Lúcia disse que não aguentava mais esperar e que queria voltar para casa imediatamente.Basílio franziu a testa, os olhos fixos nos dela:— Não tem conversa. Se você não aceitar as minhas condições, eu não vou te ajudar. O Sílvio não vai morrer. Ele é um homem adulto, aguenta sentir a dor de te perder por um tempo. Quando você voltar, ele vai te valorizar mais. Se ele não passar por essa provação, você acha que ele vai aprender alguma coisa? Se você não consegue nem fazer ele sofrer um pouco, então faça as malas sozinha, porque eu não vou te levar.Lúcia parou para pensar. Ela estava em um lugar desconhecido, sem documentos, sem nada. A única pessoa em quem podia confiar era Basílio. Depois de um momento de hesitação, ela assentiu:— Tudo bem, eu aceito. Mas você tem que prometer que não vai voltar atrás.— Não se preocupe. Eu nunca fiz nada para te prejudicar.Basílio a pegou no colo, colocando-a de volta na cama. Em seguida, colocou a comida que havia trazido na mesinha ao lado. Apes
Talvez fosse porque uma boa notícia trazia mesmo um espírito renovado. O estado de saúde de Lúcia melhorava a olhos vistos.Basílio sentia-se dividido: por um lado, estava feliz; por outro, uma sensação de vazio o consumia. Seus sentimentos eram um turbilhão.Três meses passaram rápido. Logo chegaria o dia em que Lúcia teria alta e ele a entregaria novamente para Sílvio. Essa data se aproximava cada vez mais.Lúcia estava sentada na cama do hospital, um sorriso leve iluminando seu rosto. Do lado de fora do quarto, Basílio a observava pela pequena janela de vidro enquanto segurava o telefone no ouvido.— Vai mesmo mandá-la de volta? — Questionou Daulo do outro lado da linha, com a voz carregada de reprovação.— E o que mais eu poderia fazer? — Basílio respondeu com um sorriso amargo.— Se eu soubesse que ela tinha esquecido todo mundo, menos o Sílvio, nem teria me dado ao trabalho de ajudar a salvá-la! Olha só, todo o esforço para ela voltar pra ele de bandeja. — Daulo reclamava, irrita
Ainda não era o momento certo para falar o que sentia. Ele temia ser brusco demais, assustá-la. Precisava esperar a oportunidade certa, uma chance para prender Lúcia ao seu lado. Quando conseguisse, seria para a vida toda. Ela não teria como escapar, nem se quisesse.— Certo. — Lúcia, completamente imersa na empolgação de reencontrar Sílvio, nem sequer desconfiava dos planos silenciosos de Basílio.Na véspera da viagem de retorno, Lúcia estava tão ansiosa que simplesmente não conseguiu pregar os olhos. Sentia como se quisesse criar asas e voar direto para os braços de Sílvio, abraçá-lo com toda a força.Na manhã seguinte, Basílio percebeu que ela tinha olheiras profundas. Era evidente que não tinha dormido. Durante o café da manhã, Lúcia quase não tocou na comida, reclamando sem parar sobre como o tempo parecia se arrastar. Basílio, no entanto, insistiu para que ela comesse tanto o café quanto o almoço antes de saírem. Só então chamou um táxi para levá-los ao aeroporto. Por precaução,
— O quê?A mão de Lúcia, que estava prestes a soltar o cinto de segurança, ficou imóvel no ar. Ela levantou os olhos, confusa, e encarou Basílio no banco ao lado.Basílio, com um sorriso tranquilo, repetiu:— Você disse que cumpriria qualquer pedido meu, sem condições.— Sim, eu disse.— Pois bem, Lúcia. Eu levei a sério. Quando eu souber o que quero, vou cobrar a sua promessa. — As palavras de Basílio pareciam simples, mas Lúcia, alheia ao tom sutil que escondia algo mais profundo, apenas agradeceu novamente e abriu a porta do carro.O vento gelado e cortante soprou direto em seu rosto enquanto grandes flocos de neve caíam do céu cinzento, cobrindo tudo ao redor. Sua respiração ficou curta com o impacto da friagem. Sem olhar para trás, ela fechou a porta do carro.Basílio deu um leve aceno ao motorista, que arrancou o carro e saiu da Mansão Baptista. No silêncio do carro, o assistente, visivelmente incomodado, deu uma olhada no espelho retrovisor e não conseguiu segurar o desabafo:—
— A ligação que você tentou fazer não pôde ser completada. Por favor, tente novamente mais tarde.Lúcia ouviu a mensagem automática pela décima vez. Tentou ligar para Sílvio repetidamente, mas ele não atendia.“Que estranho... Onde ele está? Será que está tão ocupado assim? Por que não atende o telefone?”O coração dela começou a bater acelerado. Os pensamentos vieram como uma enxurrada. Algo estava errado. Ela não sabia exatamente o quê, mas havia uma sensação incômoda, um pressentimento que não conseguia ignorar.Tentou se acalmar. Respirou fundo e começou a repetir para si mesma:“Lúcia, não seja paranoica. Você tem que confiar nele. Vocês estão prestes a tirar as fotos de casamento, a se casar. Confiança é a base de qualquer relacionamento duradouro. Além disso, ele achou que você estava morta. Ficou tão devastado que envelheceu de um dia para o outro. Isso não prova o quanto ele te ama?”Ela continuou se convencendo, tentando afastar o desconforto, mas o sentimento não desaparecia
O papagaio piscou os olhos negros e brilhantes, encarando Lúcia.Ela passou a mão suavemente pelas penas escuras e macias da ave, sorrindo quase sem perceber. Gostava dele. O canto dos lábios se curvou ainda mais enquanto ela dizia:— Sílvio gosta da Lúcia.O papagaio permaneceu em silêncio.— Vamos, diga! Se você falar, eu compro mais ração para você. Quem sabe até te levo para casa comigo. — Lúcia abaixou-se um pouco mais, a voz agora doce e persuasiva, toda a sua atenção focada nele.Mas o papagaio continuava mudo, como se estivesse deliberadamente ignorando o pedido.De repente, o som de pneus rangendo contra o asfalto quebrou o silêncio. Lúcia virou a cabeça rapidamente e viu um Rolls-Royce Cullinan preto estacionando em frente à Mansão do Baptista. Seu coração disparou. Ela reconhecia aquele carro. Era o de Sílvio!Ela se levantou de um salto, os olhos fixos na porta que começava a se abrir. Leopoldo foi o primeiro a descer. Ele abriu um grande guarda-chuva preto com um gesto fir
— Sílvio, eu te amo. Descobri que te amo tanto, tanto... mais do que eu podia imaginar. Quando vi que você ficou de cabelos brancos por minha causa, eu fiquei tão emocionada, tão culpada... Prometo que, daqui pra frente, eu vou te amar ainda mais.Lúcia falava com uma intensidade que crescia a cada palavra. Sua voz embargada começava a falhar, enquanto o nó em sua garganta apertava ainda mais. Lágrimas quentes escorriam sem controle, molhando seu rosto e caindo sobre os ombros do casaco preto de Sílvio, desaparecendo imediatamente no tecido.Mas ele não a abraçou de volta. Ficou parado, rígido, como se fosse uma estátua. Permaneceu imóvel, deixando que ela o segurasse, mas sem retribuir.Lúcia estranhou. Antes que pudesse dizer algo, sentiu as mãos de Sílvio em seus ombros, afastando-a com firmeza. Ele a empurrou suavemente, mas com determinação.Ela o olhou, confusa. Ele não apenas não havia correspondido ao abraço, como também a afastara. E o olhar dele... tão frio, tão distante.Ain
— Sílvio...Uma voz feminina ecoou de dentro do carro.Lúcia franziu o cenho. Aquela voz... era estranhamente familiar. Tão parecida com a dela própria que, se não estivesse ali, poderia jurar que era sua própria voz ressoando. Intrigada, ela acompanhou com o olhar Sílvio, que, com uma expressão serena, voltou sua atenção para o Rolls-Royce Cullinan parado ali perto.A neve caía sem trégua, borrando a visão de Lúcia. Sob o véu branco que cobria tudo ao redor, uma jovem de casaco branco desceu lentamente do carro. Seus cabelos longos e negros caíam em cascata sobre os ombros, destacando-se contra o cenário gélido.Sílvio estendeu a mão para a garota, que, com um gesto tímido, colocou sua mão pequena na dele. Ela tossiu levemente, e, sem hesitar, Sílvio tirou o pesado sobretudo negro que usava e o colocou gentilmente sobre os ombros dela.Lúcia ficou atônita. Como aquilo era possível? Em apenas um mês, Sílvio havia... esquecido dela? Encontrado outra mulher? Não, aquilo não fazia sentido