Margot desceu do cavalo e abraçou a garotinha, os cabelos negros e lisos macios ao toque. O cheiro de óleos era maravilhoso, espalhava-se pelo vento enquanto ela se movia.
— Você se foi sem se despedir— cobrou ela.
— Perdoe-me, Suzana— Margot ajoelhou-se.— Talvez isso compense um pouco a minha falta de delicadeza.
Estendeu o punho fechado e pôs um monte de doces nas mãos da garota, que mal pôde segurar entre os dedos, seu sorriso encantava na tarde que crescia.
— Você sabe negociar— a garota piscou e riu.
— Um pouco de doce e ela se esquece que não vê o pai há dias— lançou Viggo e pegou-a no colo.— Incrível. Por que você não me dá esse de caramelo?
— Não tem nenhum de caramelo.
— Estava falando do seu beijo.
— Ah!— Suzana inclinou-se de forma desajeitada e beijou-lhe o rosto.
— Não espere essa mesma recepção da minha parte— a esposa de Viggo apareceu à porta, encarando-o.— Você disse três dias no máxim
Agnes despertou envolta em cobertores de seda, sobre travesseiros macios de penas de ganso e um colchão tão fofo que era como se o maior algodão do mundo tivesse brotado sob ela. Tamanho conforto destoava com o que sentia por dentro, se um dia um castelo ruísse e despencasse a sua frente, a mulher saberia que a devastação de mais cem como aqueles não se compararia às rachaduras que se abriam em seu peito. Tateou com a mão e não sentiu o pelo macio de Acerbel, o seu gato de estimação, muitas vezes a única criatura que parecia gostar da sua companhia.Chamou por ele cinco vezes antes de se levantar e procurá-lo pelo quarto. Olhou no seu banheiro, na varanda, no compartimento de roupas e não viu uma sombra do felino.Deixou o quarto com suas roupas de dormir e decidiu procurá-lo pelos outros cômodos. Passou pelo escritório de Sandir e encontrou o lugar inalterado, era onde sempre podia encontrar o marido lendo livros ou escrevendo cartas para suas amantes. Ela sabia dos cas
A água borbulhava e tomava uma coloração alaranjada, o aroma do chá era delicioso, subia e amortecida seu rosto cansado com o calor. Retirou a chaleira do fogo e serviu-se da infusão em uma xícara de porcelana trincada na borda, sua companheira mais antiga, inquebrável de uma forma que ele também queria ser. Aron voltou-se para sentar na sua poltrona e teve uma esperada surpresa.— Não vai me oferecer um pouco?— Perguntou Eleanor.— Se tiver chocolate quente, ficaria mais satisfeita.— Satisfação não é o mesmo que necessidade. A noite está fria, mas não o bastante.— Então que beba sozinho— ela indicou a cadeira à frente.— Sente-se. Você sabe que precisamos conversar, e essa conversa pode ser longa.Aron não se recusou nem rebateu, obedeceu com passos lentos, ainda parecia bastante machucado.— Ouvi os rumores pela cidade— disse ele.— Sua fuga solitária e silenciosa está na boca de todos. A Lábios Es
— Então você é a que chamam de Lábios Escarlate?— Perguntou, observando a mulher que apontava a espada com mãos trêmulas em sua direção, encarando-a como uma inimiga.— Estou impressionada. Não esperava que mexesse com magia. Foi assim que conseguiu escapar do Subsolo?A expressão dela disse tudo.— Acho que entendi, está descobrindo esse dom agora.— Não é um dom.— Se considera ou não, o fato é que agora ganhará uma cela em um nível mais profundo.— O que significa?— Parecia ter dificuldade em continuar segurando a arma.— Você verá— Margot apontou para o corpo de Héder.— Esse daí não era o mais querido por todos, então talvez ninguém a assassine, mas longos anos a esperam. Quer se render normal ou lutando? Caso p
Sandir estava no seu salão secreto de armas. O mesmo em que três pares de asas, suas maiores relíquias, foram levadas. O mesmo em que encontrara o corpo de Eudora mutilado. A marca do seu sangue ainda maculava o piso de lajotas de pedras. Ele formou um círculo com mais de cem velas e ficou no centro, recebendo a iluminação bruxuleante de cada uma delas. As únicas sombras que o circulavam, mesmo que quase inexistentes, eram as dele mesmo. Colocou armas no espaço que o distanciava das velas, um arsenal pronto para quando o demônio viesse, ele viria. Sabia que estava certo.— Matarei o desgraçado— dizia enquanto segurava uma besta, aquela que estava ao lado da sua filha quando a encontrou.— Será com a mesma flecha que não conseguiu disparar. Eu o...Libertou um grito de dor, lágrimas escorriam do seu rosto, mas a sua mente trazia de volta a lembrança do sangue
Sua cabeça girava, a visão embaçada não permitia ver onde estava e aonde ia, a dor de cabeça mal permitia abrir os olhos, mas ela conseguia ouvir e entender o que falavam.— Se esse corte descesse mais um pouco, significaria a morte dela— alguém a tocava no ombro, onde antes sentia uma dor absurda, agora sentia um leve formigamento.— Menos uma para salvarmos— uma segunda voz fez escárnio.— Que desperdício de talento nosso, curá-los para apodrecerem no Subsolo. Seria mais prudente se seguíssemos a linha do Império, pena de morte àqueles que nada valem.— Silêncio! Continue seu trabalho.Poderiam ter se passado horas ou segundos sem que sua consciência fragmentada percebesse, porém quando recuperou parte dos seus sentidos, escutou portões se abrindo e chaves se chocando de maneira irritante.— Olha, Donnie, é ela. Tentou arrancar o meu braço, a assassina.— Estou vendo, Rick. Pensei
— Um prazer revê-lo, Cian— disse Margot.— Agora entendo porque veio até mim aquela noite nos campos de treinamento, sabia que estávamos caçando você. Pretendia me matar?— Se eu pretendesse, teria conseguido— sorriu para ela.— Cretino convencido, adoraria eu tirar essa expressão presunçosa da sua cara. Pensei que tivesse sido sincero em tudo que disse, uma luz no presente... Por quanto tempo ensaiou aquele discurso mentiroso?— Não costumo sair à noite para contar mentiras, não sempre.— Namorados— disse Álibi.— A tensão tá tão grande que se déssemos tempo e espaço a eles, fariam como dois animais no cio.— Cala a boca— Ordenaram em uníssono, Margot foi até a cela de Bill:— Esse aqui é quem estou pensando?— Seu pai, querida? Sou, me tire daqui, estou com saudades da sua mãe.— Viggo, onde está as chaves?— ela perguntou, sem tirar os olhos do infeliz.— Vou matar es
Eles foram traídos. Era a forma mais simples de dizer. O reino de Naglyacxa era um dos primeiros no caminho do Império para conquistar terras que levassem ao acesso do mar navegável de Druk'malor. Era onde se concentrava a maior magia do continente, era onde vivia a maior sociedade unida dos da sua raça. Cian lembrava, as cidades eram belas e prósperas, não podia se esquecer da primeira vez que pôde voar de verdade. Ele odiava o vento por julgar que o iludia, dizia que a força invisível via sua vontade de se unir ao céu e o derrubava de cara no chão para se fartar de rir. No dia que usou suas pequenas asas com sucesso, todavia, aprendeu a amar o ar. Aprendeu a amar seu lar. Era perfeito, Cian era feliz. Uma sombra o cobriu, viu seu pai ao olhar para cima, sorrindo orgulhoso para ele. Um movimento rápido do seu lado roubou sua atenção, era sua mãe. O assistia com graça, porém mais preparada para pegá-lo se começasse a cair.Por que estava pensando nisso? Por que rele
Algo alertava a Eleanor que sua dor de cabeça iria piorar.— Essa noite— disse Margot—, horas atrás. Alguém com o conhecimento dos nossos objetivos invadiu a casa de Viggo e matou sua esposa e sua filha. Um desgraçado mascarado que já sabia da nossa missão!— Sinto muito, mas é impossível ter sido um de nós— argumentou Álibi.— Se eu saísse daqui e matasse a família dele, com certeza não voltaria para cá, querida.— Filho da puta— ela agarrou as barras da cela dele e chutou.— Arrancarei sua língua. Podem não ter feito isso diretamente, mas podem ter contatado alguém de fora.— Impossível, acha que nunca tentei enviar mensagens para fora daqui? Não tem como, nem mesmo se eu criar um clone de mosca, esses guardas.