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Canal da Mancha, Entre França e Inglaterra, 1810
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Na noite anterior, tudo estava indo bem, não havia sinal de nenhuma embarcação suspeita e o resto da Frota continuava patrulhando o Canal da Mancha, sem qualquer problema aparente. Era bem cedo e Hendrick foi tomar seu desjejum fora de seu camarote, apreciou os ovos com bacon e uma boa xícara de café logo pela manhã. Depois, foi patrulhar ao mar de seu posto, observando bem o que poderia estar acontecendo, mas tudo continuava pacificamente bem. De repente, se ouviu um grito e uma agitação vinda de longe, o que chamou a atenção de Hendrick. Querendo saber o que estava acontecido, Hendrick se encaminhou até onde o barulho estava acontecendo e foi como se uma bomba tivesse caído aos seus pés! Ali, bem diante de si mesmo, estava Ebonnie, sendo segurada por dois de seus oficiais, mostrando resistência, usando roupas masculinas, indumentária de Oficial de patente inferior. Estava com jaqueta azul-marinho e meias brancas, além do colarinho branco, sinal do homem do mar. Seus cabelos estavam cortados na altura dos ombros e mantidos presos com uma fita de cetim. Perecia alguém da tripulação, podendo enganar a todos, se passando por um jovem rapaz.
— Mas o que representa isso!? — Hendrick estava de olhos arregalados. — Ebonnie!!! Como conseguiu entrar aqui dentro!? Desde quando está aqui, por Deus!? Eu estou simplesmente estarrecido, quero saber o que está fazendo nessa embarcação!
— Mande seus oficiais me soltarem! — Ebonnie disse, de nariz empinado, mostrando orgulho. — Que explicarei tudo!
Ao falar, Hendrick deu ordens para que soltassem-na, enquanto Ebonnie arrumava seu vestuário.
— Eu estou aqui desde o primeiro dia em que saiu em missão, não podia deixá-lo sozinho assim, algo me disse que precisava estar ao seu lado! Então, mexi meus pauzinhos e descobri para onde você partiria, uns dias antes e mantive segredo! — Ebonnie disse, com seus olhos de avelã bem abertos. — Assim, consegui pedir auxílio para um de seus oficiais, em troca de uma boa recompensa e que me desse uma vestimenta adequada! Como pode ver, cortei o cabelo também, mas nem me importei! Eu passei despercebida até agora, mas alguém me reconheceu como não sendo da tripulação e esses brutamontes me pegaram como se fosse um cão!
Hendrick estava embasbacado, essa era a palavra que veio em sua mente. Como sua noiva Ebonnie teve coragem de cometer uma loucura daquelas? Agora teria que mandá-la de volta para casa.
— Ebonnie, quem assessorou-lhe nisso? Eu quero saber! — Hendrick estava alarmado. — O que você fez, foi de muita irresponsabilidade, tenho que mandá-la para casa o mais rapidamente possível, você não poderá ficar aqui!
— Eu não pretendo contar! Mas por que não posso ficar do seu lado? — Ebonnie estava quase chorando, ao pensar em se ver afastada de Hendrick. — Eu quero ficar perto de você, não vou atrapalhar!
— Só que você não pode ficar aqui! Onde já se viu uma coisa dessas? — Hendrick se sentiu um palerma com aquilo. — Sua ousadia foi longe demais, tenho que mandá-la embora para casa agora!
— Por favor, não faça isso, Hendrick... — os olhos de Ebonnie estavam se enchendo de lágrimas. — Não tenho como voltar para casa, estamos longe...
— Não quero discussões, Ebonnie, o que você fez foi de total insensatez! Mais tarde conversamos, para você me contar quem colocou-lhe entre meus tripulantes e o que mais andou aprontando! Não pensou em sua reputação? — Hendrick estava furioso. — Prefere ficar com minha mãe Rachel ou prefere ficar com sua mãe Frances? Você precisa voltar imediatamente para Londres e temos que dar uma boa desculpa para seu sumiço!
Assim, antes que Ebonnie pudesse reclamar mais alguma coisa, Hendrick deu ordens para que levassem-na para algum camarote e um dos oficiais ficasse na porta vigiando, para que não fizesse mais nenhuma bobagem.
Hendrick estava furioso com a atitude de Ebonnie realmente. Mas estava preocupado com uma coisa... Se Ebonnie teve acesso ao segredo de estar partindo em missão, quem mais poderia estar sabendo? Era uma possibilidade a que se considerar...
Naquela mesma noite, Hendrick jantou com Ebonnie. Quase não falava, enquanto Ebonnie desfiava um rosário sobre sua aventura em querer ficar naquele navio. Ebonnie sabia que estava encrencada, que aquilo poderia custar seu noivado, mas sabia que tinha que ficar com Hendrick, algo dizia que precisaria de sua pessoa realmente. Conversaram mais alguns assuntos e Hendrick disse-lhe, que enquanto estivessem em alto-mar, teria que continuar usando roupas masculinas, porque não tinham quaisquer roupas decentes para Ebonnie, que estava apenas com bagagem de roupas de Marinheiros.
Sendo assim, depois dessa pequena discussão entre ambos, que Hendrick deu uma última olhada de seu posto o Canal da Mancha, mandou Ebonnie ir dormir e como estava sonolento também, por haver ficado horas acordado, foi dormir também.
Na manhã seguinte, uma névoa cobria o Canal da Mancha, mas logo se dissipou, o que deixou Hendrick mais tranquilo, porque uma bruma como aquelas, poderia fazer com que houvesse um ataque surpresa e não estava preparado para aquilo.
Sua preocupação maior era Ebonnie, não sabia como mandá-la embora agora, com uma emboscada próxima dos navios Franceses, isso ficava inviável, mas também não poderia deixá-la na embarcação. Por que essa menina tinha que fazer isso?
Então, resolveu pensar mais tarde no que faria e chamou seu Capitão Jonathan, que veio rapidamente, com um sorriso de orelha a orelha, encantado em ser útil a Hendrick.
— Então, Jonathan, alguma coisa diferente em alto-mar essa manhã? — Hendrick perguntou, preocupado. — Nada de anormal?
— Não, senhor, nada, está tudo calmo. — Jonathan falou suavemente, mas depois seu semblante mudou e resolveu comentar algo que estava deixando preocupado seus nervos. — Senhor, não sei se sabe, mas estamos próximos da Ilha de Rocher, existem grandes cavernas naturais lá, que poderiam esconder barcos inteiros sem problema nenhum, um ataque iminente poderia vir desse lugar, não acha?
"Mas é claro, como não pensei nisso antes! Rocher era aliada da França, seus barcos seriam usados na Frota de Napoleão também!", pensou Hendrick.
Enquanto ambos conversavam, trocando ideias sobre ataques surpresas e como vencer a Frota de Napoleão, uma pessoa fingia nada escutar, fazendo seu trabalho normalmente...
Essa pessoa era Pierre Legrande, um espião Francês, que fingia ser Inglês, trabalhando no barco de Hendrick, para colher informações e m****r para os inimigos. Todos se comunicam através de pombos-correios, que hora ou outra, pousavam na embarcação.
Assim, esperando um desses pombos-correios aparecer, sem que ninguém percebesse, Pierre colocou uma mensagem, dizendo que os Ingleses estavam próximos de descobrir de onde viria seu ataque e com isso, deixou o pombo-correio ir embora, levando a mensagem. Infelizmente, naquele navio, existiam muitos traidores...
*****— Por Dieu, mana! — quem falava era Bressane, irmão de Annabel, numa embarcação escondida, dentro de uma das cavernas de Rocher. — Esse tal de Hendrick está perto de descobrir nosso plano de ataque!— Então, só existe um meio de pará-lo, mano! — Annabel disse, com seus olhos faiscando. — Vamos sequestrá-lo e trazê-lo para nossa embarcação! Temos que invadir o navio desse homem, mesmo sendo muito arriscado!— De total acordo, mana! — Bressane concordou. — Com esse homem em nossas mãos, como é extremamente importante para a Inglaterra, pensarão duas vezes antes de enfrentar-nos de novo!Assim, naquela mesma noite, Hendrick estava comendo normalmente, sem saber que destino estava prestes a enfrentar...Sem saber de nada, seus homens foram dopados com láudano pelos cozinheiros, além d
*****Enquanto isso, na embarcação onde Hendrick foi sequestrado, sua noiva Ebonnie, depois de muito chorar, resolveu agir, não deixaria que levassem seu Hendrick embora e invadissem a Inglaterra, afinal, era filha do Almirante Nelson também e isso estava no seu sangue.Horatio e Frances não viviam mais unidos desde 1800, quando Horatio escolheu continuar mantendo um caso com Lady Emma Hamilton. Ambos, mesmo casados, eram amantes. Era de conhecimento geral, que Horatio teve uma filha com Emma, à quem deram o nome de Horatia. Ainda que Ebonnie não convivesse com sua meia-irmã Horatia, sabia de sua existência. Sua mãe Frances, conhecida como Fanny, se tornou uma pessoa amargurada por causa disso. Foi um escândalo enorme, na época, sendo comentado por todas as pessoas. Apesar de Ebonnie viver meio que reclusa com a mãe Fanny, aos dezessete anos, depois de alguma insistência, tev
*****No navio Inglês, os irmãos Rousseaus, agora sem máscaras, foram levados até dois camarotes pequenos, sem regalias, já que não mereciam nada, depois do que fizeram com Hendrick. Ebonnie abraçou Hendrick com ternura e ficou muito surpreendido de ter conseguido salvá-lo com o auxílio de Jonathan, seu servo muito leal, mas precisava contar que não mais podia se casarem...Já havia passado algumas horas, quando Hendrick apareceu com melhor aparência, comeu um pouco e parecia revigorado.Os dias que passou nas mãos dos irmãos Rousseaus tinha deixado-o atordoado, não merecia o que aconteceu.Ainda estava se recuperando de tudo, das agressões, da privação e agradecendo, que pelo menos, seu valete Randall conseguiu cuidar de sua pessoa um pouco, enquanto estava no cativeiro. Assim, foi agradecer-lhe por haver sido tratado, enquanto era
*****Depois de chorar durante algum tempo, Ebonnie se levantou da cama e enxugou o resto de suas lágrimas, não valia a pena chorar pela situação, já que o mal estava feito, infelizmente. Mas precisava ver a mulher com quem Hendrick estava casado, necessitava olhar em seus olhos e conversarem seriamente.Desse modo, agora melhor disposta e cheia de fúria, abriu a porta do quarto e foi até o camarote da ordinária, que havia obrigado seu Hendrick a casar compelido, num casamento hediondo. Ebonnie percebeu o Oficial que estava tomando conta da porta do camarote e pediu autorização para entrar.O homem não achou uma boa ideia e tentou explicar isso para Ebonnie, mas era extremamente teimosa e com seu jeitinho delicado, conseguiu convencer o homem a deixá-la entrar por alguns minutos.Assim que entrou, Ebonnie percebeu a mulher recostada na cama, de olhos fechados, mas assim qu
*****Canal da Mancha, Entre França e Inglaterra, 1810*****Hendrick achou melhor não incomodar Ebonnie durante algumas horas, sabia que havia sido um choque o que aconteceu, mas nada podia fazer, por enquanto. Passou um tempo vigiando a costa, olhando alguns papéis e mapas, tentando descobrir qual tática seria usada para tentarem invadir a Inglaterra, porque mesmo estando com os irmãos Rousseaus, uma Frota estava na espera de atacar.Não seria fácil arrancar de ambos, seu plano de ataque, estavam demonstrando apenas desprezo e apatia, como se não ligassem ao fato de estarem presos.Depois de alguns momentos, Hendrick resolveu procurar Bressane e Annabel, para tentar arrancar algo dos dois, mas sabia que seria praticamente impossível, mas tentaria pela Inglaterra.O primeiro que visitou foi Bressane, que estava num pequeno camarote, totalmente amarrado, para que não tenta
*****Canal da Mancha, Sete Dias Depois*****Os sete dias que se passaram, foram de tormento para Hendrick, porque não havia sinal das embarcações Francesas e Rocherianas. Todos os dias visitava os irmãos Rousseaus, na tentativa de conseguir alguma informação, mas só conseguia era aumentar seu ódio por ambos.Hendrick estava confuso, principalmente com Annabel, que brincava com seus sentidos. Por que estava tão fascinado? Era inegável, aquela mulher sabia atrair a atenção de um homem, mesmo que fosse pelo ódio mais puro. Havia proibido Ebonnie de visitá-la e se ver mais atormentada.Quantos amantes teve em vida, para ser tão surpreendente? Annabel sabia chamar um homem através de sua libido, provocando um sentimento de pura confusão e atração.Devia estar sentindo repúdio, mas estava sentindo uma mistur
*****O dia passou lento para Hendrick. Analisava o mar, andava de lá para cá dando ordens, mas automaticamente. Na hora de jantar, Ebonnie tentava puxar assunto, mas seu pensamento estava longe, bem longe... Terminaram de comer e Hendrick mandou Ebonnie ir deitar. Não estava com paciência para conversar realmente.Ambos se deram boa noite e foram para seus camarotes. Hendrick não entendia o que estava acontecendo... Seu coração chegou a bater por Ebonnie, tinha tudo que um homem precisava, mas isso parecia nada comparado com Annabel, tão fogosa e tão primorosa... Devia odiar aquela mulher, porque afinal de contas, desconfiavam que seu marido Vernell havia matado seu tio Nelson... Mas não, estava extasiado!No quarto, Hendrick andou de um lado para outro, atormentado... Não conseguiria dormir, tinha que ver Annabel, precisava estar próximo daquela mulher...Assim, depois de
*****Na manhã seguinte, Hendrick acordou com uma sensação que havia tido um sonho espetacular... Mas não, era verdade! Como sua vida havia mudado em tão poucos dias? Como se apaixonou tão facilmente pela mulher que considerou sua inimiga e agora demonstrava ser mais uma vítima de Napoleão Bonaparte?O que mais preocupava-lhe, era como contaria para seus compatriotas a situação que estava envolvido... Pelo menos, até agora, ninguém estava sabendo que os irmãos corsários, eram na verdade, o Príncipe e a Princesa da Ilha de Rocher...Assim, precisando colocar tudo em ordem, tocou a sineta, chamando seu valete, que veio correndo, prontamente. Então, trocado, foi tomar seu café da manhã. Percebeu que Ebonnie ainda não havia levantado, até porque era muito cedo. Tanto melhor, precisa dar ordens, que seus oficiais, com certeza, n&