Os óculos escuros nem começavam a esconder as olheiras que tinha conquistado naquela noite. Elas pareciam gritar em seu rosto no momento em que se olhou no espelho. Estava péssima. E a culpa era de quem? Do principal responsável por suas noites insones. Aquele que só lhe proporcionava problemas e trazia apenas destruição consigo.
Sua noite fora permeada por choro e horas em claro. Mas assim que colocou os pés no chão, pronta para se levantar e ir trabalhar, fez um pacto consigo mesma de que não iria mais se deixar abalar por Tate Barlow. Ela o amava? Por mais idiota que pudesse parecer, a resposta era sim, ainda tinha fortes sentimentos por ele. Mas teria que enterrar esse sentimento bem lá no fundo do coração e sobreviver. Seria bem mais difícil agora que ele estava de volta, porém, precisava ser mais forte. Pela sua sanidade.
Desceu as escadas da pensão, sabendo que estava atrasada, então, teria que pular o café da manhã. E Darlla sempre preparava uma mesa digna de um hotel movimentado. Por mais que Zhoe já a visse como uma amiga e não apenas como sua funcionária há dois anos, desde que esta chegara na cidade procurando emprego, sabia muito pouco sobre sua vida, apenas que ela morava com a irmã, Lori, que já vivia em Green Hill há cinco anos e era enfermeira no hospital da cidade. Outra coisa que sabia também era que Darlla era inteligente demais para permanecer em um emprego tão medíocre, com um salário mais medíocre ainda. O que era algo muito estranho.
— Bom dia, Zhoe! — ela cumprimentou animada como sempre, mas nem recebeu resposta. Zhoe apenas balançou a cabeça e começou a encher uma caneca grande com o café que ela tinha preparado. — Ih, alguém dormiu mal esta noite?
— Não pergunte, por favor.
— Tem certeza? Talvez seja melhor desabafar. Você parece realmente mal. O que aconteceu?
— O que aconteceu? Tate aconteceu!
A reação de Darlla foi a mais previsível possível. Ela arregalou os olhos e colocou as mãos na boca, parecendo realmente abismada.
— Ele voltou? E teve coragem de vir aqui?
— Sim, teve. Mas eu juro que não quero falar sobre isso. Além do mais, estou atrasada. Não quero deixar Paige sozinha por muito tempo na loja.
— Não vai nem tomar um café decente? Leve pelo menos um pedaço de bolo... — Às vezes Darlla parecia mãe de Zhoe, embora as duas tivessem praticamente a mesma idade.
— O que mais tem naquela loja é comida, Darlla. Pode ter certeza que não vou passar fome. — Mesmo não estando lá muito bem humorada, Zhoe deu um beijo no rosto da amiga, como agradecimento pela preocupação, e saiu.
Depois da tempestade da noite anterior, o dia lá fora estava lindo. O que chegava a ser uma ironia, já que nada no humor de Zhoe combinava com céu azul e pássaros cantando.
Demorou dez minutos para chegar à Sweet Dreams e quando pisou na loja, depois de abrir a porta de vidro trancada, reparou que Paige não estava sozinha.
E... uau! Tratava-se de um tipo de homem que não se encontrava facilmente dando sopa na rua.
O sorriso era a primeira coisa que se enxergava, a quilômetros de distância. Seus dentes eram perfeitos, alinhados e muito brancos. Ele tinha uma covinha atrevida bem na bochecha direita. Os cabelos eram negros, arrumadinhos e pareciam ter uma textura de veludo. Os olhos azuis se destacavam, principalmente por sorrirem tanto quanto os lábios. Era bem alto e esguio, embora seus braços parecessem musculosos por debaixo da blusa polo que usava.
Travava uma conversa animada com Paige, como se já se conhecessem há algum tempo e até tivessem um pouco de intimidade. O que era estranho. O que ele estava fazendo ali, antes da loja abrir?
Imediatamente pensou em Jacob. Será que ele sabia daquela “amizade”? Ou será que Paige estava conhecendo o belo estranho naquele exato momento e flertando com ele? Sim, porque ele só podia ser novo na cidade, já que Zhoe com certeza se lembraria se já o tivesse visto antes.
— Bom dia! — Zhoe anunciou sua chegada e só faltou pigarrear, como se tivesse pegado alguém no flagra. Tudo bem que Paige tinha se tornado sua melhor amiga muito rápido, mas Jacob também lhe era muito especial, além de já ter sido traído uma vez, ou seja, não merecia ter o coração partido novamente.
— Oi, Zhoe! Bom dia! — Paige exclamou animada. Contudo, quando se virou para a amiga logo pareceu perceber sua expressão mal humorada, e que seu sorriso desaparecera. Mas, como não estavam sozinhas, preferiu não perguntar nada. — É uma coincidência você ter chegado exatamente agora, porque estava falando de você para Craig.
Assim que foi mencionado, o tal Craig também sorriu para ela de forma simpática. E só. Olhou para Zhoe da mesma forma como estivera olhando para Paige.
Talvez fosse exatamente o fato de estar se sentindo péssima, mas aquilo a incomodou. Zhoe sabia que era bonita. De uma forma diferente de Paige, é claro. Sua amiga tinha uma beleza angelical, etérea, enquanto ela era mais atrevida, com traços mais peculiares. Porém, as duas eram mulheres que chamavam atenção por onde passavam, principalmente quando estavam juntas. No entanto, Craig, por sua vez, não parecia interessado em nenhuma das duas, e só naquele momento percebeu isso.
— Craig, esta é Zhoe, minha grande amiga e sócia aqui no Sweet Dreams. Zhoe, este é Craig, ele é vizinho de Jacob, se mudou para Green Hill há três meses.
Ah, aquilo explicava tudo.
Zhoe apertou a mão que ele lhe oferecia.
— Muito prazer, Zhoe. Paige sempre fala muito de você.
— Estranho. Ela nunca mencionou você para mim. — Zhoe sabia que tinha soado como uma mulher cuimenta e logo se arrependeu do comentário, mas não o retirou.
— Mencionei, sim. Algumas vezes, aliás. Falei sobre quando ele se mudou, falei sobre as vezes em que jantou conosco, na casa de Jacob...
Ah, era verdade, Paige tinha mesmo mencionado um vizinho novo, mas só tinha esquecido de falar que o cara era um gato.
— É mesmo. Me desculpe. Estou com a cabeça meio confusa — tentou disfarçar o constrangimento. — Mas, de qualquer forma, nunca te vi por aqui em Green Hill.
— Eu sou quase um recluso — respondeu em um tom brincalhão. — Sou escritor e estava terminando um livro que tinha um prazo apertado.
— E conseguiu terminar? — Zhoe perguntou, um pouco mais simpática.
— Finalmente. Meu editor estava quase arrancando os cabelos. Acho que os ares de Green Hill me foram inspiradores.
— Craig já foi best- seller do New York Times. Ele me presenteou com um de seus livros, e eu estou amando — Paige acrescentou.
— Qual o estilo? — Zhoe ficou interessada.
— Drama romântico.
— Estilo Nicholas Sparks?
— Exatamente.
— Acho que vou gostar, então — Zhoe finalmente sorriu.
— Te darei um exemplar também. Tenho alguns comigo do meu primeiro livro. Não é o meu melhor, mas é um lugar para se começar.
— Vou adorar.
Naquele momento, ouviu-se o apito do micro-ondas, e Paige se apressou em entrar na cozinha, voltando logo em seguida com um belo pedaço de bolo de chocolate com cobertura de ganache. O bolo fora feito por Zhoe no dia anterior, e a cobertura era especialidade de Paige.
— Adoro bolo quente — Craig comentou, enquanto era servido e sentava-se na banqueta em frente ao balcão. — É uma mania de criança.
— Também gosto — Zhoe falou sorrindo, tirando os óculos e entrando pela portinhola do balcão, colocando-se ao lado de Zhoe. — Craig, você vai me desculpar a indelicadeza, mas tenho que preparar algumas coisas na cozinha. Você foi privilegiado em ser atendido antes da loja abrir, porque daqui a pouco não teremos tempo nem para respirar.
— Não teremos, Craig, porque Zhoe é teimosa e não quer contratar ninguém para trabalhar conosco.
— Vamos esperar um pouco, Paige. Ontem foi nossa estreia, não temos como saber se vai permanecer sempre assim.
— Eu sei, eu sei. Mas poderia ser alguém temporário.
— Olha — Craig se manifestou —, não quero me intrometer na conversa de vocês duas, mas estou livre agora que terminei o livro e bastante entediado. — Zhoe e Paige se entreolharam. Como não responderam nada, ele prosseguiu: — E se meu pagamento for em forma de bolos como esse aqui, estarei mais do que satisfeito. Sou uma negação na cozinha, vivo passando fome. Vocês estariam praticamente me salvando da inanição — brincou.
— Craig, não podemos explorar você sem te pagar. Não seria justo — Paige foi quem falou.
— Não seria exploração. Seria uma salvação. Esse processo de espera até que o livro seja publicado, até começar a escrever outro, é sempre longo e tediante. Seria bom ter uma distração. E graças a Deus eu não preciso de dinheiro. Meus livros me pagam muito bem.
Novamente as duas se entreolharam. Zhoe não conseguia parar de pensar que aquele homem devia ser uma miragem: lindo, simpático e gente boa. Com todas essas características, só podia ser gay.
— Olha, por mim tudo bem. E você pode desistir quando quiser. Sem qualquer ressentimento — Zhoe respondeu, e Paige concordou, balançando a cabeça. — Então, seja bem-vindo.
Depois de dizer isso, ainda com um sorriso desanimado, Zhoe se dirigiu à cozinha. Enquanto ainda vestia o avental com a logomarca da Sweet Dreams, Paige surgiu.
— Aconteceu alguma coisa? Você está com uma cara péssima.
Zhoe não queria conversar sobre o que tinha acontecido na noite anterior. Não quando tinha a impressão de que se pronunciasse o nome dele, ele surgiria como uma maldição.
— Adivinha quem voltou?
Paige levou apenas três segundos para compreender de quem ela poderia estar falando. Exatamente como Darlla, ela também se mostrou estupefata.
— Não! Você não pode estar falando de Tate!
— E quem mais poderia ser?
— O que aconteceu? Ele foi te procurar?
— Sim. Apareceu lá na pensão que nem um fantasma. Disse que está arrependido e que quer me reconquistar. Vê se pode? — Zhoe balançou a cabeça em negativa, demonstrando que desaprovava aquela atitude.
— Que cara de pau! E o que você fez?
Zhoe hesitou, passando a mão pelo rosto.
— A maior burrada possível. Foi totalmente impensado e impulsivo. Inventei que estava namorando alguém.
Paige novamente arregalou os olhos.
— Olha, por mais que eu ache que Tate mereça uma lição, você se encrencou.
— Sei disso. Vou pensar no que fazer. Por hora, vamos trabalhar. Vai lá treinar aquele espetacular espécime masculino. Vamos vender horrores para a mulherada da cidade.
Paige obedeceu, saindo da cozinha às gargalhadas.
Aliás, o dia inteiro foi assim, de risadas e um trabalho bem mais tranquilo. Craig foi o responsável pelo bom humor na loja, era agradável, simpático e muito charmoso com os clientes.
Zhoe podia dizer com segurança que Craig tinha salvado do dia todo. Tudo estaria perfeito se não fosse por um detalhe: eram quase seis da tarde quando Tate apareceu por lá. A loja já estava quase vazia, com exceção de duas senhoras — as mais fofoqueiras de Green Hill —, que tinham excedido o tempo que seria considerado limite para ficar em uma loja de doces só para sondar a vida inteira de Craig.
E claro que suas atenções se desviaram imediatamente de Craig e foram parar em Tate. Com certeza ainda não sabiam que ele tinha voltado. Além disso, só o fato de estarem ali para testemunharem uma possível conversa entre Tate e Zhoe parecia excitá-las ainda mais.
— A loja está linda, meninas, parabéns! — Foi a primeira coisa que ele comentou assim que se fez silêncio no ambiente e todos os olhares se voltaram em sua direção.
— Obrigada, Tate — Paige respondeu com educação, mas sem nenhuma simpatia, tomando para si as dores da amiga.
Depois de balançar a cabeça na direção de Paige, como cumprimento, ele se voltou na direção de Craig, que estava sem entender o clima pesado que de repente se formou ali.
— Zhoe, podemos conversar?
Céus, ele não iria mesmo lhe dar trégua, não era? E o pior de tudo, aquelas duas velhas ali davam certa vantagem a Tate, pois Zhoe nunca iria lhes dar o gostinho de tratá-lo mal, proporcionando-lhes a fofoca mais quente da temporada. Aliás, elas não pareciam nem um pouco dispostas a sairem dali, então, Zhoe teria que fazer algo que não desejava.
— Lá fora! — Ela apontou para a porta da loja e saiu detrás do balcão.
Tate a seguiu quando ela tomou a dianteira. Assim que chegaram na rua, pararam na calçada. Ele colocou a mão nos bolsos e ficou balançando para frente e para trás, inquieto, mas ainda em silêncio.
— Você não falou que queria conversar comigo? Vai ficar aí parado? Não tenho tempo para isso — ela foi ríspida e não sentia o menor remorso disso.
— Trabalhei o dia todo na loja do meu pai e depois foi pegar Colin na escola. Levei o menino para tomar um sorvete e percebi que ele está estranho. Respondão, alienado, desinteressado... Sei que é culpa minha, por ter ido embora sem explicação, mas queria saber se posso fazer alguma coisa para remediar essa situação.
— Remediar? — Zhoe se sentia confusa. — O que você acha que pode fazer? Talvez ficar perto do seu filho seja uma boa ideia. Ou, pelo menos, se despedir caso resolva ir embora de novo.
— Eu não vou embora. Quero ficar com vocês.
— Vocês? Não, isso é muita gente. Fique com seu filho e me esqueça.
— Zhoe... — Ao chamar pelo nome dela, Tate deu um passo à frente, indo em sua direção. Ela recuou.
— Tate, chega! Sei que temos que ter um bom relacionamento por causa de Colin, mas não vamos mais ficar juntos. Até hoje você só foi motivo de sofrimento para mim. Não quero mais sofrer.
— Porque você está com outra pessoa, não é? — testou ele.
Aquela era a deixa para que Zhoe falasse a verdade e acabasse com aquele problema. Porém, não tinha coragem. Então, a situação se tornou ainda mais caótica.
— Seu namorado é aquele cara que estava lá na loja? — ele perguntou com um visível ciúme nos olhos.
— Sim. — Outra resposta totalmente impulsiva.
Mas, por Deus, o que é que estava acontecendo com ela? Sempre abominou qualquer tipo de mentira, mas estava ali, falando inverdades das mais absurdas, principalmente envolvendo outra pessoa, sem qualquer motivo válido. Até porque seu único propósito era o de magoar Tate.
E conseguiu. Ele não precisou dizer nada para que ela tivesse plena certeza de que sua mentira tinha atingido em cheio seu coração, pois ele olhou para ela com olhos cheios de desesperança, virou-se sem dizer nada e foi embora.
Que Deus a amaldiçoasse por isso, mas ela chegou a sentir pena, o que era ridículo.
Quando voltou para dentro da loja, sentia-se mais miserável do que quando chegou pela manhã, depois da noite mal dormida. Ao menos as duas velhinhas fofoqueiras já tinham ido embora.
— Ah, Zhoe... — Paige, ao ver a amiga prestes a chorar, correu em sua direção e a abraçou.
As duas ficaram assim por algum tempo até que Paige se afastou para olhá-la nos olhos. Zhoe estava precisando tanto daquele abraço que chegou a sentir-se vazia quando ele terminou.
— Me desculpe por isso, mas acabei explicando por alto a situação para Craig — Paige falou.
— Não, tudo bem. Se ele vai ficar trabalhando com a gente por um tempo, é melhor que saiba. Acho que Tate vai acabar, aparecendo aqui uma vez ou outra. — Zhoe fez uma pausa. Havia mais uma coisa que Craig precisava saber. Ele precisava ter ciência que tinha acabado de ser promovido a namorado, sem que tivesse tempo sequer de se tornar amigo. — Craig, eu preciso te contar uma coisa. Você pode ficar chateado, e tem todo o direito. Pode também achar que eu sou maluca, e talvez eu realmente seja, mas foi uma péssima decisão impulsiva.
— Estou ficando preocupado, acho melhor contar logo. — Craig parecia divertido, mas Zhoe tinha certeza que ele não ficaria mais tão sorridente quando soubesse o que ela tinha feito.
— É o seguinte... — começou meio hesitante. — Paige deve ter contado o que Tate fez comigo, não contou? — Craig balançou a cabeça em afirmativa. — Para me vingar dele, eu inventei que estava namorando alguém. Então hoje, meio que sem querer, eu falei que esse namorado era você.
O silêncio foi a resposta. Mas era exatamente o que Zhoe já esperava. Por isso, prosseguiu.
— Mas não precisa ficar preocupado. Hoje mesmo, mais tarde, eu vou ligar para ele e desmentir toda a história, porque...
— Nada disso — Craig a interrompeu. — Você não vai se humilhar para ele dessa forma. Eu posso fingir que sou seu namorado por um tempo. Depois inventamos um término amigável.
Zhoe podia jurar que seu queixo tinha caído naquele exato momento.
— Você está falando sério? — ela precisou perguntar, pois estava difícil acreditar.
— Claro. Quando Paige me contou a história eu fiquei indignado. Não consigo entender como um homem pode fazer esse tipo de coisa, ainda mais tendo um filho. Não conheço esse Tate Barlow, mas vou gostar de te ajudar a dar uma lição nele.
Ah, Deus, ele com certeza só podia ser gay!
— Nossa, Craig, eu nem sei o que dizer.
— Não diga nada. O pagamento por mais essa ajuda pode ser feito em cupcakes. De preferência os de brigadeiro, que são fantásticos! Além disso, vai ser divertido. Mas preciso confessar que faz tempo que não tenho uma namorada, já nem sei mais como isso funciona.
— Não tem problema, seremos um casal discreto.
Craig gargalhou.
— Bem, Craig, se você quiser ir embora, acho que não teremos muito mais movimento hoje — Paige falou.
— É verdade. Aliás, você foi de grande ajuda. Vou poder dormir cedo hoje e ficar com o meu filho, já que não terei que assar duzentos cupcakes de madrugada.
— Foi um prazer. Aliás, meninas, vocês salvaram meus dias tediosos. E, de bônus, ainda ganhei uma namorada bonita. Sou ou não sou um homem de sorte?
Paige e Craig deram uma risadinha divertida, mas Zhoe não conseguiu se animar. Sua situação era patética.
Craig, portanto, saiu de detrás do balcão, deu um beijo no rosto de cada uma, dizendo um até amanhã e foi embora.
Assim que ele cruzou a porta, Zhoe correu para perto de Paige com uma expressão de quem estava ansiosa por uma boa fofoca.
— Meu Deus, Paige! De onde saiu esse cara? Ele é gay, não é?
Paige novamente gargalhou.
— Claro que não, Zhoe. Por que a pergunta?
— Porque ele é lindo e tão legal! Não pode ser hétero!
— Mas que teoria mais absurda! Jacob é bonito e é legal.
Fazia sentido.
— Até onde eu sei, Craig foi casado, mas sua esposa desapareceu, ninguém sabe dela até hoje. Acho que ele ainda se sente casado.
— Uau, que história. E envolveu polícia?
— Sim, mas depois de um ano o caso foi dado como encerrado. Havia sangue na sala, no tapete. Então, eles decidiram deduzir que ela estava morta. Mas Craig não desistiu. Até hoje ele gasta muitos de seus recursos tentando encontrá-la.
Zhoe sentiu seu coração apertar. Ela sabia exatamente qual era a dor de perder alguém sem qualquer aviso prévio. Ter aquela pessoa nos braços um dia e no seguinte sentir esses mesmos braços vazios... Sim, mesmo depois de anos, Craig ainda devia sofrer. Aquele era o tipo de ferida que nunca cicatrizava.
Tate estava exausto, mas tinha cumprido tudo que havia prometido ao pai. Em troca, conseguira a chave do pequeno apartamento nos fundos da loja, que era mais do que suficiente para um homem solteiro. Ele só esperava que aquela condição de solteiro fosse temporária. Queria Zhoe desesperadamente, mas do jeito certo. Queria se casar com ela, viver com ela, envelhecer com ela. Pena que tivesse percebido tão tarde. Com as costas doendo por passar tanto tempo em pé, Tate entrou no chuveiro e quase gemeu de satisfação ao sentir a água quente tocando suas costas largas. Apesar de estar cansado, depois de seu primeiro dia de trabalho verdadeiramente duro, sentia uma imensa satisfação. Sentia-se útil como há muito tempo não sentia. Durante o per&iacut
Quando Zhoe chegou na Sweet Dreams, encontrou Craig sentado na porta de entrada. Paige ainda não tinha chegado. — Acho que temos que te dar uma chave da loja. Na verdade era para eu ter chegado mais cedo, mas, para variar, o Tate surgiu. — Tate? Você está bem? — Craig levantou-se, enquanto Zhoe abria a porta. — Estou. O que posso fazer? Ele vai aparecer sempre, quando eu menos esperar. Preciso me acostumar com isso. — Talvez tenhamos que fazê-lo acreditar que você realmente está em outra. Já disse que posso ajudar com isso. O que acha de sairmos para jantar hoje de noite? Alguém vai ver e acabar contando para e
Rolar na cama era uma das piores coisas que poderiam acontecer a um ser humano. A insônia era uma verdadeira maldição. Zhoe estava acordada desde o momento derradeiro em que fora deitar na cama, sem ter sequer cochilado. Iria passar o dia inteiro com sono, bocejando, sem mencionar as olheiras. Para sua sorte, era domingo, mas simplesmente não poderia ficar na cama, porque precisava trabalhar em algumas questões burocráticas de sua vida. Já tinha problemas demais, então, estava na hora de eliminar alguns. Pensando nisso, levantou-se da cama, sentindo-se novamente com um péssimo humor. Aquele ia ser um dia de merda. E isso já era uma certeza, se levasse em consideração a forma como a n
De todas as pessoas que poderiam aparecer na pensão àquela hora, Zhoe podia jurar que não esperava que fosse Craig a bater à sua porta. A noite estava fria, então, ele vestia um casaco de couro marrom e um pullover de gola alta marfim. Céus, estava bonito! Estava, não, ele era. Tinha um porte másculo em um rosto que, sem qualquer explicação, inspirava confiança. Era o tipo de cara com quem a mãe de qualquer moça gostaria que a filha casasse. Até mesmo Zhoe estava tendo pensamentos muito obscenos em relação a ele naquele momento. — Boa noite, Zhoe. Me desculpa aparecer sem avisar, mas eu estava entediado, agora que terminei o meu livro, ent&at
O cheiro forte do hospital penetrava as narinas de Zhoe, mantendo-a consciente e ligada à realidade. Se não fosse por isso, seria capaz de jurar que estava vivendo um pesadelo. Mas ouvia as vozes abafadas ao seu redor e quase não sentia o toque da mão pequena de Paige na sua, enquanto esta rezava. Sempre se considerou uma pessoa forte, preparada para lidar com situações adversas, mas ali estava, vegetando em cima de uma cadeira, sem conseguir se mexer ou falar, sentindo-se completamente inútil. Para sua surpresa — e alívio — Tate tinha tomado as rédeas da situação. Era ele quem falava com os médicos, que fazia as perguntas e que decidia tudo. Foi ele também quem se ofereceu para doar sangue a Colin, que precisava de uma transfus&
O dia pareceu demorar mais do que o normal para amanhecer. Quando Zhoe abriu os olhos, depois de adormecer profundamente pelo que pareceu uma eternidade, o sol já raiava lá fora. O que ela não conseguia entender era o que fazia deitada com a cabeça no colo de Tate. — Que horas são? — perguntou enquanto se sentava. — Nove e meia. — Já? — ela se espreguiçou discretamente. Estava no quarto de Colin, em uma pequena cama que tinham montado para eles ali. — Como ele está? — apontou para a cama do menino. — Bem. Acordou cedo
DOIS DIAS DEPOIS Nada era mais gratificante para uma mãe do que ser seu filho em casa, com saúde e comendo um belo pedaço de bolo feito por Paige. A palidez tinha desaparecido de seu rosto, e sua risada, por conta das palhaçadas de Tate, ecoava pelo quarto. Aquilo aquecia o coração de Zhoe. Não podia negar que as cenas de pai e filho sempre a comoviam, principalmente porque eles pareciam compartilhar de uma cumplicidade belíssima. Muitas vezes, ela tentava imaginar como seria ter uma família de verdade com eles. Os três ficaram juntos por pelo menos uma hora e meia, naquele clima familiar, até que Colin reclamou de sono. Apesar de já estar bem, precisava de repouso por causa dos remédios para a dor, que lhe deixavam mais cansado.<
Os teimosos raios de sol ganharam espaço por entre as frestas da cortina e foram brincar com os olhos de Zhoe. Ela passou a mão por eles, coçando-os e despertando bem devagar. Ainda se sentia cansada, dolorida, mas não podia passar muito mais tempo na cama, principalmente porque tinha coisas a fazer. Levantou-se e colocou-se sentada na cama, chegando a ofegar por causa da dor na costela. Tencionando se recuperar, ficou parada por algum tempo, apenas observando Tate, que ainda dormia. Ele era lindo. Até mesmo as imperfeições de seu rosto, como uma pequena marca e catapora perto da sobrancelha, uma barba mal feita e falhada, uma cicatriz no queixo e um leve entortamento no nariz, consequências de uma infância feliz — algo que Zhoe nunca teve —, o deixavam ainda mais b