A sala já estava começando a se esvaziar e as pessoas ao meu redor aplaudiam quando eu percebi que a conferência estava sendo encerrada. Num gesto automático, juntei-me a eles, mas por dentro lamentava profundamente ter perdido as últimas apresentações. A minha mente estava em outro lugar, imersa em pensamentos tumultuados. Durante toda a manhã, não consegui ouvir uma única palavra dos palestrantes, tão absorvida estava pela angústia que me consumia. O peso da verdade que eu teria que revelar para meus pais e, especialmente, para Otávio, me deixava paralisada. Como poderia encontrar as palavras certas para explicar tudo? A sensação de desconforto só aumentava à medida que me aproximava do momento inevitável de encarar essa conversa difícil. Saí do auditório com uma sensação incómoda de ter perdido algo importante. O restante do grupo já estava reunido do lado de fora, e pude sentir o peso do olhar deles sobre mim assim que me aproximei. Estavam todos reunidos, claramente esperando
Othon Ao ouvir as palavras de Karen, a primeira sensação que percorreu o meu ser foi raiva. Uma raiva intensa pulsando dentro de mim, ameaçando dominar os meus pensamentos. No entanto, eu sou um homem controlado e sempre tento ponderar as minhas palavras antes de falar, mesmo quando profundamente chateado como estou agora. As coisas estavam fugindo do meu controle desde que reencontrei Karen. Especialmente agora, com a revelação de que ela teve um filho meu, eu lutava para entender as suas razões para manter tudo em segredo. Era difícil para mim me colocar no lugar dela, entender por que ela não tentou me encontrar todos esses anos. Mas agora, tudo isso estava atingindo um ponto crítico. A raiva borbulhava dentro de mim, procurando uma saída. Eu queria exigir explicações e exigir que fizesse aquilo que combinamos na noite passada, mas, ao mesmo tempo, sabia que não era assim que as coisas funcionavam. Eu sabia que precisava encontrar uma maneira de lidar com essa situação, de encon
Karen A atitude de Othon me deixou completamente atônita. Ele simplesmente ignorou a minha decisão e assumiu o controle da situação, mesmo após eu ter deixado claro que não estava pronta para revelar a verdade ainda. Eu planejava contar, sim, mas não naquele momento. O nervosismo me dominava, e o olhar do meu filho e da minha mãe sobre mim só aumentava a pressão, deixando-me sem saber como reagir. As emoções tumultuavam dentro de mim, e a minha mãe pareceu perceber isso. — Parece que o assunto é importante. Seria melhor conversarmos na privacidade de casa — sugeriu ela, com uma expressão compreensiva. Eu ainda não estava preparada, mas Othon não me deu escolha. Não podia inventar desculpas ou contar mais mentiras, pois sabia que isso só tornaria tudo ainda pior no futuro. Com um suspiro derrotado, concordei. Não havia mais como fugir. Juntos, todos entramos em casa. — Chamarei Átila — Mamãe avisou — Peço que fique à vontade, Dr. Arraes. — Obrigada — Othon agradeceu, acomodand
OthonA cena na sala da casa de Karen havia me deixado em estado de choque. O clima tenso e carregado de surpresa pairava sobre todos nós. Não conseguia compreender como as coisas haviam escapado tão rapidamente do nosso controle.Revelar a verdade para Otávio tinha sido uma experiência mais desafiadora do que eu poderia imaginar. Ver a recusa dele em conhecer o próprio pai foi um golpe doloroso, uma sensação de fracasso que pesava no meu peito. No entanto, mesmo diante da decepção, não me arrependia de ter tentado. Aquela cena dramática tinha sido apenas o primeiro passo em um caminho incerto. Otávio era apenas uma criança de cinco anos, e eu sabia que nada era definitivo para alguém tão jovem. Tentava me confortar com essa ideia, mesmo diante da incerteza do que o futuro reservava para nós.O primeiro a quebrar o silêncio foi o senhor Buarque, que, com delicadeza, expressou o desejo de entender o que estava acontecendo.— Eu e a sua mãe merecemos uma explicação — completou ele, com
Karen Após a saída de Othon, uma dor profunda se instalou no meu peito. Encarei os meus pais, que pareciam compreender a intensidade do que eu estava sentindo naquele momento. Os seus olhares eram cheios de compaixão, mas também carregados de preocupação. Reconheci os meus erros, uma sequência de escolhas mal calculadas que levaram a esse desfecho doloroso. Nenhum dos meus equívocos foi intencional, e a ideia de magoar aqueles que amo, especialmente Otávio, era como um peso insuportável na minha consciência. Mamãe olhou para mim, os seus olhos expressando uma mistura de compreensão e solidariedade. Ela se ofereceu para verificar como Otávio estava, mas eu, senti-me responsável pela situação, respondi que preferia fazer isso pessoalmente. Eu preciso enfrentar as consequências das minhas ações e tentar amenizar o impacto que tiveram sobre o meu filho. Subi as escadas com o coração apertado, uma sensação estranha martelando no meu peito. Ao chegar ao quarto de Otávio, esse sentimen
Othon Enquanto eu caminhava com Bart, o toque insistente do telefone quebrou a paz. Karen. O seu nome piscava no visor, despertando uma sensação estranha em mim. Um pressentimento ruim se instalou no meu peito. Com um nó na garganta, atendi, sentando-me em um banco próximo. As palavras de Karen cairam como um martelo, deixando-me atordoado. Meu filho estava desaparecido. Segurei firmemente a guia de Bart, pronto para voltar correndo para casa e ajudar nas buscas. Mas algo me fez hesitar. Enquanto encerrava a ligação e segurava a guia do cachorro, um movimento estranho e muito próximo a mim capturou a minha atenção. Uma figura se aproximava, vindo de uma rua lateral. Franzi o cenho, um arrepio percorrendo a minha espinha. — Otávio? — Falei em voz alta, mas ele não me ouviria aquela distância. A pequena figura que se aproximava era Otávio. Os meus olhos mal podiam acreditar no que viam. Otávio estava ali, diante de mim, caminhando sozinho naquela praça. Um turbilhão de emoções tom
KarenEu estava tomada pelo desespero, mas sabia que precisava manter a lucidez, como Camila havia me sugerido. Otávio dependia de mim, e eu não podia me permitir desmoronar. Com passos lentos, retornei para a calçada, esperando ansiosamente pela chegada dos policiais, cuja demora parecia uma eternidade.Enquanto isso, minha mãe, com os olhos marejados de lágrimas, se juntou a mim, após vasculhar a casa em busca de qualquer sinal de Otávio. Meu pai, por sua vez, batia de porta em porta, perguntando aos vizinhos se tinham visto o menino. A angústia pairava no ar, envolvendo a todos em sua teia.— Ele está por aí, em algum lugar — minha mãe tentou me confortar, segurando minha mão com firmeza.— Eu sei, mãe, mas está tão difícil… — respondi, lutando contra as lágrimas que ameaçavam cair a qualquer momento.De repente, a expressão de minha mãe mudou drasticamente. Seus olhos se arregalaram enquanto ela fixava o olhar em algo atrás de mim.— Karen! Olhe ali! — exclamou ela, apontando para
OthonApós deixar Otávio com Karen em segurança, retornei para casa, sentindo-me dividido entre o desejo de esclarecer tudo imediatamente e a necessidade de dar um passo para trás, permitindo que todos nós digeríssemos todas as revelações daquele dia movimentado.Enquanto Bart vagava pela casa, eu estava perdido em pensamentos. Não tentei dormir, pois eu sabia que não iria conseguir. Eu me sentia inquieto ao extremo e incapaz de simplesmente deitar tranquilamente na minha cama. Optei então por tentar me concentrar na leitura de um dos meus livros dispostos na estante da sala de estar. Tentaria me perder no mundo da ficção e esquecer um pouco a reviravolta extraordinária que aconteceu na minha vida naquele fim de semana.Com um suspiro resignado, escolhi um volume e me acomodei no sofá, na esperança de que a distração das palavras impressas pudesse afastar os pensamentos tumultuados que me assombravam.Já absorto na leitura, mergulhei nas páginas do livro e enfim consegui esquecer um p