Livy Clarke
Meu corpo ainda ardia, coberto pelo café quente que começava a esfriar. Minha roupa encharcada estava grudada no meu corpo, e eu era incapaz de continuar de pé. A minha barriga doía tanto, e eu praguejei. Sentia tanto medo de perde-lo. – Oh meu bebê, por favor, não vá... Por favor... – Implorei, olhando para baixo. Em um ato instintivo, minhas mãos tocaram na barriga. – Por favor... Os meus olhos se voltaram para a devastação no rosto de uma mulher logo a frente. A forma como ela me encarava, com seus olhos grandes arregalados. Estava claro que ela não tinha a menor noção de que eu esperava um bebê, e para a minha sorte, espero que mais ninguém descubra. – Você... Você não é estranha. Você só está... – Os olhos dela ainda estavam em puro choque. – Você está gravida? – Ela praticamente cuspiu as palavras aos meus pés. – Por favor, fala baixo. – Implorei, olhando para os lados. As minhas mãos estavam no ar, pedindo que ela dissesse mais uma única palavra. O rosto ainda permanecia assustado. As mãos dela foram direto ao cabelo, massageando as mexas que se desprenderam do penteado. – Por favor, eu não sabia. Me perdoa, eu não... Eu só achei que você fosse estranha, eu... – Ela parecia nervosa. – Tudo bem, mas por favor, pare de repetir isso. – Que você está grávida? Não posso... Meu deus, eu estou em choque. Ele vai me demitir. Droga. Eu preciso desse emprego. – Por favor, não! Ele não precisa saber. – Como não? Como pretende esconder? Sua barriga ainda não está tão grande, mas em breve vai ser impossível. – Eu sei. Eu só preciso que ele entenda que eu sou boa. Eu preciso desse emprego. – Os meus olhos queimavam, e eu ainda tentava segurar as lágrimas contidas nas pálpebras. – Por favor. Eu preciso disso. Eu preciso mais que você. A mulher me olhou, sorriu, mas não parecia algo bom. Seu semblante parecia se transformar em algo estranho, como se ter um segredo meu fosse seu triunfo. – Muito bem. Eu vou fazer esse favor para você, mas espero que seja bem recompensada no futuro. Meu coração afundou dentro do peito. Eu estava ainda mais nervosa que antes. A dor na barriga começava a passar, mas eu sentia o frio do liquido derramado sobre mim. – Eu não tenho dinheiro. – Não se preocupe, Livia. – Livy. – Que seja! Nós vamos descobrir uma maneira. Não se preocupe com isso agora. Apenas troque a sua roupa. Não quero que o chefe te veja assim. Se for demitida, que vantagem eu tenho? – Ela se sentou atrás do balcão novamente, e todo o seu medo havia desaparecido. Fiquei parada, observando aquela mulher. Eu sabia que os planos para mim não seriam bons, mas que escolha eu tinha? Dez minutos e uma infinidade de cafés era tudo o que eu conseguia pensar. Corri para trocar a minha roupa, comprar os cafés e voltar para o escritório. Dez minutos depois, eu estava batendo na porta, receosa. – Entre! – Escutei uma voz masculina que ainda não conhecia. O senhor Hardin me encarou fixamente. Ele sempre parecia muito observador, mas incapaz de me enxergar como mulher, e como mãe. Nunca me disseram para quem eram os cafés, mas eu podia ler no semblante de cada um deles. Entreguei um a um, pensando num motivo plausível para não existir uma cafeteira no escritório. ‘nota mental: comprar uma’. Passei ao lado do senhor Hardin, mas os meus olhos estavam grudados no protótipo de arma gravado no computador. A tela se apagou repentinamente, e então, eu o vi, me encarando. Seu semblante não parecia bom. – Quer alguma coisa, senhorita Clarke? – Desculpe. – Apenas deixe os cafés e saia! – Sim senhor. Mas a minha memória ainda estava fixada nos desenhos. Eu poderia apontar um par de erros naquele projeto, mas duvido que o senhor Hardin me escutaria. – Precisa de mais alguma tarefa, senhorita Clarke. Ou apenas buscar café já foi o bastante por hoje? – Estou aqui para o que o senhor precisar. – Respondi. Eu sabia que ele estava bravo. Funcionários não deveriam olhar os projetos das armas. – Ótimo. Me espere na minha sala. – Sim, senhor. – Me virei e sai. Eu não sabia como, mas sentia que todos estavam olhando para mim. O desconforto era imenso. E o meu coração acelerava cada vez mais rápido. O senhor Hardin pretendia me demitir? Certamente, seria a minha tragédia. O meu fim. Caminhei em direção a sala e sentei em uma cadeira. As minhas pernas estavam doloridas, e os meus pés pareciam inchados. Respirei fundo, mas não serviu para aliviar o nervosismo. Todos os dias seriam assim? Fechei os meus olhos. Era difícil dormir naquele apartamento, ainda mais quando precisava ir ao banheiro a cada cinco minutos. – As reuniões são demoradas. Apenas um cochilo... Só um segundo...Abri os meus olhos no tempo que achei ser dois segundos após fecha-los. Um som irritante me tirou de um lindo sonho, onde nada disso precisava estar acontecendo. Meu semblante se tornou triste e desesperado, e o badalar ainda estava presente, irritante como na primeira vez que o escutei. Meus olhos se moveram em direção ao som, e então eu pulei da cadeira como um gato assustado. Me levantei e encarei o meu chefe, olhando para mim com toda sua expressão fria. Os dedos rápidos batiam fortes sobre a pilha de papéis e desenhos espalhados. – Chefe! – Os meus olhos estavam arregalados, e eu esperava que a franja pudesse esconde-los ao menos um pouco. – Gostou da minha sala? – O senhor Hardin perguntou. – Acho que deveríamos colocar uma cama, bem ali! – Ele se levantou e andou até a parede vazia. – O que acha, senhorita Clarke? Dessa forma você teria um descanso muito melhor. O que acha da ideia? Meu rosto queimava de vergonha. Eu sei que deveria explicar que o bebê me causava sono, e que
– Na minha vida? – Na sua vida, senhorita Clarke. O que há para saber? – Eu não sou interessante, senhor Hardin. Eu não tenho nada a dizer. – Tem certeza? Eu posso descobrir... – Ele segurou o telefone e o colocou no ouvido. O meu coração acelerou, mas eu tentei manter qualquer nervosismo afastado de mim. Se o Daren souber que eu estou trabalhando, vai garantir que a minha vida seja arruinada outra vez. Respirei fundo. – Espera! Ele me encarou. Parecia completamente vitorioso, e eu soube no mesmo instante que tudo não passava de um jogo de poder para ele. Meu arrependimento gritava, e eu deveria me demitir se pudesse, mas eu precisava responder as perguntas do meu chefe tirano. – Eu tenho um casamento falido com um homem rico que me traiu. Eu tenho uma mãe morta, sou imigrante, e só consegui estudar por que ajudei um homem no passado e ele acreditava que me devia algo. Eu não tenho nada no mundo, senhor Hardin, além desse emprego. E se o senhor me demitir, eu provavelmente não c
Hardin Vasculhei por todos os lugares, procurando pela maldita roupa. Maila provavelmente as jogou fora quando eu finalmente a demiti daqui. Dois anos em que eu não me relacionava seriamente com alguém, e quando finalmente abri o meu coração, aquela maldita o quebrou. Se eu ao menos tivesse raciocinado por um minuto... Se eu não tivesse assinado o maldito papel... Andei sem roupas pelo escritório, esperando que a minha assistente voltasse, mas já se passou quinze minutos desde que ela saiu, e eu ainda continua a esperar. Andei até os quadros agressivos presos nas minhas paredes e pensei no maldito erro do projeto. Maila me custou alguns milhões, e essa merda me custará ainda mais... Uma bebida seria o ideal agora. Andei até o armário e me servi. Só estava tentando afogar a maldita amargura que se instalou em mim.A porta se abriu. Os olhos dela eram incapazes de me olhar, e eu precisava admitir que achava, ao menos, adorável... O que havia da senhorita Clarke que me fazia acha-la ad
As pessoas me encaravam como se eu estivesse ao lado de uma aberração, e eu senti uma maldita vergonha por isso. Caminhei ao lado dela, e me sentei em uma mesa reservada para seis pessoas. A senhorita Clarke tentava manter a postura, embora estivesse sempre demonstrando um pouco de corcunda, ao ficar sempre com os ombros para baixo. Puxei a cadeira, mas ela se sentou em outra, totalmente alheia ao meu gesto. Eu odeio ser um homem cavalheiro com quem não presta atenção. Revirei os olhos, ainda segurando a maldita cadeira aberta, e então me sentei na cadeira que deveria ser dela. Uma garçonete andou até nós, levando com ela os cardápios. Encarei a senhorita Livy Clarke, e eu consegui notar cada traço de decepção nos olhos dela. Provavelmente pensava no quanto aquilo parecia absurdo, mas esqueça, não somos um casal e jamais vamos ser. – O que você quer comer? – Não sei. Não entendo muito do que está escrito aqui. – Não faz mal. É só me dizer do que gosta. Mas ela continuava encara
– Chega! – Bati o punho na mesa. – Você poderia deixar ela falar? – Não estava confiante, mas se ela ao menos pudesse convence-los. – Sei que o senhor tem tempo para nos dar. – Nós não temos. Ela o encarou. Nem parecia a mesma mulher medrosa de sempre. – Acredito que o senhor precisará de muito mais tempo se pedir um projeto em outra empresa. Entende que tudo terá que começar do princípio? – Entendo, senhorita, mas... – Mas estamos falando de meses de testes e projetos. Eu não acredito que o ministro da defesa fique satisfeito. Os homens se olharam. – E de quanto tempo estamos falando? – Dois dias? Eles olharam um para o outro novamente, e eu estava ali, paralisado. Esse tipo de coisa nunca aconteceu comigo. Ninguém jamais lutou por mim como ela fazia naquele momento. – Dois dias. Está bem! Mas nem mais um segundo. Ela os encarou e sorriu. – Entendo que estão com pressa, mas sei que esperariam por mais. – Mas... – Não se preocupem, não vai ser necessário.– Muito bem, senh
O meu coração estava disparado. Eu senti o momento em que o sangue foi drenado do centro do meu rosto para os meus pés. Eu estava paralisada, os meus olhos arregalados, e eu sentia cada olhar que o senhor Hardin direcionava para mim. Eu conhecia aquele olhar enviesado de maldade naquela mulher. Eu soube no mesmo instante em que aquele acordo de segredo custaria muito caro para mim. Ela encarou o chefe e os olhos dela pareciam ter tanto medo quanto os meus. – Senhor? O senhor Hardin caminhou na direção da minha mesa, e ele parecia um Deus, dono de todo o mundo. Tocou na mesa e a encarou ,de cima, como sempre costumava fazer. Dono dela, dono do projeto, dono de tudo! – Eu espero que tenha uma ótima explicação para estar mexendo nos arquivos da minha secretária. – Si-sim? – A recepcionista afirmou, mas nem mesmo ela parecia ter certeza. – E qual seria? – Ele continuava encarando, com os olhos severos que podiam queima-la. – Ainda estou esperando a sua resposta. – O rosto dele não p
Eu ainda olhava fixamente para ele, enquanto o olhar dele não recuava sobre a minha figura feia. Meu rosto estava tremendo tanto quanto as minhas mãos, e eu tinha certeza de que não deveria estar sentido tanto estresse. Não fazia bem para o bebê, e era assustador que ele ainda não se mexesse dentro da minha barriga. – Ninguém! – Eu respondi, olhando no interior dos olhos azuis intensos do meu chefe. – Ninguém? – O senhor Hardin jogou o corpo para frente, aproximando o rosto do meu. – Então como explica ter desenhado um projeto com todos os dados, números, cálculos. Isso não é possível, senhorita Clarke. – Eu não usei os seus números, senhor. – Meus olhos estavam grudados no chão mais uma vez. Eu não podia olhar para ele assim. Não depois do que havia feito. Eu sempre soube, desde que pisei nessa empresa pela primeira vez que haviam termos de responsabilidade, e o mais importante deles era que eu não deveria bisbilhotar ou deixar vazar informações de dentro. E agora, eu estava pres
Surpreendentemente o senhor Hardin sorriu. Parecia genuinamente feliz, pela primeira vez. Eu sequer me lembrava a última vez que o vi daquela maneira, sorrindo. Acredito que nunca deva ter acontecido, e que eu tenha apenas sonhado acordada. Uma onda de choque percorreu da cabeça aos pés em uma velocidade alarmante, quando os braços fortes dele me envolveram em um abraço, e eu senti o meu mundo inteiro girar. O que estava acontecendo? Por que os meus pés não tocavam o chão? Eu flutuava? Não. Eu apenas estava suspensa no ar, por um homem muito, muito forte. – Obrigada! Você é um gênio, senhorita Clarke. – Eu sou? – A minha barriga estava esmagada entre nós dois, e eu podia começar a sacudir os meus pés a aquela altura. O senhor Hardin ainda me esmagava, e os olhares assustados das pessoas pareciam estranhar toda a situação. – Eu me enganei com você. – Senhor Hardin... O senhor poderia...– Claro que eu vou te promover. – Oh, isso é...– Não gostou? – Claro que sim, senhor. Ele p