MELISSA
Sou tomada por uma imensa alegria ao cruzar as portas duplas do hospital e sentir o sol aquecendo meu rosto. Acolho com prazer os raios calorosos do Rio de Janeiro que incidem sobre a minha pele enquanto meu irmão me ampara até o banquinho no jardim em frente. Como é maravilhoso poder trocar aquela camisola ridícula por minhas próprias roupas e deixar esse lugar frio e deprimente. Pedi para me sentar um instante, não por estar me sentindo mal, mas por precisar respirar um pouco desse ar poluído e ouvir os ruídos da cidade antes de seguir para casa.
É um novo ano e finalmente estou livre dessa prisão. Como eu senti falta daqui de fora! Apesar de ter passado por um tratamento delicado e bem-sucedido, e de estar me sentindo renovada e pronta para enfrentar o mundo novamente, meus cuidad
MELISSAEu não fazia a menor ideia de onde estava e não tinha tempo para me ater aos nomes das ruas. Eu corria sem parar, mudando de direção em cada esquina. Queria poder cavar um buraco no chão e traçar um túnel subterrâneo, isolado, seguro, inatingível. Diante dessa impossibilidade, me dedico apenas a traçar o caminho mais difícil de ser rastreado por ele.Voo por ruas e avenidas, mal prestando atenção aos sinais de trânsito. Uma força interior me impulsiona a me afastar o máximo possível daquele lugar ameaçador e de qualquer pessoa que pudesse machucar meu filho. Desde que soube que estava grávida, tenho lutado por esse bebê e sei que daqui para frente vai ser sempre assim, eu o protegerei com a minha vida se preciso for.
RICKEm um momento eu a tinha, firmemente segura ao meu lado, e no outro momento já não a tinha mais. Ela se desvencilhou de mim habilmente e se pôs a correr para longe. Demoro alguns segundos até assimilar que ela está deliberadamente fugindo e começo a correr atrás dela. Não, dessa vez eu não a deixarei ir embora assim. Ela precisa ouvir o que tenho a dizer, me deixar explicar. Ela está apenas assustada, mas vai entender quando eu alcançá-la.Travamos uma luta e tudo se passa como um furacão, até que ela consegue escapar por meus dedos. Quando consigo passar pelo portão, vejo-a dobrando a esquina e a sigo. Ao alcançar a mesma esquina, ela já está no final da rua, atravessando descuidadamente para pegar outra direção. Eu a
MELISSALimpa e fresca é como me sinto neste momento e é só no que quero pensar por alguns minutos. Finalmente pude tomar um banho decente em meu banheiro, deixar a água fazer seu caminho por todo o meu corpo, livre de agulhas, soro e curativos. Sento-me na cama, acomodando-me em meus travesseiros cheirosos. A toalha ainda enrolada na cabeça. Nossa, como é bom estar em casa, já estava esquecendo essa sensação pacífica que o lar me traz. Afinal, foi preciso mais de uma noite em observação, já que minha pressão ficou completamente fora de controle.Passei por uma nova bateria de exames. Ainda que eu tivesse deixado aquele mesmo hospital naquele mesmo dia, a médica queria ter uma noção imediata do meu quadro geral. Ao constatar minha fr&aac
RICKUm mês inteiro de tentativas frustradas. Sinto Melissa mais distante a cada minuto. Não consigo dormir ou comer, acabo sempre trocando as refeições por um copo de vodka, Uísque ou café, larguei as obras da academia de mão, só apareço em casa para um banho corrido e logo saio novamente. Respiro apenas pensando em vê-la e tocá-la.Minha mãe só falta tentar me algemar no pé da cama, mas seus gritos entram por um ouvido e saem pelo outro, não me abalam nem por um segundo. Procuro não cruzar com meu pai, sem nenhuma paciência para seu sermão ridículo.A pior parte é não ter certeza de onde ela está. Sei que ela foi para casa assim que saiu do hospital, ma
MELISSAEle afasta seus olhos oceânicos dos meus e uma energia que eu nem sabia que estava presente se desfaz. Solto o ar pela boca e começo a me recuperar do susto. Ele caminha até uma mesa no canto do quarto, seu corpo esguio se curva e ele começa a revirar dentro da pequena gaveta. Tira um bloquinho de dentro e arranca uma folha. Ele volta a me olhar, com as sobrancelhas arqueadas.- Tem uma caneta? – Ele me pergunta.- Hã? Ah, acho que sim. – Alcanço minha bolsa e começo a vasculhar dentro dela. Ele anda de volta até mim. Acho a caneta e entrego a ele.- Obrigado.Ele se senta junto à mesa e começa a escrever alguma coisa, um bilhete, eu ach
RICK Depois de ver com meus próprios olhos que Melissa havia deixado sua casa para trás e ido embora como uma fugitiva, eu fiquei sem chão. Minha mão latejava com os cortes abertos pelo soco no espelho, mas mesmo assim eu apertava o volante e dirigia em alta velocidade pelas ruas alagadas. Minha cabeça trabalhava a mil por hora, imaginando para onde ela poderia ter ido. Era certo de que não estaria na casa da Lívia e nem do Anthony. Ela sabe que seriam os primeiros locais onde a iria procurar. Será que foi passar um tempo em um hotel? Ou em outra cidade? Que eu saiba, ela não tem parentes em outros lugares. Varro minha mente em busca de uma pista, de qualquer informação sobre onde ela possa ter ido, mas a única coisa que se destaca nas minhas memórias é a tal faculdade de Paris em que ela queria est
“A arte existe para que a realidade não nos destrua” (Friedrich Nietzsche) MELISSA Acordei no meio de um campo muito verde, o sol brilhava forte e me cegou por alguns instantes. Quando meus olhos se acostumaram com a luz intensa pude ver a imensidão da campina, não havia nada ao redor, nem uma casa sequer, um poste ou uma árvore, nada que pudesse me proteger dos abrasadores raios que incidiam sobre minha pele. Sentia minhas bochechas queimarem e o calor começou a tomar conta de todo o meu corpo. Senti-me fraca, como se minha energia estivesse sendo sugada. Não avistava nada e nem ninguém em quilômetros, não tinha nada a que eu pudesse recorrer. Não saber como havia parado naquele lugar me incomodava ainda mais que o calor ou a solidão, simplesmente me sentei em meio à grama e abracei meus joelhos, escondendo minha cabeça entre eles. Tentei recordar como cheguei até a
MELISSA O quarto está imerso em breu, mas levantando-me da cama consigo enxergar a enorme janela coberta pela persiana e alguns tímidos raios de sol se precipitando dentre as minúsculas frestas. Alcanço a janela mal conseguindo respirar. Meu coração saltando no peito. Com as mãos trêmulas, consigo abrir a persiana, só o bastante para o sol de início de verão banhar o espaço à sua frente. Enfim reconheço o lugar, apesar de achar que estava perdida em algum iglu no Alasca devido ao frio congelante, estou no quarto de Rick. Estou a salvo em seu apartamento em frente à praia de Copacabana. Ele começa a se mexer na cama e a cobrir os olhos, o sol parece estar o incomodando. É atordoante observá-lo dormir, sempre tão agitado e inquieto em seu sono. Volto-me para a janela e deixo que o ar fresco da manhã exerça seu efeito calmante sobre mim, porém, hoje nem a brisa do mar que entra pelo quarto faz meu coração suavizar. Fico bem na ponta dos