Virgínia se perdeu fácil naquelas lembranças. Algumas suas e algumas de outras vidas que ela não reconhecia.
Apesar de ser agradecida por não carregar o pior dos traumas que o sistema tinha vivido, o coração de Virgínia se partia todas as vezes em que pensava no que tiveram que passar para se tornarem o que eram.
Nessas horas, não podia evitar sentir um certo ódio pelo mundo e a maldade que habitava nele.
Estava com uma moldura na mão, a paisagem de um lugar em que ela não se lembrava de ter estado, quando foi acometida por uma sensação estranha na boca do estômago, muito semelhante com um ataque súbito de ansiedade.
Largou tudo e saiu da casa da pra
Assim que o ônibus atravessou os limites para a cidade natal de Vince, Travor sentiu que havia algo de muito errado naquele lugar. O ar era úmido e frio, provocando um efeito pegajoso e desagradável, como se vestir um agasalho fosse sufocante e abafado contra a pele, mas impossível de ser evitado por conta da temperatura.Ao entrar na zona habitada, Travor não teve dúvidas de que o problema era muito maior do que ele tinha imaginado. Não havia vida no andar daquelas pessoas, tudo ali parecia antigo e parado no tempo, um ponto morto no mapa disfarçado de normalidade.Travor foi o único a descer no ponto final e o motorista se adiantou em ir embora logo e fazer seu caminho de volta, não antes de lançar um olhar preocupado para aquele jovem de estilo tão estranho que escolhia
O processo de caminhar de um lado para o outro com impaciência era diferente para Cora agora. Era cansativo e seu corpo doía onde seus músculos compensavam pelo que faltava e seu cérebro estava exausto de procurar pelas melhores formas de conciliar os movimentos com esses dois membros artificiais novos.Cora entendia que era isso o que as muletas seriam para ela dali pra frente: indispensáveis.Ela não planejava permitir que sua deficiência física a impedisse de fazer o que precisava ser feito. Sua agitação nesse sentido era tanta, tendo que esperar enquanto outra pessoa resolvia os problemas, que Cora desistira de tentar manter qualquer aparência de controle sobre sua ansiedade.Além disso, Cora não queria admitir, mas parte de
Havia um pub e esse pub estava rodeado de corvos.Cora revirou os olhos para a cena e não pensou duas vezes antes de entrar, sabia quem veria lá dentro e, se ela queria ter alguma notícia dos idiotas que se dispuseram a quebrar a maldição e desapareceram, ele poderia servir pra alguma coisa.O bar estava praticamente vazio, exceto por duas pessoas que conversavam no balcão. Não haviam nem mesmo pessoas trabalhando por ali.Os cabelos loiros, corpo musculoso e roupas de couro que Cora esperava ver pertenciam a uma dessas pessoas. Como era mesmo o nome dele? Tentou se lembrar, mas era como se tivessem passado anos desde que tiveram contato e este fora tão rápido que ela
Dorothy, como Travor veio a descobrir durante o percurso, era uma lenhadora e morava em uma casa afastada, quase nos limites da cidade, o que explicava sua aparência robusta e, talvez, o fato de que ainda existia nela algum traço de curiosidade, a ponto de fazê-la abordá-lo no café. Algo que nenhum dos outros cidadãos teve o ímpeto de fazer.Travor podia ver que ela entendia o quanto era importante pra ele investigar o paradeiro de Vince, mas o medo e a inquietação que os eventos que ocorreram naqueles lugares específicos (a cabana e a casa onde a família Levit se desfez) faziam com que Dorothy não parasse de resmungar o quão estúpido e insensato ele era por querer se embrenhar no mato, sozinho, onde nem os animais iam mais.Quando se separaram, ela o deixou, como pr
Cora ficou na escuridão por tanto tempo que, quando trazida de novo para a superfície, a claridade quase a cegou.Enquanto piscava para se adaptar aos seus novos arredores, Cora se certificou de que ainda segurava firme das muletas e que se encontrava sentada no mesmo chão sólido de madeira do bar e não flutuando em um completo estado de breu.À sua volta, gemidos e sinal de movimentação indicavam que ela não estava sozinha.Do seu lado esquerdo, com olhos lacrimejantes e semicerrados, estava o sistema e, do outro, bocejando como se estivesse acordando de uma soneca da tarde, estava Tony. Os olhos dele estavam com a aparência normal dos de um ser humano e Cora se pegou respirando aliviada sabendo que as chances dele ter voltado a si eram grandes.
Tony não entendia como era possível ter desejado tanto retomar o controle de seu corpo e reencontrar aquelas pessoas apenas para passar tanta raiva logo em seguida.Ele tinha a certeza de que agora que estavam reunidos, seria natural que eles unissem forças para ajudar Travor e retribuir os favores que ele estava fazendo por eles. Entretanto, Tony havia esquecido o quão babaca e cabeça dura June podia ser.— Você não percebe que essa é uma saída que ele está oferecendo pra gente, Tony? – June argumentou. — Ele claramente não nos quer mais envolvidos do que já estamos. Bom, eu não quero ficar mais envolvido. Não chega de loucuras e monstros pra você!?
O céu se fechou e começou a chover pouco depois que pegaram a estrada e June achou esse evento incrivelmente apropriado. Ele não queria conversar, não queria aturar Antonie cantando vitória, satisfeito, como se ele não estivesse contribuindo para que cometessem um grande erro.Tony era um garoto burro e ingênuo que ainda acreditava que poderia salvar todo mundo e que finais felizes existiam. Era cabeçudo demais para escutar e entender a real situação em que estavam.Não era uma brincadeira. Aquilo não era um jogo.O barulho da chuva sobre o carro abafou qualquer tentativa de Tony para engajar uma conversa. A amargura que June sentia no fundo da garganta parecia ter se espalhado dentro daquela azeitona horrorosa.
Travor gostaria de dizer que estava se sentindo mais leve depois de fazer o seu melhor para corrigir os erros que cometeu com aquelas pessoas, mas era difícil ter qualquer sentimento positivo quando se estava fadado a passar a noite acampando em um lugar abandonado no meio de uma mata amaldiçoada, com apenas uma lanterna e barras de cereal.Depois que terminaram de definir os termos do acordo, Mack não teve nenhuma dificuldade em encontrar o caminho de volta por onde veio. Mesmo sem os seus corvos, que pareciam ter se recusado a adentrar aquele lugar, ele apenas seguiu com toda a confiança do mundo e desapareceu na escuridão noturna. A teoria de Travor era de que o sujeito simplesmente não precisava parar para nada, nem para beber água ou retomar o fôlego, e, dessa forma, seguir por uma linha reta não se transformava em um pesadelo.<