Com quatorze anos, apenas um menino como a maioria dos outros, tinha medo do escuro. Acordei após ter um pesadelo, mas não de uma forma qualquer... Muito desperto e com olhos estalados. Não tinha a mínima ideia de qual teria sido o sonho, pois o sonho em si não foi relevante, e sim o acontecimento que veio depois dele.
Como de costume meu pai deixava a luz do corredor acesa para meus irmãos menores, caso quisessem usar o banheiro no meio da noite, e naquela madrugada ela também estava acesa. Deitado na cama, só conseguia ver aquele facho de luz no chão próximo à porta, ao qual fitei por algum tempo até que pudesse cair no sono novamente. O que vi? Nada! Mas senti que não estava só. Já sentiu isso? Não podia fechar os olhos por perceber que algo estava ali, próximo a mim. Era sempre vencido pelo cansaço. Foram cinco noites consecutivas assim. Já não aguentava mais olhar para a luz no chão do quarto, esperando que o ser incômodo se manifestasse, para que eu não me julgasse louco.
Um dia foi diferente. Caí no sono cedo, perto das vinte e uma horas. Por volta das três da madrugada acordei com os olhos estalados e bem desperto novamente. Ouvi passos pelo carpete que cobria todo o segundo andar da casa, exceto o banheiro. Os passos eram próximos à escada exatamente ao lado do quarto de meu pai, do outro lado do corredor em relação ao meu. Os ruídos continuaram seguindo em frente ao quarto de meus irmãos até o banheiro, que separava o quarto da minha irmã do meu. O peso dos passos sugeria uma pessoa adulta e logo pensei ser meu pai e voltei a dormir. Na manhã seguinte questionei meu pai o porquê ter usado nosso banheiro quando seu quarto era uma suíte. Sorrindo me respondeu:
– É mesmo filho, por que eu iria? Não há por que. Por isso não fui. Tenho meu próprio banheiro!
Perplexo, perguntei então por que a mulher dele havia ido ao nosso banheiro de madrugada. Ele retrucou:
– Ela também não foi... O que houve filho? O que tem de errado com o seu banheiro?
– Nada – respondi e fui para a sala.
Indaguei meus outros quatro irmãos e ninguém havia utilizado o banheiro naquela noite. Suei frio quando obtive a resposta negativa de Danton, que fora o último para quem havia perguntado.
Quem teria andado no corredor aquela madrugada? Por que tinha aquela sensação de ser vigiado? Não sei se as respostas virão algum dia, mas o sonho recente fez-me recordar esse fato. O intrigante é que depois do acontecimento em minha juventude, nunca mais tive medo do escuro. Porém, a sensação de ser vigiado por algo que não posso ver ainda me assombra.
Hoje quando voltava do trabalho a lua estava tão clara que sua luz favorecia minha visão e consegui ver mais de uma sombra no chão. Ao virar-me para trás não encontrei nada, ao voltar-me para frente a sombra desapareceu. Não havia ninguém lá, e isso me perturbou.
Ontem enquanto navegava em minha rede social, surgiu uma mensagem de uma estranha. O nome estava oculto, porém conversamos por horas. Acreditei ter feito uma amiga virtual. Não descobri seu nome, no entanto ela pareceu ser muito bacana, e disse ter interesse em meu futuro. O que ela não sabe é que o que menos quero nesse momento é alguém se importando comigo afetivamente. No decorrer da conversa falamos sobre diversos assuntos, mas o que mais me chamou a atenção, e me manteve conversando com ela ao invés de ignorá-la ou excluí-la, foi o assunto da tal "teoria da gravidade". Segundo ela, podem existir pontos na Terra em que a gravidade seja diferente do normal, e que ela acredita serem portais que levam além desse planeta. Eu ri e disse que aquilo não poderia ser possível, mas no fundo queria mesmo acreditar em tudo e me abrir, contar do sonho que tive e dizer que era muita coincidência.
Mas, Quem era ela? Nem sabia seu nome! Poderia até mesmo ser alguma amiga da Anne ou da Solanis brincando comigo. Se não for, ela voltará. E se voltar, vou descobrir quem é ela e como me encontrou...
Passou-se dois dias em completo caos, correria e bagunça. Muitas reuniões e mudanças na empresa. Nunca mais me adaptei a essa vida, nem a essas correrias no trabalho que sempre me perturbaram.
Recebi novas fotos e vídeos de minha filha, Isabela. Ela está crescendo muito rápido, e aprendendo tudo com facilidade singular, sua mãe sempre fora muito dedicada, uma ótima educadora, algo pelo que sou muito grato a ela.
Nesses dois dias vi uma nova mensagem daquela tal amiga virtual, mas não tive tempo de abrir. Fiquei focado no trabalho. Num outro momento olharei aquilo. Afinal, tenho que terminar esses malditos relatórios que são tão insatisfatórios que me causam mal estar. Já é tarde e ainda não jantei nem tomei meu banho para aliviar o corpo cansado e suado.
Reservei alguns minutos para o meu banho de água gelada e, para o jantar, o mesmo cardápio do meio dia. Requentei no forno micro-ondas a comida que sobrara do almoço e mandei ver. A fome era tanta que a massa requentada parecia ainda mais saborosa do que a fresca. Revi a programação do dia seguinte e logo depois me deitei adormecendo rapidamente, pois o corpo estava cobrando descanso.
São exatamente quatro e quarenta e quatro da madrugada...
Acordei pensando naquela mensagem da estranha, mas não ousei abri-la ainda. Não sei de onde veio a voz que me acordou, mas ecoava em meus ouvidos "estamos ficando sem Tempo!". Exausto, virei para o outro lado e dormi novamente.
Acordei atrasadíssimo para o trabalho. Não ouvi o despertador, e quando peguei o celular havia mais de dez ligações não atendidas e vinte e três mensagens não lidas. As mensagens eram todas do mesmo número que me ligara, desconhecido. Traziam todas o mesmo texto: "Estamos ficando sem Tempo!".
Arrumei-me rapidamente e saí para o trabalho de estômago vazio, ainda meio atordoado pelo sono. Como de costume fui caminhando pela avenida e notei que para um dia de semana em horário de pico, não havia movimento algum nas ruas. Os comércios estavam abertos, mas sem pessoas. Achei estranho e comecei a caminhar rua abaixo no intuito de descobrir que tipo de comício ou acontecimento tomava a atenção de todo o povo.
Nada! Ninguém!
Quando quis começar a gritar por alguém, fui agarrado e puxado para um beco e silenciado rapidamente por uma mulher de cabelos escuros usando um lenço que lhe cobria metade do rosto. Observei bem aqueles olhos que compenetrados nos meus, disse:
– ESTAMOS FICANDO SEM TEMPO!
De repente me vi deitado em minha cama novamente...
Na minha cama? Onde eu...? Não foi real? O que foi aquilo? Foi uma visão?! Uma mensagem?
Mas o que eu, uma pessoa comum teria a ver com qualquer coisa fora do normal? Confesso que fiquei um tanto intrigado, e pensando no que ainda não sei dizer se um sonho ou uma visão me levou a ver a única coisa estranha que estava acontecendo, a conversa com a nova amiga virtual.
Saí de casa para seguir aquela rotina entediante de pelo menos um ano. Como dizia um velho amigo, "as coisas não funcionam quando você mais precisa delas". Meu celular estava sem créditos para ligações ou acesso à internet, então tive de correr para o trabalho, desta vez, para matar minha curiosidade e ansiedade usando a internet da empresa para ler a bendita mensagem.
Ao chegar à empresa a rede de internet e telefonia estavam em manutenção devido a uma chuva forte na madrugada, e segundo informações do técnico da companhia responsável pelos serviços a manutenção demoraria horas. Como usávamos a internet para praticamente todas as tarefas que executávamos na empresa, fomos dispensados. Saí daquela espelunca – como sempre gostei de chamar – às pressas, e fui a uma Lan house situada a quatro quadras dali. Aluguei um computador e acessei minha rede social. Para minha surpresa a mensagem que me deixara tão curioso dizia o seguinte:
"Você ainda é muito teimoso! Encontre-me na Rua Kentworth, 12 ás vinte horas do dia em que ler este recado. Estamos ficando sem tempo!".
Tão somente acabara de anotar o endereço em um pedaço de papel, a internet se foi. Fiquei em pé e reclamei que o sinal da internet havia caído. O rapaz verificou rapidamente o problema e disse que era erro no servidor da operadora e que iria entrar em contato. O responsável pelo estabelecimento nos informou minutos depois que não havia prazo para retorno e devolveu o dinheiro de todos que haviam acabado de chegar.
Sorte. Foi o que eu tive naquele momento. Foi o tempo cronometrado para que eu conseguisse o que precisava antes que a internet me deixasse na mão. E agora? Decidi ir até a casa de Jena, minha irmã, para compartilhar esses fatos estranhos com ela. Jekaterina passou a ficar em casa após ter dado luz a um lindo menino loiro de olhos azuis como o céu. Ela sempre estava lá. Era quase impossível não encontrá-la em casa. Jena havia se tornado uma excelente cozinheira, dona de casa e mãe. Uma mulher esforçada. Chamei Jena por quinze minutos ou mais, entre interfones, palmas e gritos.
– Droga! – disse em um tom alto o suficiente para que a vizinha ouvisse.
– Procura a moça que mora aí, rapaz? – perguntou-me a senhora.
– Sim senhora, sabe dela? É importante! – retruquei afoito logo em seguida.
– Ela saiu há uma hora mais ou menos. Não sei para onde foi querido. Posso dar algum recado? – perguntou-me a senhora preocupada.
– Não não senhora, eu retorno mais tarde. Obrigado – agradeci suspeitosamente.
Jena não estava em casa e eu estava quase explodindo de ansiedade desejando compartilhar tudo aquilo com alguém. Escolhi Jena não apenas por ser minha irmã, mas também pelo fato de ser a pessoa com o coração mais puro, gentil e caridoso que já conheci, pois sempre doou muito do seu tempo, que na minha concepção é a coisa mais valiosa que temos depois da própria vida.
Minha segunda opção era meu irmão mais velho que se tornara um grande e bem sucedido empresário, na área de desenvolvimento e programação de websites. Um apaixonado pela profissão e excelente profissional que me prestou socorro em momentos de dificuldade. Para minha falta de sorte, ou sobra de azar, não o encontrei também.
Decidi sentar no banco de uma praça próximo de onde estava. Comprei um pequeno sanduíche para evitar que a ansiedade me devorasse, pois na realidade, não estava me importando com a fome, fiz apenas pela mera necessidade de fortalecer o corpo.
Após o pequeno lanche tive a ideia de compartilhar com Anne o que estava acontecendo, já que não conseguia contato com os outros, mas, como todos, ela também estava incontactável. Então lhe gravei uma mensagem de voz, pedi que entrasse em contato quanto antes possível e pus-me a esperar sentado pela hora que faltava, para que eu tivesse meu encontro com a estranha.
Ela me chamou de teimoso e disse "ainda". Ela já me conhecia? Pensei comigo mesmo.
Dirigi-me para o endereço indicado vinte e cinco minutos antes do horário estipulado por ela, sem ter a mínima noção do que me aguardava.
Acordei com uma sensação estranha no estômago.Ao olhar à frente noto que estamos descendo uma queda d'água! Fiquei desesperado por ver a altura que estávamos caindo, mas logo o Rollet ativou jatos de água que puxava da própria cachoeira, os quais diminuíam a velocidade da queda até o impacto na água ser grandemente reduzido. Seguimos saindo do rio por uma trilha estreita com galhos e pedras que tornavam a experiência um pouco desconfortável.– Que rota interessante você escolheu para nós Baboo? – disse ironicamente.– É um atalho. Relaxa! Logo ficará melhor – disse Baboo relevando minha provocação.Finalmente saímos da
Levantamos nós três mais cedo que Joel e Baboo para treinar, e quando eles chegaram à sala de treinamento duas horas depois, estávamos intercalando os exercícios, fazendo-o da seguinte forma: Enquanto dois atacavam um defendia.– Muito bem! – participou Joel.– Notamos que estão realmente envolvidos e com vontade de aprender. Excelente desempenho na defesa corpo a corpo Isabela! – prosseguiu ele.Agora podemos ensiná-los a manusear facas e espadas – comentou Baboo.Enquanto ele ensinava as meninas a manusear a espada, Baboo me ensinava a usar a faca, ou melhor, a adaga que havia ganhado dela. Ela era de fato muito habilidosa. Extraía de mim todo o potencial que nem eu julgava ser capaz de ter, d
Lembro-me de que havia uma parede de tijolos à vista, uma árvore grande e velha e um pouco de grama meio seca debaixo do sol quente. Meu pai e eu conversávamos sobre as dificuldades da vida e de como alguns momentos bons haviam nos marcado. Ele era um homem demasiadamente ocupado para termos conversas como aquelas. Um empresário bem sucedido, de uma fama e caráter desigual, claro, para os outros era grandioso e, para nós, bem, tínhamos um empresário que em alguns momentos se fazia pai. Ele fazia seu melhor.Especialmente naquele momento, divaguei em meus pensamentos numa recordação valiosa. Com um olhar compenetrado e sério me disse:— "Filho, não importa o que você deseje. Um homem não pode fugir do seu destino. Encontre o seu".Nossos olhos contemplaram o que havia à frente. Uma esfera gigante que representava Belácia.<
"Intensa" era a melhor palavra para descrever aquela noite.Acordei algumas horas depois de termos nos deitado, não sabia dizer que horas eram, apenas que era de madrugada. Não vi Isabela. Acordei Léa, e sem muito alarde saímos em busca de Isabela, andando nas proximidades do lugar onde estávamos alojados e... — Olhe, Rick! Um respirador! Deve ser da Isabela! Onde será que ela foi parar? Eles a levaram? Nós não conhecemos essa gente, Rick! Ela é apenas uma menina! — disse Léa completamente preocupada. Eu também estava, mas sabia que não tinha nada a ver com os belacianos.— Léa, vamos continuar procurando — disse sério e muito apreensivo.Encontramos seu respirador em cima de uma mureta próxima a escadaria que saía do terreno do palácio do Governador, mas nada dela. Mais preocupados do que antes voltamos para o aloj
A selva tinha um cheiro estranho.Aquelas árvores, além de vermelhas, eram duas vezes maiores que as árvores históricas da Terra, mosquitos pretos grandes que não picavam, mas tínhamos que os tocar de nossa visão constantemente. O chão úmido era repleto de plantas carnívoras amarelo-mostarda, pequenas, bastava cair em cima delas para que elas devorassem algum de nós.Não sabíamos para qual direção seguir, com aquela escuridão não seria tão fácil encontrar o que procurávamos, então, fomos ao centro da selva. O Ovo de Ezcrat estava lá em algum lugar, mas não fazíamos ideia de onde, portanto, nos separamos em dois grupos para cobrir maior território de procura, mas estávamos sempre na visão uns dos outros.A selva tinha uma pequena inclinação que nos fazia descer indo em
No jardim andamos calmamente e paramos junto a um banco de madeira vermelha, muito bonito, com forma de animais esculpidos nele, como tessínios, túllos e madrícos, iguais aos outros bancos.Os túllos lembravam cachorros pelo seu comportamento, mas na aparência eram animais pequenos de aproximadamente quinze centímetros, com apenas duas pernas, cauda curta, pele castanha clara com manchas beges pelo corpo, sem pelos, com duas asas bem pequenas no lugar dos braços; cobertas por penas e a cabeça era muito parecida com a de um Bicho-preguiça. Já os madrícos eram animais de carga com quatro patas iguais às de urso e unhas grossas, corpo forte, dois metros de altura, andavam com as quatro patas a maior parte do tempo, como ursos, peludos da cor cinza claro, uma casca marrom grossa nas costas para suportar o peso e uma feição dócil, era
Sentamos nos bancos entalhados. O processo de acordar o Ezcrat chamou a atenção dos tessínios, por isso havia muitos voando e sobrevoando o jardim, que o deixou mais belo.— Você já sabe como pretende chamá-lo, Isabela? — perguntou Léa curiosa.— Não, mas tenho uma ideia — respondeu Isabela.— E quais são suas sugestões? — especulou Léa.— Lily, Dida ou Belinha... — disse Isabela torcendo a boca.— Sério? — retrucou Léa um tanto impressionada com as sugestões.— Claro que não, Léa! É brincadeira!
No dia de seu nascimento eu estava lá, em pé, ao lado da mesa de cirurgia, acompanhei cada segundo de seu nascimento. Quando o médico obstetra começou a cortar a barriga de Rubi eu já filmava acompanhando tudo desde o princípio. Vi-o cortar as três camadas de pele, rasgar a bolsa e puxá-la para fora, que com um choro começou a experimentar a vida.Ela nasceu saudável, com três quilos e trezentos gramas e quarenta e nove centímetros.— Quer cortar o cordão, pai? — perguntou-me o médico obstetra.— Posso? — retruquei imediatamente. — Claro! Venha cá — disse o médico...
Último capítulo