Capítulo 10

Dandara está paralisada, enquanto sua única reação é analisar o documento que agora parecia imóvel em suas mãos, pelo modo como elas tremiam. Quando os olhos de Dandara param naquele documento de licitação de modo minucioso, novamente aquela sensação a toma.

Dandara sente aquela pontada em sua memória outra vez, seguindo direto ao seu coração. Aquela sensação familiar a atinge fortemente, a fazendo desequilibrar ao ponto em que ela precisa se apoiar na mesa, seu coração se comprime no peito, anunciando um presságio gélido que corre em suas veias. Dandara sabe o que irá acontecer no instante seguinte, porque bem naquele momento, ela volta no tempo, em sua vida antiga e mesmo que agora tudo fosse diferente, as lembranças a engolem viva. 

A mulher então, assiste a memória de sua vida, como se fosse apenas uma espectadora, que sentia profundamente cada detalhe.

Ela estava deitada nos braços de Curtis, e bem ali, sente-se segura e sabe que não existia perigo porque ela estava junto ao homem que sempre jurou protegê-la. O homem que dividia muito mais que sua cama, dividia seu coração, sua vida, e os seus segredos. Essa revelação faz Dandara levantar a cabeça do seu peito, e ela recorda do que gostaria de compartilhar com ele.

— Você lembra quando te falei que estive trabalhando em novas ideias de marketing das indústrias LeBlanc?

Curtis a encara seriamente, e fica ereto no sofá, ouvindo atentamente as ideias de Dandara. E é quando ela revela detalhadamente todas suas ideias inovadoras, onde Curtis responde com apenas um sorriso, e diz as palavras exatas que Dandara sabia que ele diria:

— Eu acho que você pode tudo. — Sorri, e Dandara enxerga orgulho nas írises de Curtis. 

Dandara se liberta daquelas memórias, e sentando-se em uma cadeira, ouve as batidas do seu próprio coração sob seus ouvidos, a trazendo para o presente, para sua nova vida. Aquelas lembranças a atingiram com força, porque o documento que Dandara trazia em mãos agora comprovava, mais uma vez, que toda a sua história com Curtis não passou de uma mentira.

 Porque ela relembra que meses mais tardes, Curtis havia anunciado que as suas propostas haviam sido recusadas. Mas quando Dandara leu aquele documento, viu um tópico que Curtis não havia a revelado, um que ele ocultou para seu próprio benefício e manipulação. Acontece que, por causa de suas ideias, a sua família havia vencido aquela licitação.

— Isso significa que eu sou capaz. — Ela repete para si mesma, a sensação de uma autoconfiança palpável a tomando.

Na mesma proporção em que Dandara se sente feliz por sua família, uma tristeza profunda a invade. Porque ela pensa em Curtis outra, e em como ele esteve manipulando tudo em sua volta, a fazendo sentir-se insegura, incapaz. Lembra-se de cada palavra que disse, do como mascarou um falso amor só pela vã ideia de poder, pela ganância por dinheiro ou algum plano diabólico do qual ela não tinha a menor ideia ainda.

— Burra! Burra! Burra! — Dandara diz para si mesma, tomada pela fúria sentindo-se usada, e arrependida em seu ponto mais agudo. 

Dandara se levanta de repente, sentindo dificuldade para respirar dentro daquela imensa casa. O peso de arrependimento e tristeza parece esmagar o seu peito enquanto ela atravessa aquela porta larga e segue em direção ao jardim. Felizmente aquela festa havia terminado e não existia mais nenhum olhar curioso ou rosto conhecido ali.

Soltando a respiração enquanto exala o perfume das flores daquele jardim, ela se senta no banco de mármore posicionando bem em frente a uma fonte que criava sua performance na água que jorrava. Dandara realmente acreditou que ela estaria sozinha ali e que poderia ser entregue aos seus sentimentos, no entanto, a sua solidão não durou por muito tempo. 

Assim que olhou para frente deu de cara com os mais cintilantes e profundos olhos cor de âmbar, que a fitavam intensamente. A primeira coisa que Dandara percebe é o modo que o seu coração acelera de modo frenético, e em seguida sente-se surpresa com a presença daquele homem, todavia ali.

— O que está fazendo aqui? — ela pergunta de imediato, não se prendendo a enrolações.

Paco não a responde de imediato, apenas enfia as mãos no bolso da calça e continua a fitando, intensamente. O homem não precisava ser muito observador para perceber através das írises verdes dos olhos de Dandara, uma profunda melancolia. E aquela imagem o tocou em um ponto profundo, porque mesmo não sabendo responder como, Paco se sentiu irritado, porque jamais quisera ver qualquer tristeza na expressão de Dandara. 

— O que faz aqui? — Paco quem refez sua pergunta, se aproximando lentamente.

Dandara desvia os olhos do dele, escondendo os seus olhos marejados.

— Eu moro aqui, caso não recorde. — Ela diz, mesmo soando rude. 

— Por que está assim, Dandara? — ele indaga de modo imediato, a irritação se tornando maior. 

A mulher respira fundo no mesmo instante, se odiando e se auto maldizendo por ser tão transparente, e os seus sentimentos sempre sendo tão visíveis em sua expressão. Dandara sabia que não podia compartilhar seus sentimentos daquele modo, principalmente com Paco. Ele jamais poderia descobrir as suas inseguranças, ela não poderia entregar nas mãos do Paco os seus pontos fracos, ou ele saberia exatamente onde tocá-la, destrui-la.

Desse modo, Dandara apenas se põe de pé, e atua da melhor maneira possível, e encara Paco de modo desafiador.

— O que você ainda segue fazendo em minha casa? — ela volta a perguntar, o rosto muito próximo do seu.

Paco solta um alto suspiro em exasperação, sabendo que ela não revelaria o real motivo de estar ali, e a verdadeira razão pela dor em seu olhar.

— Por que me chamou para entrar? — Dandara voltou a perguntar, lembrando então do motivo em que a levou para casa horas antes. 

Naquele instante, Paco sorriu. Dandara se sentiu confusa pelo modo em que ele sorria, porque de repente havia mudado da expressão impassível que estava, pelo intenso sorriso iluminando o seu rosto. 

Mesmo tentando dissimular, ela não conseguiu evitar o que aquele sorriso a causou. A sua proximidade e perfume a desnortearam, porque a sua alma que parecia estar jogada em um rio em dia de tempestade, de repente se converteu para uma manhã coberta de luz.

— Você ainda não sabe, não é? — Paco sussurra, sua voz trazendo Dandara de volta, que continua tão confusa quanto antes. 

Paco aproveitou a hesitação de Dandara, que se afastou até a fonte e começou a molhar suas mãos na aula gelada, na esperança de apagar o fogo crescente em sua pele. 

— Iremos nos casar, Dandara. — Paco sussurra atrás da mulher, que fecha os olhos. — E você sabe o que isso ocasiona. 

No mesmo instante, Dandara vira sobre os próprios calcanhares e dá de cara com o homem que continuava com um sorriso no rosto. Aquelas palavras ricocheteiam na cabeça da mulher, porque por um instante ela se vê caindo em uma espécie de dejavu. Dandara sentiu como se já tivesse escutado aquelas palavras em algum lugar, em alguma outra vida.

— Não. — Ela profere então, se libertando do transe. — Isso não vai acontecer.

Ela entende repentinamente o que Paco se referia, porque aquele homem sabia que ela era sensata o suficiente e inteligente como ninguém. 

— Sim, Dandara. — Ele sorri. — Irei morar em sua casa, ficarei por perto o tempo todo. 

Quando diz isso, Dandara arfou no mesmo instante, tomada pela surpresa e sobre o que aquela revelação queria dizer, tudo o que aquela ação provocaria. Ela tentou dar um passo para trás, mas tudo que conseguiu foi dar um passo em falso sobre uma alta pedra, onde o seu salto enroscou.

Mesmo tentando se equilibrar, Dandara falhou. No entanto, Paco estava próximo o suficiente para a ampará-la, e em questões de segundos, Dandara se viu presa, agarrada nos intensos e fortes braços de Paco. 

Ela engoliu em seco, e olhou em seus olhos. Todo o seu corpo estremeceu nos braços dele, seu coração saltou e suas mãos suaram, ela sentia o toque dele queimando em sua pele. 

Sentindo-se fraca em seus braços, ela fez um enorme esforço para dizer:

— Me solte.

Paco sorriu levemente, e como se quisesse provocá-la, a apertou mais contra si. Fazendo seus corpos se tocarem ainda mais, ela arfou ao sentir todo o poder daquele corpo masculino contra o seu.

— Tem certeza de que é isso que deseja? — perguntou ele, sua voz era apenas um sussurro agora.

Seus rostos muito próximos um do outro, o suficiente para que ela imaginasse todo o tipo de coisa.

Segundos depois Paco interrompeu o contato visual, e inclinou sua cabeça, de modo que pudesse sussurrar em seu ouvido:

— Consigo sentir o bater de seu coração, e outras coisas mais. Seu corpo lhe trai uma vez mais.

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