Gehenna - A Escolha - Parte I
Gehenna - A Escolha - Parte I
Por: Abel Biasi
Cap. 1 - A Transformação

Gehenna - A Escolha - Parte I

“Hoje, os dias viraram noites, e as noites, os meus dias. O tempo parece não existir. Os segundos demoram uma eternidade e o meu rosto continua jovem do mesmo jeito de sempre.

“O meu sofrimento é lutar nesta guerra, que não era minha, mas, agora, estou bem no meio dela.”

BRASIL, SEXTA-FEIRA, 30 DE MARÇO DE 1990.

Estava voltando para casa, depois de uma das piores festas em que estive presente. Eram duas ou três horas da manhã, não tinha certeza, pois serpenteava pelas ruas. Por vezes, tentava enxergar algo, mas não sabia onde estava e nada reconhecia. Bêbado como um gambá, porém, ainda não havia caído.

Havia tomado um chute de minha namorada e, a única coisa plausível, nestas tristes horas, é se afogar em um bom e velho uísque. O que com certeza, depois de alguns goles, sua percepção lhe prega peças.

Entrei numa larga avenida e notei que estava mais escura do que o costumeiro. Olhava para as lâmpadas dos postes, estavam em baixa luminosidade e piscavam como se a carga elétrica não estivesse chegando à sua totalidade.

Abaixei os olhos e bem à frente, cerca de duzentos metros, havia um homem parado. Era forte, mas não de assustar. Usava um sobretudo, que, logicamente, cobria seu corpo todo e um chapéu negro terminava por dar certo ar de mistério a sua silhueta. Estava parado, de cabeça baixa, ao meio da rua.

Olhei para o chão e continuei a andar, sem conseguir me manter em linha reta. Depois de cambalear por mais alguns metros, olhei novamente para me certificar de que o homem ainda estava no mesmo lugar à minha frente e, para minha surpresa, já não estava! Senti-me confuso e algo me chamou a atenção atrás de mim. Assustado virei-me à outra direção.

As sensações não são descritíveis até o presente momento. Estava parado a dez metros de mim, às minhas costas! Mesmo eu estando bêbado, sabia que não havia andando tanto, a ponto de tê-lo ultrapassado, sem ao menos o tendo notado! Antes, ele estava a mais ou menos uns duzentos metros à minha frente! A confusão invadiu a minha mente, já tomada pelo efeito do álcool e fiquei ainda mais atônito. Foi quando gritei desesperado:

- Quem é você? O que quer? Se está tentando me assustar, parabéns! Você está conseguindo. – disse com a voz meio mole.

Para meu maior desespero ele não respondeu e quando deu o primeiro passo em minha direção, desapareceu repentinamente e reapareceu bem à minha frente! Notei seu rosto, um jovem senhor de meia idade, aparentava ter entre seus trinta ou quarenta anos, mas seus olhos aparentavam guardar muitos e muitos segredos de uma longa vida. Eram cheios de sabedoria, amargura, medo, sofrimento, dor, raiva e quando pude notá-lo, meu coração se encheu de todos estes sentimentos. Minhas pernas travaram e nem ao menos consegui correr. Fiquei estático, observando os seus profundos olhos. Foi quando disse:

- “Será meu escolhido. Lutará pela minha espada!”

Sua voz era aterrorizantemente assustadora! Fazia jus aos seus olhos, conhecedores de tudo e até mesmo do interior de qualquer pessoa.

- Mas, como lutarei pela tua espada? Como sou teu escolhido? – perguntei confuso, balbuciando com a voz trêmula e exalando medo.

- Saberás em breve o por quê! – disse e cravou seus dentes caninos e pontiagudos em meu pescoço.

A dor juntava-se com o espanto e os arrepios que eram avassaladores! O medo era o meu mais próximo amigo, porém desleal. Não havia como vencê-lo! O sangue, vagarosamente, extinguia-se de meu corpo! Fraco me tornava e caia à medida que tudo parava de rodar. Sentia que meu sangue esvaía-se! Por fim, caí ao chão. A lua era a minha única testemunha. Sentia-me vivo ainda, vendo-a. Meu pescoço ardia, estava quente, latejava em dois pequenos orifícios. Percebi que estava no limiar de minha vida, estava respirando de forma ofegante, procurando desesperadamente o ar que meu pulmão pudesse mandar à corrente sanguínea, mas, não havia sangue para oxigenar! Sabia que iria morrer! Apertei os olhos e enxerguei meu oponente. Estava agachado ao meu lado e olhava-me, mostrando-se cauteloso, mas sabendo muito bem o que fazia.

- Queres viver meu jovem? – perguntou-me com aquela voz forte.

- Sim! Sim! – balbuciei mais uma vez.

Ele cortou seu pulso e derramou o seu sangue em minha boca. Aturdido neste momento, não entendi o que era aquilo, mas depois da primeira gota cair em meus lábios, agarrei o seu braço. Era de um gosto muito bom! Mas, não era de sangue e sim, de vida! O sabor fez com que tudo em mim voltasse ao normal, de forma que agarrei ainda mais o seu braço e tomei-lhe o sangue!

Logo ele puxou seu braço e me empurrou. Caindo ao chão, meu corpo agora doía. Entretanto, a dor era inigualável, jamais aquela dor seria uma dor comum.

- Estás morrendo! – disse ele - Seu corpo não aguenta mais esta inútil vida! Comprará a minha guerra, mas agora, tu serás imortal! Dormirá, mas voltará sem medo! – disse em sua voz aterrorizante.

Realmente! A dor da morte é insuportável! Fora apavorante! Meu corpo parecia se dobrar e quebrar por dentro! Era como se estivessem me esmagando, os ossos sendo virados aos avessos e, por fim, vagarosamente, meu coração parou, atrofiando-se, para nunca mais bater novamente!

Pronto...Acabei de morrer...

Acordo em casa, em meu quarto e assim que abro meus olhos, a respiração toma conta de meu pulmão como um susto. Levanto-me e, parado, olho ao redor. Consigo ver tudo o que está em meu quarto de forma muito clara, com coloração mais brilhante, nítida. Ao mesmo tempo notei que tudo estava estranho. Irreal, talvez.

Meu corpo parecia estar mais solto, leve e meus pensamentos mais rápidos. A sensação de que o velho se tornara novo pairava ao ar.

Andei até o banheiro de meu quarto, fui diretamente ao espelho e levei um susto. Não vi meu reflexo ao primeiro instante! Voltei a olhar vagarosamente e logo percebi que não respirava e sobressaltei-me! Recuei e fiquei ao lado do espelho, para não olhar para ele. Levei a mão ao pescoço. Havia dois pequenos orifícios em minha artéria. Lembrei-me do que havia acontecido na noite anterior. – Será verdade? – perguntei-me em voz alta começando a ficar atônito.

Desci a mão do pescoço ao peito, vagarosamente, cheguei ao coração e:

- BLAM, BLAM, BLAM, BLAM! Ande Jeremy, já está dormindo há bastante tempo! Desça já, a janta está na mesa e está esfriando! – disse a voz de minha mãe ecoando do outro lado da porta.

O susto, ali, foi imenso! Meu coração não batia! Olhei em volta novamente e o banheiro também estava diferente. A parede, ao fundo, havia tornado-se um portal, ao qual me levava novamente direto àquela noite anterior, a qual vi a sombra daquele homem de sobretudo e chapéu negros! Escutei novamente a sua voz que me disse:

- Tente respirar. Irá disfarçar muito bem.

Assustei-me mais uma vez com a voz, porém, havia se tornado um pouco mais familiar, bem mais do que eu quisesse até aquele momento.

Mesmo assim, fiz o que ordenou sem pestanejar. Os movimentos da respiração voltaram imediatamente. Em seguida, saí do banheiro e fui trocar de roupa. Ainda estava com as mesmas roupas da noite anterior, ou seja, a noite da terrível festa. Abri o armário e fui reparando nas roupas que estavam ali. Sempre gostei de me vestir bem, então peguei algumas calças e camisas e as joguei em cima da cama. Escolhi uma calça preta, estilo motoqueiro, que havia ganhado de minha namorada. Iria continuar a usá-la da mesma forma, mesmo sabendo que tudo havia terminado. Escolhi também uma camisa preta que havia ganhado de minha mãe. Vi que ali estava ainda uma bota preta que minha tia, qual vivia na França, havia mandado junto com um sobretudo. Todos pretos, pouco detalhados, mas muito finos. Porém, no Brasil, com seu calor, era raro usar aquelas roupas. Lembrei-me de quando havia lhe pedido para que um dia pudesse ir conhecer a França. Mas, dizia sempre estar muito ocupada com seus afazeres e em outra ocasião, em que estivesse mais tranquila, iria ligar para que eu pudesse ir. Mas, isto nunca acontecera na verdade e já havia perdido as esperanças de visitá-la. Vesti-me e fui ao espelho. Notei que as roupas me fizeram um pouco mais confuso, pois, nunca havia me vestido daquela forma. Entretanto, naquele momento, de um jeito ou de outro, sabia que era daquela forma que me vestiria dali em diante.

Saí de meu quarto e desci as escadas bem devagar. Não estava com pressa de absolutamente nada. Uma calma pairava sobre mim como nunca havia sentido. As perguntas estavam se fazendo dentro de mim, como se brotassem de uma “mina d’água”. Olhei para a sala e vi que meus pais estavam assistindo o noticiário. Ouvi a chamada que dizia com sua voz grave, quase cavernosa:

- “Mais de trezentos morrem em “boate” no sul da França! Fontes Francesas informaram que terroristas armados chegaram atirando contra um grupo rival e com isso atingiram cerca de trezentos civis. Outras fontes dizem que os terroristas atiravam em um grupo de soldados Franceses que estavam de folga com suas famílias. Há ainda informações de que havia dois soldados de alta patente, ainda não confirmadas. Assim, o exército Francês disse que ninguém atira em seus soldados e não paguem depois. “A vingança será conquistada”, disse um dos soldados sobreviventes”.

- Nossa! Que violência! – disse minha mãe.

- E isso vai somente piorar! Escuta o que estou lhe dizendo! – retrucou meu pai mudando de canal em seguida.

Fui direto para a cozinha e vi que minha irmã estava, como sempre, “pregada” ao telefone.

- Nossa! Mas é sério? – dizia ela – Eu não acredito! Espera um pouco aí, Kátia! Meu irmão está aqui, acabou de acordar. – tapou o telefone com uma das mãos. – Nossa, hein? O porre foi bom então? Chegou sexta de madrugada em casa e está acordando hoje? Dormiu quase dois dias!

- Que horas é Jane? – perguntei.

- Dezenove horas. Só que hoje é domingo!

- Dormi mesmo um dia e meio? – perguntei retoricamente abrindo a geladeira e fechando-a em seguida, como se não houvesse nada para comer, mesmo estando cheia.

- O que vai fazer hoje? – continuou ela ainda tapando o telefone com uma das mãos.

- Não sei. Por quê? Tem algo em mente? – perguntei sem interesse, abrindo a geladeira novamente.

- Quer ir a uma festa comigo e as meninas? Você precisa sair! Esquecer um pouco a sua ex-namorada!

- Ah! Já está sabendo então? – perguntei sabendo que não havia dito nada sobre o que aconteceu.

- Sim! Nós nos encontramos por acaso ontem no shopping e ela estava com um sujeito grande e forte.

- Entendi. – falei e sem fazer o menor desgosto para mim, pois, estava mesmo diferente!

- Então, você vai querer sair comigo e as meninas, ou, vai quer ficar remoendo o que aconteceu? – falou ela pausadamente no início da frase e terminando quase como um apelo emocional não identificado naquele momento que estava sendo perturbador para mim.

- Onde? – falei fechando a geladeira e indo agora ao fogão procurando algo para comer.

- Na casa de uns “gringos” que a Kátia conheceu.

- Hum... – deixei um tempo passar - Não sei. Talvez. – respondi olhando as panelas que estavam sobre o fogão e tendo certa aversão ao alimento.

- Tudo bem Jeremy, faça o que quiser. – disse ela voltando em seguida a falar algo com sua amiga ao telefone.

De repente, sinto algo invadir a cozinha, como um vento. Sinto-me pronto, como se fosse um instinto que não sabia que eu possuía. Minha irmã ao telefone sentiu também aquele vento, mas não notando o perigo, somente disse:

- Jeremy! Feche a janela, por favor. Está muito frio. – voltando a falar ao telefone. – Mas, então Kátia! A que horas você vai para a festa? ... Tudo bem então! Vou tomar um banho e lhe esperar! Tchau. Até daqui a pouco! – desligou o telefone e saiu correndo para o seu quarto.

Fiquei ali mesmo, parado à cozinha, olhando de onde poderia ter vindo aquele ar gélido. A janela estava fechada, a porta também! Senti que algo me chamava para fora.

- Jeremy! – gritou ela do último degrau da escada que ainda permitia-se ver a cozinha abaixo. - A Kátia disse que irá passar aqui lá pelas nove horas! – terminou e continuou correndo escada acima até seu quarto.

Fiquei ali olhando para o nada, hora olhava para a janela, hora me perguntava o que teria sido aquele “vento” sem explicação. Continuava tendo as visões, ou apenas lembrando o que havia sido a noite anterior. Em pequenos flashes. O homem parado, o medo, seus olhos que me devoravam sem me tocar. Olhei para fora mais uma vez e pensei ter visto novamente aquele homem sorrindo de forma sarcástica para mim, sob a moldura opaca da janela. Abri a porta e saí. Não vi e nem mesmo senti nada. Desci os poucos degraus e agora estava ao meio do quintal. Apenas o leve vento tocava meus cabelos e eles voavam junto. Sim, estava uma bela noite de lua minguante e as estrelas, as quais eu fiquei a observar, formavam cadeias e aglomerados. Pude ver escorpião, as três Marias e até mesmo a Constelação de Sagitário. Mas de um jeito que nunca havia visto, estavam mais nítidas, pareciam até mais perto de mim.

Senti, pela primeira vez, uma fome desesperada; não em meu estômago, mas em todo o meu corpo, em todo o meu ser. Minha cabeça parecia explodir; os músculos retraíam-se involuntariamente. Atordoado estava e com isso tomei mais um susto. Havia um gato, o qual eu nunca gostei. Pertencia a uma vizinha, também insuportável por sinal, daquelas que fazem qualquer um perder a calma e vociferar alguma atrocidade para afugentar as maledicências da velha, e dizem que os animais pegam muito da personalidade de seu dono, assim sendo, ele era um gato que gostava de perturbar o meu sono. Era arisco e nunca ninguém conseguiu capturá-lo. Mas, essa noite, foi diferente! Quando tomei a mim, me vi sobre o gato, e, para o meu espanto, além de pegá-lo, fui traído pela fome. Cravei meus dentes em seu corpo. Ainda pude perceber os olhos do gato se assustando por tê-lo pego. Deu um grunhido enquanto cravava os dentes nele, mas logo cessou. Matei o gato.

A sensação me consumiu, era doce, porém não tão saboroso, como pude perceber posteriormente. Tomei o que precisava para me saciar naquele momento rápido, não podendo deixar ninguém ver tal ação e joguei o resto fora. Não entendi primeiro como o peguei e depois muito menos, visto que lhe tomei sua vida. Mas, meu corpo parecia mais sóbrio e se dotava de algo que nunca havia sentido. Percebi que meus dentes estavam pontiagudos machucavam minha língua, mas o gosto do sangue, ah, isso era maravilhoso.

Voltei a observar as estrelas. Parecia que eu flutuava em ver tal beleza. Porém, volto a perguntar-me, que horas eram?

- Deve ser umas dezenove e vinte. – respondi para mim mesmo.

Entrei pela porta da cozinha e olhei para o relógio em cima da geladeira, pregado à parede. Para meu espanto, eram exatamente vinte e uma horas. Fiquei intrigado. Mas não tive tempo para repensar o quanto havia passado as horas. Senti uma força a me puxar para a porta e muito rápido cheguei a ela. Parecia ter rodas em meus pés. Abri a porta rapidamente, o que assustou as meninas que haviam acabado de chegar e não tiveram nem ao menos tempo para apertar a campainha.

- Nossa Jeremy, uma bela transmissão de pensamento! – disse Michela um pouco assustada, quase com o dedo à campainha.

Michela é uma garota bonita, morena, alta e cabelos negros. É digna de respeito quanto à sua beleza. Kátia é a outra garota que eu já conhecia, loira dos olhos verdes, um pouco mais baixa, mas uma linda garota. Mas, havia uma terceira, que eu ainda não conhecia. Olhei para ela e não me contive diante de tão radiante beleza. Fiquei sem ação olhando para aquele lindo rosto muito incomum.

- Esta é Larisse, Jeremy. E Larisse, este é Jeremy, irmão de Jane. – disse Michela apresentando-nos.

- Muito prazer Larisse. Encantado estou com a sua tremenda beleza. Seus olhos azuis e essa pele morena atiçam o medo que reside em mim.

- Medo?! – perguntou ela extasiada.

- Sim, medo! Medo de lhe querer! – respondi docemente.

- Nossa! Hoje você está inspirado Jeremy! – disse Kátia meio assustada.

- Acho que sim. – falei pausadamente. - E o nome desta inspiração, é Larisse. – falei olhando fixamente aos olhos dela.

Com isso a garota também me olhava e eu mais me encantava com ela. Era de alguma descendência indígena e com olhos azuis claros, uma quase chamada, perfeita. Mas, algo mais estava acontecendo, Kátia e Michela, neste momento, também estavam de olho em mim. Além disso, sentia algo estranho em meu corpo, como se soubesse que estava muito bonito e atraente naquele momento.

- Ei! Vocês não vão entrar? – disse Jane do alto da escada sem nada perceber.

- Oh, sim! Desculpem-me! Jane as espera em seu quarto. Entrem por favor! – falei tranquilamente como nunca antes, parecia até mesmo ser de forma galanteadora, como jamais pude dizer anteriormente. Sagaz, talvez.

As três garotas foram entrando vagarosamente, enquanto eu as olhava, hipnotizado, diante aquela linda e maravilhosa garota.

Depois que entraram, fui atrás e fiquei em meu quarto esperando escutar alguma coisa e, por incrível que pareça, consegui escutar absolutamente tudo o que estavam falando! Era como se eu estivesse dentro do quarto, junto com elas! Isso me assustou um pouco, pois fazia isso sem esforço algum de concentração. O fato, de tudo o que estava acontecendo comigo, era assustador! Um acontecimento atrás do outro, me mostrava que não estava normal e algo surreal estava acontecendo.

- Nossa Jane? O que deu em seu irmão? – perguntou Michela se abanando.

- Ele está muito estranho! – respondeu Jane. – Não está? Ele sempre está. – terminou sorrindo.

- Estranho? Você está louca? Ele é simplesmente... Demais! – disse Larisse se jogando na cama de Jane. – Como você não me disse que seu irmão é um gato! – continuou Larisse.

- Meu Deus! O que está acontecendo com vocês hoje? – perguntou Jane.

- Nada! – responderam juntas. – Somente vimos o seu irmão de verdade, porque antes, ele somente dava atenção para a namorada dele, lembra? – falou Kátia e foi compreendida por Michela.

- Eu não estou entendendo nada! – disse Jane. – Bom, vamos parar de falar do meu irmão. Com que roupa vocês acham que eu devo ir? – continuou falando e se olhando ao espelho segurando um vestido à sua frente.

- Seu irmão vai à festa? – perguntou Larisse.

- Não sei Larisse. Acho que vai, mas eu é que não sei com que roupa eu vou! Dá pra ficar sem pensar no meu irmão só um segundo?

- Não Jane, eu nunca havia notado ele! Ele é muito gato! – disse Michela novamente e beirando o óbvio.

Sentei-me em minha cama e aquela conversa não estava me contentando. Tentei lembrar-me, do que fazia antes. Antes de me sentir daquela forma. Tive alguns “flashes” de meus pais, minha irmã, alguns de meus amigos e minha namorada. Lembrei-me também que havia visto ela na mesma festa, com outro cara, bem mais forte do que eu. Uma raiva encheu o meu ser e pude perceber, neste momento, que realmente eu estava muito diferente. Sentia-me diferente, mas ainda não entendia! Lembrei-me o porquê do porre.

Olhei para as minhas mãos. As unhas haviam crescido rapidamente de um dia ao outro, estavam bonitas, afiadas e consegui cortar a ponta do dedo, somente passando levemente sobre a unha. Achei incrível! Fiquei mais atônito quando vi o mesmo corte se fechar instantaneamente! Incrível!

Ainda escutava os assuntos no quarto da minha irmã, mas agora não falavam coisas interessantes, falavam somente de roupas, moda e outras coisas que para mim, não fazem sentido algum.

- Mas, eu nunca havia visto seu irmão sem aqueles óculos! Hoje está sem! - Escutei Michela dizer.

- Verdade Michela. – disse Jane, interrompendo o assunto e dando uma pausa. – Não o vi de óculos hoje. Vocês acreditam que ele dormiu desde sábado de madrugada até agora a pouco?

- Nossa! O que ele fez? – perguntou Kátia.

- Talvez, este seja o seu sono de beleza. – falou Larisse.

- Ah, para! Como uma pessoa pode dormir tanto assim? – falou Jane terminando o assunto.

Como num passe de mágica tive um impulso e este se tornou realidade. Quando percebi minha ação, estava abrindo a porta do quarto de Jane e todas as meninas se assustaram, inclusive minha irmã. Vi Jane sentada à frente do espelho olhando suas roupas, Kátia sentada numa almofada, Larisse em cima da cama de Jane e Michela à janela fumando o seu cigarro.

- Somente dormi muito porque não queria acordar para pensar no que minha ex-namorada fez comigo. Era isso o que eu queria falar para você Jane. – falei calmamente.

- Coitado! Acho que você não precisa ficar pensando nela. Por que não vai à festa com a gente? – perguntou Michela.

- Sim, eu vou à festa com vocês. – respondi.

- Então se apronte que já estamos de saída! – disse Jane pegando o vestido e dizendo, - Achei você, é com você que eu vou!

- Podem ir à frente, eu encontro vocês por lá. – respondi fechando a porta.

Voltei ao meu quarto e estava espantado novamente. Tudo era mais fácil agora. Movimentava-me com mais facilidade, com leveza extrema. Sentia-me seguro, sem nenhum tipo de receio. Por fim, percebi que não existia mais medo. Comecei até a brincar com minha velocidade adquirida, que não se mostrava pouca. Surpreendia-me com cada movimento veloz que fazia. Andava de um lado a outro do quarto numa velocidade incrível.

Olhei ao espelho novamente e meus cabelos estavam mais bonitos. Pareciam mais negros, mais atraentes e um pouco mais lisos do que o habitual. Minha pele também estava mais bonita, lisa e com um ar “pálido” ao qual realçou o escuro dos meus olhos. Certamente, eu não estava como antes. Meus olhos estavam com uma profundidade e brilho que nem mesmo eu conhecia de mim mesmo! Negros, assim como a noite lá fora. Minhas sobrancelhas estavam coerentes com o resto de meu rosto. Pareciam terem sido feitas! Mas, o que havia mudado consideravelmente, foram os meus dentes. Até pareciam novos de tão brancos que estavam. Os pontiagudos que eram bonitos de se ver. Mas, neste momento não estavam crescidos, tanto quanto à hora em que consegui cravá-los no gato errante que cruzara meu caminho...

Estava agora vestido todo de preto, furtivo. Nada mais do que a vestimenta comum para um vampiro. Peguei os óculos escuros que raramente usava e os coloquei. Já era noite, mas, para mim, agora, não fazia diferença nenhuma. A visão não ficava ruim, mesmo com as lentes escuras, pelo contrario, me davam uma sensação de tranquilidade e leveza. Desci as escadas e entrei à sala.

- Jeremy! – chamou minha mãe. – Você já jantou?

- Deixe o menino! – disse meu pai. – Você dormiu demais garoto, está tudo bem?

- Estou melhor do que nunca! – disse dando uma volta em mim mesmo e retirando os óculos do rosto.

- Tudo bem. – disse ele rindo e olhando para minha mãe.

- Jeremy, chegou um pacote para você enquanto dormia ontem. Está aqui na mesa, quer ver o que é? Será que é da sua tia da França? – disse ela.

Achei aquilo estranho. Vi tal embrulho vermelho no meio da mesa. Era do tamanho de um livro comum ou um pouco mais grosso. Sentei-me ao meio do sofá, entre meu pai e minha mãe, que não tiraram os olhos da TV.

- Nossa Jeremy! Você está muito elegante hoje! Assim que a mãe gosta.

Olhei para ela e sorri e ela respondeu com um sorriso materno. Abri o pacote e havia uma espécie de caixa de jóia. Abri a tampa e a visão era magnífica. Havia um cordão de ouro com um grande pingente em forma de estrela e ao lado uma pequena adaga de ouro. Os peguei ao impulso, coloquei em meu pescoço, como se já soubesse que aquilo era para que eu usasse e a adaga coloquei-a no bolso do sobretudo.

- Espero que saiba usar uma dessas. – disse meu pai.

Sei que estava passando por uma experiência única e eu nem sabia o que era. Eu estava um tanto estranho, mas meus pais também. Exceto minha irmã, para ela tudo estava normal, como sempre. A calma e tranquilidade com que meus pais estavam eram, de uma forma, inquietante para mim. Mal sabia o que estava acontecendo comigo, para me preocupar com eles, mas, isto, seria revelado em breve.

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