Inicio / LGBTQ+ / Anoitecer Infinito / Capítulo 05 - Licença artística
Capítulo 05 - Licença artística

O QUE É? — RESPONDO MEIO GROSSEIRO COMO SE NÃO quisesse falar com ninguém nesse instante. Lucretia precisa parar de rir e coloco a mão na boca dela. — Vista-se. Os dois.

— Zane? Você está bem? — É Jay, ela bate freneticamente na porta, talvez esteja preocupada.

Caminho até a porta, confiro Lucretia e Lennon que já se escondem entre duas prateleiras. Eu espero que a imagem deles desapareça contra a parede escura. Vampiros da Casa Taseldgar como Lennon tem, entre seus dons, Ocultação nas Sombras. Eles também são muito belos, sabem cantar como os deuses e bons de cama.

Abro uma frestinha da porta.

— O que foi, Jay? — Eu a encaro.

Jaylee se interrompe com o punho fechado erguido, acho que ia bater mais na porta e abre bem os olhos dourados na minha direção, surpresa por me ver

— Você não vem jantar? Estamos te esperando para irmos para a mesa. — Ela me pergunta segurando os cabelos castanhos e ondulados, juntando-os com as mãos. — Não seja mal educado com sua família.

Claro que se ela não me passar uma bronca eu posso até considerar que estou olhando para um clone!

— Não estou sendo. — Estreito os olhos ofendido.

— Escute, Zane. — Jay força a porta, abrindo um pouco e dá uma espiada no que tem dentro do escritório. Ela é tão bisbilhoteira, credo! Depois acha alguma coisa e fica em crise histérica. Quando não encontra nada, ela olha para mim. — Por que você não está com suas roupas?

— Você não quer saber. — Dou a dica. Não estou nu, só não estou de camiseta e sapatos, Jay que é uma exagerada!

— Certo, nem me diga mesmo. — Jaylee estende as duas mãos dando um basta como se imaginasse o que tenho a dizer. — Sei que as coisas não estão fáceis para você, mas por favor, precisamos de você, tá bem? Não se isole. Não de nós. Promete?

— Pode me dar cinco minutos? Vou me vestir.

— Você não prometeu. — Ela estreita os olhos e cruza os braços, sagaz.

— Jay!

— Você está estranho esses dias e estou preocupada com você. — Jay pontua duramente e fico compelido a concordar com tudo o que ela diz.

— São muitas coisas acontecendo ao mesmo tempo, só isso. — Dou de ombros. — Não farei nada estúpido, prometo.

— Cinco minutos e quero você na mesa, mocinho.

— Estarei lá. — Viro de costas.

— O que é isso? — Ela pergunta. Ai droga! O que é dessa vez? Por cima do ombro, observo enquanto Jay segura do lado direito das minhas costas, perto da lombar, onde a marca dos Filhos de Aesis fica e eu me amaldiçôo por estar sem camiseta. — Por que sua marca está vermelha desse jeito?

Essa é a marca que comprova que sou mesmo um Sidhe e apenas minhas irmãs possuem marcas semelhantes, porém a marca que parece uma tatuagem preta nelas em mim é como uma picada de mosquito, vermelha e inchada! É uma das coisas que estou tentando esconder, longe dos olhos dos outros.

— Lucretia me arranhou agora a pouco quando estava gozando.

— Não seja indecente! — Jaylee abre bem os olhos e se retesa, incomodada. É sempre bom falar de sexo, ou as pessoas se empolgam ou elas fogem do assunto. — Vista-se logo. Não pense que vai escapar dessa vez.

— Prefiro morrer de fome a ter que me sentar à mesa com Kaiser, essa é a verdade.

— É por isso mesmo que você tem que ir. — Jay me lança um sorriso amável de quem consegue minha plena obediência e vira, andando pelo corredor. Fecho a porta e encosto as costas, respirando fundo.

— O que há de errado? — Lennon pergunta franzindo a testa.

Ele e Lucretia aparecem diante dos meus olhos dissipando a Ocultação e os dois já estão vestidos.

— É o que estamos tentando descobrir. — Lucretia responde e se aproxima do sofá, pegando minha camisa. Ela joga a roupa em cima de mim. — Pare de ficar dando bandeira.

— Eu esqueci! — Encho as bochechas de ar chateado pela bronca.

Lucretia tem razão, preciso tomar cuidado com os olhos bisbilhoteiros de Jay, ela é uma farejadora de mistérios.

— Por que não pergunta às suas irmãs? — Lennon arrisca.

Lucretia faz cara de tédio para ele, que responde erguendo as mãos, em sinal de que sua pergunta é legítima. Eu concordo.

— Estou relutante em dizer a elas depois de tanto tempo. Tenho medo de descobrir, pela segunda vez na minha vida, que minha família não é minha de verdade.

— Você viu as fotos que elas trouxeram, Zane, aquela criança é você. E você é a cara da sua mãe, não precisa nem de um teste de DNA! Além disso, se acharem necessário, a Casa Blonard tem meios de confirmar. — Lucretia se aproxima de mim. Respiro fundo e exalo ar pesadamente. — Considero essa questão a menos problemática. O que me preocupa, são as coisas que estão acontecendo com você.

— Que coisas? — Lennon indaga.

— Os poderes de Sirena, do quarto guaridão da natureza, não respondem para mim. Quinze anos tentando fazer redemoinhos na água e eu tenho certeza que não sou um dos Filhos de Aesis. — Explico. Ele fica me olhando com um misto de dúvida e curiosidade em seus olhos vermelhos brilhantes. — Além de andar na luz do dia e chorar lágrimas de água? Bem, tem a Renúncia, a falta de presas, meu coração permanece humano... Não sou nem vampiro, nem sidhe, não acho que sou Bawarrod, não sou Guardião de Aesis. O que eu sou, então? O que essa marca na minha pele significa?

— Eu te ajudo a descobrir, Zane. — Lennon se propõe. — Pesquisa da informação é a área que Taseldgar mais domina e, além disso, eu fui um agente secreto durante muitos anos pela guerra.

— Não levante suspeitas. — Lucretia aponta o dedo para ele, insinuando que Lennon fosse fazer alguma besteira.

— Como você vai descobrir uma coisa que nem se tem pistas do que seja? — Pergunto, descrente.

— Começar pelo que temos pistas do que seja. — Lucretia sugere. — Se você não é Sirena, há alguém que seja e para reestabelecer o equilíbrio do planeta, é bom que encontremos.

— Se as marcas ativam-se quando estão todos muito perto, então acredito que N-D44 é o local para se começar a procurar um humano ou vampiro com uma marca de tatuagem. — Lennon deduz simplesmente. — Posso começar a interrogar pessoas de forma oculta, ninguém conseguiria mentir para mim.

— Certo, você me convenceu. — Visto a camisa e me apronto para o jantar.

* N.A: A questão das guardiãs é amplamente explorada em Princesa das Sombras (livro 2).

●●●

— Você aqui de novo? — Devon fulmina Lennon com o olhar dourado assim que o vê.

Viemos do escritório direto para a mesa, nos sentamos primeiro que todo mundo e a família veio da sala de estar para cá aos poucos.

— Seja educado com meu convidado.

— Milan, não fale assim com Devon! — Lauralyn me repreende, com um olhar enviesado. Seus cabelos castanhos-claros estão presos em um coque elegante que a deixa com cara de uma executiva intelectual, os brincos grandes e dourados, parte do tesouro da Casa Zegrath, centelham com a luz do lustre de cristal. — Deveria ter avisado que Lennon viria jantar conosco.

— Amor. — Henri se intromete com um sorriso de deboche no rosto, inclinando-se um pouco como se confidenciasse um segredo para Lauralyn. — Devon está com ciumes de Zane. Já aconteceu isso comigo quando Zane e eu nos tornamos amigos, ele pensou que nós tínhamos um caso.

— Todos pensaram. — Lucretia se diverte.

Lauralyn dá uma risada divertida e belisca a bochecha de Henri.

O clima pesa quando Román se aproxima da mesa e acaba vendo o momento em que Kaiser faz um carinho pelos cabelos ruivos de Thalise, entrelaçando os dedos enquanto os dois conversam e sorriem um para o outro de forma íntima.

Ciumento, Román tira uma cadeira do lado de Kaiser e coloca exatamente entre os dois, forçando Kaiser a empurrar sua cadeira para o lado, fazendo uma espécie de troca de lugares. Román se senta truculento, terminando de empurrar Kaiser. Thalise imediatamente bate os cílios irritada para Román:

— Por que você é tão mau-humorado?

— Conheço Kaiser e você é minha mulher, deve sentar-se ao meu lado. — Ele responde sério e amargurado, apoiando um dos cotovelos na mesa, segurando o rosto.

— Román, pare de besteiras! Eu te amo. — Thalise sorri por achar que ciúme é prova de amor.

— Se esta com tanto ciumes é sinal de que não merece a mulher que tem. — Kaiser sentencia, impaciente.

Obviamente o clima romântico se desfaz depois desse comentário.

Thalise rapidamente se levanta da cadeira e pega a taça de vinho, tenho certeza que é o momento da mudança drástica de assunto, avaliando as expressões de Kaiser e Román nesse instante posso dizer que é a decisão mais assertiva para ela.

— Quero dizer a todos oficialmente que nosso querido irmão Kateus está vindo nos visitar! — Thalise ergue o copo, como se oferecesse um brinde. — Sei que ele está com muitas saudades... Ah, vocês vão adorá-lo! Um brinde a Kateus. Ele e nosso amigo de… infância, Logan.

Os copos de batem em um brinde esquisito, um cochicho rola pela sala.

— Logan de novo? Queria saber que tem esse cara de tão especial, é a segunda ou terceira vez que escuto falar nele só hoje. — Pergunto enquanto minha taça bate com a de Jay. Ela me dá um olhar mortal, como sabe que eu estou provocando discórdia. Desculpa, mas eu não vim jantar pela comida, confesso.

— Logan? — Henri rapidamente olha para Lauralyn como se o assunto o incomodasse. — Não é aquele cara por quem você era apaixonada?

— Eu? Não! — Lauralyn nega de imediato, mas todos podemos ouvir em sua voz o quanto ela provavelmente era apaixonada sim. — Danielle que ficou com ele, viveram um romance.

— Que história é essa? — Dorian vira-se para Danielle com cara de bravo. Ele é o tipo de homem que você não quer encontrar bravo. — Quando ficou sabendo que esse cara viria com seu irmão?

Jay me chuta por baixo da mesa. Olho para ela e sua expressão é de quem me dá uma bronca silenciosa. Sem som, faço um “o quê?” simulado, como quem não sabe do que ela está me acusando, até dou de ombros.

— Querido, nunca falei porque não tem importância, foi a muito tempo e eu nem lembro direito. — Danielle desconversa.

— É mesmo Danielle? — Lauralyn interfere, parece ressentida, mas na verdade está apenas criando confusão. Viu? Somos mesmos irmãos. — Se ele não significou nada pra você então por que eu te via aos beijos com ele?

— Pelo amor de Nether! Não vamos regredir nesse assunto, toda vez que surge vocês esquecem que são irmãs!  — Thalise procura apaziguar os ânimos. — Eu pensei que isso estava esquecido.

— Eu também pensei que isso estivesse esquecido. Eu já te disse que eu não sabia que você era apaixonada por ele! Supere. — Danielle enfrenta Lauralyn, inconformada com as acusações.

Dorian arrasta a cadeira para trás com brusquidão, joga o guardanapo de pano em cima do prato e sai da mesa irritado. Ih, acho que eu não devia ter tocado nesse assunto. Que bola fora!

— Bom, que eu me lembre ja peguei as duas aos beijos com Logan. Sidhes tendem a ser muito rápidos em suas conquistas. — Thalise olha para mim e pisca um olho, divertindo-se.

O que ela está querendo insinuar com isso? Se for sobre Kaiser, não vejo graça.

Henri ameaça se levantar da mesa também, mas Lauralyn rapidamente segura em seu braço impedindo-o.

— Henri, amor, por favor, me desculpe. Acho que me expressei mal. — Ela pede fazendo com que ele desista de sua saída dramática. — O que eu senti por Logan foi uma paixão de adolescente. Você sabe que ficou no passado. Quem eu amo e sempre vou amar é você.

Com a declaração pública de Lauralyn, que normalmente é discreta e não costuma fazer isso, Henri derrete. Ele abre um sorriso carinhoso para ela antes de colarem os lábios em um beijo cinematográfico.

— Acho que é o momento perfeito para servirem a comida, meu amor. — Devon corta o pequeno silêncio que se faz.

— Claro. Patuk… — Jay ergue a mão e acena para a governanta. Ela está pálida, como sempre fica quando as brigam tomam proporções gigantescas.

Por bem, acho melhor calar a boca enquanto servem o jantar.

●●●

Estamos conversando amenidades sem esbarrar em nenhum tópico delicado quando Dorian e Danielle retornam para a mesa. É notório que Dorian perdeu uma das casas de botões da sua camisa, ela está um pouco torta e seus cabelos estão bagunçados, motivo pelo qual a mesa inteira para de conversar e os observa sentarem-se em silêncio.

— Quero aproveitar o momento de silêncio para recitar um poema! — Lennon puxa o seu ukulele vermelho.

— Acho que não precisamos disso hoje. — Devon estende a mão para Lennon, que obviamente ignora e testa as cordas do instrumento.

— Esse é ótimo, compûs agora a pouco antes do jantar.

Como um barco exploro seu desejo

Entre suas pernas, tremo de prazer

Ondas de um mar revolto

Embriagado em braços quentes

Afogo-me em seu calor

Até o amanhecer

Cruzo olhares com Kaiser sem querer e ele está sorrindo para mim, talvez achando engraçado o poema erótico. É um breve cintilar de seu sorriso e meu coração tem um espasmo. Que saco! Não quero que Kaiser fique sorrindo para mim quando não se lembra de nada do que houve em nosso passado.

— Por que tenho a impressão que ninguém gosta dos meus poemas? — Lennon pergunta, já sentado na mesa.

— Eles não entendem a arte por trás deles, meu querido. — Lucretia faz biquinho e um carinho no rosto de Lennon. Ele ergue as sobrancelhas ponderando que ela, como sempre, tem razão.

Eles trocam um selinho suave.

Sigue leyendo en Buenovela
Escanea el código para descargar la APP

Capítulos relacionados

Último capítulo

Escanea el código para leer en la APP