Young-ChulPavilhão culturalAinda me sentindo um tanto deslocado diante dessa cultura tão distinta, não pude evitar estranhar os gestos afetuosos entre Min-Ji e suas amigas. Havia pouco mais de um mês, Ye-Jun me contou sobre a surpresa que estava preparando para a minha amada. As amigas dela tinham mentido, alegando que não poderiam vir à Coreia, enquanto secretamente se preparavam para o show brasileiro na Conferência das Nações.As duas amigas tinham uma beleza notável, uma morena e a outra negra, ostentando corpos tipicamente brasileiros, traços que Min-Ji herdou de sua mãe. Com sorrisos contagiantes, elas conquistaram a todos, em especial Lorena, que fez o chef do restaurante, nosso convidado para celebrar o Brasil, ficar hipnotizado, seus olhos grudados nela como se fosse um encanto irresistível.— Chef parece hipnotizado — comentei, divertindo-me com a cena — Será que seu coração está batendo mais forte?— Apenas a achei bela. Nosso padrão de beleza difere bastante do de vocês.
Finalmente, aquilo se tornara uma realidade. O salão estava repleto de convidados, todos ansiosos pela entrada da noiva pela nave central. Vestido impecavelmente em um smoking, Young-Chul irradiava felicidade enquanto sorria para todos. Eu aguardava na lateral, pronta para caminhar. Tínhamos atravessado tantos dias de alegria, mas também enfrentado momentos de tristeza, e agora estávamos ali para celebrar o ápice do nosso amor.Vestidas com trajes azul-celeste, minhas amigas seguravam delicados buquês de flores-do-campo. Após terem participado do espetáculo cultural na Coreia do Sul, elas haviam permanecido no país por quinze dias antes de retornar ao Brasil. Lorena, que havia encontrado o amor no Chef, empolgou-se com a ideia de obter um visto de trabalho e vir trabalhar comigo no hospital. Já Ângela tinha uma ligação profunda com o Brasil e alguém a esperava lá, e ela optou por voltar definitivamente.Com o casamento programado para ocorrer em seis meses, Lorena decidiu permanecer n
Segundo motivo: As datas foram escolhidas meticulosamente, marcando a cerimônia para quinze dias antes do Carnaval. Com isso, consegui comprar um camarote para a família assistir aos desfiles das escolas de samba, além de ingressos para o ensaio da Portela.Terceiro motivo: Era a chance de apresentar a pequena Lili, o xodó mais recente da família Kang, ao país onde sua mãe nascera e onde o avô construíra uma vida com a mulher que ele sempre amara até o fim.Desembarcamos dois dias antes e partimos diretamente para Búzios. Alugamos uma casa em um condomínio fechado, o mesmo local onde, de frente para o mar, minha melhor amiga se tornaria a senhora Camargo. Eu e Young-Chu seríamos os padrinhos, enquanto a pequena Lili, acompanhada de Ângela, traria as alianças.O altar, montado pela manhã, estava simplesmente deslumbrante. Flores rosas e madeira compunham um cenário encantador. As cadeiras, enfeitadas com fitas douradas e arranjos de flores do campo em tons de branco e rosa, conferiam u
INTRODUÇÃOO brilho das lantejoulas prateadas no meu vestido refletia no espelho do quarto. A limusine já aguardava para me levar ao Dolby Theatre. Ao ser indicada para um prêmio da Academia de Cinema de Hollywood como melhor atriz coadjuvante, aos 21 anos, tive a chance de vivenciar o universo artístico que escolhi, onde brilhava como a estrela mais radiante do céu. No entanto, esse sonho me trouxe à tona uma realidade sombria e deteriorada que se escondia por trás das cortinas e das câmeras.Sendo assim, mesmo após estar devidamente trajada, abandonei o deslumbrante conjunto de brilho. Aproveitando que Jack, meu parceiro e também ator, já havia seguido para a cerimônia antes de mim, dei seguimento ao plano de fuga que elaborara.Deslizei a mala, que já estava pronta, para fora debaixo da cama. Coloquei uma peruca preta e lisa e recolhi os documentos falsificados que havia obtido no mercado clandestino. Adotei a identidade de Lily, deixando para trás o nome Sara Jim. Em menos de meia
Sentei-me com uma taça de vinho na mão e aguardei o anúncio da categoria de melhor ator. Jack era o favorito. Apesar de não acompanhar sua carreira, enquanto estive no calçadão, li a respeito. Quando ele subiu ao palco como o grande vencedor da noite e agradeceu ao público, percebi que nunca o havia esquecido, nem por um momento. Deixá-lo foi a decisão mais difícil da minha vida. Não me arrependi da escolha. Na época, forcei-me a acreditar que ele não me amava o suficiente para notar o que acontecia nos bastidores e debaixo do próprio nariz dele. Tentei relaxar tomando a garrafa de vinho e deitei logo após a saída de Jack do palco. Deitei-me exausta, mas lembranças do passado surgiam e desapareciam. Fragmentos de um passado distante. Lembro que, após vislumbrar seu rosto na minha memória, as últimas palavras que sussurrei antes de adormecer foram: “Hoje sou Lily, médica, cirurgiã neurológica.”***Acordei com Candance fazendo barulho na cozinha. Ela alugava o apartamento número dois
— Jack, onde vamos amanhã? Estou curiosa. Esse lugar é lindo. Tem tanto glamour — falou a atriz empolgada, enquanto arrumava uma sacola pequena no quarto.— Não sei, Pietra. Coloque o que precisar na sacola. Vou decidir na hora. O carro já está na garagem, sairemos pela rua dos fundos do hotel. Agora, será que podemos ir dormir?— Vá você, meu amor. A mochila de uma mulher precisa de vários acessórios – ela falou, beijando-me nos lábios.Antes que ela quisesse mais alguma coisa, pulei na cama e virei de lado. Demorei para dormir e sonhei com Sara, algo que não acontecia há tempos. O cenário era o nosso antigo quarto; ela estava em frente ao espelho do closet, vestindo-se para a cerimônia do Oscar. Trocamos um último beijo antes que ela desaparecesse completamente do meu mundo, deixando em mim um vazio no coração, junto com uma explicação chocante em uma carta.“Preciso fugir desse mundo de falsidade e podridão.”***Acordei assustado e suado. Além disso, perdi o sono. Fui para a sala
— Houve um acidente com o ator Jack Alton. Ele está com hemorragia cerebral e traumatismo. A namorada chegou viva, mas acaba de falecer. Preciso das duas agora no centro cirúrgico. Ele já está preparado. Os exames estão na sala.As pernas pareciam gelatina e não respondiam. O único pensamento era salvar o homem que amei e ainda amava. O outro pensamento era se daria conta.Fui me preparar, higienizar. Parecia um autômato. Candance só não percebeu porque também estava ligada no automático. Quando o vi deitado naquela mesa, a vontade era chorar e gritar. Respirei profundamente e durante cinco horas usei toda a técnica mental, espiritual e física, além da médica, para salvá-lo.A cardiologista saiu tão esgotada que foi para o quarto dos médicos e dormiu. Entrei no banheiro e chorei, mas não antes de avisar ao responsável. Cheguei à recepção, onde havia uma multidão de repórteres e perto de um homem magro, alto, loiro, olhos verdes – bem clichê. Deduzi que fosse o assessor de Jack.O home
Eu já estava no segundo copo de uísque. O bar, vazio, prenunciava uma noite chuvosa, como já havia sido anunciado no telejornal da noite. Cada gota que deslizava pelo vidro da janela parecia contar sua própria história. Por um momento, me vi mergulhada em silêncio, revisitando cenas que ecoavam desde o dia em que pisei em Seoul. Essas memórias se misturavam às lágrimas contidas nos olhos, que eu teimosamente evitava deixar rolar.O proprietário do bar, um homem de meia-idade que me tratava como filha, mantinha um olhar atencioso sobre mim. Desde o dia em que nos conhecemos, quando cheguei da Brasil e acabei do outro lado do mundo, na Coreia do Sul, construímos um vínculo que eu considerava como o de um querido tio. Mesmo de longe, do balcão, eu percebia a aflição estampada em seu rosto, preocupado com os pontos na minha cabeça, resultado do recente incidente. Porém, era a dor no meu coração que mais me turvava a mente.Uma parte de mim é estrangeira, uma revelação recente que me conec