Parte 3...
E eu já tive outros casos desse tipo, onde a parte mais forte, no caso com poder financeiro, acaba se safando de ter a punição merecida e a vítima fica abandonada e dependendo do que seja feito, a própria vítima acaba sendo julgada como culpada.
A vida é muito cruel.
Eu sei bem disso porque quase caí nesse mundo da injustiça e por pouco abandonei meus sonhos de ter uma boa vida. Foi bem difícil, tive que apanhar um pouco da vida, mas aprendi, lutei e consegui ser forte para me posicionar do outro lado.
Com a família tóxica que eu tive, seria de se esperar que eu estivesse preso a essa altura ou então morto. É muito difícil você conseguir ter um caminho certo, quando as pessoas que deveriam estar ao seu lado, lhe dando impulso, são as que mais te puxam para baixo e sem motivo nenhum, apenas porque você não pode ser mais do que eles mesmos.
Me viro e vejo um pequeno sachê de alfazema em cima da prateleira na estante, ao lado de meu primeiro livro de direito. Me aproximo e o pego. Fecho os olhos e inspiro o perfume, mas quase já não o sinto mais.
São tantos anos que ganhei isso que seria difícil manter o cheiro. Já tentaram se livrar dele algumas vezes, mas eu sempre fui contra. Apesar das pessoas não entenderem, eu tenho uma ligação forte com esse pequeno sachê, já meio descolorido e sem cheiro realmente. Eu até já salpiquei um pouco de perfume de alfazema em cima dele.
É engraçado, mas isso me acalma. Pode parecer uma bobagem ou até mesmo idiotice para os outros, mas tenho uma ligação com esse pequeno pedaço de pano cheio de alfazema.
— De novo com isso.
Eu me viro ao ouvir a frase e vejo Diana. Minha secretária. E amante atual também. Estamos juntos há seis meses, é um bom relacionamento, mas não acho que seja o ideal. Por enquanto apenas estou deixando o tempo passar.
— Pois é - dei um sorriso de canto e coloquei o sache de volta — Já está sem cheiro de novo.
— Quer que eu leve para trocar o enchimento?
— Não... Eu vou apenas borrifar um pouco do perfume em cima e vai durar um tempinho.
Ela ri e balança a cabeça, colocando alguns papéis em cima de minha mesa. Vem até mim e me abraça.
— Está tendo um dia ruim, é isso?
— Até que não... - aliso seus braços — É só que o dia começou muito quente e abafado. Eu realmente fico um pouco de mau humor com dias assim.
— Ah, mas assim fica difícil - ela deu uma risadinha — Nosso país é tropical, temos calor o ano todo - se esfregou em mim e me deu um beijo no queixo — Eu sei como aliviar seu calor - mexeu as sobrancelhas se insinuando.
— Não vai dar - segurei em sua cintura — Eu tenho muito o que fazer.
— Pode ser lá em casa, mais tarde - sorriu maliciosa.
— Não sei, Diana - mexi em seu cabelo — Eu vou tentar ir, mas não prometo nada, está bem?
Ela faz um biquinho dengoso e me solta, cruzando os braços. Sei que ela tem intenções mais sérias comigo, mas eu nunca a enganei, nunca falei sobre um casamento. Nem mesmo em morarmos juntos.
— Poxa, tem quase dois meses que você não vai lá em casa, Lucas. Assim eu vou achar que você não gosta mais de mim.
Eu não gosto muito desse tipo de chantagem emocional que algumas mulheres fazem. Se estou com ela ainda é meio óbvio que gosto dela. No dia que deixar de gostar, não tenho motivo para continuar com essa relação.
Diana é uma pessoa muito boa. Um tanto pegajosa às vezes, mas sei que isso é tudo por culpa da insegurança dela, por ter sido traída antes por outros namorados.
Só que eu nem me considero mesmo um namorado dela. Estou mais para amante. Sempre deixei claro que ela pode até ver outros caras, sair com alguém que eu não vou me incomodar. O mesmo serve para mim.
E isso não é porque eu sou um cara moderno que acha que um relacionamento aberto é melhor para o casal. Na verade é porque eu não consigo me apegar a ela ou a outra mulher qualquer, a ponto de querer me prender de vez.
Casamento é uma coisa que não passa por minha cabeça. Ainda sou novo para isso. Tenho só trinta e cinco anos e não me vejo amarrado a uma mulher.
Depois de tanto tempo vendo vários casamentos fracassados passarem por essas salas, sempre com muito drama e brigas, tudo o que não quero, é isso para mim.
E sem falar no próprio casamento de meus pais. Até hoje não entendo essa relação doentia deles. Desde pequeno sempre vi os dois brigarem muito, mas nunca chegaram a se separar de verdade. Meu pai sumia por algumas horas ou dias, a depender da briga deles, mas sempre voltava para casa e minha mãe o aceitava.
Eu não tinha interesse em Diana. Quando ela começou a trabalhar para mim como secretária, não passava disso. Mas um dia nos encontramos em um barzinho na orla e começamos a conversar sobre outras coisas que não fossem sobre o trabalho e acabamos em um motel.
Foi muito bom, mas pra mim foi só sexo. Aos poucos fomos nos aproximando e agora temos essa relação, que pra mim é apenas isso. Dois adultos que se sentem bem um com o outro e que curtem um pouco de sexo para relaxar.
Preciso mesmo ter uma conversa séria com ela. Já falamos sobre isso, ela pareceu entender e aceitar, mas nos últimos tempos venho notando que ela está mais grudenta e me cobrando mais atenção. Não posso esticar isso ou posso acabar tendo um problema com ela aqui no escritório e não quero que nada me prejudique.
— Diana, você sabe que eu sou um homem ocupado - me afastei dela — Sempre que dá eu vou te ver, saímos... Mas não dá pra ficar grudado. Você sabe disso, eu já te falei.
Ela fez uma cara de quem não gostou, mas não me respondeu nada. Mexeu no cabelo ajeitando o coque e depois sorriu.
— Tudo bem - sorriu inclinando a cabeça — Eu vou te esperar. Se der para ir, garanto que vou fazer você relaxar muito.
Eu sorri balançando a cabeça e ela saiu, piscando o olho.
— Ok... Ok... Eu prometo que vou tentar passar lá depois.
— Ótimo - mandou um beijo com a mão — Estarei esperando ansiosa, vestindo só uma camisolinha transparente.
Ela sai e fecha a porta. Para Diana as coisas se resolvem com sexo. É engraçado como ela pensa, mais de um jeito masculino do que como uma mulher.
Geralmente as mulheres são mais românticas e os homens crus, mais diretos a essa questão do sexo. Acho que por isso nós tivemos essa conexão. Temos muitas coisas em comum, mas não passa disso. Pelo menos para mim.
Esfrego a testa. Eu tenho que organizar essa minha relação com ela. Preciso mesmo antes que isso vá para outro lado. E talvez o melhor seja encerrar essa relação e continuar apenas como chefe e secretária.
Sinto até um aperto no coração. Ela merece ser tratada de outra forma. Sinto que ela está esperando que eu vá assumir algo mais sério algum dia e eu não tenho mesmo intenção disso.
Na verdade, tudo o que está me importando agora é conseguir a promoção que o dono do escritório está anunciando, mas que ninguém ainda sabe quem será o escolhido. Sei que meu nome é um dos cogitados, mas eu tenho concorrentes fortes.
O escritório conta com onze advogados, divididos em várias áreas e que fazem o bom nome da firma. Os salários aqui são todos altos porque estamos sempre com casos que muitos decidem não se envolver. Muitos são bem complicados, outros nem tanto, mas ainda assim, nosso trabalho é muito bem remunerado.
A promoção é para agenciar toda a firma aqui. O escritório tem três filiais e essa foi a primeira, por isso é a mais valiosa e mais procurada e ter o poder de comandar tudo não é pra qualquer um.
Elias é o criador. Quando ele montou o escritório era apenas ele e dois amigos. Agora é só ele. Um dos amigos faleceu em um acidente de carro há quatro anos e o outro se aposentou. Chegou a vez dele também se aposentar e por isso está buscando um subsituto para seu lugar.
Isso representa mais dinheiro, mais moral e mais fama também, o que todos aqui querem, porém poucos sabem que podem competir e eu quero isso para mim.
Pego mue velho sachê, presente dela, a garotinha que reencontrei um tempo depois. Ela me disse que isso acalma. Eu tento me acalmar sempre que encosto o nariz no paninho.
E acabo pensando nela.
Deborah Bland
Autora de romances nacionais.
Espero que continue lendo a história desse casal. Vem muita emoção por aí.
Obrigada!
Lucas - 35 anosEu estava em um ponto de ônibus com minha irmã Célia. Ela tinha um teste para fazer, na escola de balé. Como nossos pais não podiam ir, então eu a levei. Eu ainda não tinha recebido minha carteira de motorista, mas estava ansioso por isso. Estava com dezoito anos e Célia com quatorze. Era muito bonita e chamava atenção. Alta e magra e tinha uma postura muito elegante devido as aulas de balé.Eu fazia vários trabalhos para conseguir grana, já que meus pais não davam a mínima para minhas necessidades ou de minha irmã. Como ela conseguiu uma bolsa para estudar no municipal, que era muito procurado, eu ajudava a pagar com o pouco que ganhava nos trabalhos que fazia.Se ela fosse depender dos nossos pais, coitada, nem teria ficado um mês na escola. Eu até hoje não entendo porque certas pessoas resolvem ter filhos.Se você não tem mesmo vontade de ter uma obrigação pra vida toda, independente da idade do filho, apenas não tenha. É melhor, mais simples e evita causar problem
Parte 1...Carolina - 24 anos Eu estava lendo uma história em quadrinhos para a Júlia. Ela adora quando eu leio para ela e sempre que pode, ela anda pela casa com algum livrinho ou então uma revistinha que a mãe compra e às vezes o pai também.Célia está enrolada com o pai da Júlia. Eles estão em um processo de separação, mas ainda sentem algo um pelo outro, dá para perceber. Humberto é um pai muito bom para a Júlia. A menina adora quando ele está em casa e sempre que vai embora, eu percebo que ele vai com o coração pesado.Não me meto na vida das pessoas, menos ainda na vida de quem paga meu salário, mas pelo que vejo, os dois ainda se amam, porém não conseguem lidar com o erro de Humberto.Nunca perguntei nada sobre o que houve, mas ouvindo uma coisa aqui e outra ali, comecei a entender que houve uma traição da parte dele, o que causou todo o problema. Célia não aceitou isso e ficou bastante magoada. O que é bem normal.Suzana pelo jeito é do lado de Célia. Toda vez que Humberto c
Parte 2...Lucas estava bonito, cabelo mais curto e dirigia um carro que parecia novo. Isso tinha sido mais ou menos uns dois anos antes. Eu o reconheci, assim como aconteceu da outra vez, em que estava no fundo da pick-up e não tive tempo de pedir ajuda a ele, porque o carro saiu rápido e eu tive que me segurar para não ser jogada de um lado para outro.Dessa vez eu estava na calçada e ele no carro, mas fiquei com vergonha de chamá-lo. Talvez porque ele parecia tão feliz e estava acompanhado, que me senti mal de estar com uma roupa velha e suja. Não queria que ele me visse daquele jeito.— Pronto, podemos ir - eu disse sorrindo.— Ainda bem, você demora demais para arrumar as coisas. É só jogar tudo dento da mochila e pronto.Ele pega minha mão e sai me puxando. Sempre apressado. Somos assim. Eu sou calma e ele é agitado. Acho que por isso que começamos a ser amigos e depois ficamos juntos.Eu observo as novas tatuagens que ele tem no braço. Lucas adora tatuagens e resolveu que vai t
Parte 1...Carolina - 24 anosBem que eu gostaria de terminar esse bolo hoje, mas não vai dar. Vou ter que esperar até voltar para casa e aí sim, terminar o mais rápido possível. Ainda bem que eu já tinha acertado com a cliente de só passar aqui em casa depois das dezoito horas.Pedi a dona Célia que me liberasse hoje mais cedo e ela foi uma pessoa muito boa. Como sempre, aliás.Eu já trabalho na casa dela há dois anos como babá da sua primeira filha, Júlia. Uma criança muito fofa e que eu gosto muito de cuidar. Júlia é fofinha, gorduchinha e com um sorriso lindo. Adoro a risada dela.Quando consegui escapar da casa maldita, ainda fiquei um tempo pelas ruas, até que encontrei Nilce, que é a pessoa que eu considero minha mãe. Eu não a chamo assim, mas tenho um grande carinho e gratidão por ela.Se não fosse por Nilce, eu nem sei se estaria aqui hoje. É muito difícil a vida sozinha e nas ruas é mais ainda. É um jogo de sobrevivência que nunca sabemos como vai terminar. Eu pelo menos ach
Parte 2...Júlia é uma menina muito ativa e uma coisa que ela ama, é puxar meu cabelo. Depois de uns dias cuidando dela, aprendi que se quero manter meus fios, a melhor coisa é fazer uma trança que dificulta mais pra ela.Sorri olhando meu reflexo no espelho. Eu gosto muito de cuidar da Júlia, mas não quero ser babá por muito tempo. Esse foi o melhor emprego que consegui, diante da situação que o país está. E não reclamo, Célia paga muito bem e também é uma ótima patroa. Ela não me trata mal e nem como se eu fosse inferior.Graças a Deus, de vez em quando eu encontro pessoas pelo meu caminho que me fazem acreditar que ainda existe esperança para o ser humano.Torci a boca. Minha mente insiste em me puxar de volta a algumas cenas de meu passado que gostaria de esquecer, mas que ao mesmo tempo é importante que me lembre, para não cair de novo em um erro como aquele.— Carol! - escuto Nilce me chamando da cozinha.— Já estou indo - gritei de volta. Peguei a bolsa e fechei o armário — Só
Parte 3...Eu fiquei nervosa e só fiz que sim com a cabeça, agarrando minha mochila. Meu pai disse que um tio vinha me buscar, mas eu não sabia quem era. Eu nunca tive um tio antes.Ele voltou para o carro e saiu sem olhar para mim. A última vez que eu vi meu irmão Mateo foi naquele carro, quando ele se virou e colocou a mão no vidro de trás, olhando para mim com cara de choro, enquanto o carro desaparecia pela avenida.Eu nunca mais vi ninguém da minha família. E depois de um tempo, eu até acabei esquecendo de que tive uma família um dia. Me acostumei com a ideia de que eu era sozinha e de que ninguém gostava mesmo de mim.E foi assim que eu cresci.Demorei um bom tempo, passando por muitas coisas, para então entender que eu tinha sido abandonada naquele dia. Por meu próprio pai, que foi embora levando meu irmão.Ele não me queria. Ao Mateo e aos meus outros irmãos sim, mas por algum motivo que me magoou por muitos anos, a mim ele não queria. E eu tentei entender, tentei arranjar mo
Parte 1...Lucas - 35 anos“Carolina é uma menina bem difícil de esquecerAndar bonito e um brilho no olharTem um jeito adolescente que me faz enlouquecerE um molejo que eu não vou te enganarMaravilha feminina, meu docinho de pavêInteligente, ela é muito sensualTe confesso que estou apaixonado por vocêÔ, Carolina, isso é muito naturalÔ, Carolina, eu preciso de vocêÔ, Carolina, eu não vou suportar não te verCarolina, eu preciso te falarÔ, Carolina, eu vou amar vocêDe segunda a segunda, fico louco pra te verQuando eu te ligo, você quase nunca estáIsso era outra coisa que eu queria te dizerNão temos tempo, então melhor deixar pra láA princípio, no domingo, o que você quer fazer?Faça um pedido, que eu irei realizarOlha aí, amigo, eu digo que ela só me dá prazerEssa mina Carolina é de abalar, oi.”** ** ** ** ** ** ** ** **Nossa, hoje o dia parece que vai ser daqueles de pelar. Logo cedo já faz calor. Diz o termômetro na parede que está trinta graus, mas eu não creio nis
Parte 2...Eu achei estranho porque ela era muito novinha pra ficar sozinha ali na esquina. Meus pais são esquisitos. Minha mãe só vive ocupada e o meu pai está sempre pela rua. Ainda assim, eu acho que eles não iam me mandar ficar em uma esquina esperando por alguém. É um pouco perigoso, mesmo sendo cedo.Ela olhou pra mim e seus olhos tinham uma certa mágoa. Eu não entendia, mas achei que ela não deveria estar ali. Me levantei e estiquei a mão para ela.— Você quer vir comigo para minha escola?A minha ideia era levá-la comigo e pedir ajuda a uma professora para descobrir quem ela era mesmo e onde morava. Na escola tem psicólogos e também a diretoria tem contato com a polícia. Isso poderia ajudar. Pelo menos ela não ia ficar ali sozinha.Ela me deu um sorriso delicado e levantou, segurando minha mão, mas antes que eu falasse mais alguma coisa, senti uma mão forte em meu ombro, me puxando para trás.— Você é maluco garoto?Eu me virei para olhar para trás e até ergui as sobrancelhas.