Capítulo VI

MELANIE

─ Nãaoooo! Por favor! ─ Um medo atroz toma conta de mim com a possibilidade de ser pega por aqueles homens novamente ou ter de voltar para o convento. Ambas as possibilidades me aterrorizam. ─ Não me mande embora ou avise para alguém que estou aqui. Po...por favor! ─ Não aguento a pressão e caio em prantos.

Ainda é muito difícil para mim entender por que aqueles homens quiseram me sequestrar, mas mais difícil é entender como é que vim parar justamente na casa do homem que me deixa nervosa e com o coração aos pulos dentro do peito só de olhar para ele.

Quando acordei e o vi cheguei a cogitar a possibilidade de estar em um sonho, pois sentir suas mãos grandes acariciando meu rosto e ainda por cima ter seu rosto e seus olhos sobre mim, assim tão de perto foi à sensação mais maravilhosa do mundo!

Tê-lo tão perto e sentir aquela força que senti, nas duas vezes em que o vi, me fez querer parar o mundo só para prolongar o momento eternamente. Mas quando ele levantou bruscamente e se afastou para o mais longe que conseguia de mim, senti um frio absurdo, uma sensação de vazio tomou conta de todo meu corpo. Foi então que uma dor horrível latejou em meu ombro me fazendo recordar tudo! A tentativa de sequestro, a gana de lutar e por fim o medo atroz de não conseguir sobreviver.

Tudo voltou em minha cabeça e eu lembrei da fuga angustiante pelo meio da mata fechada e da perseguição daqueles homens horrendos, mas o que me fez tremer da cabeça aos pés foi a sensação da bala rasgando minha pele e da dor que senti, uma dor tão forte, ao ponto de me fazer fraquejar e desistir de lutar. Meu corpo não possuía mais energia para prosseguir e o que me restou foi apenas me entregar à escuridão chamando por meu pai em pensamentos.

─ Não se agite, por favor. Senão seus pontos irão abrir. ─ A voz grave dele me faz voltar a realidade. Ethan é o seu nome... Um nome lindo, assim como ele.

Deus! O que está havendo comigo! Por que fico dessa forma perto desse homem e por que só em ouvir sua voz meu corpo todo se arrepia? Não entendo o que esta acontecendo comigo nem com o meu corpo só por estar perto dele. Será que isso é normal? Será que todas as pessoas sentem isso que sinto por ele?

Tudo é tão novo para mim, tão fora da minha realidade. Mas o que eu entendo de normalidade mesmo? Não sou uma garota de dezessete anos como as outras, eu sou uma noviça que até ontem morava em um convento e que era humilhada, maltratada e que vivia a base de um regime rígido de disciplina que não me permitia sequer olhar o rosto das outras pessoas, quando estas estavam falando comigo. Então creio que minha reação ao ver um homem bonito de perto pela primeira vez deva ser natural, suponho.

─ Fique tranquila, não pretendo te levar ao Centro Médico e nem informar para alguém seu paradeiro, se é isso que você deseja. ─ Ele fala colocando as mãos no bolso da calça motelom.

─ O...obrigada, doutor. ─ Digo abaixando o olhar, como me foi ensinado.

─ Coma alguma coisa e descanse. Você ainda está muito fraca por causa da quantidade de sangue que perdeu e pelas horas em que passou ao relento.

Assinto sem olhar em sua direção.

─ Eu deixei uma bandeja com café da manhã na cômoda a sua esquerda. Se alimente bem para recobrar as forças, senhorita...?

─ Meu nome é Melanie Evans, senhor. ─ Ouso levantar a vista e vejo-o assentir com o semblante sério.

─ Ok. Descanse, Melanie. Daqui a pouco eu volto para pegar a bandeja. ─ Dizendo isso, ele segue em direção a porta, mas para ao ouvir o meu chamado.

─ Do...doutor? ─ Vejo-o virar-se em minha direção e minhas forças me abandonam quando seus olhos colidem com os meus. ─ E... eu gostaria de tomar um banho.

─ O banheiro fica naquela porta ali. ─ Diz apontando para a porta, que eu ainda não tinha percebido, a minha esquerda.

─ O...obrigada. ─ Falo olhando para ele, mas sentindo meu rosto queimar por vergonha.

Ele assente e se vai fechando a porta logo em seguida.

Eu tento levantar da cama, mas meu ombro dói um pouco, o que me faz parar, respirar e criar coragem para chegar até o banheiro. Com esforço levanto e sigo até a porta, abro-a e entro no pequeno banheiro, porém muito bem organizado. Fechoo a porta, paro em frente ao grande espelho disposto sobre a pia e vejo a minha imagem refletida nele. O rosto que está me olhando de volta, não é nem de longe o de uma pessoa feliz, como eu era antes de toda minha vida desmoronar. A imagem é de uma pessoa machucada, não só externamente, mas também internamente.

 As marcas em meu rosto devido à queda e o fato de descer o barranco rolando, fez os galhos caídos no chão arranharem todo meu rosto, com ferimentos superficiais, mas ainda assim marcaram toda a pele da face. Então meus olhos percorrem toda a extensão do corpo, vejo meu hábito rasgado e ensaguentado no local onde fui ferida pela bala, vejo também o véu, sobre minha cabeça, todo sujo com lama seca e folhas ressecadas. Com certa dificuldade, por causa do braço doído, consigo tirar o hábito e por último o véu, ficando apenas com a anágua e o sutiã que mais parece uma camiseta.

Após me livrar de toda a roupa evito olhar para meu reflexo no espelho, porque assim me foi ensinado, no intuito de não despertar a libido nem a curiosidade pelo o corpo e a sexualidade, pois o banho tem que ser o mais rápido possível. Ando calmamente até o Box e enfio a cabeça debaixo do jato de água morna, agradecendo a Deus por poder tirar toda a sujeira do corpo. Pego o xampu e tento lavar meu cabelo, a dificuldade para conseguir deixá-lo limpo é enorme, primeiro pelo fato do cabelo ser enorme e alcançar a altura da cintura, segundo por causa do braço ferido. Apesar da dificuldade consigo me lavar e saio do Box é então que percebo que não peguei toalha ou qualquer roupa emprestada para trocar.

Mas antes que pense em vestir minhas roupas sujas, que estão largadas no chão do banheiro, a porta se abre abruptamente, sem me dar chance alguma de me esconder ou cobrir minha nudez diante do médico que parece paralisado ao me ver nua.

Permanecemos alguns segundos assim, um encarando o outro sem saber como agir. Mas então desperto do torpor e tento, sem sucesso, me esconder atrás da porta do Box.

─ Perdoe-me por entrar no banheiro dessa forma. Eu bati várias vezes, mas como não obtive respostas acabei entrando, pois pensei que você tivesse desmaiado no banheiro. ─ Justifica-se.

Como não respondo, porque estou completamente mortificada, ele continua seu discurso um pouco embaraçado pela situação constrangedora.

─ Trouxe estas toalhas e umas roupas minhas para que se troque. Vou deixá-las sobre a bancada da pia para que se vista com privacidade. ─ Apenas assinto, ainda sem conseguir formular nenhuma palavra. Ele coloca as roupas e a toalha sobre a pia e sem mais uma palavra sai do ambiente.

Só ao me ver sozinha novamente é que consigo respirar sem dificuldades, na verdade pensei que fosse ter um ataque cardíaco, pois minha respiração corria rapidamente e meu coração batia fortemente no peito. Com o corpo todo tremendo desencosto da porta do Box e vou até a pia, pego a toalha e seco todo meu corpo e cabelo. Logo após me secar pego as roupas e começo a me vestir, coloco primeiro a calça de moletom, que ficou enorme em mim, como era de se esperar, o mesmo acontece com a blusa que faz par com calça. Já vestida e com os cabelos penteados, reúno coragem para sair do banheiro, coloco a cabeça para fora na intenção de saber se o médico está no quarto a minha espera, constato que não, e só assim entro no quarto, sento sobre a cama e começo a comer todo o café da manhã que está na bandeja. Como tudo, pois só ao saborear a comida deliciosa é que percebo que estava faminta pelo fato de não ter comido nada desde o almoço do dia anterior no convento.

Lembrar do convento me faz recordar da tentativa de sequestro, da atitude heróica do meu amiguinho Juan de tentar me salvar dos seqüestradores. Deus permita que nada tenha acontecido de mal a ele e nem a irmã Consuelo.

Decido que assim que estiver recuperada vou descobrir se algo aconteceu a ele, mas decido também aproveitar a oportunidade de não estar mais presa no convento e fugir para outra cidade e nunca mais pisar novamente naquele inferno.

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