Eyla estava no banheiro, encarando o próprio reflexo como se esperasse uma resposta. A maquiagem perfeita escondia bem as olheiras, mas não mascarava o vazio nos olhos. O batom vermelho que ela acabara de retocar parecia uma armadura — um lembrete de que, apesar de tudo, ela ainda podia fingir.
Ela suspirou, afundando os ombros. Como havia deixado as coisas chegarem até aqui? Aquele jantar, aquela festa, aquele homem… tudo parecia um teatro em que ela era a única que sabia que o roteiro era uma mentira. “Noiva”, ele dissera. Com aquela voz cheia de posse, como se estivesse selando um contrato em público, sem ao menos consultá-la. — Ele só pode estar louco… — murmurou para si mesma, franzindo o cenho. Quando saiu do banheiro, o ambiente parecia ainda mais sufocante. As luzes do salão eram fortes demais, as risadas altas demais, as taças tilintando pareciam uma provocação. E então ela o viu. Justin. Vindo em sua direção como uma tempestade, o maxilar travado, os olhos faiscando de raiva. — Por que me deixou lá? Sozinho, feito um idiota? Todo mundo rindo, fazendo piadinha. Que merda foi aquela, Eyla?! Ela parou, cruzando os braços com calma, mas por dentro, o coração tamborilava. Não era medo. Era irritação. Cansaço. E algo novo... um pressentimento, talvez? — Acho que fiquei em choque por você pensar que eu iria me casar com você. — Ela disse, sem filtrar, a voz saindo firme, com um veneno doce de desdém. Talvez o espumante estivesse ajudando. Talvez fosse só a gota d’água. Justin arregalou os olhos, o rosto corando até a raiz dos cabelos. Por um segundo, ele parecia incrédulo. No outro, virou uma caricatura de fúria contida. — Como é que é? — ele sibilou, como uma serpente prestes a atacar. Antes que ela pudesse se afastar, ele agarrou seu pulso com força. — Você não sabe o que está dizendo. O aperto era firme, grosseiro. O tipo de gesto que dizia mais que mil palavras. Eyla tentou puxar o braço, contornar a situação discretamente, mas Justin apertou mais. Um ponto entre o desconforto e a dor se instalou, e a máscara de elegância que ela vestia começou a rachar. — Me solta. — Ela rosnou, a voz baixa, cortante. — Não aqui. Não agora. Você vai me ouvir. — Justin tentou sussurrar, mas seu tom era ameaçador, ácido. Nesse instante, algo mudou. Não foi apenas a raiva dela que cresceu. Foi… outra coisa. Um arrepio percorreu sua espinha. A sensação de que não estavam sozinhos. Que alguém, ou algo, os observava. Ela olhou ao redor, procurando instintivamente uma fonte para aquele incômodo. Não era paranoia. Era mais… primitivo. Como um lobo que percebe a presença de outro predador na mata. Justin continuava falando, cuspindo palavras feridas, enquanto Eyla já não ouvia. A energia ao redor dela parecia se comprimir, como se o ar estivesse sendo dominado por uma presença invisível. Ela sentiu a pele formigar. Do outro lado do salão, parcialmente oculto entre as colunas e sombras, Adrian observava. Seus olhos verde-intensos estavam fixos nela. No modo como seus ombros estavam rígidos. No modo como tentava esconder o desconforto, o medo, a indignação. Ele viu quando Justin segurou o pulso dela. Viu a expressão dela se contorcer. E algo dentro dele se partiu. Ele não queria se envolver. Mas agora, já era tarde demais. O lobo dentro de Adrian — selvagem, possessivo, protetor — rugia, exigindo ação. A tensão em seu maxilar denunciava o esforço que fazia para permanecer ali, imóvel. Ele podia ouvir cada palavra, cada batida acelerada do coração de Eyla. Ela ainda não sabia. Ainda não entendia. Mas aquele momento, aquele olhar trocado mesmo sem se verem… era o início. De longe, Adrian deu um passo. Pequeno. Quase imperceptível. Mas, se olhassem com atenção, perceberiam o brilho sobrenatural em seus olhos, como brasas verdes prestes a incendiar. Eyla, por sua vez, conseguiu finalmente soltar o braço. Deu dois passos para trás, erguendo o queixo, tentando manter a dignidade. — Se você me encostar de novo, Justin, eu juro que vai se arrepender. — A voz dela agora era um sussurro cortante, carregado de um poder que nem ela sabia possuir. Justin riu. Um riso nervoso, seco. — Tá ficando maluca? Desde quando você fala assim comigo? Ela encarou o homem à sua frente e, pela primeira vez, viu com clareza. Não havia amor. Não havia respeito. Só conveniência e controle. — Desde agora. E virou as costas, andando com passos firmes rumo à saída. Cada passada era uma libertação. Cada passo, uma quebra de corrente. Justin, atônito, ficou parado por alguns segundos. Depois, bufou e pegou uma nova taça de espumante, fingindo que nada havia acontecido. Mas Adrian... Adrian não tirou os olhos dela. Quando ela passou perto da coluna onde ele estava, seus olhos se cruzaram por um instante. Um instante suficiente para incendiar o ar entre eles. Eyla parou, o coração descompassado. Não sabia por quê, mas aquele homem ali, com aura sombria e olhar de floresta em chamas, a fazia sentir tudo o que havia tentado esquecer: o desejo de algo mais, o arrepio da verdade, o presságio de um destino que não podia mais evitar. Adrian não disse uma palavra. Mas ela ouviu, como se ele tivesse sussurrado direto em sua alma: "Agora começa."A fúria de Adrian era como um trovão silencioso, ressoando dentro dele. Seu lobo rosnava, inquieto, exigindo ação. Aquela mulher… ela não era nada para ele, e ainda assim, o cheiro de medo misturado à indignação que emanava dela atiçava seus instintos mais primitivos.Justin segurava o pulso dela com força, e Adrian não precisava de mais nada para agir.Com um olhar, deu um comando mental para Tor. Seu Beta entendeu imediatamente. Movendo-se com precisão, ele esbarrou propositalmente em um garçom, derrubando algumas taças. O vidro estilhaçou no chão, e a confusão momentânea atraiu olhares e comentários.No instante seguinte, Adrian avançou.Seus passos eram controlados, predatórios. Ele não precisava erguer a voz para impor respeito. Sua presença já bastava. O ar parecia ficar mais pesado quando ele se colocou ao lado dos dois, os olhos verde-intensos brilhando sob as luzes suaves do salão.Justin ainda não havia percebido sua aproximação.— Cara, você não percebe que estamos no meio
O coração de Eyla martelava em seu peito enquanto seus passos se aceleravam pelo asfalto frio da noite. O som de sapatos ecoando atrás dela confirmava o que já sabia: não era sua imaginação. Alguém a seguia.O ar fresco da noite parecia insuficiente para acalmá-la. Ela apertou a bolsa contra o corpo, o olhar fixo na calçada à sua frente. Virar-se e encarar quem quer que fosse parecia uma péssima ideia. Em vez disso, tentou aumentar o ritmo, forçando suas pernas a se moverem mais rápido.Mas os passos atrás dela também aceleraram.A adrenalina percorreu suas veias. Seu dom lhe dizia que a energia daquela presença não era comum. Era intensa, imponente, quase... selvagem.Eyla virou a esquina abruptamente, entrando em um beco iluminado apenas por uma única lâmpada pública piscando. Uma decisão irracional, talvez, mas precisava de um segundo para pensar. Encostou-se contra a parede de tijolos, prendendo a respiração.Silêncio.Por um instante, acreditou que tivesse despistado seu persegui
Capítulo 6: Ecos do DestinoO toque ainda queimava em suas peles, uma corrente invisível que os conectava de forma inegável. Eyla puxou a mão de volta, tentando disfarçar o impacto daquele simples gesto. Seu coração martelava no peito, como se tentasse avisá-la de que algo extraordinário havia acontecido.Adrian, por outro lado, manteve-se imóvel por um instante. Seu lobo rugia dentro dele, inquieto, impaciente, dizendo em sua mente para marcá-la ali mesmo. Ele jamais deveria ter permitido esse contato, mas agora era tarde demais. O vínculo já estava lá, pulsando entre os dois como um segredo ancestral.O silêncio entre eles se tornou pesado. Precisavam sair dali. Precisavam de um lugar onde pudessem, ao menos, fingir que nada disso era real. Adrian tomou a iniciativa.— Vamos tomar um café? — sua voz saiu mais rouca do que pretendia, como se estivesse lutando contra algo dentro de si, sabendo dentro dele que queria algo mais que um café, já sentia sua excitação crescer, e o cheiro de
O caminho até o apartamento de Eyla foi silencioso, mas o ar entre eles parecia eletrizado. A caminhada foi com uma calma calculada, enquanto Eyla tentava ignorar o calor que crescia dentro dela. Sua mente teimava em voltar para o olhar intenso dele, para a forma como sua presença era quase esmagadora.Quando chegaram, Eyla hesitou em sua porta. Sentia que, se cruzasse aquela porta, algo mudaria para sempre. Olhou para Adrian, e ele sustentou seu olhar com aquela intensidade avassaladora.— Quer subir? — ela perguntou, sem realmente pensar nas consequências.Adrian não respondeu de imediato. Apenas a estudou por um momento, e então assentiu. Eyla sentiu um arrepio percorrer sua espinha quando ele a seguiu até o apartamento. O silêncio entre eles agora era pesado, denso, carregado de algo novo e inexplorado.Assim que entraram, Eyla largou a bolsa no balcão e se virou para ele. O ar parecia rarefeito. Adrian estava parado ali, observando-a com um olhar que fazia seu coração martelar no
O sol começava a despontar no horizonte quando Adrian abriu os olhos. A luz suave atravessava as cortinas do apartamento de Eyla, projetando sombras delicadas nas paredes. Ele permaneceu deitado por alguns instantes, sentindo o calor do corpo dela junto ao seu. A noite passada fora intensa, e agora a realidade voltava a pressioná-lo com força.Eyla dormia profundamente ao seu lado, os cabelos espalhados pelo travesseiro, os lábios entreabertos em uma expressão de vulnerabilidade. Algo dentro dele se revirou ao observá-la. Ele não deveria estar ali. Não deveria ter permitido que aquilo acontecesse. Mas era tarde demais. O elo estava criado, mesmo que incompleto.O som insistente do celular vibrando na mesa de cabeceira quebrou o momento. Adrian esticou o braço e pegou o aparelho, vendo o nome de Tor na tela. Seu beta estava preocupado.— Adrian, onde diabos você está? — a voz de Tor veio rápida e carregada de urgência. — Você sumiu a noite inteira! Há movimentação estranha na alcateia,
A viagem de volta foi envolta em um silêncio pesado. Adrian mantinha os olhos fixos na estrada, enquanto Tor dirigia com uma expressão carregada. O beta respeitava o silêncio do alfa, mas sua preocupação era palpável. Conhecia Adrian há anos e sabia que algo estava diferente.— Vão te questionar — Tor quebrou finalmente o silêncio, seus olhos ainda na estrada. — Sua ausência gerou burburinho. Alguns estão desconfiados.Adrian apenas assentiu, sem desviar o olhar da paisagem que passava rapidamente. Ele sabia que sua posição exigia presença, força e decisão. E também que sua ligação com Eyla não passaria despercebida por muito tempo.Ao chegarem aos limites da propriedade da alcateia Sombra Azul, os guardas postados nos portões endureceram suas posturas ao avistar o alfa. Havia uma mistura de respeito e receio em seus olhares. Adrian não era somente temido; era uma lenda entre os seus.Assim que desceu do veículo, sentiu a energia carregada no ar. Os lobos estavam inquietos. Sabia que
O silêncio do apartamento de Eyla era quase ensurdecedor. A penumbra da manhã invadia o espaço através das cortinas semiabertas, projetando sombras suaves pelas paredes. Ela estava deitada, encarando o teto, imersa em um torpor estranho, como se seu corpo tivesse esquecido como se mover. O calor do corpo de Adrian ainda parecia impregnado em sua pele, mas ele não estava mais ali. Só o vazio restava.Ela fechou os olhos e inspirou fundo, tentando afastar o peso em seu peito. Mas a dor era real, quase física. Um aperto desconfortável, como se algo tivesse sido arrancado dela. “Por que dói tanto?”, sussurrou para si mesma. Nunca se permitira sentir tanto por alguém. Jamais deixara um homem atravessar suas barreiras internas, ocupar seus pensamentos de maneira tão completa. Mas Adrian... ele era diferente. Desde o primeiro olhar, desde aquele instante carregado de energia, algo dentro dela havia despertado. Algo antigo, quase instintivo. Como se sua alma o reconhecesse, mesmo sem entender
O arrepio que percorreu a espinha de Eyla não era um simples pressentimento. Era um alerta. Seu dom nunca falhava, e agora cada célula de seu corpo gritava que algo estava errado. Muito errado.Ela deu mais um passo para trás, se afastou da janela o quanto podia. Seu coração batia rápido, e sua respiração ficou rasa. Seus olhos se fixaram nas figuras que emergiam do beco, e logo percebeu que não era só uma. Três homens estavam parados do outro lado da rua, altos, imóveis, como predadores estudando sua presa. Um deles, com um sorriso debochado, ergueu a mão e soprou um beijo para ela. O gesto fez seu estômago revirar. Eles iriam ao seu encontro. O medo apertou seu peito, e seu instinto de fuga assumiu o controle.Se perguntando quem eram aqueles homens e o que queriam com ela, seu instinto de fuga assumiu o controle. Ela precisava sair dali. Agora.Agindo rápido, pegou seu celular e sua bolsa, movendo-se na ponta dos pés até a porta. Seu apartamento ficava no terceiro andar, e a única