Até o momento em que chegaram ao carro de Basílio, ele foi rápido em abrir a porta traseira para Lúcia. — Quero sentar no banco da frente. — Disse Lúcia.Basílio ficou surpreso por um instante, mas logo entendeu. Ela estava tentando provocar uma reação de Sílvio. Com elegância, ele fechou a porta traseira e abriu a do passageiro para ela. A neve continuava a cair silenciosamente.Lúcia respirou fundo e ficou ali por alguns minutos, esperando. Mas ninguém apareceu. Sílvio não saiu correndo para detê-la. Ao seu redor, tudo o que ouvia era o som suave do vento brincando com os flocos de neve.Ela havia perdido a aposta. Seus olhos começaram a arder, e ela sentiu uma tristeza profunda. Virou-se para trás, olhando novamente ao redor. Ela sentia, com toda a certeza, que Sílvio estava por perto. Só não conseguia identificar exatamente onde.Lúcia teve a impressão de estar sendo observada, como se um olhar quente e intenso estivesse fixo nela. Virou-se mais uma vez. A rua deserta se estendia
Sílvio viu Lúcia e Basílio encostados um no outro. Eles estavam tão próximos. Flocos de neve caíam ao redor deles, compondo um quadro tão perfeito quanto uma pintura.Sílvio percebeu que, de certa forma, Lúcia e Basílio realmente combinavam. De pé, lado a lado, pareciam um casal perfeito.Ele franziu a testa involuntariamente. Seus lábios se comprimiram em uma linha fina. Suas mãos seguravam o frio das grades do portão com tanta força que pareciam querer esmagá-las.Embora ele não pudesse se revelar para Lúcia naquele momento, o seu único desejo naquela noite era vê-la, mesmo que de longe. Ele queria que Lúcia fosse a razão para continuar lutando. Mas, ao vê-la tão próxima de outro homem, não conseguiu evitar o ciúme. O desconforto o consumia. A raiva subia dentro dele, mesmo que ele tentasse reprimi-la.Sílvio sabia que não tinha o direito de culpá-la, mesmo que visse algo ainda mais doloroso.Com o coração apertado, ele se virou e foi embora.No pátio.Basílio permanecia parado, imóv
A temperatura na mansão era agradável, aquecida como uma tarde de primavera.Enzo, seguindo as instruções de Basílio, trouxe a caixa de primeiros socorros.Basílio pediu que uma das empregadas ajudasse Lúcia a tratar os ferimentos, mas Enzo explicou: as empregadas estavam todas de folga naquele dia. Olhando para Lúcia, ele acrescentou que o próprio Basílio sabia cuidar de ferimentos e fazia isso muito bem.Basílio, claro, entendeu imediatamente o que Enzo estava tentando fazer: criar uma oportunidade para ele estar a sós com Lúcia.Assim que Enzo foi dispensado, um silêncio desconfortável pairou no ar. Basílio olhou para Lúcia. Ela, em algum momento, havia tirado o casaco grosso de inverno. Agora, vestia apenas uma blusa preta de gola alta, justa ao corpo, com a barra enfiada na calça de alfaiataria de corte largo. Sua cintura fina e sua postura elegante realçavam o porte de uma verdadeira dama. Seu cabelo longo caía de forma descuidada sobre os ombros.Mesmo com um hematoma inchado e
Lúcia não esperava que seus ferimentos acabassem envolvendo a reputação de Basílio.Vendo que ela permanecia em silêncio, Basílio insistiu:— Você vai me contar agora ou eu mesmo vou investigar? Não seria nada difícil descobrir.Lúcia hesitou por um momento antes de responder:— Eu conto, mas você promete que não vai fazer nada contra o Sílvio?Basílio riu, incrédulo:— Foi o Sílvio quem te machucou assim?— Não foi ele, mas tem a ver com ele. Sr. Basílio, eu só te peço que, por mim, não vá atrás dele.Depois de alguns segundos de silêncio, Basílio, contrariado, acabou concordando com o pedido.Foi só então que Lúcia começou a relatar os acontecimentos da manhã, detalhando tudo.Quanto mais Basílio ouvia, mais a raiva crescia dentro dele:— Ele está tão cego assim, e você ainda o defende?— Foi você quem me disse que devemos ter fé nas pessoas que amamos. Esqueceu disso? — Lúcia rebateu, num tom inesperado.Basílio ficou surpreso. Ele realmente havia dito isso, mas sua intenção era mot
O som do vidro quebrando ecoou pela sala. O vinho tinto derramado no carpete formava manchas escuras, quase como flores murchas. Sílvio nem teve tempo de reagir quando Basílio agarrou a gola de sua camisa e, sem aviso, desferiu um soco direto em seu rosto impecável e marcante.— Sílvio, seu desgraçado! Você acha que merece a Lúcia? Tem ideia do que você fez com ela? E ainda tem a cara de pau de ficar aqui bebendo vinho como se nada tivesse acontecido? — Basílio, tomado pela fúria, balançava os punhos, que golpeavam o rosto e o corpo de Sílvio sem piedade.A dor na bochecha latejava. Sílvio passou o dedo pelo canto da boca, agora manchado de sangue vermelho e vivo. Lentamente, ergueu a cabeça e lançou um sorriso para Basílio. Era um sorriso estranho, talvez de deboche, talvez de resignação, mas, acima de tudo, vazio. Ele estava ali porque estava frustrado, amargurado, e um pouco... com ciúmes. Mas o que ele podia fazer? Nada. Absolutamente nada.Para Basílio, aquele sorriso parecia um i
Mas as palavras de Basílio tinham um peso difícil de ignorar.— Olga também foi enviada pela Giovana para matar Lúcia. Só que ela teve um surto de consciência e preferiu se jogar contra a grade e acabar com a própria vida. Sílvio, você nunca acreditou de verdade na Lúcia. Vive dizendo que a ama, mas essa sua "grande" paixão nunca chegou até ela. Nem mesmo depois de tudo o que você fez, ela ainda tentou me impedir de te procurar para acertar as contas. Qualquer outra mulher, com um pouco mais de juízo, já teria te deixado há muito tempo. — Continuou Basílio, com a voz carregada de desprezo.Os olhos de Sílvio começaram a ficar ligeiramente vermelhos, mas ele se recusava a demonstrar qualquer fragilidade na frente de Basílio. Suas íris cor de âmbar piscavam rapidamente, tentando conter as lágrimas que ameaçavam escapar.— Levanta! Vamos buscar a Lúcia e levar ela pra casa! — Basílio gritou, puxando Sílvio pela gola da camisa.“Levar ela pra casa? Ah, como eu queria que fosse tão simples.
Arthur congelou levemente a mão enquanto passava o remédio no ferimento de Sílvio.Através da fumaça nebulosa do cigarro, Sílvio conseguiu perceber com clareza a ligeira mudança de expressão no rosto de Arthur.— Arthur, o que você acha disso? — Sílvio perguntou de repente, tragando o cigarro e lançando um sorriso enigmático.Aquele sorriso fez Arthur se sentir desconfortável, e seu coração acelerou de nervosismo:— Sr. Sílvio, o senhor ouviu algum boato?— Boato?— Sr. Sílvio, o senhor e a Sra. Lúcia passaram por tanta coisa para chegarem até aqui. Não foi fácil. Entre marido e mulher, o mais importante é a confiança mútua. A Sra. Lúcia foi salva por mim. Se ela fosse falsa, eu saberia. Agora, o Sr. Basílio… esse sim, tem intenções duvidosas e está claramente tentando causar discórdia entre vocês.Enquanto continuava a enfaixar o ferimento, Arthur sorriu e comentou:— Eu lembro que, naquela vez, quando o senhor e a Sra. Lúcia quase se divorciaram, foi justamente por causa dessa proxim
O carro avançava em alta velocidade pela estrada asfaltada.A pista, molhada pela neve derretida, brilhava sob as luzes dos postes. Os flocos de neve caíam continuamente sobre o para-brisa, e o limpador trabalhava em um ritmo constante, empurrando a neve acumulada para os lados.Sílvio observava com um olhar frio as luzes de néon e os pedestres que passavam pela janela. O vidro estava meio abaixado, e o vento gelado cortava seu rosto, mas ele parecia completamente alheio ao frio.— Sr. Sílvio, os resultados dos exames do hospital ficaram prontos. — Leopoldo falou, segurando o volante com certo nervosismo.Sílvio finalmente desviou o olhar da janela e fixou os olhos nele:— Fale.— Seu instinto estava certo. A Sra. Lúcia que está na sua mansão realmente tem algo errado.— Continue.— O relógio que o senhor me entregou estava cheio de substâncias entorpecentes.— Entorpecentes?— Exato. É um tipo de droga incolor e inodora, quase impossível de ser detectada. Com o uso prolongado, ela cau