Meu amo.

Começo pela areia. O calor é insuportável, mas me encho de valentia. Nessa hora eu só penso na minha irmã, e na promessa que eu tinha feito a ela que de alguma forma eu tentaria ajudar.

Conforme vou varrendo a areia, começo a sentir nas mãos o peso da vassoura e entendo que o serviço não é tão fácil como eu imaginava. Vou fazendo montinhos e montinhos de areia e colocando no lixo, e então continuava a varrer. O suor começa a escorrer pelos vãos de meus seios, pelas minhas costas, pernas e testa.

Depois de uma hora, varri todo o pátio, e todo caminho que vai até a piscina. Minhas mãos ardem e ao observá-las, pude ver as bolhas que se formaram com o serviço.

Desanimada me dirijo às folhas, mas percebo que não conseguirei varrê-las, caso não proteja as minhas mãos. Eu não consigo mais pegar na vassoura sem que elas ardam. Minha garganta também está seca. Preciso urgente beber pelo menos um copo de água.

Entro na casa, logo sou seguida pelo guarda.

E agora?

Said está sorrindo e dando leves beijos na garota, mas não demora muito ele me vê. Afasta-se dela e falando algo em seu ouvido, caminha em minha direção. Seus olhos continuam com a mesma dureza de antes.

—Acabou o serviço?

Eu nego com a cabeça.

— Quero falar com Zafira.

— Ela está ocupada. Se não acabou, o que quer?

Eu fecho os olhos e suspiro, limpando o suor de meu rosto com as costas das mãos e o encaro altiva.

— Eu quero um copo de água e dois pedaços de pano limpos.

O encaro de queixo erguido, mesmo consciente do meu estado lastimável. Luto também contra uma torrente de sentimentos que me invadem: Tristeza, desânimo e vontade de chorar. E com tudo isso, a certeza que eu preciso ser forte.

Said fixa seus olhos em mim, parece contrariado.

— A água entendi, porque precisa dos panos limpos? Você foi para varrer e não para limpar algo!

Meu coração martela em meus ouvidos. Eu não sei o que dizer, por isso fico apenas a olhar para ele, consciente de sua presença dominante e consciente também dos olhos da moça sobre mim.

— E então? —Ele pergunta impaciente, esperando minha resposta.

— Eu acho que deveria tratar desse assunto com Zafira. —Eu digo contrariada, pois meu orgulho me impede de mostrar minhas mãos.

Ele me estuda sério.

— Quero ver suas mãos. — Ele diz de repente.

Eu as coloco para trás.

—Por que quer ver minhas mãos? —Eu digo na defensiva. —Não roubei nada!

Ele se aproxima de mim, me fazendo recuar. Seus dedos morenos pegam um dos meus braços, e depois meu pulso. Ele então, vira minha mão e força meus dedos se abrirem.

Quando ele vê o estado delas, com muitas bolhas, sendo que algumas furadas vertendo água, ele exclama:— Allah! — Ele me olha confuso, fica por um tempo sem ação. Então reage com raiva. — Mas que raios! Suas mãos não parecem de uma faxineira.

Com certeza reparou na maciez da minha pele e nas minhas unhas bem-feitas.

Allah! Ele nem está preocupado comigo, apenas com o serviço!

Aperto meus lábios com raiva e puxo minha mão das dele. Irritada com o calor e com muita sede, eu me afasto. Minhas pernas então começam a formigar e depois meu corpo inteiro. Com certeza estou pálida. Tudo some e eu teria caído se Said não me segurasse na hora.

Ele me pega no colo sem dificuldade, como se eu fosse uma pena e me coloca sentada no sofá. Grita "água". Logo três servas surgem, cada uma com um copo na mão.

Ele pega um de uma delas e me entrega:

—Beba!

Eu pego com urgência, as mãos tremendo e bebo a água fresca como se fosse a coisa melhor do mundo. Quando finalizo me sinto aliviada. Entrego o copo vazio sem encará-lo.

—Obrigada. O senhor poderia agora me providenciar os panos para eu fazer de ataduras?

— Não! Esse serviço é muito pesado para você. De hoje em diante você ajudará na cozinha, pelo que eu sei, você cozinha muito bem.

Eu ergo o rosto surpresa.

Allah! Eu mal sei fritar direito um ovo, só sei fazer uma omelete pela praticidade.

— Creio que essa informação o senhor tirou da minha antiga patroa.

— Sim, embora você tenha usado de uma atitude tão baixa, ela disse que você era uma ótima empregada, por isso nunca desconfiou de você. Que cozinhava muito bem e sabia fazer um carneiro assado como ninguém.

— Entendo! — Eu o fito por um momento, limpando novamente o suor de meu rosto.

—Hoje descanse, amanhã você começará na cozinha. Zafira te chamará cedo, cinco e meia, para que tudo esteja pronto em tempo hábil, pois costumo tomar café cedo.

A moça que o acompanha, abraça Said.

— Said, já terminou com essa moça? Daqui a pouco precisarei ir embora, e quase não ficamos juntos. E sabe como papai implica com o horário. —Ela diz toda melosa. Ah, me deu até carie.

Ele sorri para ela de um jeito tão carinhoso que meu coração dispara pela beleza e docilidade que vejo naquele sorriso.

—Estou terminando aqui, me espere na biblioteca.

Ela sorri meigamente para ele e me lança um olhar de pesar.

Allah! Realmente a minha figura não é atraente, acho que sou repelente. Eu me sinto patética! Mas isso é o que menos me preocupa. O que mais me preocupa é que cozinhar não é a minha praia.

Tento argumentar.

— Ao invés da cozinha. Eu poderia limpar a mansão, a parte interna.

—Para quê? Para roubar alguns objetos e vender para pagar suas dívidas?

Eu perco a paciência e me levanto.

—Olha aqui! Eu nunca roubei nada em toda a minha vida. —Então me lembro que me passo pela minha irmã. Respiro fundo e argumento. — Eu errei, mas foi a primeira vez e como eu te disse, isso não irá mais se repetir. Foi uma burrada muito grande o que fiz.

— Cale-se! —Ele ordena.

Aproxima-se de mim me puxando com tanta violência que vou de encontro a ele, espalmo minhas mãos em seu peito me segurando para não cair. Posso sentir seu calor e as batidas fortes de seu coração. Estremeço quando percebo que a veia do pescoço dele lateja, demonstrando o quanto ele está nervoso.

A mão quente dele levanta o meu queixo forçando-me a encará-lo.

—Não ouse me desafiar! A vontade que tenho é te entregar para a polícia, lembre-se sempre disso. Portanto, não espero receber reclamações de você por negligência. As coisas serão feitas do meu jeito. Eu estou no controle. Entendeu? Você é minha propriedade agora.

Eu me sinto fraca, mas não vencida. Tento argumentar.

— Alguém poderia me vigiar, enquanto faço as tarefas.

Ele me solta de um jeito brusco.

—Por que não quer trabalhar na cozinha?

—Eu... —Não encontro as palavras.

Ele perde a paciência.

— Sem argumentos! Você trabalhará na cozinha e acabou. Você com esse seu jeito, me insultou além do limite. Que não se repita!

—Sim, meu amo! —Digo jocosa, fazendo uma reverência.

Isso o irrita. E eu me arrependo na hora do que fiz. Ele trinca os dentes e me puxa para si.

—O que foi? Te incomoda se sentir nas minhas mãos? Faça seu serviço direito, que nem notará minha presença.

Ele então se afasta e sorri de um jeito cruel e sem quebrar o contato com meus olhos, grita:

— Zafira!

Quando ela aparece, ele volta a sua atenção para ela.

— Leve a Adara para o seu quarto e amanhã a acorde às cinco e meia, ela ajudará na cozinha. —Seus olhos voltam-se para mim novamente.

Eu desvio o meu olhar do dele e, me sentindo impotente, me afasto. Sigo até o corredor onde Zafira me aguarda.

No meu quarto tomo um banho novamente, mas dessa vez sou rápida. Minhas mãos arderam em contato com a água.

Agora latejam.

O que me dá raiva é a falta de privacidade no meu próprio banheiro e ao que tudo parece, eu sou seu novo fantoche, seu novo brinquedinho. Said está gostando muito disso. Percebo que ele adora me mostrar o tempo todo que eu lhe pertenço.

Com raiva ando pelo quarto atrás das minhas roupas. Não tenho muito o que fazer em um quarto fechado, então coloco uma camisola de algodão e me deito na cama, resolvo tirar uma soneca. Acordo com o barulho da porta sendo aberta, então luzes acesas. Eu pisco várias vezes até ver Zafira entrando com carrinho prateado. Sobre ele, um prato de comida e um copo de suco.

—Seu jantar! — Ela diz me avaliando.

— Zafira, preciso falar com seu patrão. Ele me prometeu uma ligação. Preciso falar com uma amiga.

Ela se aproxima de mim com o carrinho.

— O patrão saiu.

Eu suspiro desanimada, triste.

— Coma, quando ele chegar eu peço a ele.

Meus olhos se iluminam com a promessa.

— Obrigada.

Ela me entrega o meu prato e o copo e sai do quarto. Eu prendo o copo entre as pernas e deposito meu almoço no meu colo. Morrendo de fome, como todo o arroz com ervas e o tabule. Depois bebo todo suco de laranja

Quando ela leva o carrinho, resolvo me trocar. Dou uma olhada no relógio de pulso que está depositado no criado mudo, 9:00 PM. Penteio meus cabelos com dificuldade, estão emaranhados. Eles estão compridos e por isso resseca bastantes nas pontas e com a ausência do condicionador pioraram.

Coloco um vestido preto, que cai super. bem no meu corpo, não que eu queira chamar atenção, mas minhas roupas são inglesas, a única coisa que eu trouxe e que combina com esse lugar são os lenços, que eu usaria nas ruas, pois a pressa em vir para cá foi tão grande que não tive tempo de investir em roupas mais largas como as mulheres usam aqui. Mas tudo bem, no final, só saí na rua de burca por causa da minha situação.

Calço uma sandália preta e ansiosa vou até a janela que lembra uma prisão, por causa da grade. A lua está linda, cheia. O céu estrelado. A porta se abre e o todo poderoso Said entra. Meu amo.

Ele está lindo com uma calça preta e camisa branca semiaberta revelando partes do peito peludo. Cabelos molhados pelo banho. E aquela barba, Allah! Que charme! Bem aparada, quase rente ao rosto.

Esse homem é lindo! Se não fosse essa situação e sua frieza, creio que me apaixonaria por ele. Sim, mas com certeza eu sairia machucada dessa relação. Um homem desse, tradicionalista, jamais me olharia de outra forma, a não ser para ser usada e descartada.

Seus olhos correm minha figura. Ele sorri.

— Zafira falou que queria falar comigo.

Será que ele está pensando que eu me arrumei para ele?

Allah! Deveria ter colocado um dos caftan que Zafira me deu.

Isso quase me faz falar grossa com ele, mas me lembro que eu preciso do telefonema, então falo em um tom baixo e neutro, tom serviçal:

— Sim, quero fazer aquela ligação.

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