Lívia suspirou pesado ao pensar no cãozinho que devia estar na porta esperando por ela, mas diante de mais uma ameaça, não insistiu.
Por volta das dez horas da manhã, a campainha tocou. — Feche! — Apontou para a cortina azul da janela. — Fique quietinha. Desde que o entregador apareceu, ele não permitiu que ela atendesse outras pessoas. Durante toda a manhã, o barulho da campainha se repetiu diversas vezes. Enrico não deixou que ela abrisse para os pacientes e nem mesmo para os funcionários que trabalhavam no hospital.Por volta de meio-dia, o estômago fez barulhos que deixaram-na envergonhada. — Está com fome, doutora?— Claro, não comi nada desde que saí da casa do Mattia.— A senhorita tem um homem?— Não! Mattia é meu melhor amigo.— Sei! Já trepei com algumas amigas, — sorriu ao lembrar do colegial. — Às vezes, eram duas!Fechando os olhos, ela tentou deletar as coisas absurdas de que o mafioso se gabava. Nunca gostou desse tipo de homem.— Tenho uma sala privada onde faço as minhas refeições e descanso — confessou em voz baixa. — Vamos, o seu estômago ronca tanto que eu já estou ficando com fome. — ele resmungou ao levantar. A médica conduziu Enrico para sua sala privada. Pegou dois potes de cup noodles e colocou no micro-ondas, digitou o tempo de cozimento no painel e esperou de braços cruzados enquanto via Enrico trancando a porta e arrancando os fios de telefone.Após comerem, ambos ficaram quietos. Lívia encarava a persiana fechada e os fios arrebentados do telefone, o seu único celular estava guardado na bolsa que esqueceu no carro na noite anterior.Enrico se despiu do avental hospitalar novamente, e se aconchegou na única cama que havia naquela sala ampla enquanto observava o semblante cansado da médica.— Não me importo em dividir com você! A testa de Lívia estava vincada, não lembrava de ser tão desrespeitada por um homem. O mafioso se esticou na cama de barriga para cima e colocou as mãos atrás da cabeça.O cansaço começou a dominá-la, sentia as pálpebras fechando e abrindo lentamente.— Deite aqui! — Prefiro dormir na mesa, — Lívia respondeu, furiosa.Pegando o travesseiro em um dos armários, colocou sobre o tampo branco de madeira depois de afastar o notebook e os objetos que haviam sobre o móvel. Lívia deitou-se em forma de conchinha. Estava tão exausta que dormiu rapidamente.Enrico não conseguia desviar os olhos da mulher que dormia a sua frente, a doutora Ricci era uma garota diferente das mulheres com quem ele esteve. A maioria sabia quem ele era e não negavam o seu convite quando as convidava para a cama, estava admirado pela postura séria e profissional da médica. Enrico estava tão envolvido por seus pensamentos que não percebeu quando pegou sono. A sala estava imersa em escuridão quando os sons de tiros despertaram os dois. Lívia tapou os ouvidos, ela estava apavorada, nunca esteve no meio de um fogo cruzado. — Deite-se no chão! — Enrico berrou. Lívia se jogou no chão atrás de sua mesa e deitou-se com as mãos nos ouvidos. Chorava, nervosa, com o ruído dos vidros se espatifando. Os objetos atingidos foram lançados para longe. Não sabia ao certo quem era aquele homem e quem o havia ferido na noite passada, mas concluiu que o paradeiro de seu paciente foi descoberto.Do outro lado, Enrico se arrastou até um local onde pudesse se proteger das balas. Por mais que tentasse ignorar, estava preocupado com o problema que trouxe para a vida da médica. O som dos tiros continuou por dois longos minutos. Com os olhos fechados, Lívia pensou em seu cachorro, e dos planos que ainda tinha para a vida. O sonho de encontrar um bom homem que desejasse construir com ela uma família fez as lágrimas brotarem no canto dos olhos e se assustou quando a mão fria tocou seu ombro. — Por favor, não me mate! — implorou.— Calma, sou eu! — Enrico suavizou o tom da voz.Abrindo os olhos bem devagar viu o homem que passou o dia inteiro ameaçando-a. Ainda não estava fora de perigo, se aqueles tiros não a mataram, em algum momento, Enrico não hesitaria em matá-la. Lívia enxugou as lágrimas em silêncio temendo por sua vida. — Hei, você está bem?— Por sua culpa, detonaram o hospital! — disse ao abrir as pálpebras. — Investi minhas economias neste lugar e você simplesmente destruiu tudo. — Os olhos estavam cheios de lágrimas.— Eles estão entrando! — Olhou para a porta da sala quando escutou o barulho do arrombamento. — Quem são eles?De repente, a energia elétrica foi desligada.— Fique aqui embaixo da mesa e não faça barulhos.Enrico se esgueirou até a porta, destrancou e girou a maçaneta bem devagar. Seguiu pelo corredor sem fazer barulho e entrou no quarto em que passou a manhã com Lívia. Atento aos passos, esperou até que um homem de estatura mediana chegasse perto da porta. Tapou a boca do gângster rival e quebrou-lhe o pescoço com um único movimento. Assim que tirou o corpo do caminho, pegou o bisturi e os objetos cortantes da bandeja prata. Ouvia os gritos dos rivais chamando pelo comparsa morto.Enrico esperou por dois segundos após se esconder ao lado dos armários de remédios e atacou. Cravou o bisturi na jugular, antes que o homem gritasse. O mafioso sorria enquanto o homem se engasgava com o próprio sangue.Depois de tirá-lo do caminho, Enrico se escondeu atrás da porta. O clarão da lanterna iluminou os dois corpos jogados perto da cama. Antes que o terceiro homem pedisse ajuda, Enrico desferiu um golpe rápido com o bisturi contra o pescoço do rival. Fazia tempo que não ficava animado daquele je
Ambos ficaram em silêncio, esperando por mais ataques. Foram quase quinze minutos esperando, aflitos, mas não havia mais ninguém. Lívia estava apavorada, foi difícil recuperar o fôlego diante de tamanha selvageria, mas precisava se recompor para tratar dos ferimentos de Enrico. Apesar da forma como ele agiu, mantendo-a como refém em sua própria clínica e ameaçando sua vida, ela ainda era uma médica comprometida com seu juramento. A bala havia passado de raspão, mas foi o suficiente para agravar o ferimento já existente no braço do paciente. Lívia se viu, mais uma vez, contendo o sangramento e limpando o corte para fazer uma nova sutura. — Au! — Ele reclamou quando ela fechou o último ponto. — Faz isso direito! . — Eu sei o que estou fazendo. — ela replicou, furiosa O fato de que aquele homem estava sempre dando ordens e proferindo ameaças, sem demonstrar qualquer gratidão e respeito por ela, a deixava furiosa. Nem todos os cuidados dispensados a ele foram capazes de ameni
Lívia estava prestes a acordar o homem deitado à sua frente, mas recuou quando um pensamento cruzou sua mente. “Se quisessem nos matar, já teriam atirado”, ela refletiu, talvez aquela fosse a sua chance de pedir e ajudar a escapar dali. Em passos lentos, Lívia deixou o quarto onde Enrico estava deitado e seguiu pelo corredor até a entrada da clínica, mas antes que pudesse chegar à porta, homens de terno preto entraram no local. Antes mesmo que pudesse imaginar uma maneira de fugir, Lívia já havia sido dominada com truculência por um dos homens que a imobilizou contra ao chão. — Eu não fiz nada! — Ela se defendeu em voz baixa, imaginou que aqueles homens eram detetives e que estavam ali para prender o mafioso. — Sou médica, trabalho aqui na clínica. — O rosto estava pressionado contra o piso de madeira frio. — Fica quieta, maledita! — Tapou a boca da médica.Sem emitir qualquer som, Lívia reparou nas roupas dos quatro homens, eles não eram quem a médica imaginava.— Olha, o chefe
Os pensamentos de Lívia estavam acelerados e, enquanto escutava aqueles homens, o medo dominava à sua mente. Ouvia os gangsters chamarem o chefão de louco enquanto lembravam de tudo o que o tio de Enrico fez contra os seus rivais e, até mesmo, contra os seus próprios comparsas que falavam em suas missões. Depois de esperar por cinco minutos o motorista deu a partida no automóvel. Lívia permanecia em silêncio sentindo os cílios roçarem na venda em seus olhos, estava apreensiva, pois já há algum tempo não ouvia à voz de Enrico. — Depressa! — Um deles falou. — Onde está o senhor, Bianchi? — O motorista indagou. — O chefe está no outro carro!“Desta vez, ele me abandonou”, ela pensou. …Lívia foi retirada do carro bruscamente, não tinha noção de onde estava, apenas seguia os passos do homem que puxou-a com pressa. Ela tropeçou em alguma coisa dura.— Cuidado com os degraus!Colocando um pé atrás do outro, continuou dando passos inseguros ao descer a escada. Quando pararam de anda
Sozinha naquele cubículo frio, Lívia se deitou no banco reto onde se encolheu, por um instante pensou no pobre homem que foi agredido por Enrico sem piedade, o pobre homem nem ao menos pôde ver a filha recém nascida. Ela enfiou as mãos no meio das pernas para tentar se aquecer do frio. As pálpebras já estavam quase se fechando quando ela ouviu o barulho da porta se abrindo.A médica se levantou imediatamente, enquanto os passos pesados ecoavam pelo corredor, Lívia segurou as grades da cela tentando espionar, mesmo sem conseguir ver, imaginou que fosse Enrico, então começou a esbravejar sobre a demora para libera-la e à julgá-lo por sua tamanha ingratidão com as pessoas que lhe ajudaram.— Você nem mesmo o agradeceu! — Ela repreendeu — Eu vi o que fez com o pobre homem! Tratou os seus seguranças com tanta grosseria e violência. — disse, indignada. — Você nem mesmo deixou o homem ver a filha recém-nascida! — berrou. O corpo de Lívia ficou paralisado e a voz falhou quando viu o hom
A cela ficava a poucos passos da entrada do porão e, lá dentro, ela estava encolhida, dormindo feito um anjo. Puxando uma cadeira, ele se sentou enquanto a observava, a doutora devia estar realmente cansada para dormir daquele jeito em um lugar como aquele, sem qualquer conforto.Mesmo dormindo, a sensação de estar sendo observada era crescente, as pálpebras tremeram e, ainda sonolenta, Lívia abriu os olhos, a visão estava um pouco embaçada.— Buongiorno! — disse a voz rouca. — Dormiu bem?Lívia abriu mais os olhos e então reparou que Enrico não usava mais a faixa, os olhos se concentraram no inchaço na testa do mafioso. Percebendo o olhar clínico da médica, ele passou a ponta dos dedos sobre o hematoma.— O médico da família disse que vou sobreviver.Ela desviou o olhar, ajeitou o corpo e ao se levantar e se aproximou da grade.— Me solte agora mesmo! — Exigiu. — Eu salvei você e cuidei dos seus ferimentos. Se há um pingo de gratidão em algum lugar nesse coração de pedra, você dever
Após terminar de falar com os pacientes, Lívia olhou para os dois homens parados do lado de fora, em seguida, ela perscrutou Enrico.— Posso usar o lavabo?— Depende! — Andou ao seu encontro e se sentou. — Pretende aceitar a proposta ou quer continuar presa nesse lugar? — Olhou em torno do cubículo.— Eu disse que preciso de um tempo para pensar, mas quero tomar um banho e tirar essa roupa suja. — Ela tocou a blusa branca que, naquela altura, já estava encardida. — Você já sabe o que precisa fazer.— Que diabos você quer? Pretende se casar com uma mulher suja ou me deixar trancada aqui, fazendo as minhas necessidades naquele balde? — A médica desafiou o mafioso. Enrico torceu os lábios, o cheiro de Lívia não era dos melhores, mas não queria dizer isso para a médica.— É assim que os gângsteres tratam as mulheres? — Ela olhou para os seguranças que trocaram olhares com o chefe, mas ficaram em silêncio. — Eu pensei que os mafiosos fossem mais religiosos e cuidassem bem de suas famíli
Sem emitir qualquer som, Enrico estendeu a mão para que ela devolvesse o celular, o olhar furioso poderia fulminá-la. — Venha logo, tenho alguns assuntos para resolver enquanto você pensa na minha proposta. — Enrico deu dois passos e abriu a porta enquanto puxava a médica.— Eu aceito!— Que rápida. — Ele se encostou no batente da porta. — Eu presumo que essa decisão seja por causa da mensagem que você recebeu.— Isso não vem ao caso. — desviou do assunto. — Firmarei o acordo com você, mas tenho algumas imposições.Enrico estava com a testa vincada quando endireitou a postura. Ele bateu a porta com tanta força que Lívia recuou. — Temos que acertar os termos. Ele foi até o armário onde pegou a pistola glock e colocou na cintura antes de fechar o botão do blazer preto.— Pode começar. — Os olhos tão azuis quanto o céu se concentraram em Lívia.— Vou conviver com você, mas não quero que me toque.— Isso não será problema! Quando eu quiser trepar, vou procurar fora de casa. — Ele li