— Eu não estou aqui para discutir sua satisfação pessoal — respondeu Melissa, tentando manter a voz estável. — Estou aqui para entender o que você sabe sobre a doença da minha mãe. E sobre as cartas que você enviou para Afonso.
O sorriso de Cloé se alargou, e ela deu um passo à frente, com uma expressão que mesclava desprezo e curiosidade.
— Ah, as cartas... — ela disse, como se estivesse saboreando cada palavra. — Você realmente acha que Afonso era um santo? Ele tinha seus segredos, e você sabe disso. Por que não olhar para a verdade ao invés de se prender à ilusão de que ele era perfeito?
Melissa sentiu a raiva ferver dentro dela. Afonso havia cometido erros, sim, mas isso não justificava a crueldade de Cloé.
— Ele não era perfeito, mas você não sabe nada sobre o que realmente aconteceu. Por que você se importa tanto com isso? O que você realmente quer?
Cloé deu uma risada baixa, uma mistura de escárnio e divertimento.
— O que eu quero? Eu quero ver você se afundar nessa dor. Porque, no fundo, você sabe que ele nunca deveria ter escolhido você. Sempre fui eu quem ele queria, e você é apenas uma sombra do que poderia ter sido.
Melissa sentiu uma onda de raiva e tristeza, mas decidiu usar isso a seu favor. Ela não iria deixar Cloé a desviar do caminho. Precisava de respostas, não de provocações.
— Se você sabe tanto, então me diga: como você se envolveu com a doença da minha mãe? O que você sabe sobre os exames que estavam no envelope?
O sorriso de Cloé se desfez, e seus olhos brilharam de uma maneira que fez o estômago de Melissa revirar.
— Eu sei muito mais do que você imagina. Afonso tinha seus métodos... e algumas pessoas estavam dispostas a ajudar — disse Cloé, com uma voz que era um sussurro de malícia. — O que você vai fazer agora? Chorar? Ou vai lutar por algo que já está perdido?
Melissa percebeu que a conversa estava se intensificando, e, embora estivesse em uma batalha emocional, não podia se deixar levar pelas provocações.
— Não sou a única que vai lutar. Se você estiver envolvida nisso, não vou descansar até que a verdade venha à tona. Você pode achar que está ganhando, mas eu vou proteger minha família. E a memória de Afonso.
Cloé sorriu, mas agora havia algo mais na expressão dela — uma dúvida, talvez. Melissa percebeu que havia uma oportunidade ali, uma fraqueza que poderia explorar.
— Você não pode fazer isso sozinha, Melissa. Não sabe com quem está lidando. Afonso pode estar morto, mas a verdade não. E eu estarei sempre por perto, observando cada movimento seu.
Melissa respirou fundo, percebendo que aquele confronto era apenas o começo. Ela não estava apenas lutando contra Cloé; estava lutando por sua família, por suas crianças, e por Afonso.
— Se você quer uma guerra, então pode ter certeza de que não vou recuar. Vou descobrir a verdade, e você não vai conseguir me parar.
Antes que Melissa pudesse se afastar, Cloé a interrompeu, seu tom agora mais sério, quase conspiratório.
— Ok! Não importa mais nada agora que Afonso está morto, mas a verdade por trás das cartas é que eu descobri que alguém falsificou os exames da sua mãe para que ela parecesse doente — disse Cloé, sua voz baixa e carregada de significado. — Quando descobri, contei tudo a ele, mas ele já parecia saber disso. Fiquei surpresa com a resposta dele, foi aí que tive a certeza de que foi ele quem estava por trás dessa falsificação.
As palavras de Cloé atingiram Melissa como um soco no estômago. Falsificação? Como Afonso poderia estar envolvido em algo tão nefasto? O que ele tinha a ganhar com isso? A confusão e a dor misturavam-se em sua mente, enquanto tentava processar a revelação.
— Você está mentindo! — gritou Melissa, a indignação transbordando. — Ele nunca faria algo assim!
Cloé arqueou uma sobrancelha, como se estivesse esperando essa reação.
— Sabe, é fácil acreditar nas coisas que queremos. Mas a verdade é que ele tinha segredos. E agora, você precisa decidir se vai continuar na sua bolha de negação ou se vai encarar a realidade — disse Cloé, com um sorriso cínico nos lábios. — Afinal, a sua vida inteira foi construída sobre mentiras.
Melissa sentiu a raiva e a tristeza borbulhando dentro dela, mas uma parte dela sabia que precisava ouvir Cloé. Se havia alguma verdade nas palavras dela, precisaria descobrir antes que fosse tarde demais.
— Por que você está me dizendo isso? O que você ganha com isso? — perguntou Melissa, tentando manter a calma.
Cloé deu de ombros, parecendo desinteressada, mas havia um brilho em seus olhos que denunciava um prazer sombrio.
— Eu só quero ver você se destruindo. A verdade pode ser dolorosa, mas é necessária. E, convenhamos, seu sofrimento é uma visão maravilhosa.
Melissa fechou os punhos, tentando conter a fúria. Sabia que não poderia se deixar levar pelas provocações.
— Se isso for verdade, vou descobrir quem está por trás disso. Não vou permitir que a memória de Afonso seja manchada por mentiras.
Cloé sorriu, um sorriso que misturava desdém e satisfação.
— Boa sorte, Melissa. Você vai precisar. Porque, no fundo, ninguém é quem parece ser, e você pode não gostar do que vai encontrar.
Com isso, Melissa saiu do escritório, o coração acelerado e a mente em tumulto. As palavras de Cloé a seguiram como uma sombra, e, por um momento, sentiu-se perdida em um labirinto de incertezas. Afonso não era apenas o amor de sua vida; ele também era um homem com segredos, e agora tudo parecia estar desmoronando ao seu redor.
Enquanto dirigia para casa, as dúvidas a assaltavam. O que mais Afonso poderia ter escondido? Quem realmente estava por trás da falsificação dos exames? E o que isso significava para a saúde de sua mãe?
A dor de quase perder sua mãe por causa de um diagnóstico incorreto foi um dos períodos mais sombrios da vida de Melissa. O câncer que havia sido considerado terminal acabou sendo um erro médico, e a revelação de que sua mãe estava bem trouxe um alívio que, àquela altura, já parecia distante. Meses antes, Afonso se tornara um elemento inesperado em sua vida — um sequestrador que, de alguma forma, se transformara em seu marido.
A proposta de casamento dele fora feita sob circunstâncias estranhas e angustiantes. No início, Melissa se lembrava de ter rejeitado com veemência a ideia de se casar com alguém que a havia sequestrado. Mas, quando a saúde de sua mãe estava em jogo, o desespero tomou conta dela. Afonso parecia o único que poderia salvá-la, e sua oferta de pagar os exames e tratamentos parecia uma tábua de salvação. Naquele momento, o casamento se tornou uma negociação, uma troca de segurança por amor que, na verdade, nunca havia existido.
“Como eu fui idiota e acreditei nisso?” A reflexão assombrava Melissa agora, mais do que nunca. Afonso armara tudo para que ela se casasse com ele. Ele tinha controlado cada passo, manipulando situações para que não houvesse outra saída. O que parecia um ato de amor tornara-se uma armadilha emocional.
Ao olhar para o rosto tranquilo de sua mãe, que agora estava saudável e feliz, Melissa sentiu um misto de gratidão e ressentimento. Como ela poderia ter colocado sua vida nas mãos de um homem que, embora houvesse trazido segurança, também era a fonte de sua angústia? O casamento, em vez de ser uma união de amor, era um contrato forçado por circunstâncias adversas.
A noite envolvia a mansão em um manto de silêncio, apenas interrompido pelo leve sussurrar do vento que se infiltrava pelas frestas. Melissa sentou-se na beira da cama, as mãos sobre os joelhos, perdida em pensamentos. A luz fraca do abajur lançava sombras dançantes nas paredes, refletindo a confusão que se aglomerava em seu interior.Agora que Afonso estava morto, ela percebeu que sua vida havia se transformado em um emaranhado de mentiras e enganos. O que deveria ter sido um casamento baseado no amor se revelou um jogo cruel, uma conveniência que a aprisionara em suas próprias inseguranças. A dor da traição ainda ardia, mas havia um novo sentimento crescendo dentro dela — a necessidade de libertação.“É hora de deixar tudo isso para trás,” pensou Melissa, a determinação crescendo em seu coração. “Eu mereço uma nova chance.”Ela se levantou e começou a andar pelo quarto, como se cada passo a aproximasse de uma nova vida. O passado não poderia mais controlá-la; precisava ser deixado p
A manhã estava clara e ensolarada, refletindo o otimismo que Melissa sentia em seu coração. Após semanas de adaptação em sua nova casa, ela finalmente havia se candidatado a uma vaga como residente no hospital da cidade e, para sua alegria, fora chamada para uma entrevista. Era a oportunidade que precisava para recomeçar sua carreira e se reconectar com sua paixão pela medicina.Enquanto se arrumava, a ansiedade e a expectativa se misturavam. Olhando-se no espelho, ajustou o cabelo e vestiu uma blusa que sempre a fazia sentir-se confiante. “Você consegue, Melissa,” sussurrou para si mesma, tentando dissipar os nervos que a acompanhavam.Na sala, Matteo, seu filho mais velho, estava sentado com Laura e sua mãe, Aurora. Ele olhou para a mãe com um sorriso encorajador. “Boa sorte, mãe! Você vai arrasar!” Matteo sempre teve uma maneira de iluminar os momentos mais sombrios, e suas palavras trouxeram um calor ao coração de Melissa.Laura, com seu jeito curioso, perguntou: “Você vai ser dou
Na manhã seguinte, Melissa acordou com a luz suave do sol filtrando-se pelas cortinas. O sonho com Afonso ainda estava fresco em sua mente, trazendo uma mistura de conforto e saudade. Enquanto se espreguiçava, seu celular começou a tocar. Ela olhou rapidamente para a tela e viu que era o hospital regional.Com o coração acelerado, atendeu. “Alô?”“Bom dia, Melissa! Aqui é a Dra. Sofia, da comissão de seleção. Como você está?”“Bom dia, Dra. Sofia! Estou bem, obrigada. E você?”“Estou ótima! Estou ligando para informar que você foi aprovada para a vaga de residente. Parabéns!”Melissa ficou em silêncio por um momento, o coração pulando de alegria. “Sério? Eu… eu não posso acreditar!”“Sim, é verdade! Você teve um desempenho excepcional durante a entrevista. Estamos ansiosos para tê-la conosco.”“Obrigada! Isso significa muito para mim. É um sonho realizado!”“Ficamos felizes que você esteja tão empolgada. Você começará na próxima semana. Alguma dúvida?”“Não, acho que está tudo claro.
Cinco anos se passaram desde que Melissa começou a trabalhar no hospital. A vida havia mudado de maneira significativa, e ela se sentia mais forte e confiante a cada dia. Matteo estava prestes a completar 15 anos, um adolescente cheio de energia e sonhos, enquanto Laura, com 12 anos, se mostrava uma jovem sensível e criativa. O tempo passou, e com ele, Melissa aprendeu a equilibrar seu papel de mãe e profissional, sempre mantendo a memória de Afonso viva em seu coração.Nos últimos dois anos, Melissa também havia aceitado namorar Mike, seu colega de trabalho. Mike era atencioso e compreensivo, sempre a apoiando em seus desafios no hospital. O relacionamento deles trouxe um novo sopro de alegria à sua vida. Ele entendia as complexidades da rotina dela e estava disposto a fazer parte da família. Melissa apreciava sua presença, e, aos poucos, ele se tornou uma figura importante para Matteo e Laura também.Certa manhã, enquanto preparava o café da manhã, Melissa ouviu risadas vindas da sa
Melissa estava concentrada em seus afazeres diários no hospital quando recebeu uma solicitação de emergência. Um homem de cerca de 40 anos havia dado entrada com sintomas de confusão mental. Ela rapidamente se dirigiu ao quarto, pronta para examinar o paciente e entender o que estava acontecendo.Ao abrir a porta, no entanto, o mundo ao seu redor parou por um instante. O homem na cama tinha cabelos castanho-escuros e um olhar perdido que parecia tão familiar. Melissa sentiu um frio na barriga ao reconhecer aquele rosto. Era Afonso.“Afonso?” ela disse, a voz falhando enquanto o choque a envolvia. Ele olhou para ela, confuso, e tentou sorrir, mas a expressão não alcançou seus olhos. Aquele homem se parecia muito com Afonso, um pouco envelhecido, mas era ele, pensou Melissa. Contudo, o homem na cama não a reconhecia.“Desculpe… eu não…” ele começou, sua voz hesitante. “Quem é você?”A sensação de desespero cresceu dentro dela. “Sou Melissa, sua esposa. Estamos juntos há anos. Você… você
Ambas estavam avaliando a condição médica do paciente. Melissa, por ser especialista em neurologia, examinava minuciosamente o prontuário, em busca de qualquer evidência que comprovasse que aquele homem era Afonso. Com cada página que virava, sua esperança diminuía.Depois de duas horas de estudo intenso, ela começou a se convencer de que aquele homem não poderia ser Afonso. A documentação revelava detalhes sobre a vida de Giovani que a deixaram alarmada. Ele havia nascido com uma doença rara, uma condição que o havia submetido a diversas cirurgias ao longo dos anos. E, como se isso não bastasse, cinco anos atrás, ele havia passado por uma operação importante que alterou significativamente sua saúde.“Melissa,” disse a diretora, interrompendo seus pensamentos. “O que você está descobrindo?”Ela respirou fundo, segurando o prontuário com força. “Esse homem… ele não é Afonso. A história dele é completamente diferente. Ele passou por procedimentos que Afonso nunca enfrentou. O que me lev
Depois de horas se virando na cama, tentando organizar os pensamentos e as emoções que a atormentavam, Melissa finalmente conseguiu dormir. No entanto, seu descanso foi breve e tumultuado.Ela se viu em um lugar familiar, um jardim repleto de flores vibrantes, mas a beleza era ofuscada por uma sensação de urgência. De repente, Afonso apareceu diante dela, sua expressão angustiada. Ele estava pálido, os olhos cheios de desespero.“Melissa!” ele chamou, sua voz ecoando no ar. “Preciso da sua ajuda! Estou perdido!”O coração de Melissa disparou. “Afonso! O que aconteceu? O que você precisa?” Ela tentou se aproximar, mas o espaço entre eles parecia interminável.“Eu não consigo me lembrar! Tudo está escuro… e eles estão vindo! Eu preciso de você!” ele exclamou, desesperado.A visão dele a deixava paralisada. “Estou aqui! Vou te ajudar! Só não tenha medo!”Mas, enquanto ela estendia a mão, uma sombra obscura começou a se formar atrás dele, crescendo e se aproximando. “Afonso, cuidado!” gri
Após as emoções daquela noite e a surpresa com o pedido de Mike, Melissa se levantou mais cedo do que de costume. O coração ainda acelerado com os acontecimentos, ela sabia que precisava ver Giovani. O peso da responsabilidade sobre ele a acompanhava, e, como médica, sentia que precisava fazer o que fosse possível para ajudá-lo.Ao chegar ao hospital, no entanto, a sensação de ansiedade cresceu. Ao entrar no quarto de Giovani, ela percebeu que ele não estava lá. O leito estava arrumado, mas vazio. Um frio na barriga a dominou.“Elizabeth!” chamou, ao avistar a enfermeira que estava passando pelo corredor. “Você viu o Giovani? Ele não está em seu quarto.”Elizabeth parou e olhou para ela com uma expressão de preocupação. “Eu não sabia que você estava procurando por ele, Melissa. Na verdade, sua esposa veio aqui mais cedo.”“O que você quer dizer?” Melissa perguntou, a inquietação aumentando.“Ela apareceu dizendo que o levaria a um lugar com mais recursos para cuidar dele. Mesmo após i