Meu peito se contraiu ainda mais numa dor que fodia minha mente tanto quanto meu corpo. Voltei para o vidro da maternidade, olhando aqueles dois quilos de carne com boca e nome, se remexendo, tão frágil, tão bela, tão dependente de mim. A pediatra me observou atentamente e chamou-me com o dedo. A enfermeira foi até a porta e autorizou minha entrada.
Sentei numa poltrona, enquanto via outro bebê ir para o quarto, pois a mãe já havia voltado da sala de parto. Maria Lua foi trazida até mim, colocada sobre meu peito. Encarei aqueles olhinhos claros que se abriram na minha direção, parecendo sem foco, a pele enrugadinha, descascando levemente.
Sim, ela valia qualquer coisa. Era um amor que eu não poderia explicar em mil anos.
Ah, Heitor, abro mão de você ao mesmo tempo que aceito sua filha como minha. Quanta ironia. Quero odiá-lo pelo que fez, mas não consigo
- Maconha. É natural e você, mais do que ninguém, sabe dos efeitos. – Sorriu debochadamente.- Os dois. – Falei nervosamente, pegando o dinheiro da bolsa com as mãos trêmulas.Assim que paguei, me dirigi à porta e ele se pôs na minha frente:- Quem diria que você apareceria aqui, depois de tantos anos... E tudo que houve?- Também me impressionei de vir parar aqui. – Confessei para mim mesma, em voz alta.Ele deu um sorriso trêmulo:- Venha sempre que quiser. Recebo coisas novas antes dos demais em Noriah Norte.- Ok.Tentei abrir a porta, amedrontada. Só estávamos nós dois ali e aquilo não era nada seguro. Por sorte, ele me deixou sair.- Pode chamar um táxi para mim? – perguntei.- Não entra táxi aqui. Pode ir na boa. Ninguém vai mexer com você. - Garantiu.
Olhei para Ben:- Eu sabia que isso não daria certo. – Suspirei, resignada.Sebastian veio até mim e afastou a coberta fina, que cobria parte do rosto de Maria Lua:- O que você está fazendo, porra?- Eu vou cuidar dela. Salma pediu. – Falei, tentando me justificar.- Caralho!- Não fale alto, vai acordá-la. – Pedi.Ele passou a mãos nos cabelos, o rosto avermelhado:- Quem é o pai desta criança?- Heitor. – Confessei, com a voz quase inaudível, abaixando a cabeça, envergonhada.- Não! – ele gritou. – Não é verdade!- Não grite, porra! – Fui andando com Maria Lua, aturdida, retirando-a da sala.Sebastian foi atrás de mim:- O que você tem na cabeça, Babi? Porque cérebro eu tenho certeza que não é.Ben pegou-o pelo braço e olhou-o firmemente:- Espera, Sebastian. Vamos explicar tudo. Dê um tempo.- Não tem tempo. Ou me digam agora o que está acontecendo ou anulo esta porra de certidão. Vocês enlouqueceram juntos, só pode... – Ele passou a mão com força no rosto, indo até a o queixo, en
Ficamos todos em silêncio.- Por que você tem que ser tão sensato, porra? – Ben não aguentou as lágrimas – Eu chamei você porque era a única pessoa que poderia nos ajudar e não revelar nosso segredo, em função de amar Babi. Agora você... Joga todas estas verdades sobre a gente... Quando tudo que fizemos foi querer ficar com a criança que acompanhamos toda a gestação, que enchemos de amor desde sempre, que... – ele não teve mais palavras, que embargaram junto das lágrimas.- Eu entendo que não fizeram por mal... Eu detesto Heitor e vocês sabem disso. Mas eu no lugar dele... Acabaria com vocês dois se soubesse a verdade. E os colocaria atrás das grades.- Você tem razão. – Respirei, limpando as lágrimas.Ainda tinha um grito trancado na minha garganta, uma dor horrível que eu não conseguia expor ou deixar sair.- Thorzinho não é ruim... – Ben disse. – Mas... Não queremos nos afastar da nossa filha.- Ela é filha “dele”. – Sebastian fez questão de repetir. – Não podem esconder isso para
A primeira mamadeira que eu e Ben preparamos deu o que falar. Não acertávamos a temperatura e a cada gota que ela sorvia do leite, tínhamos medo que se afogasse.A fralda que Ben trocou vazou de primeira, sendo colocada do lado contrário. Pomada de assadura? Para que serve isso? Quantas vezes ao dia usamos? Ela deve dormir de lado, de bruços ou barriga para cima? É normal ela dormir tanto? Que horas ela abre os olhos?- Vamos deixar o celular para despertar de três em três horas. Cada um levanta uma vez para preparar o leite. – Ele sugeriu.- Ok. Mas ela dorme no meu quarto até comprarmos um berço.- Isso não é justo. Por que não no meu?- Salma pediu que “eu” cuidasse dela.- Mas “eu” comprei todas as roupas que ela tem. E “eu” fui com ela no hospital, porque ela quis que fosse assim.- Mas exigiu “
Parei ao lado dele, olhando para a escuridão do mar, mesclado ao céu estrelado.- Quer se matar? – perguntei.A cabeça dele virou na minha direção e não disse nada.- Vai me ignorar? – Insisti.- Vá embora, assombração.- Assombração? – eu ri. – Tenho cara de assombração para você?- Tem...- Hum, eu sou uma droga, não é mesmo? – relembrei as palavras dele. – Mas eu acho que posso ser uma droga melhor que o seu uísque, desclassificado mor.- Sai daqui, porra! Não posso nem sonhar em paz?Peguei o braço dele e o fiz virar na minha direção:- Isso não é um sonho, desclassificado. Vamos embora.- Eu odeio você. – falou, com a voz baixa.- Eu sei... Nem por isso vou deixá-lo morrer aqui.<
- Ok, obrigada por responder em nome de Deus. Aliás, eu acho que você não deixa de ser o meu deus... Só que grego. Quando estou ao seu lado é como se nada mais existisse, só você e eu.Ele colocou o dedo num painel na porta, fazendo com que ela se abrisse automaticamente.- Ok, devo cortar seu dedo quando precisar entrar? É isso? – comecei a rir.- Eu sou Deus! – Ele gritou, abrindo os braços enquanto entrava e as luzes se ligavam automaticamente.Fiquei parada assim que a porta se fechou, olhando tudo ao meu redor, tentando não ficar maravilhada com a vista. O lugar era simplesmente gigantesco. Uma sala com sofás em formato L e tapete branco (sim, quem, em estado normal, colocaria tapetes brancos na sala, para os outros pisarem com os sapatos?). Como o espaço era amplo, a sala, mesmo em tamanho enorme, ficava parecendo dançar sobre o piso cinza claro, que mais parecia um espelho.Atrás só se via vidros e cortinas blackout, abertas, mostrando toda a cidade. Uma escada de vidro (sim, e
- Livrai-me de Heitor Casanova... Amém – ele começou a rir – Me chupa! – o tom foi sério.- Idiota! – empurrei-o para o banheiro – Só quando você merecer. E você merece... Ah, se merece. – falei em voz alta, observando-o andando praticamente nu, não conseguindo traçar uma linha reta com os pés.O banheiro era tão grande quanto o quarto.- Caralho, por que um banheiro tão grande? – me dirigi ao box, ligando o chuveiro enquanto ele apertava o botão da banheira, que começava a encher – Duvido que teria vapor aqui se eu tomasse banho – ri – Você não teria sauna gratuita comigo, desclassificado.Ele entrou na banheira, ignorando o chuveiro com água gelada que eu tinha acabado de ligar.Ficamos nos olhando, cada um num canto, como se não pudéssemos nos aproximar, sabendo no que aquilo poderia acabar em sexo.Senti meu coração acelerar imediatamente quanto ele jogou a cueca molhada na minha direção. “Maria Lua, seu pai é um tarado, desclassificado”, pensei.- Venha. – Ele ordenou.- Não. – f
Heitor abriu os olhos e me encarou, sem pressa, fazendo com que cada minuto parecesse durar uma hora:- Pode... – disse com a voz fraca.Me aproximei dele, devagar, sabendo que talvez fosse o último beijo, a última vez, como sempre eram nossos encontros: uma incógnita, uma mistura de emoções e sentimentos sempre à flor da pele... Então cada segundo precisava ser bem aproveitado.Ajoelhei-me e toquei seu pescoço, sentindo-o estremecer sob o meu toque. Sorri e levei meus lábios aos dele, fechando os olhos e deixando o momento me levar para o céu, que era como eu me sentia quando estava ao lado dele.Os lábios de Heitor envolveram os meus, gentilmente, sugando-os. Senti suas mãos descendo pelas minhas costas escorregadias com a espuma e fiquei completamente excitada.Aquele beijo parecia um castigo, sem que eu pudesse sentir a língua dele, como se quisesse