No cais de travessia do rio da Cidade R.Ao lado do armazém, se ergue uma casa térrea que parece um pouco desgastada pelo tempo.Era hora do almoço e o aroma da comida escapava pelos corredores, se misturando com a névoa sobre o rio.Um leve cheiro de medicamento se fundia ao odor dos alimentos, mas era difícil de perceber.No final do corredor da casa, Zeca estava na porta de um quarto, segurando uma caixa estreita e hesitando em entrar.- Senhor Guilherme, trouxe as coisas de volta. - Disse Zeca. Contrariando a aparência deteriorada da casa, o interior do quarto, embora pequeno, era completamente equipado, comparável a um hotel cinco estrelas.Guilherme estava sentado no sofá junto à parede.Neste profundo outono, ele estava sem camisa, as cicatrizes marcadas em seu torso e abdômen, especialmente a ferida no abdômen, que mostrava um tom marrom-escuro após ser medicada, junto com a cicatriz feroz, se tornava ainda mais assustadora.Ele estava ocupado aplicando medicamento em si mesmo
Às seis da tarde, no momento do jantar, a cozinha da Mansão Borges também começou a fumegar. Todos sabiam que Benjamim queria provar o sabor do arroz de marisco e, por isso, pediu ao cozinheiro que limpasse o fogão para começar a preparar o jantar. Quando Lorenzo e seu grupo chegaram, o aroma fresco do arroz já estava se espalhando pela cozinha.O velho, que vivia há muito tempo na Cidade A, sentia saudades de alguns aspectos de sua vida anterior e até mexeu nos ingredientes para evitar que grudassem na panela. Ao sentir o cheiro delicioso da comida pronta, um sorriso se espalhou pelo seu rosto envelhecido.Naquele momento, ele estava misturando alho picado, azeite e outros temperos antes de os despejar sobre um prato de sardinhas assadas. Foi então que ouviu Vasco dizer:- Sr. Benjamim, o Mestre Lorenzo voltou.Benjamim não respondeu e continuou a levar a comida fumegante para a sala de jantar. Assim que terminou, disse:- Se afastem, se afastem! Este peixe acabou de ser assado, c
Lorenzo, contudo, se sentia revigorado. Após passar tanto tempo com Pedro ele aprendeu o valor de dizer o que pensava. Anteriormente, por conta de sua posição, não havia ninguém a quem ele considerasse digno de ser repreendido com tais palavras e tom, mas aquele era o momento ideal para um desabafo.Ele não acreditava que a família Borges, aquela figura astuta, faria algo contra Tatiana. Como o velho havia dito, ele certamente desprezava a modesta família Orsi da Cidade B.Mas, olhando para a situação atual da Cidade R, ninguém além dele tinha a capacidade de retirar um paciente ainda inconsciente do hospital sem deixar vestígios.No hospital da família Lacerda, além dos seus, havia também pessoas da família Orsi de guarda.O resultado foi que, no meio da tarde, Tatiana desapareceu sem deixar vestígios.Mas era óbvio que, além de Benjamim, ninguém teria tal capacidade.Vasco ainda estava muito preocupado com a atitude de Lorenzo, e sua face envelhecida e resoluta mostrava grande desco
Pedro, com seu temperamento explosivo, simplesmente não conseguiu se segurar e avançou com raiva.No entanto, antes que pudesse fazer algo estúpido, Leopoldo o interrompeu.Leopoldo segurou seu pulso firmemente e balançou a cabeça de maneira contida, seu olhar era firme.Pedro, embora impulsivo, não era tolo. Ele engoliu sua raiva e olhou furiosamente para o velho.Benjamim, por outro lado, não se importava, para ele, os jovens à sua frente eram apenas crianças incapazes de fazer grande coisa, e não valia a pena se preocupar com eles.Afinal, mesmo que aquelas pessoas não gostassem dele, não poderiam fazer nada.Lhes faltava poder e influência.- Senhores, se ainda há algo que desejam discutir, podem esperar que o Sr. Benjamim termine o jantar ou vir visitá-lo amanhã. Se não há mais nada, fiquem à vontade, pois o jantar desta noite é limitado e, infelizmente, não podemos recebê-los. - Disse Vasco, depois se virou para Lorenzo. - Mestre Lorenzo, se desejar ficar para jantar, vou pedir à
- Mestre Guilherme, há notícias do velho senhor. - Disse Zeca, hesitante.Na cabana ao lado do cais, ao longo da margem do rio, cercada por uma grade, o local que antes era coberto de flores e ervas, agora tinha sido transformado em um píer de pesca. Um terraço de madeira estava decorado um grande guarda-sol, uma mesa de madeira e cadeiras reclináveisZeca esperava ao lado de Guilherme com um tablet em mãos, cuja tela piscava incessantemente com novas mensagens. Guilherme, com sua vara de pesca posicionada à frente, pegou o tablet sem muito interesse e disse:- Como está aquela mulher?Sua voz era desinteressada, mas sua expressão se tornou mais sombria ao ler as mensagens no tablet, e o sorriso astuto gradualmente desapareceu.Zeca observou a mudança na expressão do jovem senhor, incerto se deveria informar sobre a condição de Tatiana. Com hesitação, ele revelou a verdade:- O médico disse que ela não tem nada grave, está esperando que ela acorde para administrar o medicamente, mas e
Quando as chamas irromperam à beira do rio, uma balsa turística deslizou lentamente sobre as águas, refletindo as cores dos neons e criando ondulações na superfície.No convés da frente, Guilherme casualmente jogava seu terno sobre os ombros.Ele apoiou o queixo com a mão enquanto observava o incêndio que eclodia na casa térrea ao longe, o vento de outono soprava livremente em seu rosto. Seus olhos negros brilhavam enquanto seus dedos longos e magros ritmavam levemente na grade, como se tocassem uma música em um piano clássico.- Você acha que as faíscas são bonitas? - Perguntou Guilherme.Atrás dele estava um homem de meia-idade vestido com um jaleco branco e óculos.Este último, com o rosto inexpressivo, observou o incêndio na margem do rio por um momento antes de responder lentamente:- Mestre Guilherme, a senhorita que você trouxe a bordo já acordou. Você gostaria de ir vê-la?Guilherme ergueu as sobrancelhas e se virou surpreso para o homem atrás dele.- Ela acordou? - Ele caminho
- É mesmo? - Guilherme hesitou por um momento. - Então, Tati, me diga, o que mudou em mim?Tatiana olhou para o rosto familiar à sua frente, claramente confusa.- Eu...Embora fosse idêntico ao que lembrava, algo parecia estranho, como se aquele tom de voz não pudesse vir de Lorenzo.Mas se não era Lorenzo, quem mais poderia ser?Ela balançou a cabeça e disse:- Não consigo explicar direito, só sinto que você está um pouco diferente. Além disso, Loh, você...Guilherme insistiu:- Além disso, o quê?Tatiana mordeu o lábio, visivelmente triste.- Além disso, você gostava da Carolina, ficava impaciente ao me ver, até me pediu para ficar longe de você. Por que agora está aqui cuidando de mim?Ela estava claramente abalada, relutante em olhar para o homem à sua frente, seus olhos caíram sobre o cobertor que ele havia acabado de arrumar.Guilherme riu levemente e disse:- Carolina? Então você se incomoda tanto com aquela mulher?Havia um tom de escárnio em sua voz.Não estava claro se ele es
O vento frio do outono uivava.Ao ouvir aquelas palavras, Guilherme levantou os olhos para a figura imponente ao seu lado e resmungou:- Dr. Severino, se eu pudesse discernir a verdade, por que desperdiçaria meu tempo pedindo que você fosse verificar? Você acha que estou entediado?O médico que Guilherme havia trazido a bordo era Severino Lacerda, o filho mais velho da família Lacerda e irmão de Ademir.Os Lacerda tinham uma longa tradição em medicina, e Severino seguiu o caminho da família.No entanto, ele não possuía o mesmo talento médico de Ademir, e naturalmente não tinha a mesma posição no hospital que seu irmão, que era obcecado por medicina.Mas um Lacerda, mesmo não sendo o mais talentoso entre os seus, ainda era capaz de se destacar por conta própria.E na Cidade R, os únicos jovens médicos que Guilherme considerava dignos de atenção eram os Lacerda.Severino colocou as mãos nos bolsos, com um sorriso indiferente no rosto.- Se não me falha a memória, Mestre Guilherme sempre