Marcio MelloEu tava em casa, tranquilo, comendo meu milho-cozido, quando algo aconteceu. Não sei o que deu, mas acho que fui engolir o milho com pressa. Acontece, né? Uma hora você tá ali, saboreando o milho, e na outra... engasga. O grão de milho entrou reto na minha garganta, bem no meio, e eu comecei a sufocar. Minha garganta travou e comecei a tossir sem parar. Era um pânico total. Eu não conseguia respirar, e só conseguia pensar: "Meu Deus, como é que eu vou morrer com um grão de milho preso na garganta?"Fui direto para o hospital, sem saber se ia sobreviver ou não. Cheguei lá, entrei pela porta como um herói, mas com a cara de quem já tava se preparando para a tragédia. As enfermeiras estavam no balcão, conversando, quando me viram, e imediatamente começaram a rir de mim. A situação era tão absurda que nem eu conseguia acreditar.— Eu... eu me engasguei. — falei, tentando puxar o ar.Uma das enfermeiras olhou para mim com uma cara de quem tava tentando entender o que tava acon
Raila SalimO cheiro da terra molhada ainda estava forte no ar depois da chuva. O sol reaparecia entre as nuvens, iluminando os campos verdes do sítio. Eu observava Marcio com curiosidade enquanto ele cuidava da vaca da minha tia. Desde que ele começou a vir aqui, a rotina mudou. Ele tinha um jeito tranquilo e uma habilidade natural para lidar com os animais.— Ela vai ficar bem? — perguntei, tentando disfarçar a preocupação.Ele ergueu os olhos para mim, sorrindo de leve, e respondeu com a voz tranquila: — Vai sim. Foi só uma infecção leve, nada que esse remédio aqui não resolva.Fiquei em silêncio, observando com atenção. Era curioso como o Marcio parecia em casa ali, no meio da simplicidade do sítio. Diferente de mim, que sempre me senti como uma visitante nesse tipo de lugar.— Você às vezes parece bem deslocada, já percebi isso. — ele quebrou o silêncio, guardando o que sobrou do material que usou.— Realmente, ainda estou em processo de adaptação.— A vida aqui é mais devagar,
Eu corri pelo gramado, sentindo o vento fresco bater no rosto. A tarde estava linda, e o cheiro de terra molhada ainda pairava no ar depois da chuva da noite passada. Tudo parecia perfeito, até que meus pés tropeçaram numa raiz que insistia em sair da terra. Antes que eu pudesse me segurar, estava no chão.— Ai! — gemi, sentindo a dor latejar no meu joelho.Olhei para baixo e vi que ele estava esfolado, com pequenos pontos de sangue aparecendo. A dor era incômoda, mas mais do que isso, senti a vergonha de ter caído como uma criança desajeitada. Coisas estranhas tinham que acontecer comigo por quê?— Raila! — gritou tia Marta, correndo em minha direção com uma expressão preocupada. — Você está bem?— Tô... mais ou menos. — respondi, tentando rir para disfarçar. Foi muito constrangedor, ainda mais sabendo que minha tia viu tudo.Ela se ajoelhou ao meu lado, analisando o machucado com cuidado.— Vamos para a cozinha. Preciso limpar isso antes que infeccione.Não tive escolha a não ser se
Marcio MelloEra começo de noite, e o ar fresco da praça trazia um certo alívio depois de um dia quente. Raila já estava sentada em um dos bancos quando cheguei. Ela olhava para o nada, como se estivesse perdida em pensamentos. Sentei ao lado dela e esperei alguns segundos antes de quebrar o silêncio.— Faz tempo que está aqui? — perguntei, tentando soar casual. Não era assim tão comum encontrar Raila longe do sítio da sua tia.— Um pouco. — respondeu, sem tirar os olhos do chão. A voz dela estava baixa, quase um sussurro. — Só precisava de um lugar pra pensar. Tem dias que são difíceis, sabe? Nem todos os dias consigo sorrir e fingir que estar tudo ótimo.Olhei para ela, tentando medir as palavras. Sabia o que estava acontecendo, mas também sabia que precisava ter cuidado para não parecer invasivo.— Raila, eu andei pensando sobre sua situação que você me contou outro dia... Você não pode deixar isso passar. O que seu ex-noivo fez, falsificar sua assinatura, não é só errado. É crime.
Raila Salim O sol se escondia devagar por trás das montanhas, tingindo o céu de um laranja intenso que parecia até pintado a mão. Eu estava no quintal do sítio da minha tia Marta, cercada pelo cheiro de grama cortada e pelo som dos passarinhos que ainda insistiam em cantar. Era o tipo de tarde que parecia ter saído direto de um filme clichê, mas, sinceramente, eu estava adorando.— Raila, pega aquele cesto de roupa ali para mim, menina! — gritou minha tia, do alto da varanda, enquanto mexia em um novelo de lã que parecia maior que a cabeça dela.— Peguei, tia! Mas o que a senhora vai fazer com tanta roupa lavada? Parece que deu banho em toda a vizinhança.Ela deu uma risada alta, do jeito que só ela sabe fazer, com aquele som meio rouco que sempre me fazia rir junto.— Ah, menina, você acha que roupa se dobra sozinha? Aqui no sítio, até o varal tem mais trabalho que muita gente.Eu ri, pegando o cesto. Era pesado, mas a gente dava um jeito. Enquanto isso, tia Marta me chamou para se
O sol se escondia devagar por entre os galhos das árvores do sítio da minha tia Marta, tingindo o céu de tons alaranjados que pareciam saídos de uma pintura. Eu estava sentada na varanda de madeira, sentindo o cheiro da terra úmida que vinha depois da chuva da tarde. Era um lugar tranquilo, onde os sons da cidade não tinham vez, e tudo parecia suspenso no tempo.— Gosta de silêncio assim? — perguntou Marcio, sentado ao meu lado. Ele tinha uma maneira curiosa de falar, como se cada palavra fosse escolhida com cuidado.Olhei para ele, um pouco surpresa. Não esperava que ele quebrasse o silêncio.— Gosto. Me faz pensar melhor.Ele sorriu, um sorriso que me desconcertou. Marcio era o tipo de pessoa que parecia estar sempre em paz consigo mesmo. Talvez fosse o trabalho dele como veterinário, sempre lidando com animais, vidas simples e puras. Ou talvez fosse só ele mesmo, com aquele jeito tranquilo e firme que me fazia querer ficar mais tempo perto.— Pensar melhor? Sobre o quê?— Sobre tud
O parque chegou na cidade, e a novidade se espalhou mais rápido que fofoca em dia de feira. Eu estava empolgada, claro. Era o tipo de coisa que não acontecia todo dia naquele canto do interior. Assim que vi os brinquedos gigantes sendo montados na pracinha, corri para o sítio.— Tia Marta! Vamos ao parque hoje à noite? — perguntei, já cheia de expectativas.Ela levantou os olhos da costura, ajeitou os óculos na ponta do nariz e soltou um suspiro tão longo que quase me fez desistir.— Raila, eu não tenho mais idade pra essas coisas. Você acha que vou ficar rodopiando naqueles brinquedos? Minha coluna não aguenta.— Ah, tia! Nem precisa ir nos brinquedos, vai pela companhia. Vai ser divertido.— Divertido? Minha diversão é um chá quente e um capítulo da novela. Você pode ir sozinha, querida. Aproveite enquanto tem pique. — E voltou para a costura como quem encerra o assunto.Fiquei um pouco desapontada, mas a ideia de perder o parque não era uma opção. Então, me arrumei sozinha, coloque
Marcio MelloO vento fresco que soprava sob a varanda trazia o cheiro doce de terra molhada e flores-do-campo. A chuva tinha parado havia pouco tempo, e o céu ainda carregava tons de cinza, com alguns raios de sol ousando abrir caminho entre as nuvens. Eu estava sentado num banco de madeira envelhecida ao lado de Raila, observando o horizonte distante. O sítio da tia dela era um daqueles lugares que pareciam resistir ao tempo, com o som dos grilos e o canto dos pássaros preenchendo o silêncio.— Sabe, Raila. — comecei, com a voz mais baixa do que eu pretendia. — Eu nem sei por que tô falando disso, mas... já faz tempo que eu carrego umas coisas aqui dentro.Ela virou o rosto na minha direção, os olhos castanhos dela me encarando com uma curiosidade tranquila. Raila tinha aquele jeito de ouvir sem interromper, sem parecer apressada para responder. Era como se cada palavra tivesse peso.— Carrega o quê, Marcio? — perguntou, sem julgar, apenas querendo entender.Respirei fundo, sentindo