Ágata
Somos interrompidas pelo telefone tocando, minha tia vai atender e volta dizendo que é um pedido de orçamento. E esse foi o primeiro de muitos que recebemos, no final da tarde já estávamos com todos os sábados agendados pelos próximos dois meses, isso significa que estaremos ocupados nas festas de fim de ano, não poderei passar as festas com meu pai. O telefonema mais inesperado foi de um dos hotéis mais importantes da cidade, que queria nos contratar para sua festa de réveillon.
Passo o final de semana fazendo orçamentos e, diferente dos outros que costumava fazer, esses eram imensos, pois a maioria das festas que pegamos era para o triplo de pessoas que estávamos acostumadas.
Fico feliz, mas, ao mesmo tempo, preocupada, pois teremos que aumentar o nosso quadro de ajudantes, as pessoas que nos ajudavam nas festas possuem outro emprego durante a semana, e o Bufê é uma forma de terem um aumento na renda mensal e todos são muito competentes no que fazem.
A semana passa rápido, minha matrícula na faculdade está feita, e estou tão feliz que só falto sair abraçando as árvores que encontro pelo caminho, nunca imaginei que conseguiria colocar meus planos em prática em tão pouco tempo.
Até que o que não estava planejado começa a acontecer... meu coração começa a bater um pouco mais forte toda vez que penso em um tal engenheiro metido a recreador infantil e cowboy.
Eu nunca namorei e não planejo namorar tão cedo, quando encontrar alguém quero que seja como meus pais.
O amor entre eles era lindo, meu sonho é formar uma família como era a minha antes de tudo se perder. Sempre tive umas paqueras, mas nunca passou disso, quer dizer, teve o Ditinho uma vez...
Ele era o menino mais lindo do colégio, tinha dezesseis anos e era jogador de futebol do time da escola, seu pai era um fazendeiro metido a rico, mas todos sabiam que ele estava era falido. Ele me pediu um beijo uma vez, eu tinha acabado de completar dezesseis anos e nunca havia beijado ninguém e me senti a “rainha da cocada preta”, principalmente, porque todas as garotas se desmanchavam por causa dele, e ele queria me beijar.
“Encontramo-nos debaixo da arquibancada do ginásio de futebol e ficamos um tempo conversando, um sentado ao lado do outro, de repente, ele foi se aproximando e pegando na minha mão, eu estava simplesmente desesperada, não sabia como agir. Tinha perdido minha mãe recentemente e não tinha ninguém para conversar, por mais que fosse muito ligada ao meu pai, não me sentia à vontade de conversar sobre garotos com ele.
Ele foi se aproximando cada vez mais e quando achei que fosse, enfim, me beijar, me puxou para o seu colo, apertando minha cintura. Tentei me soltar e senti sua boca sobre a minha, ele lambia meus lábios deixando sua saliva ali e empurrava sua língua dentro da minha boca, me senti enojada com aquela situação. Parecia que ele estava lambendo um picolé. Se isso era beijar, nunca mais beijaria ninguém enquanto eu viver, o pior de tudo ainda não contei... Ele me “lambia” de uma forma tão... digamos... intensa, comecei a sentir meu estômago embrulhar, nessa mesma hora ele me ajeitou em seu colo e senti que tinha sentado em algo duro, juro que não acreditei que ele estava excitado por estar me lambendo. Fiquei apavorada e não sei de onde tirei forças e consegui sair dos braços dele e saí correndo sem olhar para trás.”
Essa foi a última vez que encontrei com ele, logo depois houve um grande escândalo: a cidade descobriu que o pai dele estava falido e com problemas na justiça, ele foi preso e Ditinho se mudou para a casa dos avós com a mãe, pois estavam morrendo de vergonha pela prisão do pai e, realmente, por nossa cidade ser pequena foi o acontecimento do ano ele saindo algemado da delegacia.
Desde que conheci o Beto, senti um carinho muito grande por ele, devido à maneira que brincou com as crianças na festa no dia em que nos conhecemos, e por suas ações não imaginei que ele fosse rico, as pessoas com a mesma condição dele sempre fizeram questão de mostrar que o dinheiro pode comprar tudo, e ele é o oposto disso tudo.
Nunca imaginei que o encontraria novamente, mas como o mundo é pequeno, descubro que ele é amigo de infância de Luana e Alice, então, acredito que vamos nos encontrar muito.
Os orçamentos continuam a crescer cada vez mais, fazendo com que fosse preciso termos um espaço só nosso.
Hoje olho para trás e ainda não consigo acompanhar a velocidade de tudo o que está acontecendo em minha vida e não imaginei que fosse possível voltar para casa tão cedo para matar a saudades do meu paizinho.
Olho para a mala em cima da minha cama e sorrio feliz com as possibilidades que o mundo está me oferecendo.
Beto— Que lugar maravilhoso, filho! — meu pai diz assim que chegamos ao resort.— Lindo mesmo. As ondas aqui são ótimas, e o hotel é coisa de primeiro mundo. — Acabamos de chegar e estamos tirando nossas malas do carro, finalmente, depois de tanto tempo irei tirar dez dias de férias com meu velho.Chamamos a atenção de algumas mulheres que estão conversando na recepção do hotel, senhor Júlio foi pai novo e quem vê nós dois andando juntos, pensam que somos irmãos, inclusive, já enganamos muita gente assim, principalmente, as mulheres.— Bom dia, senhorita... — Já vai começar. Júlio e sua primeira vítima.— Cristiane, mas pode me chamar de Cris — Pisca para ele, flertando descaradamente.— Cris... Lindo nome para uma linda mulher. Reservas em nome de Júlio e Roberto Castro, por favor. — Ela só falta babar, quando meu pai repete o nome dela. Ele está debruçado em cima do balcão.— Suítes 403 e 404... — Sua voz soa sensualmente, a atendente olha fixo para meu pai, tenho que me segurar pa
BetoAcabamos por ficar o resto do dia na praia, alugamos um armário para guardar nossos pertences e ficamos à tarde toda nos revezando entre mergulhos, risadas e conversas sem importâncias no quiosque e, sem querer me gabar, sei que chamamos bastante atenção das mulheres que passam por ali.Já é fim de tarde, quando exaustos, resolvemos voltar para o hotel. Meu pai me avisa que vai jantar com Cris, a recepcionista, enquanto eu só queria a companhia da minha cama, e foi exatamente essa companhia que tive depois de um banho relaxante. Estou tão cansado que mal deito e já caio em um sono profundo.***Acordo com batidas insistentes na porta, levanto ainda cambaleando de sono.— JÁ VAI! — Nossa, que insistente. Será que o hotel tá pegando fogo?Abro a porta, pronto para matar quem esteja do outro lado, mas fico totalmente sem rumo e paralisado ao ver quem está em minha porta.— Olívia? — Arregalo os olhos, ficando totalmente desperto. — O que você está fazendo aqui? — Seus olhos vermelho
Beto— Mas ela não pode obrigar a você fazer uma coisa que não concorda! — Saber disso me deixa impaciente, pois sei que com dona Luísa tudo é possível.— Até parece que você não a conhece. Acredita que ela ainda teve a coragem de me dizer que vai fazer a lista dos convidados, e ainda me proibiu de convidar alguns amigos do colégio porque eles "não sabem se comportar em festa refinada" — imita a voz da nossa mãe. — Simplesmente porque são bolsistas, disse que não terão condições financeiras para alugar as roupas e não vão saber se comportar. Fico me perguntando como ela pode ser tão mesquinha. Como pude nascer dela... — É, pelo jeito, dona Luísa está colocando as garras para fora, mas parece que ela não vai conseguir manipular minha irmã.— E o que você quer? — coloco os cotovelos em cima da mesa curioso e posso afirmar que estou gostando de conhecer um pouco mais essa pirralha.— Na verdade, quero uma festa simples, nada de valsa e vestido longo. Quero guardar o dinheiro da festa par
Ágata― Vamos, tia, se a senhora continuar com essa moleza, vamos chegar ao sítio no Ano Novo! ― Nunca vi pessoa mais enrolada do que a dona Márcia para sair, parece que vamos ficar fora por meses e não apenas uma semana. Deixamos o senhor Joaquim, nosso vizinho, encarregado de ligar as luzes e pegar as correspondências, do jeito que anda a violência na cidade, não podemos facilitar de jeito nenhum. ― Esqueceu de que vamos num fusca e não em uma Ferrari?! ― Meu pai mora no interior, num pequeno sítio a duzentos e cinquenta quilômetros daqui.― Para quem não queria viajar, você está bem apressadinha, hein, Ág! ― minha tia diz, conferindo pela centésima vez, se as portas e janelas estão fechadas.— Quero chegar antes do almoço e fazer uma surpresa para o papai. ― Quando resolvemos passar o Natal no sítio, avisamos que iríamos chegar ao final da tarde, mas não estamos aguentando de saudade.Estou muito empolgada, é a primeira vez que vou dirigir durante a viagem. Meu pai, com muito sacri
ÁgataFizemos juntos o almoço, enquanto conto em detalhes de como está minha adaptação na cidade grande, minhas novas amizades, sobre o Bufê, as mudanças que aconteceram tão rápido e ver a felicidade e o orgulho em seus olhos quando falei sobre a faculdade, não tem preço...— Filha, sua mãe e seu irmão devem estar muito orgulhosos de você! — Seus olhos estão cheios de lágrimas, é assim toda vez que falamos sobre nossa família. — Tenho certeza de que estão fazendo a maior festa pelas suas conquistas.— Eu sei, pai... — Sento ao seu lado, o puxando para um abraço. — Sinto tanta falta deles...Ficamos um bom tempo em silêncio e, assim como eu, meu pai deve estar lembrando dos momentos que vivemos quando a nossa família ainda estava completa.— Pai... O Aurélio tá escovando os dentes do Gugu de novo!!! — gritei, enquanto meu irmão segurava firme a boca do Gugu e tentava escovar os dentes dele. Ele sempre fazia isso dizendo que o cachorro estava ficando com mau hálito.— Filho... Solta o G
ÁgataAo lado da árvore de Natal, as crianças estão montando o presépio, essa sempre foi a hora mais esperada por todas elas.Todos os anos escrevem seus nomes e colocam na meia do papai Noel, na árvore e quando é quase meia-noite, um dos adultos presentes vai até a árvore, pega a meia e retira um nome e essa é a criança escolhida para colocar o Menino Jesus na manjedoura, que está vazia agora.As mulheres vão para a cozinha e começam a preparar as comidas mais demoradas, e após deixar os assados no forno, começam a arrumar a mesa para o almoço com o prato de todos trouxeram, sempre que nos reunimos para as festas, fazemos as refeições comunitárias.Como senti falta dessa união! É uma das pequenas coisas que não encontramos na cidade grande, lá é cada um por si.O dia começa a se despedir e, com isso, uma noite linda chega, todos vão para suas casas se arrumar para a ceia, mas antes teremos uma celebração de Natal, meu pai faz questão de comparecer todos os anos na pequena capela que
ÁgataHoje pela manhã liguei para Luana, que contou sobre a festa no hotel, que foi um sucesso.Nunca vi papai tão animado, me desacostumei a dormir cedo e, o pior de todos, acordar cedo, e quando falo cedo, não estou falando seis ou sete da manhã e sim quatro da manhã! Horário em que muita gente da cidade está indo deitar, nós estamos acordando, e sete da noite já estou quebrada…E assim foi nossa rotina nesses dias em que ficamos por aqui, Malu vinha para cá quase todas as tardes, assim como dona Francisca, que sempre vinha nos trazer algo diferente e maravilhosamente saboroso. Tenho que concordar com minha tia, ela realmente quer conquistar não só meu pai, mas como todos nós, pelo estômago.Dona Francisca está viúva há dez anos e não tem filhos, era professora e, praticamente todos nós, passamos por sua sala de aula, sempre esteve ao nosso lado principalmente depois que tudo aconteceu.Em algum momento, desconfiei que ela nutria uma paixão secreta pelo meu pai e parece que ele tem
BetoNunca podia imaginar que depois de uma corrida maravilhosa, o destino nos passaria a perna, e nos levaria ao hospital, em vez de estarmos celebrando o noivado e a vitória de Rodrigo.Dia após dia fui vendo o sofrimento de todos ao nosso redor. Alice estava, assim como Luana, desesperada com a falta de respostas, a cirurgia havia sido um sucesso e, segundo os médicos, ele tinha que encontrar um motivo para sobreviver, e é nessa hora que minha ficha cai. Nós não somos nada e ainda ficamos brigando e não aceitamos aquelas pessoas que Deus colocou em nossas vidas, isso faz com que eu repense em minha relação com Olívia.Desde que voltei da praia, não estive com ela, nem ao menos liguei, e só de pensar que posso não ter a oportunidade de ser presente em sua vida, uma dor aperta em meu peito, então resolvo ligar e a convido para um cinema, ela aceita na hora, ainda não acreditando que a convidei para sair. Me despeço de todos no hospital, e vou para casa me arrumar para encontrá-la.C