Sob o Visco

Avenida Paulista estava linda, enfeitada de ponta a ponta, luzes natalinas, bonecos gigantes, até mesmo uma máquina que jogava flocos de gelo nas pessoas que ali passavam, simulando neve. Não havia como negar, o natal era a época mais linda do ano e os olhos de Helena brilhavam todas as vezes em que por ali passava. Seus dias eram corridos, não deixando espaço para relacionamentos duradouros, bem sucedida e sócia em uma empresa de comunicação, sua vida se resumia a ordens, reuniões, telefonemas e viagens de última hora. Mas eram as luzes da Paulista, o encanto das crianças por cada decoração, que acalantava o seu coração e dava a Helena, paz para respirar em meio a suas loucuras.

E foi em uma dessas noites magicas que ela decidiu simplesmente parar seu tempo. Saiu da empresa e não correu para o aeroporto, não olhou aflita para o relógio, nem brigou com seu motorista, que teimava em parar em todos os faróis amarelos, somente jogou a bolsa no ombro e decidiu que aquela noite de sexta-feira seria somente para ela. Dispensou a secretária e passeou entre as famílias que se amontoavam para fotos, sorriu com as risadas das crianças que corriam tentando pegar os flocos de gelo, caminhou sem pressa pela longa e larga avenida movimentada.

Helena parou em frente ao prédio mais lindo de todos, a decoração reproduzia com riqueza de detalhes, não somente a casa do Papai Noel, como também a fábrica de onde saiam seus brinquedos, com direito a duendes, as nove renas, pratos com biscoitos e até mesmo a Mamãe Noel que ficava sentada dentro da casa com novelos de lãs a seus pés e um imenso casaco de tricô em seu colo, a realidade do lugar levava a imaginação de qualquer pessoa a outro mundo.

— Não sei o que devo admirar agora. – Ela ouviu a voz grossa ao lado – Seu sorriso ou a decoração.

Virou-se assustada, deparando-se com um jovem. Automaticamente o sorriso se desfez em seus lábios e a expressão assumiu a seriedade que o momento pedia, não estava acostumada ser sociável com estranhos e muito mesmo responder a cantadas.

— Por favor, não desfaça seu sorriso por minha causa. Não consegui conter o comentário.

Helena realmente se virou para o rapaz, notando-o de verdade. Um homem normal, sem nenhum atributo físico que o fizesse se destacar dos demais, cabelos castanhos, olhos castanhos, pele clara, um pouco mais alto que ela. Balançou a cabeça e afastou - se do admirador, decidindo entrar e caminhar em meio a decoração. O primeiro lugar que visitou foi a casa onde a simpática senhora estava sentada com seu tricô, sorriu para a perfeição dos detalhes, imersa ao encanto que a época natalina trazia, conseguia sentir-se feliz novamente. Lembrou-se do tempo em que a casa do vó enchia-se de pessoas, a arvore gigante no canto da sala repleta de presentes em embrulhos coloridos, música alta, risadas e o aroma das comidas inundando todos os ambientes, eram momentos deliciosos, um tempo em que a família era feliz, unidos e sua vó ainda estava entre eles, hoje, nada mais daquilo era verdade. Helena sentiu a umidade da lagrima que escorria em sua face, não conseguiu conter a melancolia trazida pelas lembranças.

— Essa época realmente mexe com a gente. – Ouviu a mesma voz de minutos atrás.

Ela virou-se já levando as mãos a cintura, preparada para um discurso sobre perseguição e a ameaça de ligar para polícia caso ele não parasse de ser inconveniente, mas calou-se quando notou que ele não olhava para ela, mas para o boneco da senhora tricotando, seus olhos marejados e sua face banhada de emoção. Ela nada disse.

— Como não se emocionar não é mesmo? – Ele questionou dando de ombros – Alguns momentos em nossas vidas, deveriam ser eternos.

O rapaz virou-se para ir embora e algo dentro de Helena ligou como em um “click”. Esticou o braço e tocou levemente no cotovelo dele, fazendo-o parar.

— O natal tem esse poder. – Ela disse baixo – Desperta nossas melhores emoções.

Ele virou-se para ela e sorriu.

Sorriso bonito, daqueles que fazem os olhos da pessoa se fechar levemente e as bochechas subirem, aquele que desperta a vontade de sorrir de volta.

— Prazer, Daniel. – Estendeu a mão apresentando-se.

— Prazer, Helena. – Sentiu sua mão ser envolvida.

— Como a lindíssima Helena de Troia? – Ele sorriu.

— Hum... – Ela pareceu pensar um pouco na brincadeira – Não chego próximo dessa beleza toda. Mediana, sou bem mediana.

Daniel a olhava sem nada dizer, como se analisasse cada detalhe em Helena. Ela não se achava uma mulher feia, mas sabia que não se destacava entre as demais. Os cabelos claros e lisos, quase sempre o sonho de consumo de muitas, não agradavam, desde pequena Helena buscava artifícios para mudar a estrutura dos fios, sem sucesso. Os olhos castanhos, estatura mediana, nem gorda, nem magra, passaria despercebido em meio a multidão. Mas ele sorriu a encarando.

— Está longe de ser uma mulher mediana. – Havia tanta sinceridade no tom de sua voz que fez Helena se perder dentro de seus pensamentos por alguns segundos.

— Preciso ir.

Virou-se de súbito já andando em direção a saída, sem dar ao estranho o direito de uma despedida. Escutou ele a chamando, pedindo por mais um minuto de sua atenção, mas Helena queria somente sair dali, a aglomeração passou a ser algo angustiante, pela primeira vez em sua vida, a ideia do natal a desagradou.

Apressada, esbarrava nas pessoas, pedindo licença, afastando-os com as mãos, querendo sentir o espaço livre das largas calçadas da avenida, mas foi detida. Sentiu alguém a segurando pelo pulso, deparando-se com Daniel que a olhava confuso, como se tivesse o direito de lhe pedir alguma explicação para sua reação.

— Me solta. – Disse secamente.

— O que aconteceu?

— Disse para me soltar. – Avisou novamente.

— Vou soltar, só por favor, não saia correndo. – Um quase sorriso brincou nos lábios dele.

— O que é que você quer? – Helena disse em um tom mais alto, chamando a atenção de algumas pessoas mais próximas.

— Um café? – Deu de ombros e a esperança do “sim” estampada em sua face.

Ficou somente olhando-o, agora a posição invertida. Helena analisava o homem a sua frente, tentando entender toda aquela situação, sempre acreditou em destino e como uma boa pisciana, sonhava com o dia em que seu príncipe a encontraria e ela viveria a história de amor dos contos de fadas.

— Só um café. – Daniel juntou as mãos como em prece e fez o pedido novamente.

— Tudo bem. – Ela cedeu.

Caminharam lado a lado. Daniel buscando assunto a cada oportunidade, Helena usando respostas superficiais. Escolheram uma pequena lanchonete em uma esquina movimentada, sentara-se na parte interna, onde o barulho era abafado pelas paredes e a porta de vidro.

— O que uma mulher como você faz aqui? – Perguntou assim que a garçonete se afastou.

— Me deixou curiosa. – Helena brincava com a pequena colher na borda da xicara – Defina o que quis dizer com “uma mulher como eu”?

Ele a encarava seriamente, enquanto ela mordia o canto da boca, tentando conter o sorriso.

— Não acredito que saiu do trabalho e decidiu perder seu ônibus para visitar a decoração. Não aparenta ser assim.

— Ah não? – Ela sorriu – E como aparento ser?

— Uma mulher forte, decidida, dona de si. – Daniel apoiou os cotovelos sobre a mesa, inclinando o corpo para frente, aproximando-se dela.

— E notou tudo isso somente olhando para o meu rosto?

Os olhos do homem passeou pelo corpo de Helena, observando os detalhes antes não visto. Esquecendo completamente onde estavam, inclinou o corpo para frente, aproximando-se ainda mais dele.

— Olhando para todo o resto. – Disse baixo.

Um sorriso malicioso brincou nos lábios dela. Sempre gostou do jogo da sedução, sua vida atribulada não lhe permitia relacionamentos, mas momentos de uma noite sempre caiam bem.

— E o que todo o resto lhe diz? – Ela provocou.

— Vem aqui. – Disse a chamando com o indicador – Chega mais perto que te conto.

Helena ajeitou-se na cadeira, sentando-se na beirada, virou o rosto de lado, oferecendo a ele o ouvido, como se quisesse ouvir um segredo, ajeitou o cabelo atrás da orelha e sorriu esperando. Daniel fez o mesmo, aproximando seu corpo ainda mais da pequena mesa que os separavam, seus dedos deslizaram sobre a face de Helena, que sentiu o corpo arrepiar com o toque.

— Que você é uma mulher linda e fica fascinante sob as luzes de natal.

Ela revirou os olhos, como se a cantada não estivesse lhe causando efeito algum, afastou-se do rapaz a sua frente, apoiando o corpo no encosto da cadeira.

— Me diga, Daniel, consegue se sair bem com as mulheres usando cantadas assim? – Levou a xicara de café a boca, saboreando um gole lento e demorado, enquanto o olhava atentamente.

— Geralmente minhas cantadas trazem resultados satisfatório. – Sorriram um para o outro – Mas no seu caso, escolhi dizer somente a verdade.

Existia uma química quase palpável entre os dois, Helena sentia o arrepio que percorria sua pele a cada palavra dita por ele, a forma como a olhava e parecia devora-la, apreciando cada pedaço de seu corpo sem nem ao menos toca-la. Ela mordia o canto da boca, tentando conter as palavras que começavam a ganhar vida em seus lábios, gostava do jogo da sedução, o conquistar era envolvente para ela e desconfiava que para ele também, que estava sentado ainda apoiando os cotovelos sobre a mesa a olhando com tanta intensidade que sem nem ao menos se dar conta, Helena cruzou as pernas, contraindo a musculatura do quadril.

— Você trabalha aqui na Paulista? – Disse a primeira coisa que lhe veio à mente. Ele sorriu notando.

— Sim, mas nesse momento. – Ela o olhou confusa e ele tratou de se explicar – Dezembro é meu mês de sossego, momento somente meu, onde desligo de tudo.

— Ah, está de férias. – Constatou o que parecia ser o obvio. Ele sorriu largamente.

— Hum... – Ele pensou alguns segundos – É, quase isso.

— Evasivo.

— É que nesse momento outras coisas prendem a minha atenção. – Ele ainda a encarava.

— Como o que? – Helena entrou mais uma vez na brincadeira.

Daniel levantou o indicador e a chamou para perto novamente, olhando-a atentamente. Ela colocou a xicara sobre a mesa e com cuidado, ajeitou-se na cadeira, colocando-se ainda mais perto da mesa, enquanto inclinava o corpo na direção dele, deixando-os próximos o suficiente para sentirem a respiração um do outro.

— Oi. – Disse baixinho assim que o olhou.

— Oi. – Sorriu para ela. – Seu sorriso é encantador. – Falou no mesmo tom.

— Vai me contar o que está prendendo a sua atenção?

Sentiu o toque suave dos dedos de Daniel em sua face, descendo por sua bochecha, deslizando levemente por seus lábios. Segurou seu queixo e a puxou ainda mais para perto, aproximando de sua boca, fazendo-a sentir o encostar quente e macio dos lábios dele sobre os dela. Daniel não a beijou, somente brincou lentamente, roçando lábios com lábios, enquanto Helena fechava os olhos e absorvia aquele momento.

— Tão macia... – Ele sussurrou em seus lábios.

Helena prendeu o lábio inferior dele entre seus dentes, mordendo-o levemente, arrancando dele um pequeno gemido. Sentiu o deslizar dos dedos sobre seu rosto, indo para sua nuca e aprofundando-se em seus cabelos, segurando-a com força, a língua de Daniel invadiu sua boca, buscando a dela em um beijo intenso e molhado. Entregaram-se ao momento e quando enfim ele a soltou, estavam buscando o ar com dificuldade.

— Vamos sair daqui! – Disse já se levantando, jogando sobre a mesa um valor muito acima do que o que foi consumido por ele.

Helena não se permitiu pensar em nada, pegou a bolsa e levantou atrás dele. Assim que saíram do acolhedor café, Daniel a tomou nos braços e a puxou para ele, beijando-a ainda mais intensamente, colando seus corpos tão intimamente que ficou impossível ela não notar o desejo que ele sentia. Estavam perdidos um no outro e na vontade daquele momento, não se preocupavam com o mar de pessoas que passeavam, uns sorriam para a cena e outros viravam a cara. Ela afastou-se buscando o ar, estava tonta com a intensidade do beijo, louca de vontade de ter muito mais, ficaram somente se olhando, como se conseguissem se devorar com o olhar. Helena mordia a boca, tentando conter o desejo e quem sabe assim, receber um pouco de razão.

— Vem comigo.

Ela o puxou pela mão e quase corriam entre as pessoas, afastando-as com os braços, abrindo passagem em meio à multidão. Daniel ria da loucura que estava vivendo e Helena não conseguia conter a própria risada, seria uma noite que ela levaria para sempre na memória. Pararam de frente a um grande prédio, com toda a estrutura espelhada, alguns andares ainda com as luzes acesas, mas em sua grande maioria já desocupado, mas o foco dela não era os andares vazio da empresa que trabalhava, passaram pelos portões, entrando na área de exposição onde a magia do natal estava prestes a acontecer, toda a decoração seria entregue em dois dias, por isso o espaço ainda estava isolado para visitas. Helena abriu a pequena casa onde os duendes deveriam estar fabricando os presentes natalinos e puxou Daniel para dentro, ele a olhava incrédulo, mas o sorriso ainda estampado em seus lábios.

— Você é louca! – Riu ainda mais, tomando-a pela cintura, não dando chances de nada mais ser dito.

Ela sabia o limite de suas loucuras, mas reconheceu que até mesmo para ela aquela noite estava sendo demais, depois pensaria nas consequências.

Jogou a bolsa no chão e sem o menor pudor enroscou-se a ele que a beijava e permitia que suas mãos desvendasse cada pedacinho do corpo de Helena. Roupas foram lançadas sem o menor cuidado, ouvia-se somente a respiração forte e acelerada misturada ao barulho causado pelo impacto com a decoração.

— Você é deliciosa. – Exclamou.

— Ainda não provou tudo.

Daniel a olhou aceitando o desafio da provocação, levou as mãos a barra da saia social que Helena usava, levantando totalmente o tecido escuro, sem perder o contato visual, ajoelhou-se de frente para ela, segurando a renda da calcinha que usava, fazendo o tecido escorregar por seu corpo, deixando-a nua da cintura para baixo. Ela o olhava desejando o que estava por vir, Daniel aproximou-se ainda mais, seu nariz tocando levemente a intimidade de Helena, roçando, fazendo-a respirar com dificuldade, muito lentamente sua língua deslizou, saboreando de baixo para cima, arrancando dela um gemido. Ele se levantou deixando-a frustrada por querer muito mais.

— Você é deliciosa. – Repetiu lambendo os lábios.

Ela o segurou pelo cós da calça puxando-o.

— Vem aqui.

Apoiou-se nos ombros dele, entrelaçando as pernas ao redor de sua cintura, Daniel a beijava e suas mãos seguravam seu quadril, caminhou com ela em seu colo até onde encontrou apoio, encostando-a. Sem jeito e sem querer parar de beija-la, abriu a calça, Helena não conseguia ver o que acontecia, mas sentiu a ereção dura e quente a invadindo, abrindo caminho por sua intimidade úmida, recebendo o que tanto desejava. Levantou os braços buscando apoio na parede atrás de seu corpo, arqueando de prazer a cada investida, gemendo com o toque dos lábios dele em seu seio nu. Ela queria mais, rebolava com vontade, mexendo o corpo, sentindo ele estocando cada vez mais fundo. Os gemidos se misturando, a respiração acelerada indicando que ambos chegariam ao ápice do prazer juntos. Daniel segurou a carne macia do quadril dela com força, deixando as marcas de seus dedos ali, Helena cravou as unhas em seus ombros o puxando mais para ela. Gemeram juntos quando as estocadas se intensificaram e os corpos sentiam espasmos de prazer. Ela tomou a cabeça sobre o ombro dele, que a envolveu firme em seus braços. Aquela seria com toda a certeza a loucura mais deliciosa da vida de Helena e não se arrependia por isso.

— Quero você. – Ele disse ainda com dificuldade para controlar a respiração.

— Você já me teve. – Ela riu com a mesma dificuldade.

— Quero um pouco mais do que isso. – Ele riu, colocando-a no chão, sem solta-la de seus braços. – E em uma cama, sem duendes por perto.

Os dois riram da situação, olhando ao redor e se dando conta de que a plateia dos personagens natalinos serviram de voyeur para aquele momento.

— Tenho certeza que podemos pensar nisso, Daniel. – O encarou, encontrando carinho naquele olhar.

— Uma chance para nós? – Mordeu o lábio esperando por uma resposta.

Helena somente o olhava, tentando entender onde toda aquela loucura a levaria, sabia que a vida não deveria ser levada de forma leviana, mas encontrou tanta verdade no olhar daquele total desconhecido a sua frente, não conseguiu conter o sorriso em seus lábios e a vontade de um possível talvez acendeu em seu coração. Respirou lentamente, deixando o sorriso se alargar em seus lábios.

— Uma chance para nós.

Daniel levantou a cabeça, olhando acima deles, apontou para que seguisse seu olhar.

— Um visco. – Disse baixinho a encarando.

— E agora? – Ela brincou.

Ele não respondeu, somente a puxou ainda mais para os seus braços, a envolvendo. Os lábios se encontraram em um beijo carregado de desejo, ambos sabiam que nunca mais viveriam outra noite igual àquela, mas estavam dispostos a repetir aquele momento, muitas e muitas vezes mais.

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