Dimitri
Joe não me atrasou em nada, e no horário estipulado estávamos dentro do carro a caminho da cidade onde meus pais viviam, a cerca de três horas de distância de St Petersburg. Eu não os visitava com tanta frequência, mas procurava manter o contato regularmente.
— Me diz primo, como está a Maria? — Joe me provocou.
— O que eu te disse naquela época ainda vale, Joe. Fique longe de minha irmã — eu ameacei, me referindo a uma época durante a adolescência de Maria, quando ela se viu apaixonada por ele.
Joe nunca chegou a se envolver com ela, mas gostava de me provocar sobre o assunto. Eu sabia que apesar de sua fama, ele jamais magoaria a própria prima. Aquilo porém não evitou que eu o ameaçasse sempre que ele tocava no assunto.
— Eu só estou falando, eu vi as fotos dela na internet e os anos apenas fizeram bem — ele insistiu.
— Sabe o que mais melhorou com o tempo? Minha pontaria — eu lhe lancei um olhar enviesado, arrancando uma gargalhada do rapaz.
— Eu não acho que você teria coragem de me fazer algum mal, primo.
— Você quer mesmo descobrir? Além disso, se você tiver visto fotos da família toda, vai perceber que o Yuri está quase do meu tamanho. Aposto que ele adoraria se vingar por todas as vezes que você o provocou quando era menor.
Meu irmão mais novo sempre foi alvo das piadas de Joe, mas agora, com quase dezoito anos, eu duvido que seja tão simples caçoar dele. Joe gargalhou de novo, olhando para o lado de fora da janela, observando a paisagem que deixávamos para trás depressa.
— Você está reclamando, mas vai sentir minha falta quando eu for embora, primo.
— Joe, eu praticamente não fiquei em casa enquanto você esteve aqui — eu devolvi — eu vou ficar bem.
— E quando esteve em casa se recusou a sair — ele devolveu — você precisa aprender a se divertir.
— Acredite, eu me divirto, não preciso da sua ajuda para isso.
E aquilo era verdade, por mais que eu raramente saísse e visitasse alguma balada de St Petersburg, eu não deixava de aproveitar quando estava em outros países, sempre buscava usar minhas folgas fora do país para conhecer o máximo que pudesse o lugar onde estava, e sempre tinha uma companhia para isso. Apenas estava farto das boates de minha cidade, tudo era diferente quando tinha tantas culturas a meu dispor.
— Antes que eu vá, você deve me acompanhar pelo menos uma vez.
Eu o ignorei, sintonizando o rádio em uma estação de música qualquer, o fazendo bufar antes de voltar a olhar pela janela.
O restante da viagem até a casa de minha mãe foi tranquila, Joe e eu conversamos amenidades entre os conselhos que eu tentava dar para que o rapaz pudesse se acertar com a família.
— Eu não estou negando que você tem uma ótima profissão — ele explicou quando já estávamos próximos de nosso destino — apenas não entendo porque eu teria que seguir seus passos.
— E não tem. O que seu pai quer dizer é que ele espera que você faça alguma coisa da sua vida. Você é formado por um motivo — eu apontei — volte a pintar, tente vender seus quadros, faça qualquer coisa.
— Ele considera tudo o que eu faço a maior perda de tempo — Joe se queixou — me trata como se eu ainda fosse um adolescente.
— Sabe o que é uma atitude de adolescente? Fugir de casa após uma discussão — eu respirei fundo — Se você tivesse ficado e provado o seu ponto de vista, talvez ele pudesse te respeitar um pouco.
— Ele não respeita ninguém — ele devolveu de imediato, encerrando o assunto.
Nós chegamos à casa de minha mãe perto da hora do jantar, ela parecia surpresa em nos encontrar ali, porém não hesitou em nos receber com satisfação.
— O que eu quero dizer, tia, é que ele não acredita que eu possa fazer nada de útil — Joe relatou a minha mãe sua discussão com o pai enquanto a ajudávamos a arrumar a mesa para o jantar.
— Isso não é verdade, Joe — minha mãe declarou com indulgência — você se formou, isso prova que é capaz. Meu irmão só é um pouco duro para se expressar.
Eu respirei fundo por ouvir as mesmas reclamações nas últimas semanas desde que ele chegou à Rússia.
— Eu já falei isso pra ele.
— Você deveria ouvir seu primo.
— Ele disse que eu deveria voltar a pintar, mas qual o sentido nisso? — Joe prosseguiu em sua queixa como se minha mãe fosse uma espécie de terapeuta familiar.
Mais uma semana, é tudo o que eu tenho que aguentar, além disso, eu vou passar boa parte dela em Lisboa, não será tão difícil.
— Desse jeito você poderia provar que ele está errado, você precisa de um incentivo melhor que esse? — Maria apontou, entrando na sala de jantar.
Joe prontamente deixou o que estava fazendo para abraçar minha irmã, beijando seu rosto em seguida para meu descontentamento. Ela havia se tornado uma bela mulher com seus trinta anos, sua pele clara contrastava com os cabelos castanhos e os olhos verdes que ela tinha herdado de nossa mãe, de maneira que sempre chamava atenção dos rapazes ao seu redor.
— Maria, olha só para você — Joe levantou, piscando um olho para minha exasperação — você mudou tanto.
— Joe — eu soltei em tom de aviso.
Ela alternou o olhar entre nós dois, procurando o sentido daquela interação.
— O que? Ela merece elogios, primo. Apenas isso — Ele garantiu abraçando minha irmã — O tempo apenas fez bem para ela.
— Obrigada, Joe — ela lançou um olhar desconfiado para o primo, provavelmente se lembrando de todas as vezes que ele fugiu de suas investidas.
— Viu só, ela sempre gostou dos meus elogios, não é prima? — Ele passou um braço por seu ombro, sorrindo para mim.
Apenas uma semana, Dimitri. Ele vai embora em uma semana.
Minha mãe se limitou a balançar a cabeça como se aquilo fosse apenas bobeira de crianças e foi para a cozinha.
— Eu não sei bem, Joe. Antes você estava interessado em elogiar apenas minhas amigas, lembra? — Ela devolveu com um sorriso quase inocente.
Joe riu, sem se deixar abalar pelo comentário de minha irmã, apertou um pouco seu meio abraço, fazendo com que ficassem ainda mais próximos do que antes.
— Você tem razão, Masha. Eu não pensava muito bem na época.
— Certas coisas nunca mudam, e acho que já estou grandinha para esse apelido — ela devolveu, me fazendo sorrir.
Maria sempre foi independente, e aquele era um dos motivos que me faziam não me envolver diretamente nas investidas de Joe, apesar de ameaçá-lo. Eu sabia que ela podia se cuidar sozinha.
— Nós dois devíamos sair mais tarde, pelos velhos tempos — ele ignorou seu comentário, me fazendo franzir o cenho.
Tudo bem, eu não quero me envolver e cair em suas provocações, mas ele chamá-la para sair? Isso é passar dos limites!
— Sinto muito Joe, mas eu já tenho planos com alguém — ela retirou o braço de meu primo de seu ombro — Mas você pode relembrar os velhos tempos com a Nádia, ela ainda mora na casa ao lado.
Meu sorriso se alargou ainda mais, eu não preciso mesmo intervir.
— É melhor você desistir, Miller. Ela não está interessada — provoquei meu primo. Porém, algo me chamou a atenção, me fazendo franzir o cenho ao me dirigir à minha irmã — e com quem você tem planos?
— A melhor parte de ser adulta é não ter que dar satisfação para ninguém — ela devolveu — então eu tenho planos com alguém que não é do interesse de nenhum dos dois.
— Ela tem um namorado secreto, primo — Joe sussurrou — é melhor você interferir, namorados secretos nunca são coisa boa.
— E o que você sabe disso? — Ela revirou os olhos.
— Eu sei muita coisa, geralmente eu sou o namorado secreto — Ele devolveu.
Meu celular vibrou em meu bolso fazendo com que eu me distraísse da pequena discussão que se formou entre os dois. Eu desbloqueei a tela, encontrando uma nova mensagem de Blair.
"Você não é o único que tem uma ótima vista, comandante"
Essa era a legenda da foto da garota diante da janela de um quarto de hotel de onde era possível avistar uma bela catedral em meio a uma cidade ensolarada. Blair usava um vestido azul claro com estampas brancas e tinha os cabelos soltos um pouco úmidos, indicando que havia chegado na cidade a tempo o suficiente para um banho pelo menos.
Eu contive um meio sorriso ao ler a mensagem antes de checar o horário, me preparando para responder em seguida.
" Você chegou bem? Parece estar calor aí "
A resposta não demorou a chegar.
" O clima está ótimo. Por sorte me livrei do frio de Istambul"
Não pude evitar de rir com aquilo, era estranho pensar nela tão a vontade enquanto do lado de fora da casa de minha mãe a temperatura beirava zero graus e o sol já havia se posto, para ela aparentava ser apenas o início da manhã.
— Por que ele está rindo? — Maria questionou meu primo.
— Deve estar falando com a namorada secreta dele — Joe confidenciou.
Eu respirei fundo ignorando os dois, agradecendo mentalmente por meu irmão estar na casa da namorada, voltando minha atenção para algo mais importante no momento.
" Você odiaria estar em St Petersburg agora, então. "
" Definitivamente, eu sou uma garota de praias, comandante "
— Hey eu quero conhecer essa garota — Maria reclamou.
— O lado bom de ser adulto é que eu não devo satisfação a você, Masha — eu devolvi recebendo em troca uma carranca.
— Gostou dessa prima? — Joe gargalhou.
— Mama, o Dimulya está namorando e não quer me mostrar com quem — ela gritou de repente.
— Eu não estou namorando, é apenas uma comissária que conheci essa semana — eu devolvi com rispidez — e o que a mama sabe sobre a pessoa com quem você vai sair hoje?
— Ela sabe que não é um namorado e isso é o suficiente — ela cantarolou.
Por sorte minha mãe parece não ter ouvido o que Maria falou, e eu agradeci por isso. Tudo o que eu não precisava era ter que contar tudo em detalhes para minha ela. Já não bastava Joe que estava contando tudo o que sabia sobre Blair para minha irmã, o que não era muita coisa.
Mas eu pude aproveitar o momento para retomar minha conversa e não perdi tempo, eu não conseguia parar de falar com ela.
Blair— Vamos, você viu a foto? Eu venci essa, comandante — não pude evitar um sorriso. Estava deitada em uma espreguiçadeira em uma praia próxima de San Juan aproveitando as horas de folga antes de embarcar.— Blair, estamos falando do Duomo em Milão — Dimitri devolveu, exalando diversão em sua voz — você precisa aceitar que é uma boa foto.— Não estou negando isso, estou falando que a minha ficou melhor — eu devolvi.Já fazia duas semanas que Dimitri e eu começamos a manter contato, e praticamente todos os dias trocavamos fotos dos lugares onde estávamos, competindo para ver quem tinha o melhor destino.— É uma praia, Blair.— É uma praia em Porto Rico, Dimitri — eu devolvi — Caribe. Você já esteve no Caribe alguma vez? Uma risada soou do outro lado da linha fazendo com que eu mordesse o lábio inferior, sentindo uma crescente onda de entusiasmo surgir em meu interior. Eu adorava conversar com ele, aquilo sempre tornava meu dia sempre mais interessante.— Não, Blair. Eu nunca esti
Blair— Eu não entendo, nós fizemos seu jantar de noivado faz algumas semanas — eu encarei Abby.Nós duas estávamos acomodadas na mesa de um restaurante próximo ao aeroporto onde eu aguardava para embarcar para meu próximo destino. Inicialmente eu saí de casa pensando que embarcaria às 10 horas para a Argentina, mas no fim, por conta de uma comissária que ficou gripada e obviamente não poderia voar, eu embarcaria às 15 horas para Amsterdã.— Sim, mas meus pais não gostaram de não participar e querem fazer uma recepção — ela explicou — você é minha dama de honra, Blair, precisa ir.Eu observei meu celular em busca de algum sinal de Dimitri. Ontem ele não me enviou mensagem alguma pela primeira vez desde que nos conhecemos, e eu estava estranhando todo aquele silêncio.— Você me ouviu? — Abby franziu o cenho.— Sim, eu só acho que atravessar o país para um segundo jantar de noivado é um exagero! — eu desviei o olhar do celular, voltando minha atenção para minha amiga.— Não se trata ape
BlairDimitri veio em minha direção com um sorriso contido no rosto. Minha mão foi envolvida pela sua quando a estendi para cumprimentá-lo. O meu próprio sorriso foi mais espontâneo diante de sua presença, apesar de não saber bem como agir, agora que estávamos finalmente frente a frente.— Hey comandante, eu quase não te reconheci sem a roupa manchada — eu o provoquei.— Você não está carregando nenhum copo, então acho que minha roupa ficará a salvo. Pelo menos até chegarmos ao restaurante — ele garantiu — estou hospedado no Sheratom, você quer ir até lá? Sheratom era um dos três hotéis que ficavam dentro do complexo do aeroporto, que também contava com uma estação de trem que nos levaria até o centro de Amsterdam em cerca de quinze minutos.— Você está brincando? Nós não vamos ficar no hotel tendo uma cidade incrível para conhecer, comandante — eu neguei.— Eu já conheço Amsterdã — ele achou graça.— Mas nunca a visitou na minha companhia, te garanto que será uma experiência complet
BlairApós dividir a conta, logo estávamos de volta às ruas de Amsterdã.— O que eu quero dizer é que se casar na mesma igreja que os pais é importante para sua amiga — ele retomou o assunto inicial enquanto caminhávamos lado a lado.— De novo isso? — eu gemi — eu não devia ter te contado.— Mas contou — ele me provocou.Para meu alívio, eu avistei algo que poderia nos distrair daquele assunto.— Uma feira! Vamos fazer compras, Dimitri — Eu corri na frente, o deixando para trás.Ele balançou a cabeça com um meio sorriso nos lábios antes de me acompanhar. Eu passei por todas as barracas, analisando os produtos em busca de algo aproveitável.Aquela era uma das minhas partes preferidas de cada viagem, eu adorava encontrar souvenirs que me lembrassem os destinos que já visitei, e geralmente era algum enfeite para meu apartamento. O que talvez acabasse me transformando com o tempo em uma espécie de acumuladora internacional.— Olha, comandante. Eu preciso dessas botas! — eu exclamei, apanh
DimitriEu estava efetuando o pagamento com o cartão enquanto observava Blair com a boneca e as flores que dei a ela em suas mãos.Ela era tão bonita que era quase inacreditável. Mais do que isso, era engraçada, inteligente e espirituosa. Tudo o que eu já tinha percebido nos últimos dias havia se confirmado nessas poucas horas que passamos juntos até aqui.— O senhor quer que eu embrulhe o buquê ou sua namorada vai levá-lo assim? — A senhora que me atendeu indicou as flores que eu ainda carregava.— Aqui, pode embrulhar. Mas ela não é minha namorada — eu expliquei, entregando o buquê para a mulher.— Não? Vocês agem como um casal, talvez devam pensar na possibilidade — ela sorriu, apanhando uma caixa comprida de acetato e acomodando as flores ali — uma garota bonita assim não fica disponível por muito tempo.Eu me limitei a sorrir enquanto apanhava o embrulho. Eu sabia que ela tinha razão em relação a Blair, e se a situação fosse mais favorável, talvez eu tentasse algo sério com ela
DimitriEu saí do banheiro com uma toalha envolta em minha cintura e fui até a cama do quarto de hotel que eu ocupava em Viena. Já passava das sete da noite e eu me sentia exausto com toda a agitação daquele dia.Logo pela manhã voei de volta a St Petersburg e após algumas horas de descanso, embarquei para Viena. Eu liguei meu celular, o abandonando em cima da cama antes de ir até a janela, observando a rua iluminada repleta de prédios antigos onde inúmeras pessoas caminhavam, apesar do mal tempo. Minha mente vagou para as lembranças do dia anterior, quando a companhia de Blair se fez tão presente. Eu voltei até a cama, apanhando o celular que vibrava com as novas mensagens que chegavam.Eu ignorei as mensagens de Joe ameaçando se mudar de vez para St Petersburg e abri a mensagem que Blair me mandou de manhã."Comandante, acho que você não entendeu que as flores eram para a sua mãe."Eu havia deixado o buquê na recepção do hotel pela manhã para que lhe entregassem. Apesar de aceitar c
Eu encerrei a chamada até que chegasse à galeria. Blair adorou cada detalhe que eu lhe mostrava e eu me sentia satisfeito por conseguir distraí-la naquele momento, a única maneira daquela situação melhorar, seria se eu estivesse mais próximo a ela.— Olha, só estou falando que a última pintura... ESPERA.Eu interrompi meus passos imediatamente, sem saber o que tinha acontecido.— O que foi?— Você pode virar um pouco a câmera? — ela pediu — para a esquerda.— NÃO — eu virei na direção oposta ao entender o que ela tinha visto.Como ela consegue encontrar lugares assim?— Por favor, Dimitri — ela suplicou enquanto eu desistia e fui em direção ao mercado de pulgas¹ que ela tinha avistado de alguma forma.— Eu vou comprar apenas uma coisa — eu avisei.— Então eu vou ter que escolher bem — ela cantarolou.Não pude evitar sorrir enquanto caminhava entre as barracas, mostrando a ela tudo o que estava exposto.— Dimitri, olhe aquelas fotos antigas — Blair indicou.— São pessoas que você não c
Blair— E então? O que achou? — eu rodopiei na frente da câmera do celular, mostrando minha roupa para minha mãe.— Você ficou ótima com esse seu novo corte de cabelo — ela elogiou do outro lado da tela — deve ser mais fácil de prender agora.— Mãe, foco por favor — eu gemi.— Desculpe, mas não entendi o que você quer que eu veja — ela devolveu.— Mãe, eu te mostrei três roupas diferentes — eu me joguei na cama do quarto de hotel que eu ocupava em Madrid — eu tenho quinze minutos para terminar de me arrumar.— Você ficou bonita com todas as roupas — ela devolveu.— Não está ajudando — eu murmurei.— Eu sequer entendi com o que você quer ajuda! Você não devia voltar hoje?— E vou, mas eu terei duas horas antes de ter que ir para o aeroporto, então vou poder almoçar com um amigo no restaurante do hotel — eu expliquei apressada — e preciso encontrar ele em dez minutos, então se você puder ajudar.Eu revirei as opções que tinha separado, tentando tomar uma decisão. Por que eu não podia si