite, o que contou para as outras pessoas, assim não irei te colocar em nenhuma situação constrangedora. Estou vendo que não está acostumada a contratar esse serviço.
— Ah, por Deus, não, não estou mesmo! — exclamou em pânico, tratando de deixar claro que não fazia aquelas coisas, tirando uma risada sincera de Gustavo. Ela era encantadora.
— Tudo bem, notei que você não faz essas coisas, então por que estou aqui hoje? — perguntou com um carinho exagerado.
— Bem, meu pai não mora no Brasil há anos, cuida de tudo lá da Alemanha, onde é nossa matriz — começou a explicar.
— Sim... — Ele a encorajou a continuar.
— Mas resolveu aparecer para a semana de eventos e disse que queria conhecer meu namorado — revelou derrotada.
— E cadê seu namorado? — Não conseguia entender o que seria difícil para ela, era linda, não teria problema algum em ter alguém em sua vida.
— Eu não tenho um — suspirou.
— Então por que ele espera encontrar um? — Estava mesmo confuso.
— Meu pai me quer ao lado dele. Após a morte da minha mãe, ele ficou muito protetor, só sossegou quando disse que estava apaixonada, portanto, não poderia ir embora do Brasil. Ele viveu um amor arrebatador com a minha mãe, sabe o peso de uma paixão, é um romântico incurável, e assim que lhe contei sobre esse amor louco, disse que me entendia e que poderia ficar. — Ela não respirava, falava rapidamente e Gustavo se prendeu às suas palavras para conseguir entender o que lhe esperava. — Então ficou muito mais fácil para administrar as filiais aqui do Brasil, continuar no meu país, com ele achando que estava não somente apaixonada, mas sendo cuidada por alguém.
— Espere — interrompeu —, você é uma mulher linda e, pelo que vejo, inteligente e independente, o que acontece com os homens ao seu redor? São burros? Impossível não querer você — declarou a verdade que sentia, fazendo-a corar.
— É complicado. — Sua voz não passava de um sussurro e quando ela mordeu o canto interno da boca, fazendo a bochecha quase sumir, Gustavo enlouqueceu.
Não conteve o toque. Levantou a mão e deslizou os dedos gentilmente sobre onde a bochecha estava sendo sugada, sentiu o corpo dela tremer e se afastar automaticamente. Rapidamente abaixou sua mão e se afastou um pouco mais, não queria despertar medo nela, jamais.
— Então o que precisa de mim para essa noite é que eu seja o seu namorado apaixonado e protetor?
— Sim. — Deu de ombros, nitidamente envergonhada.
— Sem sexo? — perguntou frustrado, sabia qual seria a resposta.
— Oh, céus, sim... Não, quer dizer, não, sem sexo. — Ele sorriu da reação dela.
— Preciso saber: o que é permitido?
— Como assim?
— O que posso fazer com você, onde posso te tocar, como quer que eu me comporte... — Aquilo era um negócio e ele precisava ser direcionado da forma correta.
— Não havia pensado nisso... — Ficou quieta alguns segundos, pensando em seus limites. — Sem sexo, sem passar a mão no meu corpo, sem beijo na boca...
— Eu não beijo na boca — disse de forma seca.
— Nunca? — questionou incrédula.
— Jamais.
— E por quê?
— É pessoal, íntimo, para ser entregue a alguém que mereça.
— E o sexo não? — Estava mesmo curiosa.
— Sexo é só corpo, alguém quer prazer e eu dou, nada além disso — declarou de forma fria.
— Não entendo...
— É só um negócio. Alguém contrata meu serviço e eu executo.
— Isso é triste.
Sim, ele sabia, realmente era muito triste e solitário, poderia passar a noite em uma orgia, com milhares de pessoas, mas quando fechasse a porta da sua casa, seria somente ele e mais ninguém. Mas se não fosse assim, se não fosse essa vida, ele já teria morrido, com certeza. Deu de ombros concordando com ela, sentiu o toque leve em seu braço, atraindo a atenção de seus olhos.
— Desculpa. — Ela disse com sinceridade.
— Não tem problema, é triste mesmo, mas é a minha realidade, o que se pode fazer?
Eles não disseram mais nada, a mão dela permaneceu no braço de Gustavo durante todo o trajeto. Assim que chegaram, ele desceu e abriu a porta do carro para ela que segurou em sua mão, apertando-o um pouco. Estavam em frente a uma grande casa, tão grande quanto a casa de Jéssica, e alguns homens parados na porta garantiam a entrada em segurança dos convidados que chegavam. Homens e mulheres da alta sociedade do país, ela explicou que era o encontro entre os diretores das filiais e matriz. Não estavam em grande número, mas a presença de seu pai mexia com os nervos de todos ali, principalmente o dela. Gustavo pegou a mão de Jéssica, levou até seu braço e caminhou com ela entrando no grande salão.
— Pare de tremer — sussurrou em seu ouvido, fingindo que estava fazendo um carinho com um beijo delicado.
— Não está ajudando muito assim — respondeu sem pensar, fazendo-o sorrir.
— Só relaxe. — Levou a mão à base da cintura dela e a puxou um pouco mais para perto.
Sem sexo e sem contato íntimo, ele entendeu, mas não perderia a chance de tocá-la, isso jamais. Caminharam pelo salão, parando para ser apresentado aos sócios e diretores. Gustavo sorria, sendo gentil e educado com todos, despertando o interesse das mulheres e a desconfiança dos homens. Jéssica parava o salão por onde passava, sua beleza e simpatia enchia o lugar, era sempre amável com todos, chamando-os sempre pelo primeiro nome e perguntando dos filhos ou netos, despertando a admiração em Gustavo.
— Será que poderei enfim abraçar a minha menina?
A voz alta ecoou até o casal que estava envolvido em uma conversa com os diretores da filial do sul. Jéssica respirou fundo, virando-se na direção do pai e soltando-se de Gustavo.
Sua presença era imponente, não havia como negar. Alto, cabelos prestos e olhos claros, eram a cópia um do outro, o sorriso largo se espalhou em seus lábios e ele abriu os braços, ela correu para ele, como uma criança corre para o pai após um período afastada, matando a saudade. Gustavo segurou o bolo que se formou em sua garganta, ele sabia qual era aquele sentimento, também já foi amado, muito amado, e a sensação de segurança e proteção dos braços do seu pai foi o que o manteve inteiro durante muitos anos. Ouviu seu nome sendo chamado e balançou a cabeça buscando sua razão novamente, sorriu e caminhou em direção aos dois que o olhavam confusos.
— Desculpa, me perdi na cena linda entre pai e filha — disse com sinceridade, ganhando um sorriso carinhoso de Jéssica e o olhar atento de seu pai.
— Está desculpado, rapaz. Vem cá, deixe-me conhecer quem é que está cuidado da minha princesa e a mantendo longe de mim.
Gustavo travou, não conseguiu fazer os pés obedecerem e se mover, o pai de Jéssica era mesmo grande e com aquele “ar” de pai protetor que aterroriza os namorados, era exatamente assim que ele se sentia, como se fosse sua primeira namorada. Demorou, mas se obrigou a andar e ir para mais perto, sentiu o corpo ser puxado e envolvido em um grande abraço de urso, ele olhou para Jéssica assustado e ela se desculpava com o olhar, implorando em silêncio para que ele entendesse.
— É um prazer enfim te conhecer, Gustavo. Sei que Jéssica já falou de mim para você, mas sou Otavio, o pai dela.
Ele o soltou, permitindo que desse dois passos para trás. Agradeceu por ter se apresentado novamente, ela não havia dito o nome do pai e seria uma situação muito embaraçosa. Gustavo abriu seu melhor sorriso, aproximou-se de Jéssica, entrelaçando os dedos aos dela.
— Claro que falou, é um prazer enfim conhecer o senhor.
— Ah, por Deus! — Ele exclamou e Gustavo descobriu de onde Jéssica pegou a expressão, sorriu. — Me chame de Otavio.
— Está certo, Otavio.
Passaram a hora seguinte entre conversas e risadas. Era fácil gostar daquele homem e Gustavo, por alguns minutos, se esqueceu de que não pertencia ao mesmo mundo. A música lenta e suave começou a tocar e alguns casais ocuparam o salão central, ele puxou Jéssica com cuidado, envolvendo-a em seus braços, falando alto o suficiente para que o pai escutasse.
— Dança comigo, amor? — O sogro de mentira sorriu aprovando.
— C-Claro — gaguejou e o acompanhou pelo salão.
O casal movia-se pelo salão ao ritmo da música, os corpos colocados e embalados, ela deitou a cabeça no peito de Gustavo e ele a apertou ainda mais contra seu corpo, acariciando seus longos cabelos, respirou profundamente, sentindo o perfume doce que o corpo dela exalava.
— Como ele sabia meu nome? — Gustavo perguntou baixinho, sem querer quebrar o clima do momento.
— Oi? — Ela levantou a cabeça encontrando o seu olhar.
— Seu pai — sorriu —, como sabia o meu nome? — Ela corou.
Ficou completamente vermelha e voltou a morder o interior da bochecha.
— Vi quando você entrou no catálogo de Olivia. — Ele a olhou sem entender. — Ela é esposa do meu pai. — Deu de ombros como se aquela frase fosse tudo o que ele precisava saber.
— Espere, Olivia é mulher do seu pai? Mas como ele está lá e ela aqui? E você usa a empresa dela? Mas disse que nunca tinha feito nada parecido.
— Por Deus, não, não mesmo, não fiz. — Saiu em defesa própria. — Jamais usei, mas isso não me impede de ver o catálogo. — Deu de ombros envergonhada. — Sim, são casados há quase cinco anos. Quando papai foi embora, Olivia bateu o pé e ficou, mas eles levam isso muito bem... — Voltou a deitar a cabeça em seu peito e, automaticamente, ele passou a acariciar seus cabelos. — Vivem viajando para se encontrarem e, de uma maneira muito estranha, eles fazem dar certo.
Não havia muito o que ser dito, foi engraçado para Gustavo saber um pouco sobre a vida particular da mulher que o salvou da situação de miséria em que vivia, mas isso não lhe pertencia, não era algo do seu real interesse, então decidiu não dar continuidade ao assunto, somente apertou Jéssica contra seu corpo e se permitiu viajar na melodia da música. Relaxou com ela em seus braços, deslizando os dedos entre os fios do cabelo escuro, sentia o coração da menina bater ritmado contra seu peito, como se estar ali, dentro do seu abraço, fosse o lugar certo para ela estar. Nunca viveu um relacionamento normal, jamais teve um encontro ou uma namorada, mas de alguma forma sentia que se não fosse o desastre em sua vida, ele poderia ter vivido algo muito parecido com aquilo e sorriu ao pensar que gostaria que fosse com alguém como ela. Gustavo se deu conta do que a mente dele estava projetando e, sem jeito algum, afastou-se de Jéssica, deixando-a sem equilíbrio e sozinha no salão. Andou o mais rápido que conseguiu, atravessando as portas e saindo em busca de ar. Apoiou as mãos na mureta que separava a varanda do jardim e puxou o ar fresco com toda a força. Sua mente estava inquieta e seus pensamentos trabalhavam de forma desenfreada, não estava acostumado com aquilo. Com todos os seus outros clientes, era somente sexo e nada mais e com isso ele poderia lidar, mas ser alguém para alguém, estava além da capacidade dele.
— O que houve? — Ouviu a voz carinhosa e preocupada que atormentava a sua mente.
— Nada — respondeu secamente.
— Saiu correndo, quase me derrubando. Está passando mal? — Aproximou-se levando a mão ao ombro do rapaz, mas ele afastou-se bruscamente a fazendo recuar. — Desculpa — disse baixo, afastando-se.
Gustavo precisava colocar limites naquela situação toda, ele estava sendo pago por um serviço e iria executá-lo. Virou e a puxou para si, colando seus corpos de forma muito íntima, despertando o pavor nos olhos dela. Levou uma mão ao rosto de Jéssica, fazendo-a olhar diretamente para ele.
— Sou pago para o prazer e isso eu posso te dar — falou e seu polegar deslizou sobre o lábio inferior dela que ainda o olhava incrédula. — Mas somente isso, não espere de mim um namoradinho romântico, pois não terá.
Ele se curvou, decidido a tomar a pele do pescoço dela em seus lábios e atiçá-la até que se rendesse a ele ali mesmo, como todas sempre se rendiam. Jamais havia sido rejeitado e ela não seria a primeira, após provar do que ele era capaz, sabia que a situação seria outra. Gustavo sentiu o rosto arder, assim que a mão de Jéssica o atingiu com tanta força que sua cabeça virou para o lado e ele a soltou no susto.
— Acredite, se quisesse sexo, eu o teria e com alguém menos desprezível que você. — A fúria estampada na face da mulher. — Está aqui essa noite porque está sendo pago e muito bem pago, então desempenhe o papel que foi contratado para fazer e tenha uma gota de hombridade pelo menos.
Jéssica foi enfática, virou-se e saiu martelando os passos para dentro do salão, deixando Gustavo com a mão no rosto que ainda ardia e as palavras que ouviu, machucando muito mais do que a agressão. Ela tinha razão, ele foi um escroto com ela e não existia justificativa para sua atitude, agiu pelo medo e acabou trocando os pés pelas mãos. Respirou fundo, ajeitou sua roupa, tocou novamente o rosto e foi ao encontro dela para se desculpar. Assim que entrou no salão, viu Jéssica nos braços de um rapaz da idade dela, muito bem vestido e conversavam trocando risadas enquanto ele a deslizava para salão. Algo dentro de Gustavo inflamou, uma sensação de posse, totalmente desconhecida por ele até então, invadiu o seu peito e ele estava pronto para arrancar ela dos braços daquele homem, mas foi contido por uma mão forte que apertava de forma não gentil o seu braço, mantendo-o no lugar.
— Sabe meu jovem... — O pai de Jéssica começou a dizer. — O ciúmes é um sentimento estranho e quase sempre nos cega ao ponto de nos levar a atos impensados.
Gustavo olhava para a mão que apertava o seu cotovelo, queria somente puxar o seu braço e sair daquele lugar, mas o senhor forte ao seu lado o impedia.
— Não sei do que o senhor está falando — disse entredentes.
— Sabe sim, está praticamente rosnando enquanto minha princesa dança com o filho de um dos nossos sócios.
— Como disse, não tenho ideia do que o senhor está falando. — Ele puxou gentilmente o braço e cruzou sobre o peito, olhando a cena à sua frente. Eles ainda dançavam e riam de algo que o cara estava falando.
Otavio riu alto notando a cara que Gustavo estava fazendo, era um homem experiente e conhecia muito bem o amor. Deu alguns tapinhas nas costas dele e ainda rindo aconselhou sobre o ombro enquanto se afastava.
— Acalme-se, meu jovem. Nem todas as guerras ganhamos na força, em alguns casos, a sabedoria é o melhor caminho.
Gustavo permaneceu na mesma posição, não se moveu, não foi até Jéssica. No final de tudo o pai da menina tinha razão, ela não o pertencia, não eram nada um do outro e fazia somente três horas que se conheciam, era um trabalho, não passava disso e assim que a entregasse em sua casa, não seria mais um problema dele. Repetia essas palavras como um mantra, mas sua raiva não cedia um centímetro sequer. A música enfim acabou e ela foi ao encontro de Gustavo, estava nitidamente envergonhada.
— Me desculpe — disse decidida. — Não tenho o direito de falar o que falei e muito menos de tocar em você daquela forma.
— Está desculpada. — Não olhava para ela, mas acima de sua cabeça, na direção do jovem que a comia com os olhos.
Jéssica se virou encontrando o olhar daquele que acabou de dançar e sorriu para ele acenando com a mão.
— Acho que já encontrou o namorado para colocar no meu lugar. — As palavras saíram antes que ele conseguisse detê-las. — Caso não se importe, vou embora e faço a devolução do seu dinheiro assim que chegar em casa.
Jéssica ficou parada o olhando, não estava entendendo a atitude dele, não sabia o que dizer ou como agir, sentiu-se mal por ter deixado ele constrangido ou com qualquer sentimento ruim, mas não sabia que algo assim poderia acontecer. Levou a mão ao braço dele que ainda mantinha cruzado ao peito e o olhou atentamente nos olhos.
— Gustavo, peço desculpa se te magoei, juro que jamais foi a minha intenção. O Bê é um amigo querido, filho de um dos sócios do meu pai e....
— Não tem o porquê se desculpar ou me dar satisfação. — Ele a interrompeu. — Estou indo porque não vejo mais sentido para a minha presença, você precisa de alguém real em sua vida e agora, pelo jeito, já tem.
— Mas eu quero você — disse ainda mais baixo. — Pode me levar para casa?
Gustavo a estudou, aquilo tudo estava indo para um caminho estranho demais, quem ele achava que era para sentir ciúmes daquela mulher? Onde sua razão estava quando ele mais precisava dela? Não entendia como conseguia sentir-se tão possessivo sobre alguém que não sabia da existência até algumas horas atrás. Deixaria a menina em casa e iria embora sem olhar para trás.
— Vamos.
— Preciso me despedir do meu pai.
Ele assentiu e caminhou ao lado dela, levando a mão à base de sua cintura de forma possessiva e ela não se importou com isso. Despediram-se do pai que os olhava sondando o casal a sua frente, foram embora com a promessa de um novo encontro, que Gustavo sabia que jamais aconteceria. Entraram no carro, sentando-se longe o suficiente um do outro e a sensação de vazio preencheu o peito dele mais uma vez. Precisava acabar logo com aquilo e sair de perto dela o mais rápido possível. Vivia o melhor momento de sua vida e não estragaria tudo com um relacionamento qualquer, não que ela fosse querer se envolver com alguém como ele, não tinha nada para oferecer, não era ninguém.
— Obrigada.
Escutou a voz doce de Jéssica lhe tirar de seus pensamentos sombrios. Estavam parados na frente da casa da menina, ainda era cedo demais e teria que ir para casa de Uber e avisar Armando que não precisaria buscá-lo aquela noite. Ele desceu do carro, abrindo a porta para ela, ajudando-a a descer, caminharam em silêncio até a porta.
— Desculpe pelo fracasso dessa noite, como disse, assim que chegar em casa, faço o estorno do valor pago em sua conta.
— Pare com isso por favor — pediu. — Estou me sentindo péssima já, vamos somente acabar com tudo isso e esquecer o que aconteceu. Te peço desculpa por essa noite e prometo que não se repetirá.
Jéssica continha as lágrimas que buscavam libertação desde o momento em que ele a agarrou na festa, mas se conteve ao falar, não iria acabar sua noite passando uma vergonha ainda maior. Ela sabia quem ele era e o que fazia, estava acostumado com mulheres mais velhas, que tinham o que pagavam para ter, e não com meninas inseguras brincando de namoradas para o pai. Acenou para ele e entrou, deixando Gustavo sem palavras na sua porta, mas ficou atrás da cortina, espiando como uma menina de quinze anos. Viu ele mexer no celular, bufar e levar a mão aos cabelos. Estava claramente frustrado. Aproximou-se da porta algumas vezes, travava uma batalha interna e ela torcia com todas as suas forças para que ele batesse e a chamasse, mas não o fez. O misto de sentimentos que rompia em seu peito era esmagador, assim que seus olhos se encontraram quando ela desceu ao encontro dele, seu coração ganhou vida e tentou sair de seu peito. Sabia que era um homem bonito, flertava com ele desde o dia em que Olivia confidenciou a ela sua ideia de trazê-lo para o catálogo da empresa, dividiu com Jéssica a ideia, mostrando a ela o site dele, tendo o cuidado de lhe mostrar cada foto que existia ali. A princípio Jéssica não entendeu o porquê daquela conversa e exibição, mas ficou fascinada pela beleza que existia no olhar triste daquele homem e esqueceu das perguntas que deveria fazer à sua madrasta.
Ele suspirou derrotado e caminhou em direção à saída, deixando a menina sonhadora para trás.
Os dias de Gustavo eram todos iguais, ainda que com pessoas diferentes, sua vida seguia um padrão. Passava o dia dormindo, usando a academia do prédio, assistindo a filmes e séries, mas depois ganhava a noite paulistana, perdendo-se em corpos esculpidos pelos profissionais da cirurgia plástica. Algumas pessoas marcavam sua semana, outras simplesmente aconteciam como mais uma noite qualquer. Nunca mais ouviu falar de Jéssica, mas assim que chegou em seu apartamento, após negociar com Armando os dados bancários da mulher, fez a transferência para a conta dela, valor esse que voltou para a conta dele quase que no mesmo instante. Desistiu, estava decidido a não ficar fermentando aquela situação, esquecer o quanto ela parecia perfeita no encaixe dos seus braços e seguir em frente.— Olha, preciso dar parabéns à Olivia, faz muito tempo que ela não tem um exemplar desses no
— Saindo durante o dia? — Ric perguntou, assim que Gustavo cruzou a recepção do hotel.— Viu só, eu disse que não era um vampiro.Os dois riram e ele entrou no carro que já o esperava. Iria almoçar com Jéssica e, após a noite que passaram juntos, tudo o que ele queria era encontrá-la de verdade, como duas pessoas normais. O motorista parou em frente ao restaurante, ele desceu e ligou para ela, para saber onde estava.— Onde está? — perguntou assim que ela atendeu.— “Bom dia para você também.” — Ela riu. — “Estou saindo de casa agora.”Gustavo revirou os olhos bufando.— Poxa, Jessi! — Não conteve a frustração.— “O que foi?”— Marcamos às treze horas, já são treze e vinte, e você ainda nem sa
— Bom dia, minha pequena — ele falou ao ouvido dela.Gustavo já estava de banho tomado e usava boxer e camiseta. Não deixaria mais os ferimentos dos ombros à mostra, aquilo machucou Jéssica e ele não queria que sua vida longe dela interferisse naquela relacionamento frágil. Ela espreguiçou e abriu os olhos com dificuldade, olhando para ele sorrindo, segurou-o pela camiseta e o puxou para ela, fazendo-o cair sobre a cama, rindo.— Quem mandou você se vestir? — Ela disse puxando a camisa para cima.— Espera. — Ele pediu se soltando dela, levantando da cama. — Não quero ver em seus olhos o que vi ontem.Ela o encarou alguns segundos.— E o que você viu ontem? — Sentou-se na cama.— Dor.Não disseram nada, sabiam o que estava pairando entre eles, mas Jéssica também sabia o que havia feito, en
— Nossa! — Ele exclamou quando ela saiu do closet. — Está linda.Jéssica parou e sorriu, deu uma voltinha no próprio corpo, mostrando-se para ele.— Dá pro gasto? — brincou.Gustavo caminhou até ela e a puxou pela cintura, apertando-a contra o seu corpo, inclinou-se tocando o nariz dela com o dele, brincando em forma de carinho.— Você é o encaixe perfeito para mim — disse ainda roçando um nariz no outro.— Então acho que acertei na roupa.Sobre o corpo, um vestido azul escuro colado, na altura dos joelhos, de mangas compridas, não existia um único decote, nada que deixasse a sua pele delicada à mostra, mas a forma como o vestido se moldava ao corpo dela, deixaria qualquer homem por onde passasse, louco. Gustavo vestia um terno cinza também escuro, camisa branca e sem gravata, deixando-o com ar descontra&i
Conseguiam conciliar a vida dupla de Gustavo, quando se encontravam no decorrer da semana, o faziam após Jéssica sair do escritório e antes de Gustavo sair para a noite. Nos finais de semana, Jéssica literalmente comprava o horário do namorado e assim ele era somente dela e, de um modo muito esquisito, estava dando certo para eles. Claro que as crises de ciúmes era uma constante, ela sentia-se perdida e enlouquecida. Quase sempre que Gustavo saía de um encontro seu celular quase explodia de tantas mensagens, fazendo-o rir sempre e por inúmeras vezes. Algumas delas o faziam mudar de trajeto e ir direto para casa de Jéssica, somente para lembrar que eles se pertenciam, ainda que as circunstâncias mostrassem o contrário. Olivia parecia apostar naquele relacionamento, facilitando e muito a vida para os dois, premiando Jéssica com alguns finais de semana gratuitos, o que sempre despertava a curiosidade del
JéssicaDeixar Gustavo, sem dúvida alguma, havia sido a decisão mais doída de Jéssica, ainda que ao lado dele sofresse pelas noites em que o dividia com outras pessoas, não estar com ele era infinitamente pior.Passou dias sem sair de casa e nem ao menos conseguiu ir até a empresa, não atendeu aos telefonemas, e-mails ou qualquer outro tipo de contato. Seu pai já estava de partida, precisava voltar para a matriz, mas a falta de contato com a filha no terceiro dia, despertou sua preocupação.— Então, você está ai? — a voz paternal invadiu o quarto escuro e ela sentiu o colchão se mover com o peso do corpo masculino. — O que aconteceu com você, princesa?Não sabia o que poderia responder ao pai, como dizer o motivo de romper com o namorado? Como explicar que o trabalho dele os afastou
Acreditou que a dor física em seu corpo infantil fosse a pior que teria que enfrentar no decorrer de sua vida, ou até mesmo a dor da perda de seus pais, os dias de miséria e fome, as noite mal dormidas em bancos de praças, quando fugiu do orfanato. Gustavo acreditava que nada mais em sua vida poderia lhe causar tamanho desespero, mas estava completamente enganado. Sentia em seu corpo e sua alma a dor da perda, como se o respirar fosse um ato complicado e o pensar não estivesse mais no controle de suas mãos.Doía.Os dias que se seguiram sem a presença de Jéssica o devastou, ligou o automático e não se preocupou com as consequências que aquela atitude lhe traria. Ainda trabalhava, passava as noites com os poucos clientes que procuravam por ele, mas não se importava em dar o seu melhor. Sua má fama correu tão rápido quanto a boa e, em pouco tempo, os clientes vi
Dentro da pequena mala, somente os presentes que ganhou das clientes que se envolveu. Todas as roupas, perfumes, sapatos, tudo, foi deixado para trás. Transferiu todo o dinheiro que tinha para uma nova conta, deixando sobre a mesa da cozinha, ao lado do celular, os cartões vinculados à empresa, fechou a porta, colocando dentro de um envelope, deixando na portaria, aos cuidados de Olivia e partiu.Seis meses na empresa de Olivia havia garantido a ele um tempo para respirar e colocar as coisas em ordem. Saiu de lá e foi para o único lugar que conseguia pensar. Claudia abriu a porta de sua mansão e o encarou, enquanto ele entrava e se jogava no sofá de sua sala.— Mas o que aconteceu com você? — Quis saber, verdadeiramente preocupada. — Deixei um jovem renovado e encontro um homem acabado, somente algumas horas depois.— Uma avalanche passou por cima de mim e me soterrou — declarou