Mariana
Se desse ao que eu sentia o nome de medo, não estaria sendo sincera. Eu estava desesperada, em níveis completamente surreais. Porém, ao mesmo tempo, tinham outras sensações tão ou mais fortes que me mantinham de pé. A maior delas era o desejo de salvar a rainha Morgan. Outra, era o desejo de justiça. Zaria precisava e iria pagar pelos crimes que cometeu.
Eu apenas não fazia ideia de como faria isso.
Eu tinha achado que o quarto para onde levaram Sofia e eu na noite em que dormimos no castelo era majestoso, mas não se comparava ao local onde estávamos agora. Era o mais puro luxo, o que demonstrava o quanto Morgan se preocupava com o bem-estar de sua prima criminosa. Porém, em meio a todo o co
Mariana Eu não era capaz de imaginar nada que pudesse ser mais aterrorizante do que aquela sensação de falta de controle sobre o meu próprio corpo. Eu não conseguia nem ao menos chorar e, apesar do pavor que sentia, toda a minha musculatura se mantinha firme, sem sequer um indício de tremor. Havia segurança e destreza em minha postura, na forma com que eu empunhava a espada e, até mesmo, na firmeza com a qual eu olhava fixamente para Sofia. Mas eu não sentia nada daquilo. Eu não queria estar ameaçando uma pessoa que eu amava como uma irmã. Ouvi a risada de Zaria e a vi se levantar e vir em minha direção. Parou bem atrás de mim e me abraçou. Senti nojo daquele contato, queria empurrá-la, queria sair dali, mas apenas me mantive im
Sofia Nada do que aquela mulher dizia fazia qualquer sentido. Minha mãe se chamava Amanda e era tão terráquea quanto eu. Tinha nascido e passado a vida inteira em uma cidade do interior, vinda de uma família humilde, criada por uma tia já falecida e sem parentes vivos. Foi mãe solteira antes dos vinte, nunca se casou, não fez faculdade e trabalhava na prefeitura. Gostava de cavalos, de feng shui, de paradas místicas e artesanatos. Uma mulher de vida simples e de uma índole maravilhosa, tão humana quanto todas as outras pessoas do meu mundo. Nada de sucessora de um trono em um outro mundo. Não existia qualquer chance, por mais remota que fosse, daqueles devaneios de Zaria serem verdade. Não mesmo! Mas... e se houvesse?&nbs
Sofia Eu sempre achei que a noite que se seguiu ao dia da morte da minha mãe seria para sempre a pior de toda a minha vida, mas agora eu vivia outra que a superava. Mesmo porque, a morte dela, em si, parecia estar sendo revivida, adquirindo outro significado ainda mais doloroso na minha vida. Assassinada por uma criatura inescrupulosa e cruel, a mesma que agora tinha em suas mãos a vida de outra pessoa que também se tornara importante para mim. E, em meio ao luto, à revolta e ao medo, vinha também a culpa. Eu havia falhado miseravelmente na missão atribuída a mim. Um missão duplamente atribuída, na verdade, já que agora eu descobria que não apenas era uma das guerreiras esperadas, como era também uma futura
Mariana Minha consciência retornou de súbito, juntamente com as memórias aterrorizantes do que eu havia feito. Do que Zaria me obrigara a fazer. Ergui o tronco bruscamente, dividindo meus pensamentos entre o alívio por retomar o controle de meus próprios movimentos, com a confusão por não saber onde eu estava nem como tinha ido parar ali. Enquanto percorria os olhos pelo que parecia um casebre de madeira, tentei recordar dos últimos acontecimentos. Eu tentando matar a Sofia... péssimas lembranças... ela me atacando com algo que parecia gelo e eu revidando com alguma coisa parecida com fogo... o choque dos dois, o tremor, tudo vindo abaixo... e a escuridão. Agora, eu acordava naquele lugar desconhecido. Olhei para baixo, vendo-me sobre cobertas que cobriam um chão
Sofia Logo que meu corpo se chocou contra o chão, eu sequer me dei tempo de sentir as dores do impacto e, em um só impulso, me levantei. Daniele fez o mesmo. Porém, enquanto eu ficava parada, tentando me situar nos últimos acontecimentos, ela andava de um lado a outro, nitidamente tentando reencontrar a passagem para retornar a Atar. Compreendendo a situação, eu enfim disse algo: — Não adianta, está fechada. — Precisamos voltar. Precisamos voltar agora! Precisávamos. Eu sabia disso. Mas também sabia que não era agindo como duas desesperadas que conseguiríamos. Sendo assim, precisei forçar todo o meu lado racional e ser enérgica para me fazer
“Quando o mal tentar dominar Atar,duas jovens guerreiras de gênios e energias opostas,vindas de outro mundo, trarão de volta a paz e o equilíbrio” O belíssimo animal de crina castanha parou diante do paredão rochoso do que parecia apenas mais uma montanha como todas as outras. Os pés de Morgan, calçando botas de montaria, tocaram o solo e ela acariciou o cavalo, enquanto hesitava diante do que estava prestes a fazer. Mesmo sendo aquela uma rotina que repetia religiosamente a cada vinte dias no decorrer dos últimos dezoito anos. Desamarrou a grande e pesada sacola de pano que trouxera presa ao corpo do animal e olhou para a montanha, pensativa. Estava frio e um forte vento gelado
SofiaEu às vezes reclamava da rotina, até que chegou o dia em que tudo o que eu mais desejei foi que as coisas continuassem da forma como estavam. O dia em que voltei da escola e não fui recebida por um “Acabei de limpar o chão, tire esses sapatos antes de entrar!”; em que o cheiro delicioso do almoço não invadiu as minhas narinas; em que não dei o costumeiro beijo no rosto da minha mãe, precedido por um “cheguei!” de minha parte e seguido por um “Como foi na escola hoje?” da parte dela. O dia em que sofri a maior dor da minha vida e que descobri que precisaria reaprender a viver, sem a minha mãe ao meu lado.Tinha sido tudo absolutamente repentino. Era dia de folga dela e, por isso, decidira tirar a manhã para organizar os armários da cozinha, que estavam todos uma bagunça. Saí para a escola e, quando voltei, a enc
MarianaUau, uau, uau... mil vezes uau!Eu tinha mesmo feito aquilo? Tinha salvado a vida de um gatinho?Eu o abracei com força, sem nem me preocupar com o fato de ser um bichano que eu ainda não conhecia o temperamento (e se ele fosse arisco? Gatos, na maioria das vezes, não são muito adeptos a abraços, ainda mais de desconhecidos). Para a minha sorte, ele continuou bem quietinho, e compreendi, naquilo, que também devia estar feliz. Porque a vidinha dele tinha sido salva.Meu Deus, eu era uma super-heroína!Aliás, não apenas eu! Era incrível, mas o outro gatinho tinha sido salvo pela Sofia! Animada, fui até ela, olhando atenta para os dois lados antes de atravessar a rua. Percebi que ela parecia meio tensa, meio aérea, e isso me preocupou.— Você tá bem? — perguntei, parando diante dela.Sofia movim