Sílvio observou Lúcia sentada na cadeira, parecendo perdida, sem reagir por um bom tempo. Isso o deixou ainda mais irritado. Será que ela estava tão nervosa e assustada por ele ter mencionado que a acompanharia na consulta? Nem um pingo de surpresa ou alegria?— Eu disse para você se trocar. Vamos para a consulta pré-natal. Você não ouviu? Ou será que agora que aquele velho voltou a ser tratado, você resolveu desobedecer de novo? — Seu tom de voz carregava uma clara insatisfação.Lúcia, ainda atordoada, teve seus pensamentos puxados de volta à realidade. Sentindo-se culpada, tentou mentir:— Você tem trabalho importante. Eu posso ir sozinha.— Hoje eu não vou a lugar nenhum. Vou com você à consulta. — Respondeu Sílvio, determinado a não ceder.A pressão no peito de Lúcia só aumentava, e ela começou a falar sem pensar:— Eu já disse, não precisa me acompanhar. Eu não sou uma criança, sei ir sozinha.— Por que tanto medo de eu ir ao hospital com você? Está tentando esconder algo?Lúcia l
Ele disse que faria a família Baptista pagar com a vida!Lúcia não podia suportar essa consequência, e muito menos se arriscar a jogar com isso.Toc-toc.— Já terminou de se arrumar ou não?Pelo tom impaciente, era claro que a paciência dele estava no limite. Ele não tinha mais tempo para suas desculpas.Lúcia, sem querer que ele abrisse a porta e a confrontasse, decidiu abri-la ela mesma.Sílvio estava impecável, como sempre. O cabelo curto, no clássico penteado para trás, brilhava sem um único fio fora do lugar. O terno preto, simples, mas de uma elegância inegável, ainda era o que ela havia comprado para ele.Agora, ao olhar para aquela roupa, Lúcia só sentia uma ironia cortante. Como podia ser tão contraditório? Se era um canalha, por que ainda usava as roupas, sapatos e até as meias que ela lhe havia dado? E com frequência, ainda por cima.Por outro lado, como poderia ser considerado um homem apaixonado, se continuava seu relacionamento com Giovana? Fotografando-se com ela em tra
Enquanto Sílvio falava ao telefone, ele não se preocupou em ser discreto e respondeu de forma direta:— Exatamente.Ele desligou.Lúcia esboçou um sorriso que parecia mais um choro:— Sílvio, você faz questão que eu faça essa ultrassonografia hoje?— Você está se sentindo mal, então pedi ao Dr. Arthur para vir verificar o que está acontecendo. E, aproveitando, faremos a ultrassonografia. — Sílvio respondeu com um tom frio, franzindo a testa.Lúcia, furiosa, deu um sorriso amargo, apertando a manta sobre os joelhos com força:— Eu já disse, não preciso disso.— Quem decide se precisa ou não, não é você.Exatamente. Se precisava ou não, realmente não era ela quem decidia.Mesmo que conseguisse evitar hoje, não escaparia amanhã.Vinte minutos depois, o Dr. Arthur chegou ao apartamento.Vestido com o jaleco branco e segurando uma maleta, ele cumprimentou Sílvio e sorriu educadamente para Lúcia.Lúcia, em um estado de total desânimo, apenas mexeu os lábios em resposta, sem iniciar conversa.
Ele olhou para Lúcia sem expressão:— Eu volto logo.— Certo. — Lúcia respondeu, mas aquela palavra carregava todo o peso do seu cansaço.Ela observou Sílvio e Dr. Arthur saírem da sala, um atrás do outro, e descerem as escadas.A ansiedade, o medo, o pavor, todos começaram a tomar conta de seu coração.Lúcia levantou-se do sofá e foi à cozinha preparar uma cafeteira de café.Ela tinha uma sensação ruim: Sílvio ia descobrir que ela perdeu o bebê!Tudo estava prestes a desmoronar!Quando ele voltasse, seria uma batalha inevitável!O som da água fervendo ecoou pelo ambiente.Ela, atordoada, pegou a cafeteira e despejou o líquido quente no copo de vidro à sua frente.O bico da cafeteira deslizou, e o café escaldante derramou-se inesperadamente sobre seus dedos pálidos.A dor intensa a fez largar a cafeteira de imediato.Correu para a cozinha, abriu a torneira e colocou a mão queimada sob a água gelada, tentando aliviar a dor, mas o alívio foi mínimo.Lágrimas caíram em silêncio na pia.Ap
Sílvio tinha muita força e segurou exatamente no local onde Lúcia havia se queimado com água quente. Uma dor intensa percorreu seu corpo, atingindo cada extremidade.— Lúcia gostava do Sílvio, mas não gosta mais. E não vai ter bebê nenhum! — O papagaio, inoportuno como nunca, saltitava e sacudia suas penas negras com energia.Assim que ouviu essas palavras, a expressão de Sílvio ficou ainda mais fria e sombria. Até o papagaio sabia que ela tinha abortado! Só ele, o tolo, não sabia de nada.Mas Sílvio se recusava a aceitar essa realidade. Não queria acreditar no que o Dr. Arthur havia dito. Ele não podia aceitar que Lúcia teria sido tão cruel a ponto de, pelas suas costas, tirar a vida do filho deles!Sílvio lançou um olhar gelado ao papagaio, e talvez tenha sido o suficiente para calá-lo. O pássaro fechou os olhos e fingiu dormir, como se sentisse o perigo no ar.Ele andava depressa, e Lúcia mal conseguia acompanhá-lo, quase tropeçando na soleira da porta de vidro da varanda. Sua cabeç
Lúcia sentia como se estivesse sendo mergulhada em um caldeirão de óleo fervente. A angústia, o desespero e a sensação de impotência lentamente devoravam seu coração, mas sem lhe conceder a misericórdia de um fim rápido.O mais irônico era que o hospital para o qual Sílvio a levou era justamente o hospital onde seu pai estava internado. E, por coincidência, o médico que a atendeu era o mesmo que havia tratado seu câncer anteriormente.Antes, quando ela queria se consultar, ele não acreditou nela. Mas agora, depois de tanta insistência, acabaram no mesmo hospital, e ainda encontraram o seu antigo médico.O doutor, ao ver Sílvio arrastando Lúcia para dentro, levou um susto. Mas ao perceber o estado debilitado dela, franziu a testa:— Srta. Lúcia, você não está se sentindo bem?O médico sabia que Sílvio era seu marido, mas havia prometido a Lúcia que manteria sua doença em segredo. Ela havia deixado claro que queria o divórcio e não queria complicações. Por isso, ele optou por descrever a
Lúcia viu o rosto de Sílvio coberto por uma expressão sombria, com as veias da testa pulsando de raiva.A tempestade finalmente havia chegado. Sílvio sabia de tudo.— Sílvio, eu... — Lúcia sentiu o coração acelerar, mas, ao abrir a boca, não encontrou as palavras.Antes que pudesse continuar, Sílvio amassou o relatório de exames em suas mãos com um movimento brusco. O rosto dele, contorcido pela fúria, não deixava dúvidas sobre o que sentia. Ele agarrou Lúcia pelo braço e, com passos largos e rápidos, a arrastou para fora do hospital.Lúcia mal conseguia acompanhá-lo, tropeçando várias vezes.Sílvio finalmente abriu a porta do Bentley preto e, como se estivesse descartando algo sem valor, a empurrou para o banco traseiro.Bang! A porta foi fechada com força, reverberando o som de sua raiva.A mão grande de Sílvio apertou o queixo de Lúcia com brutalidade, enquanto ele jogava o relatório amassado contra o rosto dela.— Explique!A dor no queixo de Lúcia era insuportável, como se fosse s
Tum-tum. A nuca de Lúcia batia furiosamente contra a janela do carro.A qualidade do vidro era surpreendente, mesmo com toda aquela força, não se quebrou.— Fala! Fala, Lúcia! Você ficou muda? Eu mandei você falar! Fala! — Sílvio berrou, completamente fora de si, o desespero em sua voz era palpável.De repente, Lúcia ficou paralisada.Ela pensou que estava vendo coisas, mas não, não estava. Lágrimas escarlates, como pequenas pérolas quebradas, escorriam dos olhos de Sílvio, inundando seu olhar impiedoso.Lúcia ficou atordoada. Sílvio estava chorando?Era a primeira vez que o via chorar.Será que esse filho era tão importante assim? A ponto de fazê-lo chorar?Se ele chorava pela perda de um filho, será que choraria por ela também? Se ela morresse, ele derramaria uma lágrima sequer em seu funeral?Com a mente enevoada, Lúcia sussurrou:— Sílvio, se algum dia eu morrer, você vai chorar por mim assim como está chorando agora?Toda a razão de Sílvio tinha sido levada embora pela raiva, pelo