Ponto de vista de Sebastian Enquanto a observo tentar me envolver em uma conversa, fingindo me distrair com uma gratidão falsa, só sinto amargor na boca, não importa quanto anestésico eu despeje em mim. Agora sei por que ela mentiria para mim. Não sou mais especial para ela. Sou agora, para ela, como todos os outros: uma pessoa que ela pode usar sem sentir remorso. A honestidade é, para ela, uma "base sólida para o casamento". Eu destruí aquele casamento, e ela tem o direito de não se importar com essa base. Ela estava certa. Construiu um lar para mim, para nós. Um lar de verdade, não apenas uma casa para viver, mas um porto onde eu poderia relaxar depois do meu dia e recarregar as energias, onde eu era cuidado ao extremo, sem precisar pagar nada. Eu quebrei aquele paraíso em pedaços, sem perceber o que tinha. Eu a observo. Quer dizer, eu "não percebo" quando ela rouba meu celular e o entrega para um cara que eu nem conheço, como a ladra mais desajeitada do mundo qu
Ponto de Vista de ScarlettNão pode ser o Lucas se estamos indo pela porta em vez da janela. Tem que ser eu. Mesmo que alguém me veja, não será um crime.— O que demorou tanto?! — Sibilo para ele quando me arrasta para um canto escuro. Na mão, ele segura uma chave de bronze antiga, com um formato estranho. O portão da vila usa uma fechadura biométrica, mas o escritório de Jack Fuller ainda usa uma daquelas fechaduras antigas, com uma chave física complicada.O que ele está escondendo lá dentro?— Esse tipo de fechadura é muito cara, uma fechadura com uma única chave, e ela não pode ser duplicada. — Vendo minha confusão, Lucas explica. — E, para responder à sua pergunta, é porque você me deu a senha errada do telefone.— O quê?! Não é o aniversário da Ava?! — Exclamo. — Eu juro que já o vi usando isso.— Bem, talvez fosse, mas agora não é mais. — Lucas faz uma expressão estranha. — Você quer saber qual é?— Não precisa. — Faço um gesto com a mão. — Não pretendo ficar roubando o t
POV da ScarlettMeus ciclos menstruais nunca foram regulares, mas, ainda assim, eu deveria ter percebido.Náusea, cansaço, mudança no paladar... Você acharia que seria óbvio, mas você só percebe, depois, quantos sinais ignorou.Assim como eu venho ignorando os sinais gritando para mim de que o homem com quem eu estava casada nunca me amaria de volta, por mais que eu tentasse.Eu vim para a consulta de saúde pensando: "Qual é a pior coisa que pode acontecer? Se fosse câncer, eu conseguiria lidar."Mas com isso eu não conseguiria lidar.Um bebê.A melhor coisa chegando no pior momento.Não sei quando sentirei aquele amor materno poderoso que sempre ouvi falar, mas tenho certeza da reação DELE. Ele vai odiar o bebê.É melhor que seja apenas um câncer. Pelo menos isso faria um de nós feliz.Sentada no lobby movimentado do andar da maternidade, sozinha, tento absorver a notícia. Meus esforços são em vão. De repente, meus olhos se enchem de lágrimas, enciumada pelos casais felizes e amorosos
POV da ScarlettSentada no táxi a caminho de outro hospital – o hospital onde ELA está, para vê-lo. Eu me sinto mal. Enjoo de carro, enjoo matinal, ou apenas... enjoo dessa viagem.Essa é a viagem que mais odeio, e é uma viagem que venho fazendo há dez anos: ela está sempre no hospital, e ele está sempre perto dela, mesmo antes do nosso casamento.Isso é o que acontece quando o homem de quem você gosta ama sua irmã que tem a doença de von Willebrand, combinada com o tipo sanguíneo RH-, nada menos.Sim, a doença em que a pessoa não pode se curar de sangramentos, com o tipo sanguíneo que apenas 0,3% das pessoas possuem.Até mesmo um pequeno corte no dedo pode ser letal para ela. Por isso, ela é o tesouro mimado de toda a família, a intocável, o milagre que consegue tudo o que quer só por existir.Eu? Até a minha existência é ignorada.Meus pais só têm Ava em seus olhos. Meu irmão me odeia como se eu tivesse roubado a minha saúde de Ava.Não, eu apenas roubei o homem dela.Mas eles já me
POV da Scarlett— O transplante de medula óssea foi há três meses, boba.A risada de Sebastian segue o pedido dela até o corredor vazio.Coloco minha mão na maçaneta da porta, mas não consigo encontrar forças para girá-la. Já vi o quanto eles são carinhosos um com o outro, tantas vezes, por tanto tempo.Como se fosse uma tortura, eu simplesmente fico ali parada, ouvindo.— Hoje é só um check-up de rotina, e o resultado tem sido bom todas as outras vezes, não é? — Sebastian conforta.Eu podia ver o sorriso carinhoso dele na minha cabeça enquanto ele acalma o amor de sua vida, sua mão poderosa acariciando a cabeça dela como se ela fosse a flor mais delicada do mundo.Esse calor e esse amor são algo que eu só experimentei uma vez dele e, naquela única vez, eu pensei que tinha tocado o sol. Por aquele único momento de luz que vi na minha vida sombria, eu me joguei em direção ao sol, apostando com tudo o que tinha.E, assim como o sol, ele me queimou.Não importa o quanto eu o amasse, não
POV da ScarlettApago o cigarro na lixeira quando a porta dela se abre.Sebastian franze a testa para mim, permanecendo na porta, a meio corredor de distância de mim. Ele me odeia fumando. Ele me encararia, me repreenderia ou, como agora, ficaria longe, com nojo estampado no rosto.É um hábito nojento, mas uma mulher precisa de ALGO para liberar a dor no peito ou ela vai explodir. Mas, pensando bem, se sua delicada Ava pudesse ter esse hábito, ele com certeza se juntaria a ela.— Então?Ele coloca uma mão no bolso, me encarando enquanto finalmente se aproxima. Ele faz isso quando está impaciente. Como, o tempo todo comigo.Olho para o rosto dele, bonito e dominante, igualzinho ao dia em que ele me encontrou naquela floresta. Mas, naquela época, aqueles olhos eram claros como cristal, com brilhos como a Via Láctea. Agora, são pura escuridão de ódio.Ele estala os dedos para chamar minha atenção.— Desculpe...Eu desvio os olhos para o chão, puxando os papéis do divórcio. Ele estica a mã
POV da ScarlettAurora ainda me levou ao aeroporto. Mas não me deu minha passagem.Colocou uma xícara de chocolate quente nas minhas mãos e me encara do outro lado da mesinha do McDonald's, como uma mãe feroz julgando sua filha que fugiu da escola.— Eu ACABEI de descobrir isso hoje... — Começo timidamente e, instantaneamente, ela retruca:— Sim, você já disse isso!Não é como se eu tivesse planejado tudo isso. Baixo os olhos para o meu chocolate quente, não consigo olhar para ela. Ela está brava, e eu sei o motivo.Ela vem de uma família rica. Bonita, popular, com pernas perfeitas, etc. Mas não nasceu rica. Viu sua mãe solteira se matar de trabalhar para criá-la, odiando seu pai irresponsável a vida inteira, apenas para descobrir que ele não as abandonou, como sua mãe sempre lhe contou. Foi sua mãe quem pediu o divórcio.Ela está me vendo fazer exatamente a mesma coisa.— Não vou ensinar o bebê a odiá-lo... — Murmuro, sem coragem de olhar para a raiva no rosto dela. Eu sei o quanto e
POV da Scarlett— O que foi isso? — Aurora pisca os olhos. Minha ligação de uma frase a surpreende.Aperto meu celular, pela segunda vez hoje, lutando com meu plano. Eu só quero parar de ser machucada. Será que é pedir demais? Fecho os olhos. Uma parte de mim quer apenas pegar a passagem e ir embora, deixando o mundo queimar atrás de mim.Mas não posso. Se minha mãe precisa de uma transfusão de sangue, eu preciso estar lá. É para isso que eu estou nesta família. O recipiente de sangue deles.Por favor, Deus, por favor me diga que essa ligação não tem nada a ver com a minha mensagem para o Sebastian.Entre "minha mãe está realmente ferida" e "Sebastian me entregando"... Eu não sei qual das duas opções eu espero que seja a situação.— Acho que não vou embora hoje, depois de tudo.Solto um suspiro, murmurando para Aurora:— Sinto muito, mas... preciso que você me leve de volta.— Que ótimo!Aurora se joga contra mim com uma felicidade genuína na voz:— Era ele? O que ele disse? É sempre