Matheus
Minhas mãos tremiam enquanto o professor de física entrava na sala.
Uma coisa: minhas notas são maravilhosas, mas minha menor nota sempre era em física. Desde que comecei a ter essa matéria, nunca consegui 10. Era sempre 9,5 ou 9,75.
No caso, o 9,75 podia ser arredondado para dez, mas o filho da puta do professor arredondava pra 9,5.
Cara, eu odiava esse professor.
– Professor, você já tem as notas da última prova? – uma das meninas perguntou.
– Já vou passar pra vocês. – o professor respondeu se sentando e tirando o envelope de provas corrigidas da mochila.
Respirei fundo, ainda tremendo. Ok, ok, tudo bem. Eu não tinha entendido bem a matéria, mas tinha estudado bastante, tinha me dado um branco na hora da prova sobre como fazer as contas, mas eram todas de alternativa e eu tinha quase certeza de
RianGelei ainda na garagem.Alexia estava falando com a vizinha em frente ao portão.O Dobermanão estava com elas.E ele estava me olhando.Voltei para dentro correndo.Meu Deus, eu só queria comprar leite condensado pra fazer brigadeiro!Eu só queria uma porcaria de brigadeiro.Inferno.Já na sala me joguei no sofá irritado. Por que eu tinha que ficar assim só com um cachorro que ficou me olhando? Por que eu tinha que ser tão idiota e me prestar a um papel tão ridículo?Senti um beliscão no tornozelo e me sentei, tentando afastar esses pensamentos.“Você comprou o leite condensado?” – minha mãe perguntou.Hesitei.Merda.“Tava fechado.”Ela uniu as sobrancelhas não parecendo acreditar. Encolhi os ombros sem jeito. Ela sabia que
MatheusUni as sobrancelhas quando Alexia veio abrir o portão.– Ele me pediu pra vir abrir. – respondeu vendo meu rosto. – Não saiu do quarto hoje. Minha mãe teve que levar café na cama.– Eu pensei que o cachorro não tinha feito nada. – murmurei entrando e dando um abraço nela.– Ah, ele fez. – Alexia garantiu. – Fez ele lembrar que tem um medo fodido de cachorro. Era só o que precisava. Mas, tem males que vem para o bem, né, amorzinho? Eu consegui convencer ele a passar com uma psicóloga. Agora só vamos ter que convencê-lo a sair de casa no dia da consulta. Nada de mais. – apesar do tom relaxado, pude perceber quão preocupada ela estava.– Lexi, ele tá bem mesmo, não é?Ela parou, umedecendo os lábios antes de declarar:– Eu n&atild
Rian"Eles fizeram o que?" - franzi a testa para o meu celular. Do outro lado da tela, o Matheus deu de ombros, os olhos baixos. - "Mata eles!"Matheus deu risada, mas não pareceu ser um riso sincero. Dava para vê-lo encostado contra a cabeceira de sua cama, parecendo incrivelmente deprimido."Mata!" - repeti. - "Ou só dá um soco mesmo, também serve."Outra vez, ele deu risada. - "Eu to tão cansado daquela escola.""Bate em todo mundo e depois muda de escola!" - sugeri."Vou parar de levar os cadernos pra aula." - ele deu de ombros. - "O que os professores ditarem eu posso gravar no celular e copiar no caderno depois. O que eles copiarem na lousa, eu posso tirar foto e copiar depois.""E não vai bater em ninguém?" - franzi a testa."Primeiro, eu nem sei quem fez isso, então não é como se eu soubesse em quem bater.""Em t
MatheusMordi os lábios, grifando frases-chaves do livro de história e anotando as palavras e datas mais importantes em post-its. Ajustei meus óculos enquanto lia.Eu não uso óculos, mas quando estudava em casa, gostava de usar. Não tinham grau nem nada, eram apenas de enfeite. Mas, me sentia mais focado quando usava óculos.Coloquei meu colar de sodalitas e âmbares para dentro da camisa. Tinha quem acreditasse que aquelas pedras ajudavam a melhorar o intelecto. Eu não sou uma pessoa de acreditar em coisas místicas, mas, eu acredito em placebos.Então, acreditar que ajudava, fazia ajudar mesmo se no fim das contas aquelas pedrinhas não fizessem nada. Por isso, eu usava e acreditava e torcia para que desse mesmo certo.Pulei de susto ao ouvir meu celular tocar e o coloquei no silencioso imediatamente enquanto atendia a chamada de vídeo
RianQuando eu era criança, minha mãe dizia que eu tinha o nome de um anjo. Lembro de ter ficado bem revoltado quando descobri que ela estava errada e não era exatamente isso.Sinceramente, me senti enganado!Rian, ou Icarus como é em latim, é o personagem de uma história grega. E como a maioria das histórias gregas, é uma tragédia. A história era a seguinte:Icarus era filho de um inventor grego muito habilidoso, o pai dele foi quem inventou o Labirinto do Minotauro. Ele ajudou um herói a matar o Minotauro e fugir com a filha do rei, então, o rei ordenou que o inventor e seu filho fossem presos nesse mesmo Labirinto. Mas, essa ainda não é a parte trágica.No Labirinto, o inventor juntou materiais o bastante para planejar sua fuga. Ele juntou penas que caíam, fios e fez asas de cera.E, só uma pausa
MatheusRian parecia profundamente envergonhado enquanto tentava soletrar os palavrões para mostrar os sinais em seguida, mas sempre que ele estava quase acabando de soletrar escondia o rosto nas mãos por pelo menos dois minutos.Não vou mentir, era meio que adorável.“Pensa assim...” – falei quando ele ergueu o rosto novamente. – “Palavrões são palavras iguais todas as outras, mas que alguém decidiu que eram palavras feias. Mas, são iguais todas.”“Não são não!”“São sim!”“São palavras feias.”“Ensina logo, Rian!”“Eu to com vergonha!”“Por favor!”Ele virou o rosto respirando fundo antes de soletrar:“P-U-T-A” – ele colocou a mão aberta na frente do rosto, os
RianDuas semanas sem sair de casa e eu já estava enlouquecendo.Andava pelos cômodos em círculos, com o coração disparado e os olhos vidrados, sem saber bem o que estava fazendo, ansioso e ocioso ao mesmo tempo, a fadiga tomando conta do meu corpo. Sem forças para me mover e sem paciência para ficar parado, bagunçando meu cabelo e estalando meus dedos várias e várias vezes.A sensação de ansiedade era nauseante e os pensamentos vinham em ondas avassaladoras. As imagens daquele dia pareciam ficar indo e voltando repetidamente diante meus olhos, e, a noite, nos meus sonhos eu fugia de uma matilha de cães eternamente. Ao olhar pela janela durante o dia, era como se aqueles dois cães e o velho maldito estivessem do outro lado da rua, me observando.Lembro de ter ficado tão feliz quando ele morreu, mas de uma partezinha de mim, ter
MatheusOs últimos dois meses se resumiram na seguinte rotina:Depois da escola, eu vinha para casa, tomava um banho, almoçava e ia para casa do Rian. Lá, eu ficava tentando convencê-lo a fazer alguma coisa. Se eu insistisse demais, ele se irritava e ia para o canto. Na maior parte do tempo, acabava que ficávamos os dois quietos, então eu aproveitava para tentar fazer alguma lição. Às vezes, conseguia convencê-lo a jogar ou assistir alguma coisa, mas não era nada muito animador porque ele parecia... Não sei. Perdido. Como se não estivesse realmente prestando atenção no que fazia.Ver Rian daquela forma, frágil, me fazia sentir tão mal. Passava tanto tempo preocupado com ele... E também era cansativo. Era difícil e cansativo porque eu realmente me preocupava muito e isso acabava se somando com a afliç&