Ivone achou que o papagaio estava chamando por ela. Achava o animal tão inteligente e esperto que se apressou em se aproximar.— Você está me chamando de novo? Que fofura! Como você sabe o meu nome? — Disse ela, enquanto estendia a mão para acariciar suas penas, que eram incrivelmente macias.O papagaio a observou fixamente, sem fazer mais nenhum som.Ivone pensou que Basílio devia gostar muito dela, provavelmente chamava seu nome tantas vezes na frente do pássaro que ele acabou aprendendo. Isso a fez sorrir. Talvez Basílio não fosse tão frio assim; ele apenas era reservado e tinha dificuldade para expressar seus sentimentos.— Com fome... — Disse o papagaio, enquanto seu estômago roncava audivelmente.Ivone procurou a ração e encheu o comedouro no suporte. Também colocou água fresca no recipiente.O papagaio, empolgado, abaixou a cabeça e começou a comer rapidamente. Em poucos instantes, já tinha devorado tudo.— Ei, coma devagar. Ninguém vai roubar sua comida. — Disse Ivone, rindo, e
A caligrafia familiar no caderno perfurou os olhos de Ivone como uma lâmina. Seus dedos, que seguravam o caderno, tremiam levemente. [Hoje, na escola, me chamaram de "bastardo". Lúcia se colocou na minha frente, me defendeu e disse que eu era amigo dela. Quem mexesse comigo, mexeria com ela. Ela ainda fez quem me insultou pedir desculpas.][Hoje foi um dia triste. Parece que Lúcia me esqueceu. Mas eu tinha dito meu nome para ela. Queria tanto me aproximar, ser amigo dela. Só que eu sou apenas um bastardo. Não sou digno de ser amigo dela. Por isso fiquei criando "encontros casuais" com ela em todos os cantos da escola. Eu acreditava que, um dia, poderia ficar frente a frente com ela, de verdade, e dizer o meu nome.] [Eu a segui pelo ensino fundamental, médio e até a faculdade. Vi ela deixar para trás a infância e se transformar em uma mulher linda. Mas, enquanto eu ainda não me tornava a pessoa extraordinária que imaginava ser, ela foi atrás de Sílvio.][Lúcia vai se casar com Sílvi
[Lúcia, não importa o que eu faça com você, você nunca pode desistir de mim.] [A menos que eu diga que não te quero mais, você deve ficar ao meu lado.] A voz de Basílio ecoava nos ouvidos de Ivone como uma lâmina afiada, cortando sua pele e rompendo seus nervos. Cada palavra trazia uma dor lancinante, como se seu coração fosse espremido sem piedade. Agora tudo fazia sentido. Não era de se admirar que Basílio a tivesse obrigado a aceitar aquelas condições absurdas. Desde o início, ele nunca a viu como uma namorada. Ela era apenas um passatempo, um substituto. Não era de se admirar que ele tivesse saído sem dizer nada, inventando desculpas de que estava "trabalhando até tarde". A verdade era que a mulher que ele realmente amava estava dando à luz e precisou dele. Como ele poderia ignorar isso? A escolha entre quem ele realmente amava e a substituta era óbvia. Ivone curvou os lábios em um sorriso amargo, sentindo uma pontada de dor no peito. Ela havia gostado dele por tanto te
O silêncio tomou conta do ambiente. Um segundo, dois segundos, três segundos… Ivone olhou para Basílio, que continuava sem dizer nada. Ele nem sequer se dava ao trabalho de tentar explicar? Com um movimento brusco, ela lançou o caderno diretamente no rosto dele. As lágrimas escorreram pelo seu rosto enquanto ela gritava: — Explica! Basílio, eu quero que você me explique! O que você quer dizer com isso? Ficou mudo agora? Fala comigo, explica! Basílio a encarava com frieza, sem o menor sinal de que faria qualquer esforço para se justificar. Ivone, com a voz rouca de tanto gritar, começou a socar o peito dele, golpe após golpe: — Explica, Basílio! Eu quero que você explique! — E se eu explicar, você vai acreditar? — Ele rebateu com uma pergunta, ignorando os ataques dela. Ela soluçou, tentando controlar o choro: — Se você explicar, eu vou acreditar. — Que ingenuidade a sua. — Ele respondeu com sarcasmo, zombando dela. Ivone congelou. Ela ficou tão chocada que até esq
“Você, um bastardo, acha que é digno de ser meu marido? Acha que merece que eu tenha um filho seu?”Os olhos de Basílio ficaram ainda mais frios. Ele suspirou com impaciência e decretou: — Já terminou? Então volte e reflita sobre o que disse! Ivone soltou uma risada irônica:— Não tenho nada mais para refletir, Basílio. Nós dois acabamos. Desta vez, sou eu que não quero mais você. Eu, Ivone, por mais que esteja arruinada, por mais que ninguém mais me queira, nunca vou me rebaixar ao ponto de aceitar ser a substituta de alguém. Homens como você, desonestos, que brincam com os sentimentos dos outros, nunca terão um final feliz. — Você deveria se sentir grata por ter ao menos um pouco da semelhança com a Lúcia! Não abuse da sorte! — Ele rebateu com dureza, aumentando o tom de voz. As palavras dele fizeram Ivone explodir em uma gargalhada insana. Ela ria a ponto de as lágrimas escorrerem pelo rosto. Sua respiração ficava entrecortada de tanto rir. — Por que você está rindo? — Ele
Basílio desceu as escadas correndo atrás dela. A cabeça de Ivone bateu no chão do hall de entrada, e a pele de sua testa foi rasgada, deixando o sangue escorrer em fios grossos, manchando seu rosto. Por alguns segundos, tudo ficou completamente escuro. Ivone sentiu o desespero crescer dentro de si enquanto a dor em seu abdômen aumentava. Era uma dor cortante, como se uma lâmina afiada estivesse perfurando suas entranhas sem piedade. De repente, sua visão voltou aos poucos, como se uma rede embaçada de repente fosse rasgada, trazendo de volta a luz. Ivone levou a mão trêmula à testa e sentiu o sangue quente escorrendo. Quando olhou para baixo, viu que suas pernas estavam molhadas, cobertas por manchas de sangue. O vermelho intenso se espalhava em camadas, como ondas violentas invadindo uma praia, ou como as rosas desabrochadas nos jardins da propriedade da família Araújo. — Iva! — Basílio correu até ela, ajoelhando-se ao seu lado para segurá-la nos braços. Aquele nome falso, "
A mente de Basílio estava uma confusão completa. Ele não sabia se estava feliz ou incomodado. Seus sentimentos eram um misto de emoções conflitantes. Ele se perguntava como seria o filho que teria com Ivone. Será que a criança se pareceria mais com ele ou com Ivone? Mas, ao mesmo tempo, outro pensamento o atormentava: isso seria uma traição a Lúcia? Ele agora teria um filho com outra mulher. No meio da madrugada, Lúcia não conseguia dormir. Sílvio, sempre atencioso, a acompanhava em uma caminhada pelos corredores do hospital. De longe, os dois avistaram um homem sentado em um banco, com a cabeça baixa, parecendo abatido. Lúcia reconheceu Basílio imediatamente. — Volte para o quarto e descanse. — Sílvio sugeriu, notando a intenção dela de se aproximar. Mas Lúcia, ignorando o conselho, decidiu ir até o irmão. Ela caminhou até ele, sentando-se no banco à sua frente: — Mano, o que você está fazendo aqui tão tarde? Aconteceu alguma coisa? Basílio ergueu a cabeça lentamente. El
Basílio parou no meio do caminho, interrompendo o impulso de acompanhar Lúcia. As palavras de Sílvio o fizeram hesitar, e ele acabou ficando. Meia hora depois, a porta da sala de emergência finalmente se abriu. Ivone, inconsciente, foi levada para um quarto comum. Basílio se aproximou do médico, que tirava a máscara enquanto começava a falar: — Você é o responsável pela Srta. Iva, certo? Basílio assentiu com a cabeça. — Preciso que o senhor se prepare para o que vou dizer. — O médico o encarou com uma expressão séria e pesada. O coração de Basílio disparou.— O bebê... o bebê não sobreviveu? — Ele perguntou, com a voz tensa. — A saúde dela já era muito frágil. Durante a gravidez, ela esteve emocionalmente abalada... você provavelmente a ignorou, não foi? — O médico o olhou com reprovação. — Além disso, o tempo que demoraram para trazê-la ao hospital complicou tudo. Fizemos o possível, mas o bebê não resistiu. As palavras do médico atingiram Basílio como uma pedra pesada