Meu curso de barista estava acontecendo à tarde, eu tinha aula de segunda a sexta. De primeira eu pensei em não aceitar, pois seria um mês trabalhando apenas pela manhã. Mas Ulisses garantiu que não seria problema, ele daria um jeito e realmente deu. Quando o fluxo aumentava na minha ausência, ele entrava para o atendimento.
Saber disso me deixava grata mas também incomodada, eu não via a hora de terminar o curso e voltar para o atendimento, pois não aguentava mais as gracinhas de Laura. Principalmente hoje, que Ulisses não estava presente, como de costume ele a deixava no comando e ela mostrava quem realmente era na ausência dele.
— Trabalha bem muito pra compensar a tarde toda que você passa fora.
— O que é que esse cara tá fazendo aqui? — questionou-me Ulisses. — Ele tá lá todo prosa comendo o cupcake de morango dele como se nada tivesse acontecido.— Pois é Ulisses eu já disse pra ela que não era pra esse cara pisar mais aqui. — intrometeu-se Laura.— Ah, pode ficar tranquilo que eu me acertei com ele.— Tem certeza que esse cara não vai aprontar mais nenhuma?— Longe de mim querer me meter… Até porque você que é o gerente, mas você acha que pega bem pra comissão das franquias o envolvimento dos atendentes dos clientes?... Assim… Eu sei que no coraç&at
Era sábado fim de expediente, pré folga. Todos na cafeteria estavam entre o cansaço de uma semana de trabalho, a animação pelo restinho de fim de semana e a folga do dia seguinte.— Eu não vejo a hora de largar! — disse Suzy com as mãos levantadas para o alto — Acho que essa foi a semana mais agitada dessa cafeteria.— E com a equipe reduzida fica tudo mais difícil. — falou Laura em tom de ironia.— Pior do que a equipe reduzida é uma cobra entre a gente brincando de ser chefe. — respondeu Suzy.— Toma Laura! Podia ter dormido sem essa. — debochei. Depois de termos batido e chamado bastante, pensei que Ulisses não fosse conseguir abrir aquela porta à força mas em algum momento a guarnição, que provavelmente nunca havia sido trocada, cedeu. Chamamos várias vezes e ele não respondeu, então entramos. As luzes estavam apagadas, mas a televisão em volume baixo iluminava a sala. Tropecei em alguma coisa mas Ulisses me segurou me impedindo de cair, olhei para baixo e vi garrafas de bebidas alcoólicas. — Pierre? — Chamamos Ulisses e eu várias vezes. — Vamo ficar perto um do outro, tá bom? — sussurrou Ulisses ao meu lado. — Tá bom. Sentimos um cheiro ruim que vinha da cozinha e lá nos deparamos46. Todos Por Um
— Por que vocês não me falaram? — perguntou Suzy — Eu com certeza teria ido com vocês. — Você já tinha saído e disse que o Paulo tava te esperando e que tava muito cansada. — explicou Ulisses. — O importante é que deu tudo certo e que a primeira consulta dele com psiquiatra já tá marcada. Eu e o Ulisses vamos com ele. — Vocês têm certeza que vão junto com ele? Os dois? — Qual o problema de a gente ir os dois? — perguntei. — Não corre o risco de vocês dois serem expulsos junto com Pierre, não? — Oxente! E por que a gente seria expulso? O piso era claro, as cadeiras acolchoadas, brancas; Na parede um único quadro minimalista com desenhos de folhas em preto e branco, era nele onde eu tentava manter minha atenção, até conseguia exceto quando sentia o aperto mais forte em minha mão. Estávamos os três na recepção do consultório do doutor Pedro Lopes. Eu sabia que Pierre estava nervoso pelo jeito como olhava para baixo e segurava forte a minha mão. Era uma quarta-feira e pelo visto eu perderia todo o dia de trabalho, pois além de acompanhar Pierre no psiquiatra pela manhã, à tarde eu estaria no curso. Em qualquer outro ambiente de trabalho eu já teria sido demitida a muito tempo, mas Ulisses sentado ao meu lado não parecia se importar com isso, pelo contrário ele parecia tão preocupado com Pierre quanto eu, a julgar por suas sobrancelhas levemente franzidas e o48. Nova Cláusula
— Não titia!... Não puxe não! — falei levando a mão ao cabelo — É o coque frouxo, tia. — Ah, desculpe… — disse ela rindo — Mas porque é que você não solta esse cabelo, garota? — Sei lá… É mais prático. — Tem certeza que é mais prático ou você não gosta do seu cabelo? — disse minha tia puxando a presilha e soltando meus cachos. — Ô titia!... Dá trabalho deixar arrumadinho. — Melhor que cabelo arrumadinho é cabelo natural. Você vai pra uma festa né pra igreja, não. — Falta de convite pra igreja, não é. — rebateu minha mãe. — A empresa tá fazendo quantos anos? — perguntei.— Quinze anos. — respondeu Ulisses olhando o trânsito à frente.— Tu tá nela a quanto tempo?— Um uns nove anos, incluindo meu período de estágio e como atendente.— Tu sempre trabalhou nessa empresa?— Eu fiz faculdade particular e meus pais se viravam nos trinta pra pagar, além das despesas que eu tinha aqui na cidade enquanto eles estavam em Santos.— Santos é muito longe daqui? Fomos em toda parte menos ao bar já que beber não era do feitio de Ulisses e o banheiro masculino por razões óbvias.— Manda uma mensagem pra ele — sugeriu Suzy.— Por que tu não manda?— Olhe, eu vou mandar mas não se acostume não, viu? Resolva seus próprios problemas.— Qual o problema de tu falar com ele?— Lis, quem tem o rabo preso com ele não sou eu não, é você.— E quem disse que eu tenho rabo preso com aquele tabacudo?... Sabe de uma coisa? Eu mesma 50. Rainha do Gelo
51. Choque do Trovão