Na quinta-feira seguinte, Amie estava no escritório do Sagrada Família, fazendo os cálculos da contabilidade quando Olívia, que crescera no orfanato e agora a ajudava, entrou sem bater. Além da moça e dela própria, o orfanato contava com a ajuda da cozinheira Holly Nickson e de Paula Newland, a dona do prédio. A instituição mantinha-se com doações de nobres que empregaram crianças crescidas ali. O Orfanato Sagrada Família tinha a reputação de formar excelentes pessoas e trabalhadores capacitados.
—Desculpe incomodá-la, Amie, mas há um casal na sala de espera. Querem conhecer as crianças.
—Está bem! – disse ela, levantando-se. – Vamos até eles.
Embora reticente, Amie sabia que não podia privar as demais crianças da oportunidade de ter uma família porq
Mais tarde, naquele mesmo dia, na taverna Queen’s Garden, Jesus, Connor e mais quatro homens do almirante conversavam em voz baixa. Iriam invadir a casa dali a alguns minutos e Connor dava as instruções finais.—Patrick, você e Jones entrarão pela janela do segundo andar. Claude e Jarrod, pela porta dos fundos. Jesus e eu bateremos na da frente. Sem estardalhaço, sem tiroteio, estamos entendidos?—Certamente, senhor.—Ótimo, vamos então.Os homens saíram da taverna, dois de cada vez.Connor e Jesus caminharam pela Oak Street, conversando amenidades, rindo e flertando com algumas damas. Pararam em frente à casa indicada por Amie. Um assobio baixo soou da rua de trás. Era o sinal para entrarem.Ainda rindo, os dois homens subiram os poucos degraus que separavam a casa da rua e puxaram o sino da entrada.Uma mulher baixa e atarr
Vestida em azul real e celeste, Amie chamava a atenção por onde passava; um charmoso chapéu de plumas enfeitando a cabeça delicada.Disfarçado de vendedor de castanhas, Connor seguia-a com o olhar, enquanto ela caminhava pela praça em frente à catedral de St. Paul. A multidão começava a deixar a igreja, enchendo a praça de risos e vozes animadas.Jesus, vestido de mendigo, aproximou-se dela, pedindo uma moeda.—Casaco verde, chapéu coco e guarda-chuva. – sussurrou. – À sua esquerda.—Já vi.Ela aprumou os ombros e ajeitou o casquete delicado de volta no topo da cabeça.Pela primeira vez, encarou seu alvo. O cavalheiro era bem apessoado. Ainda que na casa dos sessenta anos, atraía olhares. Bem-vestido e sorridente.Ela respirou fundo. Não seria difícil, bastava lembrar-se dos velhos tempos
Sylvia Porter era uma mulher simples e sem atrativos, mas muito inteligente e perspicaz. Vivia em uma casa modesta, distante duas ruas do endereço que Grant dera a Amie.Outrora uma vendedora de flores ambulante e batedora de carteiras, a dona da casa fora convocada pelo Almirante Smith, quando este a flagrara com a mão dentro da bolsa de sua esposa, enquanto esta conversava calmamente com um dos comandados do marido em plena Picadilly Circus. A perícia da moça chamara a atenção do militar e a proposta de uma vida honesta e com sustento garantido haviam assegurado a concordância de Sylvia. Desde então, ela era a emissária do Almirante nos submundos de Londres. Trabalho que amava de coração.—Vamos entrando! – Acenava com a mão ossuda para os recém-chegados. – Está tudo pronto.—Amie, esta é Sylvia. Como já lhe expliquei, ela a aj
A carruagem cercada de barras sacolejava pelas ruas de Londres, e Amie fazia o que podia para se segurar e não cair do banco tosco. À sua frente, um calado Abraham Grant, já recuperado da bebedeira, fitava o chão.O veículo parou com um solavanco e imediatamente as portas foram abertas por dois guardas uniformizados. Estavam em um beco formado por três prédios novos, em alguma parte da capital inglesa.Um par de portas de ferro foi aberto e os prisioneiros conduzidos para dentro. Lá, uma mulher vestida de negro, a quem Amie reconheceu como sendo Sylvia Porter segurou-a pelo braço e a levou para a ala contraria à que Grant estava sendo conduzido.—Está tudo bem, Amie? – Sylvia perguntou baixinho, enquanto abria as algemas, ao que a moça assentiu. – Terá de esperar um pouco antes de ir para casa, temos de ter certeza de que seu depoimento não ser&aacu
Estava frio, frio demais para uma noite de junho... Ele estava de pé em uma estrada coberta pela neve. Conhecia aquela estrada, as árvores, as poucas casas... De repente uma carruagem passou a toda velocidade, ele ergueu os braços para se proteger da neve que ela espirrava, mas nada o atingiu. Olhou na direção em que o veículo seguia a tempo de vê-lo derrapar e tombar no meio da estrada. Gritos encheram a noite e ele correu até lá para ajudar.Qual não foi sua surpresa ao ver seu próprio rosto no homem caído próximo aos destroços. No instante seguinte, os rostos de Annabel, Jonathan, Ethnee e seus pais giravam ao redor dele repetindo sempre a mesma frase: “Sua culpa!” “Sua Culpa!”.“Não! Eu sinto muito!” Ele caiu de joelhos e começou a gritar. “Perdoem-me!”—Connor! Connor, acorde!Amie estava
—Bom dia Amie! – O sorriso da menina foi substituído por um vinco na testa, logo acima do nariz arrebitado, que cheirava o ar. – Bom dia, tio Connor!Os dois entreolharam-se, surpresos e responderam ao cumprimento.—Amie, feliz aniversário! – A menina beijou Amie no rosto e sentou-se na cama.—Meu aniversário! Eu havia me esquecido!—Como alguém pode se esquecer do próprio aniversário? – questionou a menina, dando uma risada.—Isso não importa. – replicou o conde. – Temos de comprar um presente, não é querida?—Sim, e planejar um jantar de aniversário!—Exato! Venha, borboleta, vamos sair e comprar algo para Amie.—Ora essa! – disse a jovem, sorrindo, mas os dois já saiam para o corredor, cochichando e rindo como duas crianças planejando uma travessura.
—Queria falar comigo, Connor?—Entre, Amie. – Connor parecia chateado, até mesmo preocupado. Será que algo acontecera à condessa? – Sente-se. O que tenho para lhe dizer é muito importante e não muito agradável, eu receio.—Fale logo, Connor, está me assustando.—Eu descobri o que aconteceu com a fortuna de seu pai.Amie nada disse, apenas assentiu.—Meu contato no Tesouro investigou a história que me contou e não há registro dessa desapropriação naquele ano nem em qualquer outro.Sem saber como reagir, Amie encarou-o por vários minutos.—Isso quer dizer que fomos enganadas? Tudo pelo que passamos, as coisas que tive de fazer... – Ela estava ficando histérica, então Connor a fez se levantar e a abraçou. – Minha mãe morreu na miséria porque alguém
O sino da entrada soou no instante em que Amie pisava no hall. A Sra. Fitzwaring estava em seus aposentos, no terceiro andar da mansão, por isso, adiantou-se para atender à porta.Um jovem ruivo de sorriso gentil estava parado à entrada. Um imenso ramalhete de rosas apoiava-se em seus braços.—Entrega para a senhorita Amie Templeton. – disse o rapaz indicando as flores.—Sou eu mesma. – estarrecida, esticou os braços para apanhar o presente. Da pequena bolsa que trazia na cintura, tirou alguns xelins que entregou ao rapaz. – Muito obrigada.Amie correu os dedos pelas pétalas delicadas e aspirou seu perfume. A parte interna das pétalas era de um rosa muito forte e dobrava-se para fora, formando um magnífico contraste com o exterior bem mais claro. Eram as flores mais lindas que Amie já vira. Preso no papel que envolvia o buquê, havia um cartão. Amie ap