A mulher se aproximou toda pomposa. Cumprimentou meu namorado e dirigiu um olhar fuzilante em minha direção. Seus olhos transmitiam seu desprezo. Ela achou que assim eu abaixaria a minha cabeça, creio, depois de tudo o que aconteceu a seguir, esse foi o meu maior erro. Deveria ter ficado na minha, mas retribuí o olhar, sorri e acenei. Aquela doida possessiva levou esse gesto como uma afronta.Young-Chul apertou a minha mão, pediu licença e fomos até o camarote vip. Ele foi para o seu lugar no palco, e eu fiquei ao lado dos meus tios. A sensação de agonia voltou com força total. Após a apresentação, fomos direto para a casa dele sem falar com a imprensa. Dormi por lá, naquele final de semana que completava sete meses juntos, voltaríamos a Jeju. Foi uma viagem ainda mais linda do que a primeira, apesar do frio, o sol deu o ar da graça. Parecia uma despedida, e o sol a esquentava.Estava na sacada, vendo o mar, de olhos fechados, sentindo o estrondo das ondas batendo na enseada de pedra
Kang, Yen-Jun2020Desde a apresentação de Young-Chul, não tirei os olhos de Min-Ji. Eu também percebi o olhar de ódio da ex-namorada para ela, quando viu que o casal estava tendo um relacionamento sério. Sem ela saber, coloquei um segurança atrás deles, um agente aposentado que era especialista em parecer um fantasma.Para a viagem de inauguração do hospital, pedi que esse profissional seguisse de carro atrás dela a uma distância segura, para não causar suspeitas. Infelizmente, a maior dor é sempre lembrar que o pior aconteceu mesmo que ele estivesse a poucos metros de distância. Quando recebi o telefonema do segurança, fiquei em choque.— Alô, o que aconteceu? Por que você está ligando? — A sensação de pânico, mesmo sem saber nada ainda, aflorou só com o toque do celular.— Senhor, estou aqui correndo para socorrer a sua sobrinha, não sei como, mas o carro dela saiu da rodovia e colidiu com uma árvore. O airbag não foi acionado. Não sei como isso ocorreu… Ligue para a emergência. En
Ele deixou-se ser puxado até as cadeiras de espera. O som da ambulância fez com que ele se levantasse novamente. Quando Min-Ji foi trazida, deitada na maca e com o rosto ensanguentado, Young-Chul não conseguiu conter suas emoções. Correu até ela, tentando falar enquanto as lágrimas rolavam por seu rosto.— Min-Ji, fala comigo, por favor. Fala comigo — ele segurava a mão dela e andava junto com a maca, até que corri e o arrastei. Os médicos precisavam fazer os primeiros procedimentos.O médico fez um sinal, indicando que era hora de realizar os exames urgentes e iria levá-la para a ressonância magnética.— Young-Chul, todos estamos desesperados, mas os médicos precisam fazer os exames para avaliar o real estado de saúde dela, por favor. — Eu o puxei para um abraço, tentando transmitir algum conforto.Não sabíamos quanto tempo havia se passado. Sem comer, apenas bebendo café e água que minha esposa trazia. O tempo parecia ser nosso inimigo, passando devagar, mas correndo na contagem da
— Eu não consigo trabalhar, por favor? — ele pediu, achando que iríamos insistir para ele continuar a vida normal.— Não vamos recusar seu pedido, jamais. Ela precisa de você quando acordar. Fique tranquilo.— Mas o que explicarão para os contratantes de shows?— A verdade. A namorada sofreu um acidente, e ele está inconsolável.Revezamos para dormir no hospital, vivendo vinte dias nessa angústia insuportável. O médico nos recomendou que conversássemos com Min-Ji todos os dias, pelo tempo que desejássemos, e assim o fizemos. Os médicos não podiam prever as sequelas que poderiam surgir, e infelizmente elas não foram positivas.Seo-Yun estava no quarto quando ela acordou. Min-Ji se mexeu e interrompeu minha esposa, que estava lendo um livro. Assim que Seo-Yun percebeu o movimento, levantou-se rapidamente e se aproximou da cama e a viu de olhos abertos, meio assustada, com os olhos meio arregalados.— Oh, meu Deus. Você acordou. Estou tão feliz! Sentimos tanto a sua falta. Vou chamar o m
Min-JiA única pessoa que eu reconhecia entrou no quarto ao mesmo tempo, com um sorriso no rosto, mas também carregando tristeza pela situação. Eu estava deitada, virada para a porta. Me ajeitei na cama enquanto ele se aproximava e me deu um beijo na testa. Sentado ao lado da cama, segurando minha mão, começou a me contar tudo, sem esconder nada.— Min-Ji, o médico pediu que eu lhe conte toda a história. Talvez ajude no tratamento e recuperação da memória.Ela assentiu e escutou paciente toda a narrativa, sem me interromper.— Sou apaixonada por aquele rapaz? — perguntei com curiosidade. Certeza, tio? Parece não fazer o meu tipo.— Sim, vocês estão apaixonados, e muito. O médico acha importante que você pelo menos converse com ele, permita que fale com você. Isso pode ajudar a trazer de volta suas memórias.— E por que tenho medo dele? Senti como se ele fosse me machucar. Se somos apaixonados, isso não era para acontecer, você não acha? Conte a verdade, ele já fez algo comigo?— Nós a
Na noite anterior, conversei com as meninas e criei uma história sobre um pressentimento ruim em relação ao prédio onde morava. Pedi para passarem a noite na minha casa. Como éramos muito próximas, elas concordaram de imediato. Sabia que as encontraria no restaurante coreano, desfrutando de uma boa cerveja e momentos divertidos.O táxi me deixou um pouco mais adiante. Com uma pequena mala, entrei no estabelecimento e logo ouvi risadas. Elas estavam se divertindo com músicas populares brasileiras, afogando suas mágoas e rindo de qualquer coisa.Ao chegar à porta, o primeiro a me ver foi o proprietário do restaurante, o Sr. Cláudio, nome brasileiro dado por seu pai.— Meu Deus, você voltou! E está deslumbrante, menina Júlia. Quanta saudade, fez falta, hein.As duas me viram e correram para me abraçar. Nunca ficamos tanto tempo separadas. Elas sabiam do acidente, mas não em detalhes, e tinham conhecimento apenas superficial das minhas sequelas.Abracei também o dono do restaurante e me s
Ye-JunAo mesmo tempo em que Young-Chul recebia uma mensagem de despedida de Min-Ji, o motorista dela entrou com um envelope e explicou que a deixou no aeroporto sem saber seu destino. Tentamos ligar na hora, mas sem sucesso. O rapaz ligou para as amigas dela no Brasil mais de dez vezes até elas atenderem.— Olá, quem fala? Já recebi mais de dez ligações desse número no meu celular. — disse Ângela, a mais fluente em inglês.Young-Chul colocou no viva-voz para que todos pudessem ouvir.— Olá, tudo bem? Sou Young-Chul, namorado da Min-Ji. Gostaria de saber se ela está no Brasil. Ela saiu de Seul hoje, mas não disse para onde ia. Não temos ideia de onde está agora.— Vou matar essa garota! — disse Ângela, logo pedindo desculpas. — Onde ela está com a cabeça? Júlia deveria estar aí, tentando se lembrar... Ela nos disse que perdeu a memória. Young-Chul, estou triste porque ela não está aqui e já deveria ter chegado, caso tivesse vindo para cá.— Se ela aparecer ou souber do paradeiro, nos
Min-JiApós várias cervejas — não me recordo de quantas — misturadas com Soju, comprado em uma importadora, acordei com uma ressaca infernal. Minha cabeça pesava toneladas. Ao meu redor, percebi que estava no meu quarto. Vi a pequena mala vermelha, com um casaco de inverno em cima, o passaporte e a bolsa, tudo arrumado.O cheiro de café me guiou até a cozinha. As meninas estavam sentadas à mesa, assistindo ao noticiário, e pelo barulho do chinelo batendo na madeira, estavam bravas, elas olharam para a pessoa ressacada que vos fala.— Bom dia. Nem perguntarei como me trouxeram para casa. Pela dor na cabeça, acho que vim dormindo.— É, você nos deve muito, principalmente pela dor nos braços ao carregá-la. Percebeu a mala que estava no quarto?— Sim, e não entendi.— Você vai embora. Às seis da tarde, um avião particular contratado pelo tio vai te levar de volta para o lugar de onde nunca deveria ter fugido. Não se escapa dos problemas ou se afoga na bebida para esquecê-los, e nem venha