Aviso: Os caps cujos números sejam acompanhados de ´´.5`` não seguem a cronologia dos demais capítulos, podendo se passar tanto no futuro quanto no presente e passado quando comparados aos outros. Também podem se passar no ponto de vista de outros personagens ou até de um narrador onisciente.
No cap a seguir acompanhará Augustus, um elfo, nos eventos que precedem a fuga da protagonista da cidade vampira, mencionada no primeiro cap e no prólogo.
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Foi quando Augustus finalmente o acertou, quando a lâmina trespassou a couraça que parecia imune a qualquer ofensiva, que o demônio mais perigoso e temível que já vira e o inferno deixado onde quer que este passasse desapareceram. Morto não era muito diferente de um vampiro qualquer, com um grande buraco no peito e cercado por um sem fim de cadáveres, não passava de outro corpo despido de vida.
Ainda assim, no momento que o elfo sentiu a energia mágica absurda do inimigo ceder, suspirou e caiu de costas numa poça de sangue. A tensão e o medo da morte que mantiveram Augustus de pé esvaídos. Uma enorme sensação de alívio correndo por sua alma mesmo naquele cenário horrendo.
Olhar para aquele vampiro durante os encontros que às vezes ocorriam entre representantes dos elfos e o de outras raças não o deram qualquer base que ajudasse a estar pronto para o lorde Fearblood no campo de batalha. Até vê-lo massacrar seus iguais, destroçando-os das formas mais selvagens, pensava nele como um homem calmo e ponderado. Agora não conseguia tirar da mente o monstro imparável e sanguinário que provavelmente teria exterminado os trinta mil elfos ali presentes se não fosse a super magia criada especificamente para lidar com vampiros.
Aquilo fora um desastre e Augustus sabia bem disso. Três dos elfos mais poderosos morreram na primeira grande batalha junto a um terço do exército, como ficou constatado horas depois na reunião entre os oficiais de mais alta patente.
Culpa do idiota rico, membro do conselho que regia Sangue Branco, que fez o que obviamente não era apto a fazer: pensou. Mas o pior veio a seguir, quando agiu sem pedir permissão e os forçou a pôr em prática o plano, nada superior a um rabisco de palavras jogadas ao vento, carregado da probabilidade de trazer o fim dos elfos se eles houvessem por algum motivo subestimado o poder de luta dos alvos.
Mas a culpa maior recai sobre a velha crença de que elfos eram os seres mais próximos de deus, depois das fadas, e todos os demais iam caindo como existência até o ponto de que não eram melhores que animais irracionais. A ideia da superioridade, o conceito ´´demônio`` imposto sobre algumas raças, a burrice inata a aqueles que se acham muitos passos a frente de alguém ao seu lado. Às vezes parecia que criar um sistema parlamentarista e deixar o alto sacerdote, ou pontifici, ser um de muitos a gerir as coisas saiu pela culatra. Agora tolos tinham voz e ela não se mostrava sensata.
E Augustus não gostava de matar.
Sentir o sangue espirrar em si, a carne ceder sobre sua lâmina e a vida sumir diante de seus olhos. De novo e de novo enquanto ouvia gritos de pavor e o cheiro de carne queimada subir por suas narinas junto a outros odores repugnantes.
´´E eu que achava matar monstros selvagens ruim…`` pensou com um tom amargo ao decapitar o último vampiro escondido no porão da taberna horas depois de ser curado e enviado de volta ao serviço. Aquele até tinha traços élficos, como as orelhas e a cor dos olhos. ´´Com esse são quinhentos`` disse para si mesmo enquanto a pior parte da invasão a cidade vampira chegava ao seu fim. Chacinar inocentes se mostrava, surpreendentemente, mais amargo do que ver companheiros soldados e guerreiros caindo no campo de batalha.
Ao seu redor o caos também começava a dissipar. Alguns lutaram, mas com aquela super magia ativa, vampiros eram acometidos por um terror quase absoluto e suas forças caiam numa grande porcentagem, embora o efeito de enfraquecimento reduzisse conforme se afastavam do ponto de origem da super magia e o medo levasse algum tempo para atingir o máximo que ela podia proporcionar. Demorou umas boas horas para ser completa, cada minuto até lá foi sofrido. Inúmeras baixas ocorreram e quase não sobrou alguém sem ferimentos. Se houvesse demorado mais um sexto de hora para estar funcional é provável que ele mesmo fosse um dos mortos.
Mas depois disso foi só abate. Não houve sobreviventes dentro das muralhas. O normal seria enviar algumas tropas para caçar fugitivos fora da cidade, porém a prioridade era outra. Urgente demais para desperdiçar até mesmo um par de olhos.
— Uma hora de descanso, depois comecem a busca. - A voz do comandante reverberou sobre o ar se espalhando, soube instintivamente, pelos ouvidos de todos os elfos presentes naquela investida.
Saiu do estabelecimento e sentou na calçada. A armadura manchada de sangue e suor, mas muito melhor do que ao fim da batalha contra o líder daquela cidade. Muitos ossos quebrados precisaram ser curados e o antebraço direito precisou ser regenerado do zero, além de vários outros danos ao qual não deu muita atenção devido à dor quase cegante. Se perguntava o que sua esposa e filhos estariam fazendo agora, perto do fim da tarde. Talvez voltassem de uma ida às compras, jogassem algum jogo ou preparassem o jantar. Isso de certo modo fazia o derramamento de sangue parar de o incomodar tanto.
Enquanto puder fazê-los capazes de sorrir, seus próprios dilemas, dores e convicções podiam ser deixados de lado.
Ouviu o som de alguns companheiros na outra rua e decidiu ir até eles. Seria melhor não ficar só. O sangue de incontáveis vidas fora derramado, mas aquilo não era mais que só o começo.
Édipo, o alto sacerdote, seu antigo mentor e amigo, pretendia seguir com a decisão do conselho e enviara seus melhores discípulos para a batalha. Todos velhos amigos de Augustus, embora bem mais jovens que ele, poderosos como exércitos e gênios. Três deles mortos pelo lorde Fearblood.
Ainda veria muitos rostos conhecidos falecerem antes que aquela empreitada terminasse, aquilo não estava nem de longe pensado para encerrar na queda de uma cidade apenas, e se sua suposição estivesse certa… Não, era melhor não pensar nisso.
Juntou-se ao grupo de elfos que desfrutavam de uma cesta de comida e vinho. Ninguém parecia muito festivo apesar das tentativas de gerar e manter uma conversa existirem. Arqui, Ene, Penty e Minos, antes eufóricos e animados pela perspectiva da batalha e do saque após ela, carregavam um semblante abatido.
Aquilo era bom. Ninguém deveria ser capaz de sorrir tão cedo após matar homens, mulheres e crianças que gritavam por suas vidas. Não importava se faziam parte de uma raça diferente.
Da última vez não os encarara apropriadamente. Estava numa fuga e eles em meio a um massacre, com gritos de agonia e morte os seguindo de perto. Ainda lembrava de como a lança atrevessou aqueles dois, um homem e uma criança, num único movimento. Do som de membros caindo no chão e casas explodindo sob o efeito de magia.Não prestara atenção em como os algozes de seu pai eram altos, brancos como o tecido mais alvo que já tivera e bonitos. Tinham olhos azuis e corpo musculoso sob a armadura simples, e eram fortes. O primeiro deles até mesmo desviara de um golpe súbito e mortal que lançara a seu pescoço.— É uma vampira, não é? - disse ele após esquivar e riu puxando em seguida a espada e pedindo com um gesto para os outros não
As outras duas cidades de vampiros caíram mais facilmente. Diferente da Cruz do Primeiro, elas não os viram chegando sob magia de camuflagem até que o primeiro soldado da linha de frente pisasse muralha adentro. Nem mesmo foi preciso usar a super magia contra eles, embora houvesse tido confrontos e baixas para os elfos, aquelas ainda puderam ser consideradas vitórias fáceis. Augustus até lutou contra alguns indivíduos formidáveis. Se não fosse o suporte de algumas dezenas de magos que acompanhavam seu pelotão existiria a possibilidade de que o resultado pudesse ter sido sua morte. Embora, claramente, não lutara com ninguém tão terrível ou forte quanto o vampiro Fearblood. Seu antebraço e mão ainda sentiam dores provindas daquele confronto e mesmo o menor pensamento sobre o combate o enchia de calafrios. Rank um a quase vinte anos e mesmo assim havia aquele en
Quando pensou naquilo não pôde deixar de ver como era óbvio. Não tinha possibilidade de o livro profético dos elfos, o símbolo máximo de sua religião voltada ao deus Branco, ter simplesmente aparecido na biblioteca dos Fearblood sem que alguém o houvesse posto lá. E não havia chance do alto escalão élfico não tomar isso como uma ofensa do mais alto grau e não realizar uma retaliação com força total. Sem perguntas, apenas derrubando a porta com seus melhores homens e destruindo os hereges. Na verdade, havia sido extremamente estúpido da parte dela só ter notado agora. Provavelmente aquela citação que dizia que um leitor não é necessariamente alguém inteligente era mais que palavras jogadas ao vento. Não acreditava que seu pai o tivesse roubado e tão pouco o fizera. A garota, durante toda a vida desde de que lembrava, nunca saíra do castelo, o que sabia d
Augustus já havia notado isso há um tempo, mas o número de demônios selvagens os atacando era bem acima do esperado desde a queda da segunda metrópole vampira. Embora tenha começado com monstros de baixo rank, isto já via-se diferente no dia que derrubaram a Centelha, a cidade liderada por outro grupo de vampiros. A última investida dos demônios selvagens teve até mesmo direito a criaturas que sequer faziam parte da fauna natural daquela região e a colaboração entre diferentes espécies. Ogros, lobos gigantes e sombras vivas. Muitos de baixo rank foram mortos e se as coisas continuassem nesse ritmo o exército dos elfos estaria cada dia mais fraco. Quando as novas tropas chegassem seria preciso ainda mais reforços e o ciclo se repetiria. Por alguma estranha razão as barreiras anti monstro falhavam uma atrás da outra. — Entendo, sim, ficarei feliz em acompanhá-los. Mas não sou dos mais fortes combatentes e tudo que tenho são magias de cura, elemental básica e aumento de desempenho. Acha suficiente? — Sim, mais do que isso. Esta criança comigo é bem forte, então contanto que possa dar suporte e curá-la no caso de uma necessidade já me dou por satisfeito. - respondeu o mercador usando o queixo para apontar para a garota. E sem muitos mais acertos deixaram juntos a cidade rumo a vegetação de árvores de porte grosso e baixo, com folhagem farta sobre suas galhadas, frutas e ninhos de pássaros. Um lugar que fora pensado para ser um enorme jardim pela unificadora Semiramis. Ela, antes de partir do lago, ordenou que naquela margem fossem plantadas vegetais frutíferos. Pretendia construir uma fortaleza próxima a floresta e então por estradas que ajudariam a percorrê-la. Mas no fim 4° O poço
Enzo não era apenas um velho tolo como seus colegas governantes de Semiramis pareciam crer. Ele sabia quando tentavam mentir sobre qualquer aspecto da situação na cidade. Graças, em grande parte, aos que mantinha perto de si como seus olhos e ouvidos. Apesar de às vezes, como agora, nutrir uma tênue tristeza pelo enfeite do cenário ser apenas isso. — Quantas baixas? - perguntou ignorando a tentativa feita de mantê-lo tranquilo com palavras cautelosas e vagas. Já sabia a resposta, mas queria terminar logo aquele teatro para começarem a parte produtiva da reunião. — Ontem morreram mais dez. - disse Jurandir após um suspiro que anunciou sua desistência da tarefa de manter Enzo longe dos problemas. - No total perdemos cerca de quatrocentos soldados e cem aventureiros. Alguns poucos de rank quatro e três.
— Aquele é um lugar amaldiçoado pelos deuses, um ponto de reunião para almas atormentadas. Não há o que encontrar lá além de morte. Recomendo firmemente que não vão. - a atendente começou tentando pôr medo e juízo neles. - Relatos dizem que uma quantidade anormal de mortos vivos vaga por ali e os lobos azuis são bem mais ativos nessa área. Ninguém irá com vocês, os aventureiros que estão aqui já conhecem o lugar, mas muitos mais foram para nunca mais voltar. Os pobres que tentaram ir fundo demais naquela área. Já tentamos pedir auxílio às grandes cidades, mas ou nos ignoravam ou pediam muito mais do que tínhamos como pagar. Esse é um dos maus de não fazer parte do território de uma das grandes metrópoles. E mesmo as duas aventureiras de alto nível que vieram não deram um fim ao problema, entregando algum vago relato e voltando-se a caçar os lobos azuis. Isso já se estende há quase um ano, não é tarefa para novatos. Tudo começou com um pequeno gesto de bondade para uma desconhecida. As trevas há muito tocavam a terra quando, por entre as árvores, ela surgiu. Carregava um embrulho de tamanho razoável e uma expressão selvagem que lembrava um animal encurralado. O casal que saíra para passar a noite na margem do lago a observou com certo receio, uma espada via-se presa às ancas da mulher por um cinto, mas ao notarem o bebê aquilo logo mudou. Os levou certo esforço para desvencilhar a estranha pessoa segurando uma criança de sua desconfiança, a trazer para junto da fogueira e alimentá-la com alguns peixes que haviam trazido para o piquenique. Assim que ela ficou confortável o suficiente, lhe foi pedido para contar sua história. Não recusou-se a fazê-lo, na verdade parecia ter mais interesse nisso que o casal. <5.5°