No dia seguinte também não me atrasei, liguei para Lucy e dispensei a carona, sai de casa andando apressadamente, quanto antes eu chegasse à escola melhor.
O céu estava escuro, ameaçando derrubar litros de água a qualquer momento, o vento forte soprava bruscamente bagunçando meus cabelos, jogando-os em meu rosto. O vento soprou mais forte, e dessa vez acabou levando meu cachecol, então comecei a correr desesperadamente atrás dele, mas o vento era imperdoavelmente mais rápido. Depois de correr em ziguezague por um bom tempo, o vento finalmente cedeu. Olhei em volta procurando por algo Azul bebê, e ali estava ele, na rua bem na minha frente. Andei até onde ele estava e me agachei para pega-lo quando algo me chamou a atenção, havia uma pessoa, um homem bem na minha frente, do outro lado da rua, eu não podia ver seus olhos, mas sabia que ele olhava para mim. Sei que estava olhando para ele quando aconteceu. Um carro me atingiu com toda a força, e voei alguns metros antes de cair no chão, já quase desacordada. Muitas pessoas que sofrem acidente, dizem que quando você esta ali deitada, esperando pra ser socorrida, tudo o que resta é um branco total, você não sente nada, não vê nada e não ouve nada. Porém comigo foi diferente, a dor era insuportável, e ela estava por todas as partes de meu corpo, nas mãos principalmente, que ardiam como o fogo, eu mal podia respirar. E então algo cortou meu fôlego de uma vez, qualquer outra pessoa na minha situação nem teria notado, mas eu notei, bem ao fundo de minha agonia ouvi em alto e bom som uma leve risada... Uma risada que eu já havia ouvido antes.- Fique comigo - um homem de branco e vermelho disse enquanto checava meu pulso- não feche os olhos, permaneça consciente, fique comigo...Quando acordei demorei a perceber que eu estava no hospital, encarei o teto branco por um tempo até que uma enfermeira entrou no quarto. Ela era uma senhora ruiva dos olhos verdes, tinha um sorriso acolhedor.
- Como esta se sentindo? - ela perguntou enquanto analisava os aparelhos ao meu lado.- Dolorida... - respondi- minhas mãos estão doendo.- Isso é normal - ela sorriu novamente – O carro te atingiu com força, tem sorte de estar aqui... Tem muita sorte de não ter se machucado gravemente. Não respondi, ela ainda mexia nos aparelhos atentamente.- Só teve um corte em seu rosto, continua linda... E quanto ao restante, você vai ficar bem. Respirei fundo enquanto digeria as informações, suspirei aliviada.- minha mãe esta aqui? - perguntei.- Ela esteve aqui ao seu lado o dia todo, tenho quase certeza de que só foi tomar um ar e logo volta.- Ah... – suspirei – espera, o dia todo?
A enfermeira deu um sorrisinho disfarçado, e foi só então que olhou para mim de verdade.
- Você ficou desacordada por um bom tempo, estávamos começando a ficar seriamente preocupados, fico aliviada que tenha acordado.
- Que horas são?
- Oito e meia...
Olhei em volta a procura de meu celular apesar de saber que não o encontraria.
- Não foi tanto tempo assim – falei
- São oito e meia da noite.
Dizendo isso ela tocou de leve minha bochecha e sorriu, logo em seguida saiu do quarto apressadamente.
Agora estava sozinha outra vez, fitei o teto enquanto ouvia em algum lugar dentro de mim aquela risada ecoando. Eu não sabia dizer de quem era, se havia mesmo acontecido ou se tudo não passava de imaginação, mas me lembrei do homem me encarando segundos antes do acidente, por mais louco que pudesse ser, eu não podia duvidar do que havia visto. Não podia duvidar da minha sanidade mental.
Mesmo sabendo que não podia duvidar de mim mesma, eu não esperava que acreditassem em mim, sabia que não acreditariam, então decidi que não falaria sobre isso.
Minha mãe entrou na sala como um furacão, seus olhos estavam vermelhos e a fisionomia preocupada.
- Graças a Deus você está bem! – ela disse me abraçando – Quase me mata do coração.
- Sinto muito mãe.
- Tudo bem querida, precisa ficar mais atenta, está sempre por ai andando perdida, não me surpreende que alguém tenha atropelado você.
- A pessoa está bem? – perguntei seriamente preocupada, porque pior do que ser atropelada com certeza devia ser atropelar alguém.
- Não sabemos. – ela respondeu – A pessoa fugiu.
Algo dentro de mim estremeceu, quem fugiria depois de atropelar alguém? Por que eu tinha a sensação de que a risada era cada vez mais real? Por que alguém iria querer me atropelar?
- é... - ela respondeu, e pude notar em seu rosto uma sombra de raiva – Eu imagino o que está sentindo meu bem, mas o importante é que você não se feriu.- e quando posso ir pra casa? - perguntei num tom de criança mimada.
- quando o medico te der alta...
- o que não vai demorar muito - um homem disse enquanto entrava na sala, ele estava todo de branco então com certeza era o médico - você é muito forte sabia?
- obrigada -falei meio sem jeito, o médico era um homem que devia ter uns quarenta anos, alto, cabelo preto com bastante gel e jeito acolhedor, de qualquer forma, eu estava com uma camisola super fina e curta, e velho ou não ele ainda era um homem.
- Meu nome é Makenzi, Edwart Makenzi, mas pode me chamar de ken... se quiser é claro.Então mamãe e ele sorriram, e meio que rolou um clima, analisei as mãos dele em busca de uma aliança de ouro que pudesse me tranqüilizar sobre um possível caso, mas a mão dele estava impecavelmente limpa e nenhum sinal de aliança.
Passei a noite naquela cama que tinha cheiro de produtos de limpeza e remedios, meu corpo doia muito, tentei me levantar mas a dor invadiu meus braços e costa... então fiquei ali, esperando que eu ficasse com sono, sem nada pra fazer a não ser encarar o teto branco sem graça. Só me restou pensar no acidente, e em tudo de estranho que vinha acontecendo nos últimos dias, eu tentava me convencer de que eu estava ficando maluca, e talvez realmente estivesse, mas pensando melhor agora, o medo de que eu poderia estar em perigo me invadiu de uma só vez. Tentei não pensar nisso, e só veio em minha mente os olhos negros de Daniel. Eu me odiava por pensar nele, mas permiti esses pensamentos porque eram melhores do que o que havia ocorrido.Demorei a pegar no sono, e a noite parecia mais longa e assustadora ali do que era em minha casa, mas ainda assim me forcei a relaxar, esperando que o dia seguinte fosse melhor que o anterior.
Fiquei no hospital por mais um dia, o dia mais longo da minha vida.Cheguei em casa com uma felicidade estampada em meu rosto, mamãe ficou em silêncio o caminho todo, o que era estranho. Me perguntei se sua preocupação seria eu ou seu trabalho, mas não quis perguntar, de certa forma era reconfortante poder ficar em silencio.Assim que entrei em casa fui direto para o banheiro tomar um banho, a sensação da agua quente caindo em minhas costas era absolutamente reconfortante. Depois fui para a minha cama, de todos os lugares, o melhor para se estar.Dormi a tarde toda, e só acordei quando mamãe entrou no quarto.- Nalu... - meu apelido soando inédito na voz dela - desculpe ter que te acordar, sei que esta cansada, mas você precisa se arrumar.- Está tudo bem? - perguntei me espreguiçando. - você vai passar alguns dias em Brighton com seu pai...
Passamos a maior parte do caminho em silêncio, até que meu pai, o mestre de assuntos importantes e piadas sem graça resolveu abrir o verbo.- então vocês já se conhecem?- ele disse sorrindo- isso é ótimo!- não é bem assim pai... só conversamos uma vez quando ele foi me dar um recado do sr.Gretel.- sr. Gretel?- papai perguntou meio confuso.- professor de biologia. - Dominic disse se intrometendo - nosso professor de biologia...- então estudam juntos?- é... - falei.- isso é incrível - papai sorria novamente.Faltava pouco para chegarmos até Brighton, a rodovia estava clara e só as vezes um carro ou outro passava por nós...Dominic dormia tranquilamente no banco traseiro, o radio estava chiando um pouco e tocava uma musica calma o bastante para fazer um bebê dormir.- garotinha? - meu pai disse
Naquela noite eu não consegui dormir, as palavras de Dominic não saiam da minha cabeça. Pessoa errada? Lado errado? O que ele estava dizendo? Não fazia o menor sentido, e a curiosidade tomou conta de mim de tal forma que eu estava a ponto de levantar da cama em plena madrugada e ir pedir satisfações... quem ele pensava que era pra me assustar e confundir daquele jeito?Acendi o abajur em formato de cogumelo, e me sentei na cama, algo se moveu perto da janela, alguns poucos metros de distância de mim. Congelei. Seria a mesma sombra que eu havia visto na minha casa? Poderia também ser o dono do sorriso (Dominic), ou poderia também ser o motorista que havia me atropelado e fugido.Mas essas hipóteses pareciam malucas demais até para mim.Apaguei o abajur novamente e me deitei, o sono viria uma hora ou outra.Outro barulho perto da janela, o que quer que fosse queria ser descoberto.
Fiquei no quarto por longos vinte minutos, até me dar conta de que não agüentaria mais um minuto sequer naquela casa. Troquei de roupa e ajeitei meu cabelo rebelde, chequei as horas no celular e sai do quarto.Dóris e Mariana não estavam mais lá quando desci, Megan me olhou franziu o cenho quando me viu arrumada para sair.- Vai sair? - papai disse se encostando no balcão.- vou dar uma volta ... - falei secamente enquanto colocava água num copo de vidro.- Você não conhece a cidade garotinha, é perigoso - ele cruzou os braços e arqueou as sobrancelhas, fiz o mesmo logo em seguida.- Não vou para muito longe - falei calmamente.- pode ir se Dominic for junto. – ele disse decidido.- Eu não vou com Dominic... - falei irritada- Eu sinto muito desapontar você mas preciso de um pouco de ar fres
Megan estacionou o carro em frente uma loja enorme, numa placa azul lia-seValentine's chic, a loja era gigante, a pintura azul turquesa dava a sensação de estar no céu.Vasculhamos tudo o que tinha na loja, e no fim acabei comprando um vestido verde com flores, um jeans preto básico e algumas blusinhas coloridas.- pronta para a próxima? - Megan disse enquanto entravamos no carro.- Claro. Fomos em mais duas lojas, mas nenhuma se igualava à primeira, de modo que acabei comprando apenas dois shorts jeans e uma sapatilha vermelha. Depois que saímos da ultima loja, Megan perguntou se eu queria ir em mais alguma, neguei e sugeri que fossemos comer alguma coisa, ela aceitou rapidamente. Fomos à uma pizzaria, escolhemos uma das mesas vazias e fizemos os pedidos.- compras me dão fome - ela disse sorrindo.- em mim também aparentemente – observei. 
Daniel não saia de minha cabeça, seu sorriso, seu cheiro, o calor de seu corpo tocando o meu, iam e vinham em minha mente, impedindo que eu pensasse com clareza.Por um momento fiquei com medo de que ele não me procurasse mais, mas no fundo eu sabia que esse não era o estilo de Daniel.O problema era que ao mesmo tempo que me sentia atraída por ele, também sentia um medo avassalador quando estava ao seu lado. Daniel, o garoto dos sorrisos condescendentes e dos olhos negros que pareciam capazes de enxergar através de mim, havia me beijado, beijado intensamente. Resolvi que precisava vê-lo, eu precisava falar muitas coisas para ele, e ao mesmo tempo manter distância, por que não era certo aquilo, ele era sinistro e assustador, parecia me seguir para todos os lugares e era extremamente sexy de uma forma que eu não era capaz de explicar... Assim que minha mente formulou esses pen
- Não sou não!- falei já nervosa, Peter e Ana Rita não desistiam da ideia de eu ser a tal garota, e isso estava me deixando louca.- querida!- Peter disse - você ...- Analu. - corrigi.- o.k. - ele suspirou - você não consegue se lembrar de nada?- eu me lembraria se fosse essa tal garota.- disse impaciente com a demora de Dóris.- isso é extraordinário! - os olhos dele brilhavam - ela nem sequer se lembra Ana Rita...- é mesmo incrível! - Ana Rita continuou - é diferente de tudo... eu achava que era apenas uma lenda.Dóris entrou sem bater, mas não havia nem sinal de Mariana.- olá garotas - ela sorriu - e Peter.Ele fez um aceno rápido.- ótimo! Vamos pra casa... - falei já me levantando.- Dóris, você precisa ver uma coisa. - Peter se levantou com o livro e foi ate ela.
- mas Daniel... - falei interrompendo-o pela primeira vez desde que começara a monologar - então quando me beijou, não beijou a mim, e sim a ela.- Analu... por favor! - ele disse pacientemente - sabe que não é bem assim.- eu gostaria muito de saber Daniel... gostaria mesmo - puxei minha mão e me afastei, ele segurou meu pulso.- Analu!- Daniel me olhava fixamente - quando beijei você pela primeira vez, eu admito que estava lembrando de Elaine, mas agora foi diferente, você foi a única garota em décadas que conseguiu me fazer esquecê-la, mesmo que apenas por alguns segundos.- Obrigada Daniel... estou me sentindo muito melhor - puxei meu braço com força e comecei a andar rapidamente - Obrigado por ter limpado minha