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Capítulo 5 - A confiança

Pires 🥋

Falei com Isadora algumas vezes antes do meu julgamento, porém estava confiante em seu trabalho. Quatro meses trancado sem ter recebido uma sentença, quatro meses longe da comunidade sabendo que tô fazendo falta pra caralho.

Quando eu era moleque e vendia bala no sinal, eu via os engravatados passar e pensava que um dia, eu poderia ser igual a eles, mas eu mal tinha oportunidade para estudar, tá ligado? Aquilo ali era o sustento da minha família, então não tinha como eu perder tempo estudando quando eu deveria estar trabalhando para garantir o pão de cada dia. Minha mãe era uma viciada e meu pai, nunca ouvi falar.

Éramos 3 irmãos contando comigo, mas todos eram mais novos que eu, então querendo ou não, a responsabilidade inteira caía em cima de mim. Minha mãe não se preocupava em arrumar alimentos para nós, mas minha maior preocupação era minha irmã mais nova, Bárbara.

Eu descia cedo e só voltava a noite, e muitas das vezes meus irmãos estavam sozinhos esperando por mim, tive que amadurecer rápido demais porque eu tinha pessoas que dependiam de mim para tudo e essas pessoas, eram meus irmãos. Eu não tive infância, sempre trabalhei duro, pra ter o que comer dentro de casa, e minha mãe, nem se importava. Eu nunca chegava em casa com dinheiro, sempre gastava tudo antes de chegar em casa porque sabia que minha mãe pegaria. Ela vivia trocando feijão, arroz, e tudo que eu me esforçava pra comprar, por drogas.

Aos meus 17 anos, voltei a estudar, fui aprender a ler só com essa idade e consegui me formar. Nessa época, minha mãe já morava na rua e eu cuidava dos meus irmãos, além de trabalhar, não era muito, mas finalmente tínhamos o que comer dentro de casa que não fosse a miséria.

Até que um dia chegando do curso que eu fazia, queria ser advogado também, encontrei a casa toda revirada e Bárbara machucada, minha mãe havia ido até lá e procurado por dinheiro para sustentar seu vício, mas como não encontrou, agrediu minha irmã. Meu sangue ferveu, eu dava duro pra cuidar dela pra minha mãe simplesmente fazer aquilo com a própria filha. Eu sabia exatamente onde ela dormia, então, esperei a madrugada chegar, tirei a gasolina da moto que eu trabalhava de mototáxi durante o dia, coloquei em um galão e catei um isqueiro.

Ela estava deitada do lado de uma barraca feita por um lençol branco, a rua estava deserta devido ao horário, e para minha sorte, ela estava sozinha. Não pensei muito nas minhas consequências diante do ato, o que eu não poderia permitir era ela entrar na nossa casa, roubar nossa comida e ainda espancar meus irmãos.

Pela vida que ela me proporcionava, eu nunca senti aquele zelo e amor de mãe, ela via a gente mais como um peso em sua vida, o que eu fiz, diante dos olhos de muitos que se julgam os donos da razão, é errado, pecado e eu vou para o inferno. Se minha condenação for passar a eternidade nas profundezas do inferno por ter matado ela antes dela ter matado a gente, que seja, desço tranquilo e ainda abraço o capeta.

Então se eu não consegui realizar meu sonho, vou deixar que a dona realize o dela. Minha vida está toda errada, do início ao fim, mas se eu tiver que fazer a coisa certa na hora certa, eu faço.

Meus irmãos hoje em dia mal falam comigo pelo o que aconteceu, mas também não julgo, era a mãe deles também, po. Mas antes ela do que nós, tá ligado?

Encosto a cabeça na parede sentindo o ar penetrar meus pulmões, o tempo aqui dentro passa devagar, e minutos sem transformam em horas, teste de resistência parceiro. Só os fortes continuam, e os fracos morrem sem tentar.

— Seu julgamento é por esses dias, irmão? — Rogério, um parceiro de cela me pergunta.

— Falaram né, mano. Mas pelo visto eles gostam da minha presença aqui. Tô no aguardo da boa, po.

— Com fé tu sai, po. Tem crime nenhum na tua ficha, né não? — coço a cabeça sentindo o celular vibrar no meu bolso.

— Só desacato, mas isso aí não em nada. Eles estão tentando achar prova de que eu estava envolvido naquele assalto.

— E tu tava? — fecho a cara na hora e olho pra ele que está deitado, com o braço por cima da testa me encarando.

— se liga mas não se envolve, demorou? — me levanto tirando a mancha da parede que fica em meu braço, qualquer dia desses essa cela desmonta com todo mundo dentro, vai vendo. — fugia os guardinha aí, tenho que dar um confere no radinho.

Vou atrás da parede que divide o que eles chamam de banheiro, com o quarto, e me baixo ali desbloqueando o celular. Pra conseguir um aqui dentro, é muito fácil, basta está disposto a pagar quase mil reais em um celular que só manda mensagens e mal faz ligação.  Mas eu precisava, vou fazer o que.

Mensagem da Isadora, já logo abro o sorriso no automático.

Isadora: Leonardo? Quando puder, me liga. (13:47)

Ligo pra ela que chama uma pá de vez até ela atender, com a respiração pesada.

Pires: e aí, doutora? Tem notícia boa pra mim?

Isadora: cheguei no tribunal agora pouco. Pronto para sair desse buraco?

Pires: Po... — encosto na parede com os olhos fechados, e suspiro aliviado. — não vejo a hora de sair daqui.

Isadora: Encontro com você na quarta, por favor, não se meta em confusões até lá. Promete isso pra mim?

Pires: Ae Isadora!

Isadora: Sim?

Pires: Tu é firmeza, mina. Quero está presente quando tu conquistar esse mundão todo.

Isadora: obrigado por confiar em ser o meu primeiro cliente. Lembrarei sempre do que está fazendo por mim.

Pires: Esse é só o começo da sua trajetória.

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