POV da ScarlettSentada no táxi a caminho de outro hospital – o hospital onde ELA está, para vê-lo. Eu me sinto mal. Enjoo de carro, enjoo matinal, ou apenas... enjoo dessa viagem.Essa é a viagem que mais odeio, e é uma viagem que venho fazendo há dez anos: ela está sempre no hospital, e ele está sempre perto dela, mesmo antes do nosso casamento.Isso é o que acontece quando o homem de quem você gosta ama sua irmã que tem a doença de von Willebrand, combinada com o tipo sanguíneo RH-, nada menos.Sim, a doença em que a pessoa não pode se curar de sangramentos, com o tipo sanguíneo que apenas 0,3% das pessoas possuem.Até mesmo um pequeno corte no dedo pode ser letal para ela. Por isso, ela é o tesouro mimado de toda a família, a intocável, o milagre que consegue tudo o que quer só por existir.Eu? Até a minha existência é ignorada.Meus pais só têm Ava em seus olhos. Meu irmão me odeia como se eu tivesse roubado a minha saúde de Ava.Não, eu apenas roubei o homem dela.Mas eles já me
POV da Scarlett— O transplante de medula óssea foi há três meses, boba.A risada de Sebastian segue o pedido dela até o corredor vazio.Coloco minha mão na maçaneta da porta, mas não consigo encontrar forças para girá-la. Já vi o quanto eles são carinhosos um com o outro, tantas vezes, por tanto tempo.Como se fosse uma tortura, eu simplesmente fico ali parada, ouvindo.— Hoje é só um check-up de rotina, e o resultado tem sido bom todas as outras vezes, não é? — Sebastian conforta.Eu podia ver o sorriso carinhoso dele na minha cabeça enquanto ele acalma o amor de sua vida, sua mão poderosa acariciando a cabeça dela como se ela fosse a flor mais delicada do mundo.Esse calor e esse amor são algo que eu só experimentei uma vez dele e, naquela única vez, eu pensei que tinha tocado o sol. Por aquele único momento de luz que vi na minha vida sombria, eu me joguei em direção ao sol, apostando com tudo o que tinha.E, assim como o sol, ele me queimou.Não importa o quanto eu o amasse, não
POV da ScarlettApago o cigarro na lixeira quando a porta dela se abre.Sebastian franze a testa para mim, permanecendo na porta, a meio corredor de distância de mim. Ele me odeia fumando. Ele me encararia, me repreenderia ou, como agora, ficaria longe, com nojo estampado no rosto.É um hábito nojento, mas uma mulher precisa de ALGO para liberar a dor no peito ou ela vai explodir. Mas, pensando bem, se sua delicada Ava pudesse ter esse hábito, ele com certeza se juntaria a ela.— Então?Ele coloca uma mão no bolso, me encarando enquanto finalmente se aproxima. Ele faz isso quando está impaciente. Como, o tempo todo comigo.Olho para o rosto dele, bonito e dominante, igualzinho ao dia em que ele me encontrou naquela floresta. Mas, naquela época, aqueles olhos eram claros como cristal, com brilhos como a Via Láctea. Agora, são pura escuridão de ódio.Ele estala os dedos para chamar minha atenção.— Desculpe...Eu desvio os olhos para o chão, puxando os papéis do divórcio. Ele estica a mã
POV da ScarlettAurora ainda me levou ao aeroporto. Mas não me deu minha passagem.Colocou uma xícara de chocolate quente nas minhas mãos e me encara do outro lado da mesinha do McDonald's, como uma mãe feroz julgando sua filha que fugiu da escola.— Eu ACABEI de descobrir isso hoje... — Começo timidamente e, instantaneamente, ela retruca:— Sim, você já disse isso!Não é como se eu tivesse planejado tudo isso. Baixo os olhos para o meu chocolate quente, não consigo olhar para ela. Ela está brava, e eu sei o motivo.Ela vem de uma família rica. Bonita, popular, com pernas perfeitas, etc. Mas não nasceu rica. Viu sua mãe solteira se matar de trabalhar para criá-la, odiando seu pai irresponsável a vida inteira, apenas para descobrir que ele não as abandonou, como sua mãe sempre lhe contou. Foi sua mãe quem pediu o divórcio.Ela está me vendo fazer exatamente a mesma coisa.— Não vou ensinar o bebê a odiá-lo... — Murmuro, sem coragem de olhar para a raiva no rosto dela. Eu sei o quanto e
POV da Scarlett— O que foi isso? — Aurora pisca os olhos. Minha ligação de uma frase a surpreende.Aperto meu celular, pela segunda vez hoje, lutando com meu plano. Eu só quero parar de ser machucada. Será que é pedir demais? Fecho os olhos. Uma parte de mim quer apenas pegar a passagem e ir embora, deixando o mundo queimar atrás de mim.Mas não posso. Se minha mãe precisa de uma transfusão de sangue, eu preciso estar lá. É para isso que eu estou nesta família. O recipiente de sangue deles.Por favor, Deus, por favor me diga que essa ligação não tem nada a ver com a minha mensagem para o Sebastian.Entre "minha mãe está realmente ferida" e "Sebastian me entregando"... Eu não sei qual das duas opções eu espero que seja a situação.— Acho que não vou embora hoje, depois de tudo.Solto um suspiro, murmurando para Aurora:— Sinto muito, mas... preciso que você me leve de volta.— Que ótimo!Aurora se joga contra mim com uma felicidade genuína na voz:— Era ele? O que ele disse? É sempre
POV do SebastianEu não respondi à mensagem da Scar. Ela nunca iria embora. Ela só manipula com ameaças como essa.Talvez eu tenha passado tempo demais com a Ava recentemente, e a Scar está fazendo birra. Ela deveria entender que é uma vida em risco, mesmo que essa vida pertença à irmã que ela odeia.Não é que eu não entenda a Scar. Eu entendo. Sendo a saudável, ela sente inveja de toda a atenção extra que a Ava está recebendo. Por isso, ela é a criança problemática. Sempre rebelde, mas orgulhosa, agindo indiferente, mas implorando por amor. Ela está sempre procurando atenção, com mensagens ácidas, lágrimas ou um divórcio.Não achei que ela realmente me daria um assinado. Pense na catástrofe se eu ousasse realmente seguir com isso.Com certeza, Scar voltou.Também não estava mais com aquela mala meio vazia. Acho que o show dela termina hoje à noite.Afinal, hoje tivemos o melhor resultado nas plaquetas sanguíneas de Ava, quase chegando ao nível normal. Hoje é o dia em que Ava finalmen
POV da ScarlettSentada no chão frio, percebo que fiz meu julgamento muito cedo.Eu pensei que minha vida costumava ser um inferno na terra. Como eu estava errada. Embora todos me tratassem horrivelmente, nunca colocaram a mão em mim. Afinal, eu era o recipiente de sangue precioso para a frágil Ava. Eles não podiam se dar ao luxo de me perder.Mas não mais.Coloco a palma da minha mão no rosto, olhando lentamente para o homem que um dia chamei de pai, apenas para perceber a frieza em seus olhos: Ainda sou o recipiente de sangue, só que não "precioso" mais. Agora sou algo que eles "podem ter".Afinal, Ava já está praticamente curada.Eles não vão me descartar porque talvez eu ainda tenha algum valor. O que eles têm a perder se eu não tiver a chance de uma vida normal?Por causa desse leve "talvez", eu não posso ter minha liberdade. Não tenho permissão para deixar a cidade e ter minha própria vida. Eles não se importam se meu coração for quebrado um milhão de vezes todos os dias aqui, v
POV do SebastianHá cacos espalhados por todo o chão. Não ouso colocar Ava no chão. A quantidade de plaquetas sanguíneas dela pode ter chegado a um nível normal agora, mas ninguém ousa testar se o monstro que tem assombrado ela ainda está à espreita por perto.Da última vez, Ava precisou de sangue de Scar por causa de um corte de papel, literalmente. Um corte que Scar causou, nada menos que isso.— ...Por favor? — Scar murmura quando se aproxima de mim, sem olhar para mim.— Não posso colocá-la no chão, você sabe por quê.Scar dá uma risada fria, finalmente olhando para cima por baixo de seu cabelo bagunçado. Jack deve ter dado um tapa bem forte nela para bagunçar o cabelo daquele jeito, além de deixar uma marca vermelha de palma na bochecha dela.— Com licença. — Scar diz com um tom claro, mas frio, com o qual não estou familiarizado: — Estou passando.Eu parei Ava na porta.Franzo a testa, odiando o sarcasmo nos olhos de Scar. Ela sabe por que eu não entendi direito e está zombando