Khadija AzizCemitério de Miami Bem, a farsa acabou, penso olhando para o verde sombrio repleto de lápides e rodeado por cercas e portões de ferro. O céu está cinza, combinando com este dia tão triste. Uma brisa gelada farfalha pela copa das árvores. Apenas os canteiros de flores vermelhas e amarelas vibrantes quebram o aspecto sombrio do local.Intranquila eu olho de soslaio para o mais novo Sheik. Rashid Jael Barak. Ele está ali, em silêncio, não olha para mim, apenas encara o caixão do pai sendo baixado, ouvindo o Shaykh dizer algumas palavras de alento.Pó ao pó... O Sheik Al Jain está morto, penso sendo imergida pelo desânimo, desanimo este que parece me sufocar, me inundar. Eu realmente gostava dele, ele era um homem sábio, pacato e de sorriso fácil.Uma multidão de pessoas está presente para se despedir, e entre essas pessoas está o Zafir, irmão do Rashid, que segura um grande guarda-chuva preto e está ao lado da esposa com um bebê de um ano no colo.Rashid conversou muito pou
Essa é a nossa história, um amor unilateral. Eu me pego me lembrando em como os nossos caminhos se cruzaram...Três meses atrás...Conheci Rashid em um dia chuvoso, uma época difícil da minha vida. Meu irmão tinha acabado de falecer e eu já morava há dois meses em um albergue para mulheres. Local horrível. Havia um banheiro que eu dividia com mais nove pessoas, mas isso nem era o pior. Como se não bastasse tudo isso, eu ainda tinha uma tremenda dívida com o hospital que tratou do meu irmão.Nesse dia eu dancei como um robô, naquela noite eu fiz o meu papel de odalisca. Diverti os presentes, mas eu não via a hora de sair daquele lugar, queria chorar em algum canto.Quando terminei o meu trabalho me troquei rapidamente. Eu não tinha predileção por roupas caras nem nada disso. Eu nem sabia o que estava na moda, me vestia de forma desleixada. Agora no papel de odalisca eu sempre passei outra imagem, a de uma mulher linda e exuberante, que sempre chamava a atenção do seu público.Neste dia
No dia seguinte eu vou trabalhar. Visto o meu traje para dançar. Um biquíni branco com adereços e véus presos a ele. Maqueio o meu rosto como de costume, reforçando mais a área dos olhos com uma sombra escura, lápis preto, e delineador.Hoje me parece uma daquelas noites em que absolutamente nada fica fora do lugar. Passo os olhos pelas mesas baixas nos clientes sentados em almofadas. Homens sozinhos, famílias inteiras, homens e mulheres acompanhados. Estaco quando eu o reconheço. Na última mesa à direita está sentado o meu salvador, que tem a sua atenção voltada exclusivamente para mim.Os refletores se acendem, me envolvendo, e o palco se enche de suaves nuvens de fumaça. Eu ergo os braços e coloco uma das minhas pernas torneadas para frente, algumas pessoas assobiam com o meu gesto. Assim que a música Laily Lail de Mario Reyes e Carole Samaha se inicia eu começo a dançar, mexo freneticamente as minhas pernas e quadris. Agora eu não sou mais uma mulher comum, eu visto o personagem
Eu toco no meu pescoço e deslizo a mão sobre ele, incapaz de parar o gesto de nervosismo, querendo desesperadamente que ele pare de me olhar desta maneira tão estudada e tão intensa. Seus olhos negros tempestuosos me mantêm cativa.Ele abre a porta do carro e me convida para entrar fazendo um gesto com a sua mão.—Entre.Eu congelo, sem conseguir me mover. Rashid se aproxima e para na minha frente.—Eu não vou te fazer mal, ontem eu te salvei. Acho que comportamentos assim geram segurança, não?Eu estremeço diante do seu olhar quente.—Você não é nenhum mafioso ou coisa do tipo, é?Ele inclina a cabeça para trás e ri, sua garganta bronzeada zombando de mim, quase tanto quanto a sua risada musical. Eu tento lutar contra a chama do desejo que percorre o meu corpo.—Não, não sou. —Ele diz fazendo um esforço supremo para conter a sua risada. —Gosto disso, da sua ingenuidade em relação a quem eu sou. Por favor, entre e ouça a minha proposta.Eu me sinto emocionalmente confusa, me criticand
Ele sorri de forma apreciativa.—Ótimo. Esse cargo que você ocupará não permitirá que você tenha compromissos fora, nem com ninguém.Eu respiro fundo tentando entender aonde ele quer chegar com tudo isso. O que ele vai me propor?—Você tem parentes? —Uma nova pergunta.Com o coração agitado respondo:—Não, sou só eu.Ele me olha pensativamente.—Eu andei te investigando. Descobri que tem uma grande dívida no São Marcos.O quê? Meu coração dá um salto no peito e minhas mãos tremem.Por que me investigar? Por que diabos ele precisava saber disso?—Sei que está confusa, mas tive que entrar na sua vida para saber com quem eu estava lidando.—Então deve saber tudo sobre mim. Por que me perguntou se tenho namorado ou parentes?—Para você entender que se aceitar o que eu vou te propor, sua vida sentimental será zero. Amigos, parentes, tudo deve sumir nesse momento. Você se dedicará exclusivamente ao seu cargo.Ficamos em silêncio por alguns minutos. Ele está completamente à vontade, enquanto
Eu estremeço.—Entendo.Ele se aproxima de mim, assustada dou um passo para trás. Ele sorri e olha para mim por vários momentos, e eu não consigo ler sua expressão. Fico mais desconfortável a cada segundo que passa. Ele é enorme, agora que percebo como ele é forte e alto.—Khadija. —Ele fala como se tivesse provando meu nome com sua língua. —Você precisa aprender a relaxar comigo. Meu pai é muito perspicaz. Se cada vez que eu me aproximar, você saltar como fez agora, tudo irá por água abaixo.Silencio por um momento. Eu estou muito ofegante, de repente começo a sentir esse prazer inexplicável que corre através de mim, que não é tão invisível quanto eu penso que é. Minhas bochechas aquecem. Meu coração está agitado no peito. Balanço a cabeça apenas concordando, lutando para manter meus olhos fixos nos dele.Seus olhos descem para os meus lábios. Eu estremeço, pois sei o que ele fará. Posso ver seu coração agitado como o meu, ele também está ofegante. Então ele me puxa para os seus braç
No dia seguinte fico em frente ao espelho e dou uma última olhada na minha figura. Meu vestido tubinho preto vai até o joelho. Meus cabelos negros estão soltos, mas devidamente bem penteados, a maquiagem é leve. Não sou eu naquela imagem refletida no espelho, mas sei que de agora em diante eu vou ter que me vestir dessa maneira.Saio do quarto e caminho em direção aos elevadores. Os saltos altos nos meus pés me lembram do quanto eu me sinto desconfortável com eles.A secretária simpática de Rashid me recebe com um sorriso. E como da outra vez, eu entro no escritório do Rashid sem bater.Meu coração acelera como sempre acontece quando eu estou prestes a vê-lo. Não entendo muito o porquê dessa minha reação, mas respirar fica sempre mais difícil quando dou de cara com esses olhos negros.Rashid sorri para mim, um sorriso torto. Imediatamente isso envia ondas de calor pelo meu corpo. Eu sorrio com frieza para ele, pois o que eu menos quero é demonstrar que babo por ele.Posso sentir o rub
Algo que sem dúvida chamou minha atenção – e não era preciso ser muito observadora – foi o quanto essa família parecia gostar de lutas, das batalhas e guerras. Nas salas da seção central da mansão, que são decoradas em madeiras nobres, nos escritórios internos e nas suas bibliotecas, estão dispostas armas antigas. Ali, um arcabuz de algum tempo muito anterior à guerra civil; em outra parede, alabardas e espadas medievais. Ao lado da estante, na biblioteca, armaduras de cota de malha.É nessa mansão que se iniciou a minha história. Na casa antiga que domina uma colina de onde se pode ver o mar logo abaixo, que quebra em uma linda praia particular de areias claras.Depois que Rashid me mostrou a casa, o pai dele surgiu na sala para me conhecer. Rashid nessa hora envolveu minha cintura e com um sorriso me apresentou para ele. Foi neste momento que eu me apaixonei pelo velhinho simpático e de sorriso fácil. Quem olhasse para ele não diria que estava doente ou com problemas sérios de saúde