Olhou para a casa. Na mesa, ainda estavam os pães que Jorge havia comprado, junto com os farelos do lanche que ela preparara para ele levar. Esses últimos quatro dias tinham sido intensos. Não conhecia Jorge bem, mas ele passava segurança. Era carinhoso. Lembrou-se de seu rosto preocupado no caminho, de seu sorriso enquanto escolhiam os móveis, dele limpando a casa com ela, sem saber segurar a vassoura direito, cedendo o colchão e sua blusa, dormindo na poltrona. Já havia tantas lembranças boas com ele, mais do que em anos com Ruan.Jorge havia deixado dinheiro para ela comprar algumas coisas que ainda precisavam. Decidiu ir até o mercado, quem sabe procurar um emprego para começar a se virar. Sabia que Jorge era algo passageiro; logo ele seguiria sua vida, assim como já estava resolvendo seus problemas junto de Tito nessa manhã.Fechou a casa. Em frente, havia um canteiro que saía para a avenida. Observou algumas folhas caírem no chão; a árvore estava ficando sem folhas, mas logo, na
Apesar de não querer pedir ajuda a Jorge, Clara sabia que ele não hesitaria em ajudá-la. Precisava ligar para ele para informar sobre seu irmão. Ana disse que ele estava em cirurgia e também não tinha mais informações.Conforme o telefone chamava, Clara dava passos largos na sala, de um lado para o outro.— Alô? Romeu?— Catarina? O que houve? Tá tudo bem?— Você irá demorar para voltar? — Clara, apreensiva, não sabia como dar a notícia a ele.— Catarina, o que você precisa? Me fale que eu volto à noite e te levo.— Na verdade, é com seu irmão! Falei com Ana, ela me disse que seu irmão está no hospital... — Antes de terminar, Romeu deu um grito do outro lado da linha.— Meu irmão, o que? Está onde?— Ana me falou que ele teve um AVC logo no início dessa manhã e está em cirurgia. Não tenho mais notícias.Jorge estava com a voz preocupada. — Vou ligar para lá e buscar informações. Obrigada por me ligar.Não demorou muito para Jorge retornar a ligação.— Catarina! Vou para a casa do meu
Era fim de tarde, o céu estava laranja enquanto o frio gelado começava a entrar pela janela. Catarina foi até a janela e observou os carros passando na rua, perdida em pensamentos. Sabia que Jorge não tinha nenhum vínculo com ela, mas, de alguma forma, sentia alívio ao saber que ele voltaria. Antes mesmo de fechar a janela, ouviu o som de um carro encostando e, logo em seguida, vozes e risadas ecoando pela entrada, seguidas pelo som das portas batendo. Jorge chegou acompanhado de Tito. Apesar das preocupações, ambos pareciam animados naquele fim de tarde. -Olá, Catarina, como está? Como foi seu dia? Alguma notícia do meu irmão?” perguntou Jorge, enquanto tirava os sapatos e a blusa com naturalidade. Tito, que vinha logo atrás, fez o mesmo, também retirando seus sapatos e a blusa. Catarina ficou surpresa com a atitude deles. Nunca havia conseguido que Ruan, seu marido, respeitasse seu pedido de tirar os sapatos antes de entrar em casa, e ali estavam Jorge e Tito, fazendo isso sem
Era evidente a preocupação no olhar de Clara. Jorge, atento, lançou diversos olhares pelo retrovisor, observando a tensão que marcava seu rosto. Dias antes, eles haviam percorrido aquele mesmo caminho, com Clara tomada pelo choro incontrolável. Agora, porém, estavam a caminho de recuperar aquilo que mais a angustiava pela distância: sua filha, Carol.Enquanto o carro avançava, Clara não conseguia afastar os pensamentos que a atormentavam. Ela sabia que Ruan não era astuto, sua mente limitada e a violência que sempre demonstrou eram as únicas armas que possuía. Clara havia suportado tanto, permitindo os abusos por não ter para onde ir ou o que fazer. Foram inúmeras as vezes em que implorou para que ele mudasse, que parasse de beber, mas parecia que, a cada dia, ele só piorava. -Eu sei que o que fiz foi um ato de desespero, disse Clara, sua voz carregada de tristeza. -Pedi tantas vezes para ele melhorar, mas parecia que nada ia mudar. Foram anos e anos. Ana me ofereceu ajuda, e mesmo
Enquanto o carro deslizava suavemente pela estrada, Clara mal percebeu o tempo passar. O movimento rítmico do veículo a embalava, e seus pensamentos pareciam se dissipar no horizonte. Foi apenas quando Jorge a chamou que ela voltou à realidade.— Vou fazer uma parada aqui — avisou ele, os olhos se encontrando com os dela pelo retrovisor. — Vou ligar para o Fred e ver se há alguma novidade sobre meu irmão. Também quero saber se tem alguém do lado de fora, talvez não seja seguro passar por lá agora.Clara assentiu, ainda um pouco atordoada pela súbita imersão no presente.— Sim, vou ligar para a Carol e ver se está tudo certo. — Ela fez uma pausa, observando a estrada deserta pela janela. — Chegaremos em quanto tempo?— Uns dez minutos. Já estamos perto da cidade — respondeu Jorge, enquanto manobrava o carro para uma parada na beira da estrada. Ele precisava ajustar os últimos detalhes da busca por Carol, e Clara sentiu o peso da situação se intensificar no silêncio que se seguiu.Clara
Vamos dar uma volta pela cidade e ver como está o movimento, disse Jorge, enquanto dirigia calmamente pelas ruas. Ele mantinha os olhos atentos em cada esquina, observando o ambiente com cautela. Ao se aproximarem do centro, notavam-se grupos de jovens conversando em um clima descontraído, a cidade parecia tranquila.-Se você avistar o Ruan em algum lugar, nos avise, disse ele, voltando-se para Clara com uma expressão firme. Vamos passar em frente à sua casa também, só para ver como está.Clara assentiu silenciosamente, o coração acelerado. Era estranho estar tão perto de um lugar que ela preferia esquecer, mas a presença de Jorge e Tito lhe dava uma sensação de segurança.Quando chegaram à rua de sua antiga casa, Jorge diminuiu a velocidade. O ambiente estava quieto. A casa de Ruan estava escura, e o carro dele não estava estacionado na frente, um bom sinal de que ele provavelmente não estava por perto.-Parece vazio, comentou Jorge, os olhos atentos a qualquer movimento.-Vou dar um
Enquanto o carro de Ruan saía lentamente da garagem, ele lançou um olhar desconfiado na direção do veículo de Jorge, que manobrava próximo à sua casa. Jorge, sem hesitar, encarou Ruan de volta, seus olhares se cruzaram através dos vidros escuros. O silêncio tenso se manteve até que Ruan finalmente se afastou.Assim que ele virou a esquina, Clara levantou-se, ainda abalada, mas determinada. -Vou agora. Ele deve ter esperado ela dormir.- Vou abrir o portão pra vocês. Só me dêem um minuto, disse Jorge decidido que trocou um olhar com Tito, como se já soubessem exatamente o que fazer.-É isso aí, irmão. Tá na mão, vamos lá, Tito respondeu com um aceno decidido.Ambos saíram do carro sem perder tempo, movendo-se com uma precisão quase automática. Cada um segurava um pedaço de metal nas mãos. Com algumas sacudidas no portão, ele cedeu rapidamente. Jorge olhou para Clara, agora com um sorriso tranquilo no rosto, e fez um sinal para que ela viesse.Clara, ainda incrédula com a rapidez e a h
Com muita dificuldade, finalmente conseguiram deixar a cidade para trás e entrar na rodovia. O carro acelerava pela estrada escura, e os sons dos tiros gradualmente ficaram para trás, misturando-se ao ruído distante da cidade. A tensão dentro do carro ainda era palpável, mas a sensação de alívio começava a surgir lentamente enquanto a distância entre eles e Ruan aumentava. Tito, com o rosto sério e focado, mantinha o pé firme no acelerador, enquanto Jorge, ainda atento, olhava pelo retrovisor, certificando-se de que não estavam mais sendo seguidos.No banco de trás, Clara segurava Carol com força, tentando acalmar a filha, que ainda soluçava baixinho. Ana, sentada ao lado, olhava para elas com preocupação, tentando oferecer conforto com um leve toque no ombro de Clara.-Conseguimos sair, mas ele vai tentar nos achar, -Tito disse em voz baixa, sem tirar os olhos da estrada.-Precisamos de um lugar seguro vamos.para casa. -Jorge respondeu, ainda cauteloso, guardando a arma com cuidado