Havia um pub e esse pub estava rodeado de corvos.
Cora revirou os olhos para a cena e não pensou duas vezes antes de entrar, sabia quem veria lá dentro e, se ela queria ter alguma notícia dos idiotas que se dispuseram a quebrar a maldição e desapareceram, ele poderia servir pra alguma coisa.
O bar estava praticamente vazio, exceto por duas pessoas que conversavam no balcão. Não haviam nem mesmo pessoas trabalhando por ali.
Os cabelos loiros, corpo musculoso e roupas de couro que Cora esperava ver pertenciam a uma dessas pessoas. Como era mesmo o nome dele? Tentou se lembrar, mas era como se tivessem passado anos desde que tiveram contato e este fora tão rápido que ela
Dorothy, como Travor veio a descobrir durante o percurso, era uma lenhadora e morava em uma casa afastada, quase nos limites da cidade, o que explicava sua aparência robusta e, talvez, o fato de que ainda existia nela algum traço de curiosidade, a ponto de fazê-la abordá-lo no café. Algo que nenhum dos outros cidadãos teve o ímpeto de fazer.Travor podia ver que ela entendia o quanto era importante pra ele investigar o paradeiro de Vince, mas o medo e a inquietação que os eventos que ocorreram naqueles lugares específicos (a cabana e a casa onde a família Levit se desfez) faziam com que Dorothy não parasse de resmungar o quão estúpido e insensato ele era por querer se embrenhar no mato, sozinho, onde nem os animais iam mais.Quando se separaram, ela o deixou, como pr
Cora ficou na escuridão por tanto tempo que, quando trazida de novo para a superfície, a claridade quase a cegou.Enquanto piscava para se adaptar aos seus novos arredores, Cora se certificou de que ainda segurava firme das muletas e que se encontrava sentada no mesmo chão sólido de madeira do bar e não flutuando em um completo estado de breu.À sua volta, gemidos e sinal de movimentação indicavam que ela não estava sozinha.Do seu lado esquerdo, com olhos lacrimejantes e semicerrados, estava o sistema e, do outro, bocejando como se estivesse acordando de uma soneca da tarde, estava Tony. Os olhos dele estavam com a aparência normal dos de um ser humano e Cora se pegou respirando aliviada sabendo que as chances dele ter voltado a si eram grandes.
Tony não entendia como era possível ter desejado tanto retomar o controle de seu corpo e reencontrar aquelas pessoas apenas para passar tanta raiva logo em seguida.Ele tinha a certeza de que agora que estavam reunidos, seria natural que eles unissem forças para ajudar Travor e retribuir os favores que ele estava fazendo por eles. Entretanto, Tony havia esquecido o quão babaca e cabeça dura June podia ser.— Você não percebe que essa é uma saída que ele está oferecendo pra gente, Tony? – June argumentou. — Ele claramente não nos quer mais envolvidos do que já estamos. Bom, eu não quero ficar mais envolvido. Não chega de loucuras e monstros pra você!?
O céu se fechou e começou a chover pouco depois que pegaram a estrada e June achou esse evento incrivelmente apropriado. Ele não queria conversar, não queria aturar Antonie cantando vitória, satisfeito, como se ele não estivesse contribuindo para que cometessem um grande erro.Tony era um garoto burro e ingênuo que ainda acreditava que poderia salvar todo mundo e que finais felizes existiam. Era cabeçudo demais para escutar e entender a real situação em que estavam.Não era uma brincadeira. Aquilo não era um jogo.O barulho da chuva sobre o carro abafou qualquer tentativa de Tony para engajar uma conversa. A amargura que June sentia no fundo da garganta parecia ter se espalhado dentro daquela azeitona horrorosa.
Travor gostaria de dizer que estava se sentindo mais leve depois de fazer o seu melhor para corrigir os erros que cometeu com aquelas pessoas, mas era difícil ter qualquer sentimento positivo quando se estava fadado a passar a noite acampando em um lugar abandonado no meio de uma mata amaldiçoada, com apenas uma lanterna e barras de cereal.Depois que terminaram de definir os termos do acordo, Mack não teve nenhuma dificuldade em encontrar o caminho de volta por onde veio. Mesmo sem os seus corvos, que pareciam ter se recusado a adentrar aquele lugar, ele apenas seguiu com toda a confiança do mundo e desapareceu na escuridão noturna. A teoria de Travor era de que o sujeito simplesmente não precisava parar para nada, nem para beber água ou retomar o fôlego, e, dessa forma, seguir por uma linha reta não se transformava em um pesadelo.<
Encontraram Travor parado em frente à casa que os moradores diziam ser a origem da tragédia da cidade. Ele parecia a estátua de um baixinho, ruivo e malafrojado encarando a porta de entrada de um lugar caindo aos pedaços.Ele estava pálido e parecia concentrado demais em apenas respirar, golfadas curtas de ar, como se estivesse tentando se acalmar, ou, o que era mais provável, tomar coragem.June não fazia ideia do que se passou com Travor no meio tempo em que estiveram longe, mas sua aparência era péssima. Haviam cortes e sujeira em suas roupas, os cabelos amarrados de qualquer jeito, pendendo para um lado e o rosto fundo, como se não dormisse ou se alimentasse há dias.A finura de sua pele destacava ainda mais sua expressão de foco
— Eu acho que antes de pensar em quebrar uma janela, a gente devia, sei lá, bater na porta. – June disse, ao perceber a hesitação de Travor, que esperava perto de uma das janelas (as cortinas escuras bloqueavam a visualização do interior e, quem quer que estivesse lá dentro, escolheu iluminar somente o andar de cima) — Se ninguém atender, o que é muito provável, eu arrombo. Vai economizar tempo e você não vai se borrar todo.Travor gostaria de conhecer uma magia que pudesse silenciar pessoas insuportáveis. Mas, infelizmente, tudo o que ele sabia eram longos textos em uma língua quase esquecida para obter resultados temporários. E, mais infeliz ainda, logo nem isso ele saberia mais.— Cala a boca. – replicou, erguendo a mão, pedin
June se sentia okay em lidar com um homem tendo uma crise psicótica. Vince aparentava delirar e ter alucinações com todas aquelas cenas que narrara a eles. Ele precisava de ajuda profissional e não de um cara com uma chave de roda na mão e uma mulher com uma arma pendurada no ombro.Subiram atrás dele até o segundo andar, e ali o ar era quase irrespirável. Cheiro de poeira, mofo e restos de coisas em decomposição, fora o que ele não conseguia identificar, tudo abafado. June fez uma nota mental de abrir a primeira janela que tivesse acesso.No final do corredor havia uma porta entreaberta, o quarto que tinha a luz acesa do lado de fora. Vince terminou de abri-la da mesma forma como fez com a porta de entrada, com polidez e teatralidade.Último capítulo