ClaireOs dias seguiam como um exercício constante de paciência e resiliência. Lucas ainda estava no hospital, preso na estranha desconexão que sua mente insistia em manter. Ele era fisicamente o homem que eu amava, mas emocionalmente, parecia um estranho. Eu precisava acreditar que havia uma forma de atravessar esse abismo.Era uma manhã cinzenta quando decidi tentar uma abordagem diferente. Gabriel e eu fomos ao parque antes de irmos ao hospital, e ele correu entre as árvores, rindo como sempre fazia. Algo sobre aquele momento parecia certo. A natureza vibrava com vida, mesmo sob o céu nublado. Talvez fosse isso que Lucas precisava: um vislumbre da simplicidade que uma vez compartilhamos.Voltamos para casa e preparei uma cesta com coisas familiares. Escolhi cuidadosamente: uma foto nossa emoldurada, o perfume que eu sempre usava, o pequeno casaco que Gabriel vestia quando nasceu. Cada item era uma peça do quebra-cabeça que eu esperava que ajudasse Lucas a reconstruir sua memória.Q
ClaireOs dias se arrastavam, um após o outro, como uma rotina sem fim. Levantar, preparar o café da manhã para Gabriel, levá-lo à escola e, depois, passar horas no hospital com Lucas. Cada dia era uma batalha silenciosa contra a sensação de perda. Eu sabia que ele estava ali, vivo, mas o homem que ele era — o homem que eu amava — parecia inalcançável.Naquela manhã, Gabriel estava animado. Ele parecia perceber, de alguma forma, que Lucas começava a fazer pequenos progressos, mesmo que não tivesse plena consciência disso.— Mamãe, o papai vai lembrar hoje. Eu sei que vai! — ele disse, segurando minha mão enquanto caminhávamos para o carro.Eu queria acreditar nas palavras do meu filho. Queria agarrar aquela esperança infantil que ele carregava com tanta naturalidade. Mas a realidade era muito mais dura. Lucas estava lutando, sim, mas sua memória era um quebra-cabeça cujas peças estavam misturadas e perdidas.Quando chegamos ao hospital, encontramos Lucas sentado à beira da cama, olhan
ClaireA noite havia sido longa. Depois de deixar o hospital com Gabriel, deitei-me no sofá da sala, abraçada ao vazio do silêncio. O relógio tiquetaqueava, uma lembrança implacável de que o tempo passava, mas para Lucas, ele parecia ter congelado.Gabriel dormia tranquilamente no quarto ao lado. O pequeno ainda carregava uma esperança que eu temia perder. Toda vez que ele dizia "O papai vai lembrar", eu sentia meu coração se partir em dois — metade ansiava por isso com todas as forças, enquanto a outra temia que nunca acontecesse.Eu precisava ser forte, por Gabriel, por Lucas. Mas às vezes a força parecia um fardo pesado demais.Na manhã seguinte, enquanto o sol despontava no horizonte, tomei coragem para mais uma visita ao hospital. Gabriel estava animado como sempre, segurando sua mochila com alguns desenhos que havia feito para o pai.— Mamãe, o papai vai adorar esses aqui! — disse ele, mostrando um desenho em que nós três estávamos juntos, sorrindo.Sorri, apesar do nó na gargan
ClaireO relógio marcava pouco mais de nove da manhã quando recebi o telefonema da equipe médica. Eles haviam notado mudanças sutis no comportamento de Lucas desde nossa última visita. O médico sugeriu que fosse uma boa ideia continuar com as visitas regulares, incentivando a exposição a momentos familiares.Eu concordei sem hesitar. Cada pequeno progresso era uma fagulha de esperança, e por mais desgastante que fosse, eu sabia que precisava manter essa chama acesa.— Gabriel, vamos visitar seu pai mais uma vez hoje, — anunciei enquanto o pequeno se vestia, puxando uma camiseta azul que Lucas havia comprado para ele em nosso último aniversário juntos.— Oba! — Gabriel gritou, empolgado, mas seus olhos brilharam com algo mais profundo. Era fé, pura e inabalável, no retorno de sua família.Preparei uma sacola com fotos, alguns vídeos no tablet, e itens que poderiam ajudar Lucas a recuperar as memórias. Havia álbuns de viagens, bilhetes antigos, até mesmo um dos seus relógios que havia p
ClaireNaquela manhã, o céu estava carregado de nuvens cinzentas que pareciam refletir o peso em meu coração. Desde que Lucas havia perdido a memória, cada dia era um novo desafio. Ele estava diferente — mais calmo, mais observador, mas ainda assim, um estranho em muitos aspectos.Gabriel estava na cozinha, mordendo uma torrada enquanto rabiscava algo em um pedaço de papel. Ultimamente, ele parecia determinado a ajudar Lucas a se lembrar, desenhando momentos que ele achava importantes. Hoje, ele havia desenhado uma grande árvore com um balanço pendurado em um galho.— Essa era a árvore do jardim, mamãe. A gente costumava brincar lá. O papai me empurrava no balanço, lembra? — Ele me mostrou o desenho com orgulho, seus olhos brilhando com esperança.— Sim, lembro sim, meu amor, — respondi, sorrindo. — Vamos mostrar para ele hoje.Peguei o desenho e o guardei na bolsa junto com outras memórias que esperava compartilhar com Lucas. Havia álbuns, cartas antigas e um pequeno caderno onde eu
ClaireA noite estava calma, mas meu coração não. Desde o dia em que levei Gabriel para visitar Lucas no hospital, algo havia mudado. Não eram as memórias que tinham retornado para ele — ainda não. Mas eu podia sentir que algo começava a despertar dentro dele, como um fogo lento prestes a ganhar força.Estávamos na sala de estar, Gabriel brincando com seus carrinhos enquanto eu olhava pela janela. As luzes da cidade ao longe eram um contraste gritante com a escuridão dentro de mim. Perguntei-me, mais uma vez, se havia algo que eu pudesse fazer para ajudar Lucas. As visitas, as memórias que compartilhávamos, tudo parecia tão insuficiente.— Mamãe? — a voz de Gabriel interrompeu meus pensamentos.— Sim, meu amor? — perguntei, me voltando para ele.— Quando vamos visitar o papai de novo? Ele parecia feliz com a música que você colocou. Acho que ele gosta de ouvir coisas que faziam parte da nossa vida. — Ele falava com a sabedoria ingênua de uma criança, mas suas palavras atingiram algo d
ClaireA manhã começou como tantas outras desde o acidente de Lucas. Gabriel estava animado para ir à escola, mas mesmo em sua empolgação, não escondia as perguntas que o inquietavam. "O papai vai se lembrar de nós hoje?", ele havia perguntado antes de sair. Era a mesma pergunta que eu fazia a mim mesma todos os dias.Depois de deixá-lo na escola, fui direto ao hospital. Carregava comigo uma pequena mala contendo coisas que, esperava, pudessem ajudar Lucas a recuperar as memórias. Fotos, bilhetes antigos, pequenos objetos que ele guardava com carinho. Estava disposta a tentar qualquer coisa.Quando cheguei, Lucas estava sentado na cama, olhando pela janela. Ele parecia calmo, mas havia uma inquietação em seu olhar.— Bom dia, — cumprimentei com um sorriso, colocando a mala no chão.Ele se virou para mim, oferecendo um pequeno sorriso de volta. — Você está sempre trazendo coisas para mim. O que é dessa vez?— Algumas lembranças, — respondi, sentando-me ao lado dele. — Achei que talvez
ClaireA manhã estava fria, e o sol tímido de inverno mal iluminava o céu. Meu coração estava pesado enquanto colocava Gabriel no banco de trás do carro. Ele parecia mais quieto do que o habitual, mas não era surpresa. A situação com Lucas estava pesando em todos nós, até mesmo nele, que geralmente tinha uma visão mais leve das coisas.— Mamãe, você acha que o papai vai lembrar da gente hoje? — ele perguntou, a voz cheia de esperança.Olhei para ele pelo retrovisor, tentando sorrir. — Não sei, meu amor, mas vamos fazer tudo o que pudermos para ajudá-lo.Gabriel assentiu, abraçando seu urso de pelúcia, um presente que Lucas havia lhe dado no seu aniversário de quatro anos. Era uma pequena conexão com o pai que ele adorava, mesmo que Lucas não se lembrasse mais disso.Chegamos ao hospital pouco depois. O ar estava cheio do cheiro de desinfetante, e o som dos passos apressados dos médicos ecoava pelos corredores. Gabriel segurava minha mão com força, como se temesse que eu o soltasse. Eu