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Já era de madrugada e Hendrick não conseguia dormir, mesmo havendo sido acordado bem cedo por causa da reunião no Almirantado. Quando saiu, seus filhos ainda estavam dormindo e apenas desceram às nove horas para o desjejum. Foi complicado Hendrick explicar para Lady Tempera Mallory e para Marquês Dane de Rowell, que precisava sair em missão inesperadamente, que seria preciso deixá-los sozinhos em Londres para a Temporada com a Viúva Duquesa Rachel de Darchester, a mãe tagarela de Hendrick e tia da bonita Lady Ebonnie Nelson. Era verdade que prometeu estar presente na primeira Temporada de ambos em Londres, mas terminaram entendendo.
O próprio Hendrick sentia bastante o fato de não acompanhar seus filhos num momento tão interessante de suas vidas, mas tinha ordens a cumprir. Agora, estava sentado na poltrona de sua biblioteca, alisando um dos gatos de sua filha Tempera e analisando a situação, enquanto segurava um copo de brandy na mão e deixava seu olhar vaguear pela lareira acesa. Apesar de ser o começo da primavera, havia noites em que o clima esfriava e precisavam acender as lareiras, obrigando Hendrick a procurar algo mais que calor naquelas brasas.
Como sentia falta de Caroline... Em momentos como aqueles, era o refúgio que Hendrick buscava sempre e ainda que saísse em missão, sabia que a encontraria no mesmo lugar de antes, esperando ansiosa pelo seu retorno. Agora, Caroline estava morta e Hendrick sentindo o coração apertado. Não queria falhar naquela missão, não podia falhar. Precisava impedir que Napoleão triunfasse no seu plano insano de tentar invadir a Inglaterra pela segunda vez, para que seus filhos tivessem segurança. Apenas em ambos Hendrick se concentrava, mas, de repente, seu pensamento recaiu sobre Ebonnie...
Ebonnie sempre deixou-lhe claro o quanto gostava de sua pessoa e aos vinte anos, apenas não se casou devido continuar tendo a esperança de Hendrick vê-la com outros olhos algum dia. Isso, por mais que Hendrick nunca tenha dado-lhe falsas esperanças, gostava de Ebonnie também, mas como sua prima querida, um sentimento que rezava para que mudasse em amor. Entretanto, será que num momento de solidão como aqueles, não seria melhor reconsiderar a situação?
Hendrick se lembrou quando perdeu Caroline. Era de tarde, o médico que atendia a família Mallory, o Doutor Andrew Windham, tentou fazer de tudo para salvar a doce Caroline, mas um tumor no cérebro, tomou conta de tudo e nada puderam fazer para restaurar sua saúde. Mas Hendrick não culpava Andrew da morte de Caroline, foi uma fatalidade.
Andrew pediu para Hendrick entrar no quarto, que Caroline queria conversar. Quando chegou lá, Caroline estava recostada nos travesseiros e parecia muito fraca. O rosto continuava delicado, como de uma orquídea. Hendrick começou a chorar, ao se aproximar e segurar suas mãos.
— Hendrick, por favor, não chore! — A voz de Caroline era apenas um sussurro. — Sei que vou morrer e quero dizer-lhe, que não se feche para o amor, caso venha a se apaixonar de novo.
— Não, Caroline, eu não quero mais ninguém nessa vida, senão você, meu amor! — Hendrick implorou, muito emocionado. — Você é tudo o que quis no mundo!
— Meu amor, te amo demais e onde quer que eu esteja, cuidarei de você de algum modo... — Caroline comentou, sorrindo um pouco. — Agora, partirei, mas quero que saiba, que você é o homem que mais amei nessa vida e ninguém nunca teve meu coração, senão você, que Deus abençoe-lhe e cuide de nossos amados filhos...
Depois disso, Caroline fechou seus olhos e as mãos, que Hendrick segurava, perderam as forças. Caroline morreu de modo muito sereno.
Agora, Hendrick se recordava disso e as lágrimas tomaram conta de seu rosto. Caroline ainda continuava sendo seu grande amor. Mas depois, se recompôs, tinha planos para concretizar.
Nos próximos dias, sairia de Portsmouth comandando aquela missão e Hendrick rezava para que tudo corresse bem. Cada detalhe deveria ser exato. O tempo corria e determinados pontos já estavam programados, mas havia uma preocupação. Seus superiores disseram-lhe, que da mesma maneira que os agentes Ingleses pareciam estar trabalhando bem em descobrir alguns segredos importantes como aqueles, a preocupação era que os espiões de Napoleão sabiam agir também.
O Ministério temia que alguém estivesse infiltrado no próprio Gabinete e terminasse descobrindo todo o plano da missão de Hendrick antes do tempo, colocando algum risco nisso. Era um fato que preocupava-os muito. Napoleão havia ganhado diversas batalhas com a ajuda desses espiões, portanto, não deviam desprezar a astúcia do inimigo. Muito menos em se tratando de Napoleão realmente. Tanto que pouco antes de sair da reunião, ainda que sabendo que Hendrick nunca comentaria com ninguém o que conversaram, Spencer lembrou-o pela segunda vez que tudo o que foi conversado ali, deveria ser mantido no mais absoluto segredo.
E assim, enquanto Hendrick torcia para que nenhum maldito espião de Napoleão atrapalhasse sua missão vital, esperava que seu sexto sentido revelasse-lhe qual a estratégia que os Rousseaus usariam para enfrentá-lo diretamente também. Mais que nunca, precisava dessa visão e implorava para Deus que aquela resposta viesse depressa, antes que fosse tarde demais...
*****Portsmouth, Alguns Dias Depois*****Portsmouth está localizado no Condado de Hampshire, na costa sulina da Inglaterra. Existiam alguns pontos interessantes no lugar, como a fortificação de madeira que ficava na ponta do porto construída por Henry V e reconstruída em pedra por Henry VIII, que mandou erguer o Castelo Southsea também. Além de manterem uma doca seca no Porto, o lugar era considerado uma importante base naval usada pela Marinha Real Britânica. Havia sido daqui que Nelson deixou a Inglaterra para a Batalha de Trafalgar, para não mais retornar vivo. O fato deixou Hendrick perturbado por segundos. Apesar disso, Nelson cumpriu sua missão e agora, Hendrick precisava cumprir sua própria missão, ainda que necessitasse dispor da própria vida da mesma maneira.O pensamento de Hendrick estava ligado naquela consideração enquanto o navio HMS Sea
*****Canal da Mancha, Mais Alguns Dias Depois*****Com a patrulha não percebendo sinais de ataque inimigo, por enquanto, Hendrick decidiu que pequena parte da Esquadra Inglesa permaneceria estabelecida em pontos estratégicos para não chamar muita atenção dos Franceses. Porém, não muito longe uma da outra, caso o ataque começasse de repente, parecessem que estavam vigiando o Canal da Mancha, como de costume. Porque, se permanecessem unidos e estivessem sendo espreitados de perto, uma emboscada de proporções violentas seria inevitável. Isso, Hendrick deveria evitar a todo custo, portanto, seu plano serviria para que em qualquer movimento estranho, tivessem tempo de se reagrupar para o ataque iminente.Porém, a pior suspeita de Hendrick seria que os Rousseaus poderiam estar sabendo de seus planos iniciais e tivessem em mente empregar aquela manobra contra sua pessoa. Isso,
*****Canal da Mancha, Entre França e Inglaterra, 1810*****Na noite anterior, tudo estava indo bem, não havia sinal de nenhuma embarcação suspeita e o resto da Frota continuava patrulhando o Canal da Mancha, sem qualquer problema aparente. Era bem cedo e Hendrick foi tomar seu desjejum fora de seu camarote, apreciou os ovos com bacon e uma boa xícara de café logo pela manhã. Depois, foi patrulhar ao mar de seu posto, observando bem o que poderia estar acontecendo, mas tudo continuava pacificamente bem. De repente, se ouviu um grito e uma agitação vinda de longe, o que chamou a atenção de Hendrick. Querendo saber o que estava acontecido, Hendrick se encaminhou até onde o barulho estava acontecendo e foi como se uma bomba tivesse caído aos seus pés! Ali, bem diante de si mesmo, estava Ebonnie, sendo segurada por dois de seus oficiais, mostrando resistência, us
*****— Por Dieu, mana! — quem falava era Bressane, irmão de Annabel, numa embarcação escondida, dentro de uma das cavernas de Rocher. — Esse tal de Hendrick está perto de descobrir nosso plano de ataque!— Então, só existe um meio de pará-lo, mano! — Annabel disse, com seus olhos faiscando. — Vamos sequestrá-lo e trazê-lo para nossa embarcação! Temos que invadir o navio desse homem, mesmo sendo muito arriscado!— De total acordo, mana! — Bressane concordou. — Com esse homem em nossas mãos, como é extremamente importante para a Inglaterra, pensarão duas vezes antes de enfrentar-nos de novo!Assim, naquela mesma noite, Hendrick estava comendo normalmente, sem saber que destino estava prestes a enfrentar...Sem saber de nada, seus homens foram dopados com láudano pelos cozinheiros, além d
*****Enquanto isso, na embarcação onde Hendrick foi sequestrado, sua noiva Ebonnie, depois de muito chorar, resolveu agir, não deixaria que levassem seu Hendrick embora e invadissem a Inglaterra, afinal, era filha do Almirante Nelson também e isso estava no seu sangue.Horatio e Frances não viviam mais unidos desde 1800, quando Horatio escolheu continuar mantendo um caso com Lady Emma Hamilton. Ambos, mesmo casados, eram amantes. Era de conhecimento geral, que Horatio teve uma filha com Emma, à quem deram o nome de Horatia. Ainda que Ebonnie não convivesse com sua meia-irmã Horatia, sabia de sua existência. Sua mãe Frances, conhecida como Fanny, se tornou uma pessoa amargurada por causa disso. Foi um escândalo enorme, na época, sendo comentado por todas as pessoas. Apesar de Ebonnie viver meio que reclusa com a mãe Fanny, aos dezessete anos, depois de alguma insistência, tev
*****No navio Inglês, os irmãos Rousseaus, agora sem máscaras, foram levados até dois camarotes pequenos, sem regalias, já que não mereciam nada, depois do que fizeram com Hendrick. Ebonnie abraçou Hendrick com ternura e ficou muito surpreendido de ter conseguido salvá-lo com o auxílio de Jonathan, seu servo muito leal, mas precisava contar que não mais podia se casarem...Já havia passado algumas horas, quando Hendrick apareceu com melhor aparência, comeu um pouco e parecia revigorado.Os dias que passou nas mãos dos irmãos Rousseaus tinha deixado-o atordoado, não merecia o que aconteceu.Ainda estava se recuperando de tudo, das agressões, da privação e agradecendo, que pelo menos, seu valete Randall conseguiu cuidar de sua pessoa um pouco, enquanto estava no cativeiro. Assim, foi agradecer-lhe por haver sido tratado, enquanto era
*****Depois de chorar durante algum tempo, Ebonnie se levantou da cama e enxugou o resto de suas lágrimas, não valia a pena chorar pela situação, já que o mal estava feito, infelizmente. Mas precisava ver a mulher com quem Hendrick estava casado, necessitava olhar em seus olhos e conversarem seriamente.Desse modo, agora melhor disposta e cheia de fúria, abriu a porta do quarto e foi até o camarote da ordinária, que havia obrigado seu Hendrick a casar compelido, num casamento hediondo. Ebonnie percebeu o Oficial que estava tomando conta da porta do camarote e pediu autorização para entrar.O homem não achou uma boa ideia e tentou explicar isso para Ebonnie, mas era extremamente teimosa e com seu jeitinho delicado, conseguiu convencer o homem a deixá-la entrar por alguns minutos.Assim que entrou, Ebonnie percebeu a mulher recostada na cama, de olhos fechados, mas assim qu
*****Canal da Mancha, Entre França e Inglaterra, 1810*****Hendrick achou melhor não incomodar Ebonnie durante algumas horas, sabia que havia sido um choque o que aconteceu, mas nada podia fazer, por enquanto. Passou um tempo vigiando a costa, olhando alguns papéis e mapas, tentando descobrir qual tática seria usada para tentarem invadir a Inglaterra, porque mesmo estando com os irmãos Rousseaus, uma Frota estava na espera de atacar.Não seria fácil arrancar de ambos, seu plano de ataque, estavam demonstrando apenas desprezo e apatia, como se não ligassem ao fato de estarem presos.Depois de alguns momentos, Hendrick resolveu procurar Bressane e Annabel, para tentar arrancar algo dos dois, mas sabia que seria praticamente impossível, mas tentaria pela Inglaterra.O primeiro que visitou foi Bressane, que estava num pequeno camarote, totalmente amarrado, para que não tenta