Era uma tarde comum, ou pelo menos eu pensei que seria. Precisava ir a um shopping fora da cidade, pois meu telefone havia dado problema e a única assistência autorizada ficava naquele local. Caminhava distraída, a mente cheia de pensamentos, quando meus olhos se fixaram em uma cena que fez meu coração congelar.Isaías estava lá, parado ao lado de Fernanda em frente a uma vitrine de roupas de bebê. Ela sorria, encantada com um macacãozinho azul claro que segurava nas mãos, e ele… ele parecia sereno. Presente. Quase confortável.Fiquei ali, sem conseguir me mover. A realidade diante de mim era um golpe forte demais para suportar. Meu peito apertava tanto que quase me faltava o ar. O homem com quem eu tinha compartilhado tanto, que conhecia minhas falhas, meus medos, estava ali, ao lado de outra mulher, escolhendo roupinhas para um bebê que eu nunca teria com ele. A mesma pessoa que dividira comigo noites de conversas e segredos estava construindo uma vida da qual eu jamais far
Posso sentir o peso das palavras que ecoam no vazio dessa prisão que criei – ou que deixei ser criada ao meu redor. Cada detalhe dessa história, cada erro, parece se multiplicar, ampliando o sufoco. Por um instante, tento lembrar de quem eu era antes de tudo isso, antes de Fernanda transformar meus dias em uma sequência interminável de frustrações. Mas é como tentar enxergar através da névoa: tudo se desfaz no instante em que parece ganhar forma.Fernanda. Só de pensar nela, sinto um misto de asco e desgosto. Lembro-me de como ela se insinuou, trazendo sorrisos que agora parecem apenas máscaras bem calculadas. Nunca houve inocência ali, só uma voracidade fria, uma sede de possuir, de amarrar o que não lhe pertence. E agora, aqui estou eu, enredado em uma teia que ela teceu com precisão, sem falhas. O que parecia apenas uma noite sem propósito se tornou uma sentença de vida.Se em algum momento eu permiti que ela entrasse nos meus dias, esse foi o erro que ela aproveitou para d
A casa estava iluminada de forma acolhedora, com a música suave no fundo e o cheiro de comida ainda no ar, mesmo depois do jantar. Alice, como sempre, estava no centro das atenções, brincando com seus brinquedos enquanto os outros riam e conversavam ao redor da mesa. Charles, de modo um pouco mais reservado, parecia à vontade, embora sua postura ainda carregasse vestígios de um homem que, há pouco, estava lidando com um término difícil. Eu o observei por um momento, tentando entender o que passava por sua mente. Depois que todos se foram, e a casa voltou ao silêncio habitual, Charles e eu ficamos ali, na varanda, apreciando a noite tranquila. A lua estava alta e clara, e uma leve brisa agitava as folhas das árvores no jardim. Era o tipo de noite perfeita para conversas mais profundas. Ele foi o primeiro a falar. — Você é boa nisso, sabia? — ele disse, olhando para mim com um sorriso leve, mas os olhos demonstrando um toque de seriedade. — Em fazer as pessoas se sentirem
Eu não conseguia tirar da cabeça a cena do Isaías no shopping com Fernanda. Cada vez que fechava os olhos, era como se minha mente me forçasse a reviver aqueles momentos, e tudo o que eu queria era fugir dessa dor insuportável. Como eu pude me enganar a ponto de achar que algo entre nós poderia ser real?Aquela imagem dele com ela, tão confortável, tão próximo, me dilacerava por dentro. Ele estava com ela, comprando coisas para o bebê, e a única coisa que me restou foi o vazio. Como se nada do que vivemos, nada do que compartilhamos, tivesse significado algum. O que era tudo aquilo? O que eu era para ele, afinal?Fechei os olhos, tentando afastar a dor, mas era impossível. A cena ficava ali, nítida, na minha mente. Os sorrisos trocados, as palavras ditas entre eles, as gestos de carinho. Como se Fernanda fosse a mulher da vida dele, e eu... bem, eu era apenas uma espectadora, alguém que, de repente, se perdeu no meio da confusão de sentimentos que ele nunca soube ou quis divi
A tarde estava tranquila, o sol se pondo preguiçosamente no horizonte, tingindo o céu de um laranja suave, quase como se o dia quisesse se despedir devagar. Estávamos no parque, Alice correndo à minha frente, brincando com uma bola enquanto eu a observava de perto, como sempre. Ela era a razão pela qual eu ainda me levantava todos os dias. Sua energia, sua inocência, seu sorriso iluminado... ela era tudo para mim.Mas então, no meio daquele momento simples e tranquilo, Alice parou. A bola rolou para longe, mas ela não a seguiu. Ficou ali, imóvel, os olhos brilhando de algo que eu não conseguia identificar. Então ela me olhou, com um olhar tão puro, tão cheio de algo que parecia pesar mais do que uma criança poderia carregar. — Alby, quando eu vou ver o tio Isaías de novo? — a voz dela soou suave, quase como uma pergunta casual, mas havia algo em seu tom que me fez parar.O mundo ao redor se desfez por um segundo. A pergunta simples, inocente, estava me esmagando por dentro de
A lembrança ainda era amarga, latejava em algum canto da minha mente como uma cicatriz que nunca deixava de doer. Aqueles dias ao lado de Fernanda… a sensação de ser enganado, traído de forma tão vil e inesperada. Eu, que tinha me entregado, que confiava nela como em ninguém, havia me tornado alvo da mais desprezível das humilhações. Era como se fosse ontem. Lembro-me do sorriso dela ao lado dele, aquele maldito sorriso que antes me pertencia. Ela estava tão à vontade, rindo e trocando olhares com um dos nossos amigos mais próximos, um médico que frequentava minha casa, alguém que eu considerava como família. O choque me paralisou. Ver Fernanda nos braços de outro homem, um homem que eu pensava ser meu amigo, destruiu qualquer noção de realidade que eu tinha. Eles riam juntos, íntimos, envoltos em uma atmosfera de cumplicidade que eu nunca imaginaria presenciar.A princípio, achei que estava sonhando, que meus olhos estavam me pregando uma peça cruel. Mas não… Era real. A r
Nunca pensei que fosse o tipo de pessoa que sentiria ciúmes – ou, pelo menos, era o que eu acreditava. Sempre tive a certeza de que a confiança era a base de qualquer relação, que, onde há confiança, não há espaço para inseguranças. Me orgulhava de ser alguém que dominava suas emoções, que não se deixava consumir por medos infundados. Mas então Alby apareceu e, com ela, tudo o que eu sabia sobre mim desmoronou. Já a fiz suportar humilhações que nenhum ser humano deveria enfrentar, testei minha sorte ao extrapolar limites e tive a arrogância de presumir o que jamais deveria. Agora, nesse momento, sinto que tudo o que eu defendia foi por terra, e encaro o abismo das consequências que criei.Eu estava ali, mais uma vez, observando Alby de longe. A única forma que encontrei de estar perto, sem invadir o espaço dela, sem ultrapassar os limites que ela havia estabelecido. Ela e Alice haviam se mudado para buscar um pouco de paz, um refúgio da confusão que havia sido a vida nos último
Enquanto me entregava ao momento, ao consolo de um abraço simples, algo desconfortante se arrastou pelo meu peito. O abraço de Charles, com sua força tranquila e familiar, não deveria ser interrompido, não deveria ser manchado por algo que eu temia ver. Mas ali, no meio de uma risada abafada, algo fez meu corpo se congelar, meu coração acelerar. No meio do movimento, entre um passo e outro, algo me fez parar. Algo no ar, no ambiente, no som que me cercava, me fez virar a cabeça, como se meu corpo estivesse reagindo antes mesmo da minha mente entender o que estava acontecendo. E lá, entre a multidão, com a rua se espalhando ao redor de mim, eu vi uma figura que, a princípio, me parecia familiar. O olhar penetrante, aquela postura rígida que me era tão conhecida… Era Isaías. Não podia ser. Não poderia ser. Mas, mesmo assim, o mundo ao meu redor parecia diminuir enquanto meus olhos fixavam naquele vulto.A sensação foi como um soco no estômago. Eu não sabia o que estava acontec