Juliana segurava o copo de papel com delicadeza.Seus cílios longos caíam sobre os olhos, ocultando o turbilhão de pensamentos que se agitava por dentro.Helena não insistiu. Ficou em silêncio, como se já soubesse que a resposta não viria.Virou-se devagar, encostando os braços no corrimão de ferro gelado.A postura era de uma calma preguiçosa, quase displicente, mas os olhos… Os olhos estavam atentos. A mente, sempre alerta.— Eu acho que foi de propósito. — Disse ela, como quem comenta sobre o tempo. — Ouvi uns boatos… Parece que meu primo mexeu com o bolo de alguém.A frase foi dita num tom casual, mas acendeu imediatamente um alerta em Juliana.Seu pensamento voou direto para Felipe.Ergueu os olhos, encarando Helena.A garota não devia ter mais de dezessete, dezoito anos… Mas a maturidade no olhar era afiada demais pra idade.Parecia enxergar muito mais do que deixava transparecer.O tempo passou devagar. Minuto a minuto, como se a madrugada estivesse suspensa no ar.Foi só quando
Cidade A já estava no terceiro dia seguido de chuva.Juliana havia pedido folga da plataforma de lives e, desde então, se dividia entre casa e hospital num vai e vem exaustivo.As escoriações no corpo começaram a cicatrizar, formando casquinhas.As mais profundas exigiam trocas diárias de curativos e aplicação de pomadas. Uma rotina dolorosa, mas necessária.Bruno continuava internado na UTI.Nesses três dias, tanto os que tinham boa relação com a família Mendes quanto os que não se davam tão bem apareceram para fazer uma visita.Sem exceção, todos foram barrados por Joana.— Ju, você não precisa ficar vindo e voltando todo dia... — Disse com carinho. — Os médicos já falaram que o Bruno tá fora de perigo. Faz o que eu digo, vai pra casa e descansa um pouco.As olheiras profundas sob os olhos de Juliana não mentiam.Estava claro, ela mal havia dormido bem nos últimos dias.O coração de Joana apertava só de olhar.Do lado da polícia, o relatório oficial apontava que o motorista responsáv
Catarina foi ao hospital acompanhando o irmão, Vitor.Desde o episódio constrangedor no instituto, dias atrás, ela vinha se isolando no quarto, sem querer trocar uma palavra com ninguém.No momento em que soube do acidente de carro de Bruno, o coração de Catarina entrou em conflito.Bruno tinha humilhado Catarina na frente de todo mundo. Se agora ela aparecesse no hospital, não ia parecer que estava correndo atrás dele feito uma boba? Uma verdadeira puxa-saco sem amor-próprio?E se isso chegasse aos ouvidos do pessoal do meio? Que moral Catarina ainda teria?Ela hesitou por um bom tempo.Mas, ao saber que Vitor ia ao hospital, acabou cedendo ao impulso e foi junto.Ao entrar no elevador, Catarina virou-se para Vitor e avisou:— Se o Bruno perguntar o que eu estou fazendo aqui, diz que foi você quem me arrastou à força, entendeu, Vitor?Era o mínimo para tentar preservar um pingo de dignidade.Vitor já não aguentava mais ouvir aquilo. Desde que saíram de casa até chegarem ao hospital,
Cinco minutos depois.Paulo se endireitou, mantendo a expressão serena e controlada, e disse:— O caso do Bruno pode ter sido causado por um impacto externo no cérebro, o que acabou gerando uma confusão de memória.— E agora? Como resolve isso? — Joana franziu a testa, visivelmente preocupada.Confundir a ex-noiva do sobrinho com a própria esposa? Até pra novela mexicana isso já era demais.— Não me atrevo a dar um prazo pra recuperação. Mas, no geral, confusão de memória não costuma atrapalhar a vida cotidiana. — Respondeu Paulo, sem rodeios.Mal ele terminou, Gustavo lançou um olhar carregado de desconfiança, e a voz saiu seca:— Então quer dizer que ele pode nunca voltar ao normal?Paulo sacou na hora a hostilidade ali.Ergueu uma sobrancelha, mantendo a calma:— Não foi isso que eu disse. Mas também, né... A gente não é Deus. Tem coisa que só o tempo resolve. Pode melhorar amanhã, pode levar anos... A real é que ninguém sabe.O quarto mergulhou num silêncio pesado.Joana passou a m
O homem estava deitado na cama do hospital.Tinha uma faixa branca enrolada na testa, o rosto pálido, e, sob os cílios longos e espessos, os olhos escuros pareciam ainda mais profundos.Comparado ao ar nobre e sempre imponente de antes, agora ele carregava uma certa fragilidade... Um ar de quem estava quebrado por dentro.Juliana não conseguiu evitar de lembrar da última frase que Bruno disse antes de desmaiar:“Não tenha medo, eu estou aqui.Com aquelas palavras ainda ecoando em sua mente, alimentar Bruno com pedaços de maçã parecia algo pequeno demais para se negar.Ela cortou a fruta em pedacinhos e, com um garfinho, levou até a boca dele.Bruno ainda estava fraco, mal conseguia comer direito.Mesmo com a insistência dele, Juliana se manteve firme, não deixaria que exagerasse.No fim, Bruno cedeu, contrariado.Ela acabou comendo a metade que sobrou da maçã, devagar, mordida por mordida.Alguns minutos depois...Juliana lavou as mãos e voltou a se sentar ao lado da cama.A curiosidad
Mesmo após vários dias de investigação, ainda não tinham encontrado nenhum indício concreto.O motorista que causou o acidente morreu na hora.O laudo da autópsia foi claro, ele estava dirigindo completamente bêbado.E sua vida… Era simples ao extremo.Órfão de pai e mãe, recluso, sem amigos na Cidade A, morava num porão úmido e infestado de ratos.Com alguém como Bruno, um verdadeiro queridinho do destino, ele não tinha absolutamente nada em comum.Muito menos qualquer motivo para inimizade.Bruno estreitou levemente os olhos.Lá no fundo, ele já tinha um nome na cabeça.— Tinha um cara no instituto… Se chamava André — Disse, com a voz calma. — Roubou dados de pesquisa e fugiu. Na última vez que viajei pro exterior, foi por causa disso.Chegaram a pegá-lo e deram o devido recado.Mas depois, numa brecha, André escapou de novo.Segundo os relatórios da investigação, ele tinha uma ligação bem próxima com Viviane.Se o acidente realmente tivesse dedo dele… Então não havia dúvida, André e
Houve um breve silêncio do outro lado da linha.A pergunta de Maia realmente pegou Juliana de surpresa.A tal confusão de memória do Bruno... Era verdade mesmo, ou só fingimento?Se fosse fingimento, por que ele escolheria mentir justamente para ela?O silêncio se prolongou, e Maia ficou impaciente.— Ju? Tá me ouvindo?— Estou, sim. — Juliana respondeu, voltando à realidade.Mas, na verdade, sua mente estava uma bagunça.Ela sinceramente ainda não sabia como responder àquela pergunta.Era tudo confuso demais.Pra evitar que Maia insistisse no assunto, Juliana desviou rapidamente:— A Sarah ainda tá indo aí no escritório?Atualmente, a família Rodrigues vivia um verdadeiro caos.O caso de traição do Raul já estava mais que confirmado.Quanto ao suposto filho fora do casamento, por enquanto, era só suspeita, sem provas concretas.E Raul, claro, não admitiria jamais.Pelas leis atuais, se Sarah entrasse com pedido de divórcio, ele sairia como o culpado.Na hora de dividir os bens... O pr
Ela se remexeu no sofá, tentando encontrar uma posição mais confortável. Estava entediada e, por impulso, baixou o aplicativo da plataforma onde a Viviane fazia lives. Entrou só para dar uma espiada.Na transmissão, Viviane aparecia toda produzida, com a maquiagem impecável. Ao fundo, uma fileira de estantes luxuosas compunha o cenário, dava para ver que o estilo dela tinha ficado bem mais refinado.Algo tão fora do comum só podia ter alguma jogada por trás.Com certeza tinha alguém por trás disso, dando as cartas.Juliana não acreditava nem por um segundo que Viviane, que, na visão dela, mal tinha meio cérebro, tivesse sido capaz de bolar essa estratégia sozinha.Na cabeça de Juliana, Viviane sempre foi mão de vaca ao extremo.Talvez fosse um reflexo da forma como cresceu, sempre obcecada por dinheiro, controlando cada centavo.Mesmo depois de ser oficialmente reconhecida pela família, esse defeito nunca a deixou.Na época em que Juliana foi expulsa da família Rodrigues, e ainda teve