Poderia morrer ali, naquele exato momento e assim, teria o meu melhor fim. Sentia meus pés se afundando na areia fofa e quente, as ondas quebravam ao longe e via a força que o mar fazia para me atingir sem sucesso algum, nem mesmo a umidade tocava meus pés. Sei que para muitos, parece somente drama, mas aqui dentro, dentro da minha cabeça, sei bem o caos que é. Tenho tantos pensamentos, tantas vontades e desejos, nenhum deles se realiza e a frustração toma conta de mim, a ansiedade então, essa nem estou ligando mais, já virou minha mais intima parceira. Morar no litoral tem suas vantagens, sair do colégio e correr para me esconder na praia é uma delas, não sei quanto as outras meninas da minha idade, mas as vezes tudo o que eu queria mesmo era que uma grande onda armasse sobre mim e somente me engolisse, sem nem ao menos deixar rastro, ser engolida pelo mar e levada a um mundo completamente diferente, sob a agua, cercado de seres míticos e aventuras sobrenaturais, mas minha razão sabe que isso acontece somente nos livros. Levantei batendo a mão na calça do uniforme, minha mãe me mataria se chegasse em casa toda suja novamente, peguei a mochila que vivia quase sempre vazia, joguei no ombro e fui em direção da minha doce e entediante vida. Me chamo Isabela Gouveia, tenho dezessete anos, estou cursando o terceiro ano do ensino médio e o mundo ao meu redor, espera que nesse ano eu decida o que irei fazer pelo resto da minha vida, então tenho o último ano do colégio para sobreviver, vestibular, escolha do curso e faculdade e ainda tentar me encontrar, pois acredite, ainda não tenho ideia do que estou fazendo no mundo. Assim que sai do elevador, senti o cheiro conhecido do feijão da minha mãe, era uma cozinheira de mão cheia e tudo o que fazia era perfeito. Meu estomago deu sinal de vida, pensar em um delicioso almoço me dava até mais ânimo. Abri a porta e já me deparei com a mesa posta, nosso apartamento era pequeno, dois quartos, sala e cozinha, mas tudo tão apertadinho que brincava que se um dia caísse na sala, cada parte do meu corpo esbarraria em um comodo. Minha mãe é uma batalhadora, sempre foi minha base para tudo e mesmo quando o cara que ajudou a minha vinda ao mundo acontecer foi embora, ela segurou a onda e se refez como poucas mulheres conseguem, voltou a estudar, se formou em psicologia, no começo atendia as poucas pessoas que se aventuravam a acreditar no profissionalismo dela, dentro de casa mesmo. Ligava a televisão do meu quarto, trancava a porta e eu, como a boa menina que era, dormia assistindo desenho, aos poucos e no famoso boca a boca, as pessoas foram chegando, dando a ela a chance de abrir seu próprio consultório e assim aquela mulher, abandonada pelo marido, mãe solteira, tornou-se meu exemplo de superação. Ela me enchia de orgulho.
— Mãe! – Gritei assim que passei a porta.
— Bela para de gritar, por favor. – Disse baixo, saindo da cozinha com uma travessa de arroz nas mãos.
Outra coisa que ela fazia com maestria, era mãe. E uma das melhores. Mesmo trabalhando fora, não marcava consultas no horário do almoço e fazia questão de fazer a comida, arrumar a mesa e almoçar em casa comigo, então, sempre tínhamos uma mesa linda, com uma refeição deliciosa.
— Vá se lavar e vem comer enquanto está quente. – Repetiu a mesma frase de todos os dias. Sorri e obedeci. Entrei no quarto jogando sobre a cama a mochila e após uma passada pelo banheiro, estava sentada ao lado dela a olhando enquanto me servia como fazia todos os dias.
— O que foi? – Ela sorriu me olhando.
— Amo muito você, Dona Renata. – Falei com sinceridade. O sorriso se espalhou nos lábios dela, enquanto se inclinava para beijar o alto da minha cabeça.
— Você é a minha luz, Bela. A minha luz. E nada mais foi dito. Minha mãe sempre deixou claro que em meio aos seus momentos mais escuros, eu era a luz que a guiava de volta, nessas horas, minha única vontade era de dar um chute bem dado no meio das pernas do meu querido e precioso pai.
— Como foi a aula hoje? – Ouvi sua voz me tirando dos devaneios.
— Normal. – Dei de ombros sem ter muito o que acrescentar.
— Nossa que desanimo, todos os dias são assim, “normal”. – Fez uma imitação horrível da minha voz.
— Mas o que você queria que acontecesse? – Ri, não entendia a necessidade dela em um último ano extremo.
— Sei lá, está no último ano, cadê as novidades, namoro, bailinhos, saídas....
— Mãe, em que século está? – Ri alto a encarando – Bailinho? Ela riu alto, do jeito que somente minha mãe conseguia fazer, gargalhou gostoso de fazer o som ecoar em nosso minúsculo apartamento.
— Ah filha... na minha época era assim.
— E isso já fazem...um milhão de anos... – Fiz uma voz sombria e ri com ela, enquanto tirávamos a mesa.
— A louça é sua. – Era sempre a mesma coisa.
— Mãe, a louça sempre é minha. – Revirei os olhos e ela apertou minha bochecha brincando.
— Muito bem! Vou tomar um banho e ir trabalhar. Nos vemos a noite. Louça lavada Mãe trabalhando Lição feita Banho tomado Tédio total Me enrolei na manta que ficava sobre o sofá, me perdendo nos pensamentos, ainda que a televisão estivesse ligada bem na minha frente, não era o foco da minha atenção, na verdade, nada mais prendia a minha atenção, há meses estava ligada no automático, nem mesmo a dona Renata notava, nem o lado mãe, nem o profissional e isso era desesperador. Queria poder conversar, dizer para ela o que sentia, as dores e angustias do meu coração, mas como iria falar isso? Como contar a uma mulher que se refez e sobreviveu, que uma pessoa que teoricamente tem tudo, estava sentindo-se triste ao ponto de não querer mais viver. Como? Era uma missão impossível.
— Bela. – Ouvi a voz suave da minha mãe e o toque de sua mão em meus ombros. – Dormiu no sofá de novo minha filha, vai ficar com o corpo dolorido. Mal sabia ela que meu corpo já estava no limite da dor.
— Vou para a cama. Levantei e sai, ouvindo ela resmungar sobre o fato de não querer jantar mais e essa minha vida de sono e mais sono. Não parei para argumentar, não queria, me joguei na cama, me enroscando nas cobertas, meu último pensamento era sempre o mesmo: Quando enfim isso tudo vai acabar?
— Isa... Uma voz suave e feminina, como uma melodia perfeita ecoou em meu ouvido.
— Isa... Senti o colchão afundar, como se alguém deitasse ao meu lado.
— Isa...
Um toque em meus cabelos, rosto e o deslizar por meu braço. Abri os olhos devagar, sonolenta e perdida entre o sonho e a realidade, meu quarto tomado do mais profundo breu, ainda sentia em meu corpo o toque frio que deslizou sobre minha pele, não queria me virar, por mais que minha razão gritasse para eu deixar de ser boba, meu emocional já não estava mais ao meu lado e fugiu correndo como o bom medroso que ele é.
— Ah minha menina... Um sussurro em meu ouvido e o ar que saiu daqueles lábios desconhecidos, gelaram as minhas veias.
— Tem chamado tanto por mim e quando venho, me rejeita. Não sabia se estava sendo sarcástica ou sentia-se triste realmente. Respirei fundo, reunindo toda a coragem que existia em mim e me sentei na cama olhando para o outro lado rapidamente. Nada. No quarto estava somente eu e meu sonho confuso. Levantei e acendi a luz, como fazia quando era criança, sai abrindo as portas do guarda roupa e olhando embaixo da cama, não havia ninguém. Sem fazer barulho, fui até o quarto da minha mãe e abri a porta, dormia no mais profundo sono. Estava mesmo ficando louca, não estava faltando mais nada. Voltei para o quarto, apaguei a luz pronta para me deitar novamente, determinada a deixar de ser louca e dormir, afinal, acordava cedo demais para ir à escola.
— Me manda embora e depois me chama de volta. Decida-se.
E lá estava ela, acendi a luz rapidamente e a vi, deitada na minha cama. Claro que tentei gritar e sair correndo do quarto, mas minha voz travou na garganta e minhas pernas se recusavam a me obedecer, não consegui dizer nada e ficamos por alguns minutos nos encarando. Sobre a minha cama, estava uma mulher semi nua, com algumas faixas de tecido preto cobrindo as partes essências da decência, os cabelos longos, também preto com cachos que fariam inveja a qualquer babyliss, os olhos escuros e tão profundos que me constrangiam, as curvas perfeitas de um corpo que me encheu de inveja, imediatamente. Ela sorriu, e os lábios pintados de um vermelho vivo e convidativo, deixou a cena ainda mais surreal.
— Oi. – Levantou a mão e acenou como se fosse uma amiga de escola e não uma louca estranha deitada na minha cama. – Estranha, pode até ser, agora me chamar de louca, acho um pouco demais.
Disse refletindo meus pensamentos, deixando-me ainda mais confusa.
— Como você.... Quem é você.... O que está acontecendo? – Não consegui formar uma única frase coerente e tenho certeza que ninguém iria me acusar por isso.
— Volte para a cama bebê. - A voz rouca em um tom sedutor, ecoou diretamente em meus ouvidos.
— Voltar? – Falei mais alto do que gostaria e me arrependi imediatamente, com toda a certeza, Dona Renata mandaria me internar se ela acordasse e me encontrasse acordada com essa história delirante.
— Eu também acho, se bem que ela está tão cansada coitada que não irá acordar com um gritinho à toa. E lá estava novamente, lendo meus pensamentos e decifrando o que meus lábios não diziam.
— Pare com isso! - Falei entre os dentes em um misto de medo e fúria.
— Com isso o que? – A estranha aparição sentou-se na minha cama e me encarava confusa.
— Essa coisa de ficar lendo a minha cabeça. – Aquilo era loucura demais, não existia uma explicação lógica para o que estava acontecendo dentro do meu quarto. Meus pés não faziam mais parte do meu corpo, pois ganharam vida própria e passaram a me levar de um lado a outro.
— Vai fazer um buraco no chão... – Ela disse manhosa me olhando. – Anda, vem deitar bebê.
— Pare de me chamar assim. Desaparece daqui! – Gritei mais alto que consegui e da mesma forma que ela surgiu, sumiu diante dos meus olhos e para o meu desespero, uma mãe muito preocupado surgiu na porta do meu quarto, levando trinta minutos do meu sono. Passei a próxima meia hora explicando o sonho ruim, acalmando a minha mãe, prometendo que oraria, mas foi quando ela saiu do meu quarto e me deixou sozinho com a escuridão que os questionamentos tiraram realmente o meu sono. Cheguei na escola e me senti um “zumbi”, só que no meu caso, queria mesmo era estar morta, mas arrastava o meu corpo com o mesmo entusiasmo e pelo jeito que o povo me olhava, meu rosto não deveria estar muito diferente dos “zumbis” do seriado.
— Bela, alguém precisa te apresentar uma base urgente, você horrível. – Minha amiga entrelaçou o braço dela no meu, me pegando de surpresa.
— Obrigada, Paloma. Sua sinceridade é sempre bem-vinda.
— Sabe que sempre poderá contar comigo. Paloma era uma das poucas, se não a única pessoa que não me irrita profundamente nesse colégio, aliás, nessa vida. Era de uma sinceridade tão absurda, que as vezes afastava quase todos de perto e por isso eu amava, estar ao lado dela, significava não estar ao lado de muitos outros seres humanos e isso era perfeito. Sem contar que existia algo incrível com ela, respeitava meus limites e entendia o meu espaço, sabia exatamente quando não estava afim de companhia e ficava na dela e me deixava sozinha e quieta no meu canto e isso acontecia com mais frequência ultimamente.
— Porque está com essa cara de acabada?
— Não dormi direito essa noite.
— Melhoras. Te vejo depois. Simples assim. Nos separamos e cada uma foi para sua aula. Sei que deve estar pensando que ela é uma amiga ruim e que não se importa, mas comigo, funciona. A manhã passou arrastada e a imagem da noite passada assombrava a minha mente, um misto de saudade e curiosidade começava a me dominar, afinal, algo sobrenatural em minha vida pacata e tediosa, não seria ruim, quem sabe não seria algo bom. Já vi vários vídeos de acontecimentos loucos, relatos de pessoas que conviviam com espíritos, falavam com eles, deveria ser algo bem parecido com o que aconteceu comigo na noite passada. Ouvi o estridente sinal e sai correndo da sala de aula, hoje não passei pela praia, corri para casa o mais rápido que consegui, surpreendendo a minha mãe com o horário. Após a nossa pequena rotina diária e meu desespero em joga-la para fora de casa, me vi sozinha em nosso pequeno apartamento, respirei fundo, enchi meu corpo esquelético de coragem e deixei as palavras saírem.
— Ei... você de ontem à noite... ser de luz... – Andava pelo apartamento me sentindo uma idiota, falando com os cômodos vazios. – Apareça... eu te invoco...
E não aconteceu absolutamente nada. Nem mesmo a cortina balançou com um ventinho. A frustração se apoderou do meu corpo, estava me sentindo uma completa tonta, somente dentro da minha cabeça defeituosa que espíritos iriam se manifestar assim, em plena quarta-feira à tarde, em um apartamento apertado na Praia Grande. Deixei meu corpo cair sobre a cama, levando as mãos ao rosto, tentando cobrir a minha vergonha.
— Eu te invoco? É sério? Ouvi o som da voz sensual e o riso gostoso bem no meu ouvido, o susto foi tanto, que levantei bruscamente e cai desajeitada no chão.
— Ah céus, você veio. – Encarava a mulher linda e semi nua na minha cama.
— Vim e isso não tem nada a ver com o céu. – Ela riu alto. — Como assim? Você é um fantasma né? – Só poderia ser, não teria outra explicação para o que estava acontecendo dentro do meu quarto.
— Fantasma? Estou mesmo precisando passar mais tempo com vocês. – Ela disse cheia de ironia.
— Como assim? Quem é você? – Conversa mais estranha que já tive em toda a minha vida.
— Sou muitas coisas bebê, mas pode me chamar de Hades. – Ela sentou-se na cama me encarando.
— Hades, aquele Hades, irmão de Zeus, daquele negócio do Percy? – Agora foi a minha vez de rir e rir muito.
— Limitações, você são limitados demais. Tenho te observado, vim te atender.
— Atender?
— Você desejou tanto a morte minha querida, pediu tanto por ela... Vim te entregar o que tanto anseia, mas antes... - Colocou o dedo nos lábios e brincou entre eles e foi tão sensual que poderia passar o resto do meu dia vendo aquela cena - Quero algo em troca. Morrer. Dar fim as minhas dores e angustias. Ter somente um fim para os meus dias tempestuosos.
Sim, eu queria aquilo.
— O que você quiser. - Entregaria tudo o que ela pedisse, se aquele ser fosse a minha tábua de salvação, então a ela me entregaria. Vi no exato momento que a face dela se transformou, perdeu o brilho divertido e travesso, ganhando um ar perveço e carregado de prazer. Ela me daria o que queria, mas algo me dizia que levaria muito mais em troca. Ela me encarou tão profundamente que senti que seu olhar atravessou tudo o que existia em mim, levantou da cama devagar, sem perder o contato visual, seu corpo coberto por faixas vermelhas e nada mais, assim que parou a minha frente, ofereceu a sua mão que de pronto aceitei, sem nenhuma dificuldade ela me tirou do chão, deixando-me de frente a ela. Erámos quase do mesmo tamanho e em um passo quase perfeito, ela andou para frente e eu para trás, colando meu corpo na parede fria do quarto. Tentei encontrar a minha voz, mas todos os meus sentidos sumiram, não existia forças ou querer dentro de mim, o toque gelado dos dedos dela subiram pelo meu braço, fazendo meu corpo se arrepiar, com uma lentidão irritante, ela me despiu, apreciando cada detalhe do meu corpo nu e magro demais. — Linda.
Ouvi a voz rouca e o sopro gelado bem no centro do meu corpo nu, ela estava ajoelhada a minha frente, meus olhos fixos ao dela, suas mãos finas e delicadas, deslizavam por meu corpo, congelando e me levando a loucura por onde tocavam. Senti sua língua invadir minha intimidade e o ar deixou meu corpo, desejei gemer, mas não consegui, sentia que ela sorria com os lábios dentro de mim, sua língua trabalhava com maestria, tocando pontos delicados, invadindo minha carne, fazendo meu corpo inteiro tremer. Suas mãos tomavam meus pequenos seios, brincavam, massageavam, apertavam. Estava entregue, a pertencia, era dela, não existia em mim forças para recuar, para dizer não. Muito menos queria tal coisa. Senti quando uma de suas mãos que mais pareciam pedras de gelo, deixaram meus seios, escorregaram por meu corpo, indo ao meio de minhas pernas, sem delicadeza algumas, seus dedos me invadiram, enquanto sua língua brincava com minha carne inchada. Poderia morrer naquele exato momento.
Queria morrer naquele exato momento.
Gozei.
Morri.
Não sei exatamente o que aconteceu, não me recordo da sensação da morte, não houve dor, nem mesmo vi um filme passando rapidamente na minha mente. Uma hora eu existia e no minuto seguinte, não existia mais, fui levada por ela, após tanto pedir, após tanto desejar, ela me atendeu e veio me buscar... Todos os meus conflitos se acabaram, todas as minhas angustias findaram, enfim estava em paz, nada mais me assolava, não existia mais lutas internas, não existia mais dor, somente um eterno nada e absoluto silêncio.
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Põe-me como selo sobre o teu coração, como selo sobre o teu braço, porque o amor é forte como a morte, e duro como a sepultura o ciúme; as suas brasas são brasas de fogo, com veementes labaredas.Cantares 8:6*********************************************************************Há dias ele vagava pela terra que o sol aquece, seus pés não sabiam o caminho certo a seguir, somente o levava de um lado a outro, sem rumo ou direção. Estava cansado e sua alma angustiada, desejoso em sentir a vida novamente. Andava, respirava, comia e dormia, mas era como um simples vulto, passando século após século e nada mais.Permitia-se sentar nos bancos das praças da grande cidade, contemplava a realização de seus sonhos, através de outras pessoas. As crianças corriam, riam alto e brinc
Valentina estava longe de ser o padrão de beleza estabelecido pela sociedade, suas curvas, destoavam das medidas exibidas nas telas da televisão. Desde sua infância travou uma batalha contra a balança, batalha essa que piorou muito em sua adolescência, levando-a se esconder do convívio social. Somente em sua maioridade e após longos anos de acompanhamento psicológico, se descobriu mulher, aceitando as fartas curvas, as coxas grossas, o rosto cheio e a barriga saliente. Nada disso a incomodava mais, sentia-se linda e cheia de vida, cabelos pretos na altura dos ombros, olhos claros e sorriso largo, iluminava qualquer lugar onde chegava. Mas uma vida de reclusão tem suas consequências, Valentina não teve êxito nos poucos relacionamentos amorosos, foram tão poucos que conseguia contar em uma mão e lhe sobravam dois dedos. Pisciana, era uma sonhadora, vivia mil vidas em seus sonhos e mil amores
Avenida Paulista estava linda, enfeitada de ponta a ponta, luzes natalinas, bonecos gigantes, até mesmo uma máquina que jogava flocos de gelo nas pessoas que ali passavam, simulando neve. Não havia como negar, o natal era a época mais linda do ano e os olhos de Helena brilhavam todas as vezes em que por ali passava. Seus dias eram corridos, não deixando espaço para relacionamentos duradouros, bem sucedida e sócia em uma empresa de comunicação, sua vida se resumia a ordens, reuniões, telefonemas e viagens de última hora. Mas eram as luzes da Paulista, o encanto das crianças por cada decoração, que acalantava o seu coração e dava a Helena, paz para respirar em meio a suas loucuras.E foi em uma dessas noites magicas que ela decidiu simplesmente parar seu tempo. Saiu da empresa e não correu para o aeroporto, não olhou aflita para o relógio, nem bri
O sol se despedia novamente, seria somente o fim de um dia exaustivo de trabalho na lavoura para os homens, correria e afazeres para as mulheres da pequena e pacata vila, se a noite que se formava diante dos olhos de todos, não fosse a primeiro noite de lua minguante. Assim que a claridade começou a ceder lugar para a brisa fresca do fim de tarde, mães corriam em buscas de suas crianças, amontoando-as em seus braços, enquanto buscavam a segurança enganosa de seus lares frágeis. Pais, voltavam a passos apressados, carregando com esforços seus equipamentos pesados e sem cuidado algum, despejando ao lado da entrada da casa simples, encontrando no cômodo mal iluminado os olhos aflitos daquela que sabia o que estava por vim e implorava em silencio para que algo fosse feito, mesmo sabendo que contra a maldade que os assolariam ao escurecer, não teriam como lutar. Precisavam ser rápidos, o tempo se di