Quando as chamas irromperam à beira do rio, uma balsa turística deslizou lentamente sobre as águas, refletindo as cores dos neons e criando ondulações na superfície.No convés da frente, Guilherme casualmente jogava seu terno sobre os ombros.Ele apoiou o queixo com a mão enquanto observava o incêndio que eclodia na casa térrea ao longe, o vento de outono soprava livremente em seu rosto. Seus olhos negros brilhavam enquanto seus dedos longos e magros ritmavam levemente na grade, como se tocassem uma música em um piano clássico.- Você acha que as faíscas são bonitas? - Perguntou Guilherme.Atrás dele estava um homem de meia-idade vestido com um jaleco branco e óculos.Este último, com o rosto inexpressivo, observou o incêndio na margem do rio por um momento antes de responder lentamente:- Mestre Guilherme, a senhorita que você trouxe a bordo já acordou. Você gostaria de ir vê-la?Guilherme ergueu as sobrancelhas e se virou surpreso para o homem atrás dele.- Ela acordou? - Ele caminho
- É mesmo? - Guilherme hesitou por um momento. - Então, Tati, me diga, o que mudou em mim?Tatiana olhou para o rosto familiar à sua frente, claramente confusa.- Eu...Embora fosse idêntico ao que lembrava, algo parecia estranho, como se aquele tom de voz não pudesse vir de Lorenzo.Mas se não era Lorenzo, quem mais poderia ser?Ela balançou a cabeça e disse:- Não consigo explicar direito, só sinto que você está um pouco diferente. Além disso, Loh, você...Guilherme insistiu:- Além disso, o quê?Tatiana mordeu o lábio, visivelmente triste.- Além disso, você gostava da Carolina, ficava impaciente ao me ver, até me pediu para ficar longe de você. Por que agora está aqui cuidando de mim?Ela estava claramente abalada, relutante em olhar para o homem à sua frente, seus olhos caíram sobre o cobertor que ele havia acabado de arrumar.Guilherme riu levemente e disse:- Carolina? Então você se incomoda tanto com aquela mulher?Havia um tom de escárnio em sua voz.Não estava claro se ele es
O vento frio do outono uivava.Ao ouvir aquelas palavras, Guilherme levantou os olhos para a figura imponente ao seu lado e resmungou:- Dr. Severino, se eu pudesse discernir a verdade, por que desperdiçaria meu tempo pedindo que você fosse verificar? Você acha que estou entediado?O médico que Guilherme havia trazido a bordo era Severino Lacerda, o filho mais velho da família Lacerda e irmão de Ademir.Os Lacerda tinham uma longa tradição em medicina, e Severino seguiu o caminho da família.No entanto, ele não possuía o mesmo talento médico de Ademir, e naturalmente não tinha a mesma posição no hospital que seu irmão, que era obcecado por medicina.Mas um Lacerda, mesmo não sendo o mais talentoso entre os seus, ainda era capaz de se destacar por conta própria.E na Cidade R, os únicos jovens médicos que Guilherme considerava dignos de atenção eram os Lacerda.Severino colocou as mãos nos bolsos, com um sorriso indiferente no rosto.- Se não me falha a memória, Mestre Guilherme sempre
Anteriormente, Benjamim era muito arrogante, acreditava que o poder prevalecia e que as regras eram apenas muros construídos para os fracos. Agora, ele mesmo oferecia ajuda.Era algo quase inacreditável.Sem esperar qualquer reação dos irmãos da família Orsi, Benjamim já estava se afastando com seu corpo visivelmente cansado.- Leo, o que você acha que ele quis dizer? - Perguntou Eduardo.Leopoldo observou a figura do ancião se afastando com um olhar pensativo.- Que seja o que ele quis dizer, se a família Borges quer intervir e ajudar, não vou reclamar. Quanto a nós, só precisamos continuar cuidando dos nossos assuntos. - Disse ele. - E a nossa irmã, alguma notícia?Com a menção à Tatiana, o semblante de Eduardo se tornou mais grave.- Ainda não temos notícias. - Ele lançou um olhar para a sala de emergência, a emoção em seus olhos era complexa. - Desta vez, devemos um favor a ele.Se antes, a atitude indiferente da família Orsi em relação a Lorenzo era até compreensível, Lorenzo agor
Tatiana não se lembrava de Lorenzo olhando para ela com tal intensidade. Mesmo depois do retorno de Carolina, quando ele mostrava sinais de impaciência para com ela, ele apenas a evitava ou mantinha uma expressão fria.Será que a personalidade dele poderia ter mudado tanto nos anos em que ela perdeu a memória?O homem à sua frente era realmente Lorenzo?A garota, parada no quintal, tinha o rosto pálido e os olhos negros, confusos e inocentes, e permaneceu parada em silêncio, incapaz de continuar sua fala.Guilherme, percebendo que sua expressão havia sido severa demais, suavizou o olhar e colocou um sorriso falso nos lábios.- Tati, por que você saiu? O Dr. Severino não te disse que é melhor ficar de repouso até que suas feridas estejam completamente curadas?Tatiana falou sinceramente:- Estava muito abafado lá dentro, não conseguia ficar parada, então queria te perguntar algumas coisas.A casa alugada era simples e desprovida de comodidades. O televisor era um modelo antigo que só re
Por causa da dor da ferida, Tatiana não conseguiu se exaltar por muito tempo. Após murmurar algumas maldições com raiva eperceber a mudança na expressão do homem, sua voz de repente suavizou.- O que foi, Loh? Eu disse algo errado?Guilherme observou seu semblante e, depois de um momento, falou hesitante:- Você não disse nada de errado, só estou surpreso que você use esse tipo de linguagem...Por um instante, ele chegou a suspeitar que talvez ela tivesse se lembrado de alguma coisa.Ou talvez ela estivesse apenas fingindo.Mas seu rosto parecia tão inocente que era difícil detectar qualquer falha.Bastava encontrar seus olhos para que ela voltasse a ter aquela expressão de quem não entende nada.Além disso, embora as palavras dela fossem de reprovação, elas tinham sido provocadas pela história que ele mesmo havia inventado, e ele parecia não encontrar um motivo justo para questionar sua honestidade.Ele nem mesmo tinha o direito de interferir em seu direito de se irritar.Alguém bateu
Severino estava apostando tudo o que tinha.Ele apostou no último resquício de valor utilitário que poderia ter para Guilherme, bem como num pequeno espaço que Tatiana poderia ocupar em seu coração.Afinal, mesmo um animal de estimação que pode ser descartado a qualquer momento deveria ser tratado de forma diferente de um estranho sem qualquer ligação, certo?Caso contrário, por que Guilherme se daria ao trabalho de tirar ela do hospital com tanto esforço?As feridas dela eram graves e, num pequeno vilarejo desconhecido e com escassez de serviços médicos, ter um médico particular era certamente uma grande vantagem.Se Guilherme realmente pretendesse cuidar bem de sua "mascote", ele não mataria o médico tão facilmente.De fato, após as palavras de Severino, a expressão lúdica no rosto do homem pareceu se suavizar um pouco, como se ele estivesse considerando o significado das palavras dele.Manter um médico por perto realmente parecia vantajoso.Severino continuou a persuadir:- Mestre G
A atmosfera estava um pouco tensa.Severino, percebendo a irritação de Guilherme, se apressou em intervir:- A Srta. Tatiana não está bem, eu posso cuidar do preparo da comida.Tatiana ainda parecia confusa e lançou um olhar inquisidor para Guilherme.- Dr. Severino é nosso convidado, como podemos pedir que ele cozinhe? Minha ferida já está melhor, eu posso cozinhar e, se realmente não conseguir, vocês podem me ajudar depois. Eu acho que consigo fazer.A expressão de Guilherme parecia indicar que ele não estava ouvindo.Tatiana franziu a testa e disse:- Loh, você está me ouvindo?Guilherme respondeu automaticamente, mantendo seu rosto impassível.Ele caminhou até Tatiana, seus olhos rapidamente passando pelo grande cesto de vime ao lado de suas pernas e finalmente pousando em suas mãos.Diferente das mãos delicadas das damas criadas em luxo que ele estava acostumado a ver, as mãos de Tatiana não eram exatamente bonitas, até podiam ser descritas como ásperas.Era compreensível, conside